O Direito Urbanístico, tratado muitas vezes como consequência da proteção do meio ambiente artificial ou da própria disciplina de Direito Ambiental ou mesmo um capítulo de manuais de Direito Administrativo, tem sido adotado, em linhas gerais, como o estudo da cidade ou o “conjunto de normas disciplinadoras do ordenamento urbano”.1
Mas este estudo da cidade não está apenas ligado ao espaço, mas também aos seus habitantes. Paulo Affonso Leme Machado afirma que o direito urbanístico preocupa-se com o “desenvolvimento da cidade para assegurar, através do emprego de todos os recursos técnicos disponíveis, vida condigna para toda a população”.2
Conclui Machado que “não trata somente do melhoramento viário e higiênico, como em outros tempos. A legislação urbanística deve cogitar das exigências globais da comunidade, procurando impedir a criação de áreas de sub-habitação”.3
O art. 182 da CF consigna expressamente que a política de desenvolvimento urbano deve promover a função social da cidade e o bem-estar dos seus habitantes.
O zoneamento ambiental, um dos principais procedimentos urbanísticos, conforme a Lei 6.938/1981, tem justamente o objetivo de regular o uso da propriedade do solo no interesse maior coletivo.
O inciso VIII do art. 30 da CF preceitua que compete aos Municípios, responsáveis diretos pela urbanização, promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.
Neste sentido, a previsão do art. 182 da CF, ao determinar que o Poder Público Municipal seja o responsável pela execução da política de desenvolvimento urbano e o instrumento básico para isso é o plano diretor (art. 182, § 1.º).
A presente disciplina está vinculada também ao meio ambiente cultural, pois a preservação do patrimônio histórico e cultural, necessariamente, interferirá no ordenamento urbano como bem lembra Lúcia Valle Figueiredo.4
José Afonso da Silva apresenta o direito urbanístico de duas formas:5
Direito urbanístico objetivo |
Consiste no conjunto de normas que têm por objeto organizar os espaços habitáveis, de modo a propiciar melhores condições de vida ao homem na comunidade. |
Direito urbanístico como ciência |
É o ramo do direito público que tem por objeto expor, interpretar e sistematizar as normas e princípios disciplinadores dos espaços habitáveis. |
Para fins de exame de ordem, vamos encontrar questões urbanísticas também na disciplina de Direito Administrativo, quando se aborda o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001). No entanto, ainda é cedo para dissociar o Direito Urbanístico das disciplinas “tradicionais” e termos uma regularidade nas provas da OAB, apesar da crescente cobrança em concursos jurídicos, principalmente, para cargos de procurador de município.
O art. 24 da CF informa que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre direito urbanístico (inciso I). Já vimos no capítulo 1 desta obra que este artigo trata da competência concorrente, sendo importante observar as seguintes regras:
• a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais;
• a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados;
• inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades;
• a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.
As normas urbanísticas brasileiras, como bem assevera a doutrina, ainda não adquiriram unidade substancial, formando conjunto coerente e sistematizado legislativamente como acontece em outras disciplinas. Não há uma consolidação normativa, muito menos um código urbanístico como há em outros países, por exemplo, no Uruguai e na França.
Elida Séguin muito bem coloca que as normas urbanísticas têm, entre si, “pura conexão na razão do objeto específico: a ordenação dos espaços habitáveis ou da sistematização do território objetivando atender as funções básicas do homem previstas na Carta de Atenas: habitação, trabalho, lazer e circulação”.6
Hely Lopes Meirelles já previa que as normas urbanísticas tinham de baixar do plano nacional ao local, “numa gradação descendente de medidas gerais que se vão particularizando do âmbito federal ao estadual, e deste ao municipal, de modo a formar um sistema, orgânico e funcional, com a tessitura própria de cada entidade estatal”.7
Como podemos observar, o art. 24 da CF não incluiu os Municípios na competência legislativa concorrente sobre direito urbanístico, no entanto, não há dúvidas de que a ordenação das cidades passa necessariamente por normas de interesse local (art. 30, I, da CF), como já deferiu o STJ.8
A Carta Magna trata também da divisão da competência material (executiva ou administrativa) em relação à disciplina, assim disposta:
Entes Federativos |
Competência Material |
Atividades |
União |
Exclusiva |
Elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social (IX); |
União, Estados, DF e Municípios |
Comum |
Proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos (III); |
Municípios |
Exclusiva |
Promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (VIII). |
Lembrando o que já foi dito, será o Poder Público Municipal o executor da política de desenvolvimento urbano, desde que observadas as diretrizes gerais fixadas em lei conforme determina o art. 182 da CF. A União, a partir da sua competência prevista no inciso XX do art. 21 da CF, instituiu tais diretrizes gerais com a promulgação da Lei 10.257/2001 denominada Estatuto da Cidade.9
Além das disposições constitucionais e as leis ordinárias que trazem matéria urbanística, a CF prevê um único caso em que se exige a edição de lei complementar, notadamente para que os Estados possam instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum (art. 25, § 3.º).
Por fim, José Afonso da Silva apresenta “três complexos de normas urbanísticas”, que são:10
• Normas de sistematização urbanística – que estruturam os instrumentos de organização dos espaços habitáveis, e são as pertinentes ao planejamento urbanístico e à ordenação do solo em geral e de áreas de interesse especial;
• Normas de intervenção urbanística – que se referem à delimitação e limitações ao direito de propriedade e ao direito de construir;
• Normas de controle urbanístico – que são aquelas destinadas a reger a conduta dos indivíduos quanto ao uso do solo, como as que estabelecem diretrizes de atividades urbanísticas dos particulares, as que regulam a aprovação de urbanificação, a outorga de certificado ou certidão de uso do solo, a licença para urbanificar ou para edificar.
Sob o título “Política Urbana”, a Constituição Federal traz importantes diretrizes em dois artigos (arts. 182 e 183) desdobrados, posteriormente, no Estatuto da Cidade.
Preceitua o § 1.º do art. 182 da CF:
O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.
Nas palavras de Hely Lopes Meirelles: “é o complexo de normas legais e diretrizes técnicas para o desenvolvimento global e constante do Município, sob os aspectos físico, social, econômico e administrativo, desejado pela comunidade local”.11
O Estatuto da Cidade repete a designação constitucional de que o plano diretor é “instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana” (art. 40) e que será aprovado por lei municipal (“aprovado pela Câmara Municipal”, segundo a CF). Esta lei deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos (art. 40, § 3.º), pois o plano diretor deve ser mutável e dinâmico, segundo Elida Séguin, porque, para atingir a sua finalidade, deve variar no tempo para “acompanhar o crescimento e as necessidades da cidade”.12
A elaboração do plano diretor é da competência do Executivo Municipal (iniciativa do projeto de lei) e é obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, sendo que o Estatuto da Cidade determinou que estes municípios deveriam aprovar o seu plano até 30 de junho de 2008 (art. 50, redação dada pela Lei 11.673/2008).
O aspecto físico do plano diretor, segundo José Afonso da Silva, é o seu “aspecto fundamental”,13 tendo em vista que o planejamento territorial visa a transformar a organização do solo, inclusive no seu aspecto econômico (destinação industrial e comercial do solo), buscando a qualidade de vida ao prever loteamentos, sistema viário, de zoneamento urbano, áreas verdes, entre outras diretrizes.
É importante ainda destacar que no processo de elaboração do plano diretor a participação popular é obrigatória por meio de audiências públicas e debates também com a presença de associações representativas dos vários segmentos da comunidade, além do acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos (art. 40, § 4.º, I a III).
Por fim, o Estatuto da Cidade determina, por meio de seu art. 42, que o plano diretor deverá, no mínimo, conter:
a) a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infraestrutura e de demanda para utilização;
b) o direito de preempção (preferência do Poder Público Municipal para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares);
c) fixação de áreas nas quais o direito de construir poderá ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário;
d) fixação de áreas nas quais poderá ser permitida alteração de uso do solo, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário;
e) delimitação de área para aplicação de operações consorciadas (conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental);
f) a transferência do direito de construir a que se refere o art. 35;
g) o sistema de acompanhamento e controle.
O direito à propriedade está previsto no inciso XXII do art. 5.º da CF: “é garantido o direito de propriedade”. No entanto, esta garantia não é absoluta, havendo limitações, como estabelece o inciso seguinte (XXIII): “a propriedade atenderá a sua função social”.
Enquanto a propriedade rural tem a sua função social cumprida pelo atendimento aos critérios do art. 186 da CF, a propriedade urbana cumpre a sua quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor (art. 182, § 2.º, da CF).
O problema está em distinguir a propriedade rural da urbana. Neste sentido, André Ramos Tavares acrescenta que “alguns doutrinadores defendem que a noção correlaciona-se com a situação do imóvel (em zona rural ou urbana). Para outros, interessa averiguar a destinação pelo imóvel”.14
Apesar da indecisão dogmática, o Código Tributário Nacional, para efeitos da cobrança de IPTU, aponta a lei municipal como definidora da zona urbana, desde que respeite pelo menos dois requisitos do § 1.º do seu art. 32. O Estatuto da Terra (Lei 4.504/1964), por sua vez, define imóvel rural como sendo o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 4.º, I).
Determinada a zona urbana, o imóvel deverá cumprir sua função social prevista no caput do art. 39 do Estatuto da Cidade:
A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2.o desta Lei.
Portanto, as diretrizes do plano diretor do Município onde se encontre a propriedade urbana regulamentarão a sua função social, observadas as diretrizes gerais do Estatuto (vide art. 2.º, principalmente inciso VI). Nas palavras de Elida Séguin, a função social “passa a estar atrelada ao aproveitamento e à destinação que o Plano Diretor lhe atribuiu”.15
Para tanto, o constituinte atrelou também ao plano diretor restrições ao direito de propriedade ao prever, inclusive, desapropriação de propriedade urbana não edificada, subutilizada ou não utilizada (art. 182, § 4.º, III), o que a doutrina costuma denominar de desapropriação urbanística.16
Esta espécie de desapropriação está prevista no Estatuto em seu art. 8.º e somente será aplicada como sanção depois de:
• Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo no tempo (mediante a majoração da alíquota por este prazo, art. 7.º) sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação (condições e prazos) de parcelamento, edificação ou utilização do imóvel (art. 5.º).
O pagamento da indenização pela desapropriação, de caráter sancionatório, será feito em títulos da dívida pública, de prévia aprovação pelo Senado Federal, a serem resgatados no prazo de até dez anos, em prestações anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais de seis por cento ao ano (art. 8.º, § 1.º, do Estatuto e art. 182, § 4.º, III, da CF).
Não confundir com a desapropriação de imóveis urbanos do § 3.º do art. 182, pois esta será feita com “prévia e justa indenização em dinheiro”, normalmente, por utilidade ou necessidade pública (art. 5.º, XXIV, da CF).
Diz o caput do art. 183 da CF:
Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
É o que está também insculpido no art. 9.º do Estatuto e no art. 1.240 do Código Civil. Prevê, ainda, a Carta Magna que o título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil e que esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez (art. 183, §§ 1.º e 2.º).
Pois bem, usucapião é forma originária de aquisição de propriedade pelo decurso do tempo, no caso em tela, cinco anos, de quem detém posse sem oposição. Segundo lição de Elida Séguin, este usucapião especial urbano é uma “forma de regularização fundiária, onde busca-se tornar lícita a ocupação da terra que tenha ocorrido de modo irregular, como loteamentos clandestinos ou irregulares”.17
São partes legítimas para a propositura da ação de usucapião especial urbana (art. 12 do Estatuto):
I – o possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;
II – os possuidores, em estado de composse;
III – como substituto processual, a associação de moradores da comunidade, regularmente constituída, com personalidade jurídica, desde que explicitamente autorizada pelos representados.
O rito processual a ser adotado é o sumário (art. 14) e a usucapião poderá ser invocada como matéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título para registro no cartório de registro de imóveis (art. 13). É obrigatória a intervenção do Ministério Público (art. 12, § 1.º) e na pendência desta ação ficarão sobrestadas quaisquer outras ações, petitórias ou possessórias, que venham a ser propostas relativamente ao imóvel usucapiendo (art. 11).
Atente-se que os imóveis públicos, federais, estaduais, municipais e distritais não serão adquiridos por usucapião (art. 183, § 3.º, da CF).
Novidade trazida pelo Estatuto da Cidade, prevista no art. 10, que dispõe:
As áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.
A sentença que declarar a usucapião especial coletiva servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis, sendo atribuída igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas (art. 10, §§ 2.º e 3.º).
Será, portanto, constituído um condomínio especial, indivisível, não sendo passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio (§ 4.º).
Em 03.01.2012, foi sancionada a Lei 12.587/2012, que trata da Política Nacional de Mobilidade Urbana, cujos arts. 1.º e 2.º enunciam:
Art. 1.º A Política Nacional de Mobilidade Urbana é instrumento da política de desenvolvimento urbano de que tratam o inciso XX do art. 21 e o art. 182 da Constituição Federal, objetivando a integração entre os diferentes modos de transporte e a melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas e cargas no território do Município.
(...)
Art. 2.º A Política Nacional de Mobilidade Urbana tem por objetivo contribuir para o acesso universal à cidade, o fomento e a concretização das condições que contribuam para a efetivação dos princípios, objetivos e diretrizes da política de desenvolvimento urbano, por meio do planejamento e da gestão democrática do Sistema Nacional de Mobilidade Urbana.
A Política Nacional de Mobilidade Urbana tem como princípios, diretrizes e objetivos os seguintes:
Art. 5.º A Política Nacional de Mobilidade Urbana está fundamentada nos seguintes princípios:
I – acessibilidade universal;
II – desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais;
III – equidade no acesso dos cidadãos ao transporte público coletivo;
IV – eficiência, eficácia e efetividade na prestação dos serviços de transporte urbano;
V – gestão democrática e controle social do planejamento e avaliação da Política Nacional de Mobilidade Urbana;
VI – segurança nos deslocamentos das pessoas;
VII – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do uso dos diferentes modos e serviços;
VIII – equidade no uso do espaço público de circulação, vias e logradouros; e
IX – eficiência, eficácia e efetividade na circulação urbana.
Art. 6.º A Política Nacional de Mobilidade Urbana é orientada pelas seguintes diretrizes:
I – integração com a política de desenvolvimento urbano e respectivas políticas setoriais de habitação, saneamento básico, planejamento e gestão do uso do solo no âmbito dos entes federativos;
II – prioridade dos modos de transportes não motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado;
III – integração entre os modos e serviços de transporte urbano;
IV – mitigação dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade;
V – incentivo ao desenvolvimento científico-tecnológico e ao uso de energias renováveis e menos poluentes;
VI – priorização de projetos de transporte público coletivo estruturadores do território e indutores do desenvolvimento urbano integrado; e
VII – integração entre as cidades gêmeas localizadas na faixa de fronteira com outros países sobre a linha divisória internacional.
Art. 7.º A Política Nacional de Mobilidade Urbana possui os seguintes objetivos:
I – reduzir as desigualdades e promover a inclusão social;
II – promover o acesso aos serviços básicos e equipamentos sociais;
III – proporcionar melhoria nas condições urbanas da população no que se refere à acessibilidade e à mobilidade;
IV – promover o desenvolvimento sustentável com a mitigação dos custos ambientais e socioeconômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas nas cidades; e
V – consolidar a gestão democrática como instrumento e garantia da construção contínua do aprimoramento da mobilidade urbana.
Sobre as atribuições de cada ente político, confira os arts. 16 a 19 da Lei 12.587/2012.
Segundo Hely Lopes Meirelles, ordenamento urbano é “a disciplina da cidade e suas atividades, através da regulamentação edilícia, que rege desde a delimitação da urbe, o seu traçado, o uso e ocupação do solo, o zoneamento, o loteamento, o controle das construções, até a estética urbana”.18 Neste sentido, foi apontada ao Poder Público Municipal a responsabilidade de promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (art. 30, VIII, da CF), com a utilização de sistemas operacionais, padrões construtivos e aportes tecnológicos, de modo a reduzir impactos ambientais e economizar recursos naturais (art. 2º, XVII, da Lei 10.257/2001).
O Estatuto da Cidade traz, entre as diretrizes gerais da política urbana, a ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar (art. 2.º, VI):
a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura urbana;
d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como polos geradores de tráfego, sem a previsão da infraestrutura correspondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização;
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental;
h) a exposição da população a riscos de desastres.
Todas estas formas de degradação ao civilismo urbanístico estão compreendidas no objetivo da disciplina do ordenamento urbano. A ordenação do uso e ocupação do solo é um dos aspectos substanciais do planejamento urbanístico, segundo José Afonso da Silva,19 impondo-se, para sua efetividade, o zoneamento da cidade.
Em qualquer de suas qualificações (urbano, ambiental e industrial), afirma Elida Séguin, zoneamento é um “procedimento que tem como objetivo regular o uso da propriedade do solo e dos edifícios em áreas homogêneas, no interesse coletivo do bem-estar da população”.20
Nas palavras de Hely Lopes Meirelles, zoneamento urbano “consiste na repartição da cidade e das áreas urbanizáveis segundo a sua precípua destinação de uso e ocupação do solo”.21 Lei municipal deverá fixar as normas e critérios de zoneamento.
Já o loteamento urbano, segundo o § 1.º do art. 2.º da Lei 6.766/1979 (que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano), é a subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. Em outras palavras, é o modo procedimental do parcelamento do solo urbano ou urbanizável, voluntário e formal, em que o proprietário se submete às normas urbanísticas da legislação municipal, observado o plano diretor.
O conceito legal da Lei 6.766/1979 traz o termo gleba, que é justamente a área de terra que não foi loteada. É importante ainda destacar que esta lei trata de requisitos gerais (vide o art. 4.º), enquanto a lei municipal disporá sobre as peculiaridades locais ao regulamentar os loteamentos.
As questões abaixo abordadas foram retiradas de provas realizadas pelo CESPE dentro das disciplinas de Direito Ambiental, Direito Administrativo e Constitucional.
1. (OAB/CESPE 2007.1) Acerca de política urbana, agrícola e de reforma agrária, assinale a opção correta.
(A) Compete privativamente à União desapropriar o imóvel rural para fins de reforma agrária, mas essa competência somente poderá incidir sobre imóveis que não estejam cumprindo a sua função social, como, por exemplo, aqueles em que a atividade não favoreça o bem-estar dos trabalhadores.
(B) O beneficiário da distribuição de imóvel rural objeto da reforma agrária pode alienar o seu domínio imediatamente, sendo esse um dos grandes entraves à concretização da reforma agrária.
(C) O imóvel urbano que não esteja cumprindo a sua função social poderá ser imediatamente desapropriado, efetuando-se o pagamento com títulos da dívida pública.
(D) Os imóveis públicos urbanos não são suscetíveis de usucapião, mas essa restrição não se aplica aos imóveis públicos rurais.
2. (OAB/CESPE 2007.2) Acerca dos bens públicos, assinale a opção correta.
(A) Todas as terras devolutas são bens da União.
(B) As cavidades naturais subterrâneas, como as grutas, são bens dos municípios nas quais se encontram, cabendo a esses explorá-los economicamente sem prejuízo da ação fiscalizadora da União, dos estados e do DF.
(C) Nos casos de programas e projetos habitacionais de interesse social, desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública com atuação específica nessa área, a concessão de direito real de uso de imóveis públicos poderá ser contratada coletivamente.
(D) Os bens das empresas públicas e das sociedades de economia mista que prestam serviço público submetem-se ao regime próprio das empresas privadas.
3. (OAB/CESPE 2009.1) Com base na disciplina legal sobre a política de desenvolvimento urbano, julgue os itens a seguir.
I – Compete aos municípios instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, incluindo-se habitação, saneamento básico e transportes urbanos.
II – O plano diretor, instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana, é obrigatório para as cidades com mais de vinte mil habitantes, para as que pertencem a regiões metropolitanas e aglomerações urbanas e para as que integram área de especial interesse turístico.
III – Aquele que possuir, como sua, área ou edificação urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
IV – Compete aos municípios, como executores da política de desenvolvimento urbano e no exercício de sua autonomia legislativa, editar normas gerais de direito urbanístico.
Estão certos apenas os itens
(A) I e II.
(B) I e IV.
(C) II e III.
(D) III e IV.
4. (OAB/CESPE 2009.2) No que se refere à política urbana e à de reforma agrária, assinale a opção correta.
(A) Compete à União desapropriar, por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro.
(B) O plano diretor, aprovado pela câmara municipal, é obrigatório para cidades que tenham mais de vinte mil eleitores, nos termos do que dispõe o Estatuto das Cidades.
(C) É insuscetível de reforma agrária a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra.
(D) O imóvel público situado na área urbana só pode ser adquirido por usucapião se estiver sendo ocupado há cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, como moradia familiar, desde que os membros da família não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.
5. (OAB/FGV 03-2010) O Estudo de Impacto de Vizinhança – EIV é uma espécie do gênero Avaliação de Impacto Ambiental e está disciplinado no Estatuto da Cidade, que estabelece e enumera os instrumentos da política de desenvolvimento urbano, de acordo com seus arts. 4.º e 36 a 38. A esse respeito, assinale a alternativa correta.
(A) As atividades de relevante e significativo impacto ambiental que atingem mais de um Município são precedidas de estudo de impacto de vizinhança.
(B) O estudo de impacto de vizinhança só pode ser exigido em área rural pelo órgão ambiental municipal.
(C) A Avaliação de Impacto Ambiental é exigida para analisar o adensamento populacional e a geração de tráfego e demanda por transporte público advindos da edificação de um prédio.
(D) A elaboração de estudo de impacto de vizinhança não substitui a elaboração de estudo prévio de impacto ambiental, requerida nos termos da legislação ambiental.
GABARITO: As respostas destes testes encontram-se no final do livro.
___________
1 Disciplina urbanística da propriedade. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 32.
2 Direito ambiental brasileiro. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 108.
3 Ob. cit., p. 108.
4 Ob. cit., p. 35.
5 Direito urbanístico brasileiro. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 49.
6 Estatuto da cidade. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.25. A Carta de Atenas é um dos principais documentos sobre urbanismo mundial, datada de 1933, resultado do Congresso Internacional de Arquitetura Moderna realizado na Grécia.
7 Direito municipal brasileiro. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 370.
8 Ação Rescisória 756/PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe 14.04.2008.
9 José Afonso da Silva aponta como uma “lei geral de direito urbanístico”, pois a lei institui princípios de direito urbanístico, disciplina diversas figuras e institutos próprios da disciplina, bem como estabelece instrumentos da política urbana, regulamentando os arts. 182 e 183 da CF.
10 Ob. cit., p. 64.
11 Ob. cit., p. 383.
12 Ob. cit., p. 85.
13 Ob. cit., p. 140.
14 Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 599.
15 Ob. cit., p. 174.
16 ALEXANDRINO, Marcelo, e PAULO, Vicente. Direito administrativo. 13. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007. p. 601. José Afonso da Silva denomina também de desapropriação para fins urbanísticos (ob. cit., p. 421), no entanto, critica o Estatuto da Cidade por não ter disciplinado este instituto, uma vez que não se trata somente de desapropriação-sanção, mas também de outras formas de desapropriação, como para urbanização. O autor aponta o Decreto-Lei 3.365/1941 (Lei das Desapropriações) como regra a ser aplicada na hipótese de desapropriação por “utilidade pública”.
17 Ob. cit., p. 192.
18 Ob. cit., p. 386.
19 Ob. cit., p. 239.
20 Ob. cit., p. 76.
21 Ob. cit., p. 395.