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— As minhas sinceras condolências, Miles, pela perda da sua coleção única. Sei o que esses quadros representavam para si, e terem sido destruídos de uma forma tão cruel deve ser devastador.

— Obrigado, BW. Agradeço a preocupação — disse Faulkner, tentando parecer destroçado.

— É claro que sei que tinha planeado recomprar Limpton Hall, e com o tempo…

— Os quadros eram muito mais importantes para mim do que a casa, mas mesmo assim espero reaver o sinal de meio milhão de libras o mais depressa possível.

— A papelada já está em andamento. Pelo menos, o Vermeer está em segurança na sua nova casa, no Fitzmolean.

— Não por muito mais tempo.

— Não compreendo — disse Booth Watson.

— Nem há razão para que compreenda, BW. Digamos apenas que tenho planos para que ele se junte ao resto da minha coleção.

— Foi muito amável em receber-me, coronel — disse William, quando os dois homens se encontraram na área da receção. — Sei que o comandante está ansioso por pôr as novidades em dia consigo.

— O Hawksby foi um dos meus melhores subalternos. Teria dado um belo soldado — disse o coronel, seguindo William para dentro do elevador. — Vai ser bom rever esse jovem ao fim destes anos todos.

William reprimiu um sorriso enquanto saía do elevador e conduzia o coronel pelo corredor até ao gabinete do comandante. Bateu à porta e, ao entrarem, Hawk ergueu-se e fez a continência.

— É uma honra voltar a vê-lo, meu coronel — disse.

— Com a idade que tenho, fico sempre surpreendido por ainda haver quem se lembre de mim — disse o coronel, apertando-lhe a mão.

— Como é que alguém poderia esquecer? — disse Hawksby. — A minha geração foi criada à sombra de Colditz, Dunquerque e Navarone.

— Então, não foi o David Niven que comandou esse ataque? — disse William, entrando na brincadeira.

— Não — disse o coronel —, mas não me posso queixar. Quando o Niven conseguiu o papel, a minha reputação junto das senhoras até melhorou. Então, como posso ajudar?

— Coronel, posso perguntar-lhe se acha que a ideia do inspetor Warwick tem algum mérito?

— Com certeza que sim. Além disso, conheço o homem ideal para o trabalho. Na verdade, atualmente é vosso colega. Quando o capitão Scott Cairns deixou o regimento, a Polícia Metropolitana recrutou-o para criar a sua divisão antiterrorismo, que é mais ou menos o SAS com uniformes de cor diferente. Acho que irão constatar que já se encontra completamente operacional, embora tenha sido mantida em segredo.

— Nesse caso, teremos de desvendar o segredo — disse William. — Como é que entro em contacto com o capitão Cairns?

— Não sei — disse o coronel. — Mas não ficaria surpreendido se ele estivesse enfiado algures neste edifício.

— A Scotland Yard emprega mais de duas mil pessoas em mais de trezentos escritórios distribuídos por dezanove pisos, mas se ele estiver aqui hei de encontrá-lo antes do final do dia — disse Hawk. — Agora, só espero que os nossos rapazes sejam tão bons como os seus eram.

— São muito melhores — disse o coronel. — Em comparação, nós éramos um bando de amadores. Os de agora são profissionais altamente treinados, que farão o que for preciso para cumprir a missão.

— Mas terão o mesmo grau de loucura? — perguntou Hawk.

— Doidos varridos. Continua a ser a única qualificação essencial para a função. Entretanto, agora que já resolvi o vosso problema, posso pedir um favor?

— Tudo o que quiser — disse Hawk.

— Uma vez que consegui entrar finalmente na Scotland Yard sem ter sido preso, seria possível fazer uma visita guiada ao Museu do Crime?

— Quando nasce o bebé? — perguntou Christina, enquanto William saía da autoestrada e seguia as placas para Limpton, que tantas memórias lhe traziam.

— Já não falta muito — respondeu Beth.

— Devem estar os dois tão entusiasmados…

— O William tem mais uma ou duas coisas em que pensar neste momento.

— O que pode ser mais importante do que o vosso primeiro filho?

— Fogo posto e roubo de arte — disse William. — Mas espero ter resolvido ambos os casos antes que o Alexander ou a Vivien venha ao mundo.

— Boudicca ou Leonardo — atalhou Beth. — Como pode ver, ainda não chegámos a acordo sobre o nome. Mas, para já, vamos concentrar-nos no fogo posto.

— Nunca é fácil provar que alguém cometeu o crime de fogo posto — disse William. — A menos que haja sinais óbvios e reveladores, como vestígios de acelerante numa tábua do soalho, ou um trapo embebido em gasolina que foi enfiado dentro de casa através da caixa de correio. O tipo de erro crasso a que apenas amadores seriam capazes de esperar escapar impunes.

— E os profissionais? — perguntou Christina.

— Só precisam de um monte de lenços de papel colocados mesmo debaixo de um teto de madeira, junto a um aquecedor de imersão, e de um fósforo. Não há muita gente a cumprir pena de prisão por fogo posto, uma vez que é um dos crimes mais fáceis de cometer sem deixar rasto. Portanto, teremos de nos concentrar em provar que o Miles roubou os quadros antes de a casa ter sido consumida pelas chamas.

— Claro que roubou.

— Por mais que acredite que foi isso que aconteceu, Christina, e não estou a dizer que não concordo consigo, vai precisar de provas concretas para o caso poder ser aceite como válido em tribunal. Sem elas, as alegações vexatórias de uma ex-mulher furiosa tendem a ser alvo de chacota.

— William — disse Beth rispidamente —, isso é muito cruel, depois de tudo o que a Christina passou.

— Eu estou do lado dela — disse William. — Mas, a menos que descubra o que procuro, estaremos todos a perder o nosso tempo — acrescentou, ao mesmo tempo que virava para o caminho que levava a Limpton Hall, desta vez conduzindo com vagar.

— Então, começamos por onde? — indagou Christina.

— Revistamos o local a pente fino.

— O que procuramos? — perguntou Beth.

— Tudo o que tenha sobrevivido ao incêndio.

William passou pela casa da guarda abandonada e subiu o longo caminho de acesso, sem saber bem o que esperar. Por pouco não colidiu com uma árvore quando avistou pela primeira vez o que restava da linda mansão ao estilo de Lutyens que outrora se perfilava orgulhosamente no alto da colina, dominando a região circundante. A única coisa que restava eram duzentos metros quadrados de cinzas e escombros.

William estacionou o carro, abriu o porta-bagagens e tirou de lá três conjuntos de fato-macaco, botas Wellington e luvas de borracha. Depois de todos estarem equipados, foram até ao sítio onde estava antigamente a porta de entrada.

— Muito bem — disse ele. — Temos de ser o mais metódicos possível. Começamos deste lado e vamos progredindo em linha reta, depois damos três passos para a direita e repetimos o mesmo exercício no regresso. Se encontrarem alguma coisa que tenha sobrevivido às chamas, digam.

— Isto conta? — perguntou Beth, inclinando-se e retirando a aldraba da porta do meio das cinzas.

— Um início promissor — disse William, depois de a examinar com mais atenção, enfiando a primeira descoberta dentro de um grande saco do lixo preto.

Passados uns minutos, Beth voltou a descobrir alguma coisa, desta vez uma torneira de banheira, seguida de Christina com um ovo de mármore.

— Comprei-o quando estivemos de férias em Atenas — disse, enquanto William o examinava mais atentamente antes de o guardar no saco.

Passou algum tempo até ele perguntar:

— O que é isto?

Os três analisaram a descoberta mais recente e depois Christina respondeu:

— É o mecanismo de corda do nosso relógio de parede antigo. Um presente de casamento — acrescentou tristemente.

— Excelente — disse William, colocando-o dentro do saco.

— Porquê? — perguntou Beth.

— Mais tarde… Ainda não temos o suficiente. Mas precisas de descansar? — perguntou, olhando ansiosamente para a mulher, que estava com ar fatigado. — O meu filho não te agradecerá se nascer entre as cinzas.

— Ao passo que a minha filha é capaz de estar a gostar demasiado da busca para parar agora — redarguiu Beth.

— O que se esqueceu de me contar, senhora Warwick, se é que posso perguntar? — disse William, que ficou parado no meio de um monte de cinzas a olhar para a mulher.

— Oh! Ter-me-ei esquecido de lhe contar que vai ser pai de gémeos, senhor Warwick?

William e Beth começaram a saltar de alegria e a abraçar-se enquanto Christina largava o seu saco para aplaudir. Levaram algum tempo até voltarem à sua tarefa, embora William sentisse dificuldade em concentrar-se.

— Isto serve para alguma coisa? — perguntou Christina passados uns minutos, entregando-lhe um gancho de pendurar quadros.

— A nossa melhor descoberta até agora — disse ele, ainda não recuperado da notícia. — No entanto, precisamos do maior número de ganchos possível.

E acrescentou o pequeno gancho à sua coleção.

— Porquê? — quis saber Beth.

— Mais tarde — disse William.

Passou-se mais uma hora até terem os três sacos de lixo cheios com inúmeros objetos diferentes, altura em que William insistiu para que fizessem uma pausa.

— Creio que merecemos todos um almoço comemorativo no Limpton Arms — disse Christina, enquanto guardavam os sacos no porta-bagagens.

— Só se o William tiver encontrado a coisa que procurava — disse Beth.

— Em vez de uma, encontrei sessenta e uma — replicou William. — E penso estar agora em condições de provar que os quadros foram retirados da casa antes de a incendiarem. Mas, para ter a certeza absoluta, ainda preciso de visitar o Fitzmolean.

— O coronel resolveu um dos nossos problemas — disse Lamont durante a reunião de segunda-feira de manhã. — Assisti a um ensaio num bloco de apartamentos devolutos em Croydon, na sexta-feira passada, e posso dizer que o inspetor-chefe Scott Cairns e a sua equipa fizeram todo o exercício em bem menos de cinco minutos.

— Isso é impressionante! — exclamou Hawk. — Mas não resolve o nosso problema no terreno, onde os vigias conseguirão ver-nos a um quilómetro de distância, o que lhes dá tempo mais do que suficiente para fechar a fábrica e desaparecer nos seus esconderijos antes de conseguirmos chegar sequer à porta de entrada.

— Será que estamos a abordar o problema da perspetiva errada? — perguntou William. — Talvez devêssemos pensar numa solução mais simples.

— Esclareça-me lá.

— O nosso plano atual é ter uma dúzia de homens armados escondidos no apartamento que arrendámos no bloco B e, assim que a ordem for dada, eles assumem o controlo da passagem entre os prédios e prendem qualquer pessoa que tente fugir através dessa porta.

— E que mal tem isso? — disse Lamont rispidamente.

— Porque não fazer exatamente o oposto? Sabemos que há pouca ou nenhuma hipótese de deitar abaixo a porta de aço reforçado do matadouro, ou mesmo de chegar lá perto, antes de o Rashidi estar de volta ao seu apartamento no bloco B.

— É precisamente por isso que teremos agentes armados à espera dele na passagem — disse Lamont.

— Mas isso deixa-nos imediatamente em desvantagem — replicou William. — Em primeiro lugar, temos de levar pelo menos uma dúzia de homens e o respetivo equipamento até ao vigésimo terceiro andar do bloco B sem que ninguém os veja, o que por si só constituiria um pequeno milagre. Em segundo lugar, mesmo que prendêssemos o Rashidi e os seus capangas quando tentassem fugir pela passagem, íamos acusá-los de quê? Porque, se eles forem representados por um traste como o Booth Watson, podem ter a certeza de que ele irá apresentar o argumento convincente de que os seus clientes iam a caminho dos seus apartamentos no outro edifício, e com toda a legitimidade. Sairiam sob fiança no mesmo dia. Não, temos de prender o Rashidi enquanto ele estiver nas instalações, caso contrário estaremos todos a perder o nosso tempo.

— Qualquer pessoa é capaz de encontrar um problema, inspetor Warwick — disse Lamont. — Encontrar uma solução é que é um bocadinho mais difícil.

— Levar doze homens até ao nosso apartamento no bloco B, juntamente com um arsenal de armas e outro equipamento, sempre comportou o risco de alguém perceber o que estamos a planear. Porque não reduzir as hipóteses de doze para um?

— E, tal como Horácio, ter de defender a ponte sozinho? — perguntou Hawk com ar pensativo.

— Não, senhor. Não precisamos de Horácio para este trabalho, apenas de um bom carpinteiro que, à nossa ordem, seja capaz de fixar três tábuas grossas na porta do nosso lado da passagem numa questão de minutos, para que os canalhas fiquem encurralados dentro do matadouro, restando-lhes apenas um caminho de fuga: a porta de entrada. E, quando se aperceberem disso, já estaremos lá fora à espera deles.

— Engenhoso — disse Lamont. — Mas ainda nos deixa com o problema dos quatro vigias no terreno e do rufia que controla o elevador. Quando os nossos rapazes tiverem subido metade das escadas, o Rashidi estará a descer no elevador e, quando sair no rés do chão, a imagem viva da inocência, não haverá crime que lhe possamos imputar e toda a operação terá sido um fracasso. Porque uma coisa é certa: o presidente da Marcel & Neffe não terá drogas com ele.

— Isso não acontecerá se o elevador ficar preso no rés do chão — disse Paul.

— Como planeia fazer isso, inspetor estagiário Adaja — perguntou Hawk —, tendo em conta que, assim que eu der ordem para lançar a operação, uma dúzia de veículos armados e carros-patrulha entrarão em força na praça, dando aos vigias mais do que tempo suficiente para avisar o Donoghue, que por sua vez há de avisar o Rashidi? Como é que nos desenvencilhamos disso, Houdini?

— Temos de estar escondidos à vista de todos — disse William. — Embora deva confessar que foram precisas várias noites sem dormir até descobrir uma coisa que esteve sempre à frente do meu nariz ao longo do último mês. — Ninguém o interrompeu. — Não há necessidade de fazermos uma entrada à John Wayne, a disparar em todas as direções, quando podemos conduzir pela rua acima e parar junto à porta de entrada sem ninguém reparar em nós.

— Está a pensar transformar-se no homem invisível, é isso? — perguntou Lamont. — Nem mesmo o John Wayne conseguiu tal feito.

— Não, mas se o Paul se transformar no cobrador do nosso próprio autocarro 118 será invisível, assim como toda a gente que estiver a bordo.

Hawk e Lamont entreolharam-se.

— As noites sem dormir valeram a pena, inspetor Warwick — disse o comandante. — Creio que o comissário vai ficar impressionado com a minha última ideia.

Começaram todos a bater com as mãos na mesa.

— Bem — disse Hawk, repondo a ordem. — Já temos cobrador para o nosso autocarro, agora precisamos de um motorista.

— Tem de ser o Danny Ives — disse William sem hesitar.

— Juntamente com dezasseis agentes especializados da PT17 escolhidos a dedo — disse Lamont — que irão ocupar o piso inferior do autocarro, prontos para avançar de imediato.

— No entanto — disse Paul —, os primeiros a sair não deverão estar fardados nem armados até aos dentes, mas sim de fato de treino e ténis, pois terão de neutralizar os quatro vigias em menos de dez segundos, enquanto outros três agentes dominam o Donoghue e se apoderam do elevador.

— Altura em que uma dúzia de passageiros fortemente armados estarão a subir as escadas e em que chamarei os especialistas antiterrorismo para fazerem a sua parte.

— Também vamos precisar de uma dúzia de mulheres-polícia à paisana — disse William.

— Esclareça-me lá — pediu Hawk.

— Os vigias do Rashidi podem ficar desconfiados se virem um autocarro completamente cheio de homens jovens e em forma, com cabelo cortado à escovinha, que estão a ir para o trabalho quando deviam estar a voltar para casa. Por isso, quero que haja uma série de mulheres dispersas, vestidas como donas de casa ou trabalhadoras no seu trajeto diário, outras com ar de quem foi às compras, isto é, que aparentem ser tudo menos agentes da polícia.

— Belo retoque, William — disse o comandante. — Mas também teremos de retirar todos os bancos do piso superior e montar um centro de comando a partir do qual eu possa supervisionar toda a operação. O que me deixa com o problema de como deitar a mão a um autocarro de dois andares.

— Ainda bem que encontrámos alguma coisa para o comandante fazer — disse Paul, arrependendo-se imediatamente das suas palavras.

— Tal como encontrámos para si, inspetor estagiário Adaja, porque quando esta operação terminar terá qualificações para se candidatar ao lugar de cobrador de autocarro. Mas, até lá, tente não se esquecer de quem manda aqui.

Depois de a reunião terminar e os elementos da equipa terem regressado aos seus postos, Hawksby recostou-se e pensou cuidadosamente numa maneira de aumentar as hipóteses de sucesso da operação. Passados alguns momentos, abriu a gaveta de cima da secretária, tirou um maço de Marlboro por abrir e uma caneta de feltro. Rasgou o invólucro de celofane, abriu o maço e despejou os cigarros em cima da secretária.

Retirou o papel de prata e pensou cuidadosamente na mensagem simples que precisava de transmitir. Passados instantes, escreveu «23h00, dia 12» e, em seguida, voltou a pôr o papel de prata no sítio. Fechou o maço e enfiou-o num bolso interior. Depois saiu do gabinete e foi de elevador até à cave. Saiu pelas traseiras do edifício, virou à direita e dirigiu-se para a Catedral de Westminster. Desta vez, entrou pela porta principal, não como padre, mas como paroquiano.

Percorreu lentamente a nave do lado esquerdo, admirando a obra de Eric Gill, Jesus Pregado na Cruz. Quando chegou ao seu alvo, olhou em volta antes de destrancar a caixa de esmolas e colocar o maço de cigarros a um canto. A seguir, fechou a tampa da caixa e trancou-a, introduzindo finalmente cinquenta pence através da pequena ranhura para mitigar a sua culpa.

Decidiu ir a pé para casa. Ainda ficava longe, mas precisava de fazer exercício e de tempo para pensar no seu discurso.

— O superintendente Lamont contactou-me — disse Booth Watson, sentando-se em frente do cliente na sala de reuniões privada da prisão. Abriu a pasta, tirou de lá uns papéis e colocou-os sobre a mesa de vidro entre eles. — Requereu uma audiência para produção de prova ao abrigo da Lei sobre a Polícia e as Provas Criminais, e quer interrogá-lo o mais depressa possível.

— Então? Vou ser transferido para uma prisão de regime aberto? — perguntou Faulkner. — Ou será que vão reduzir-me a pena para metade por bom comportamento?

— Nem uma coisa nem outra. O Lamont quer inquiri-lo sobre outros dois crimes em que suspeitam do seu envolvimento.

— Tais como?

— Fogo posto, para começar. Têm razões para acreditar que o Miles foi responsável pelo incêndio que destruiu a sua própria casa.

— Enquanto estava aqui preso?

— Juntamente com o roubo de setenta e dois quadros antes de a casa ter sido reduzida a cinzas, avaliados aproximadamente em trinta milhões de libras — disse Booth Watson, ignorando a pergunta.

— Mas eles arderam juntamente com a casa!

— O Lamont pensa que não e diz que consegue prová-lo.

— Nem o Sherlock Holmes conseguiria prová-lo.

— Mas o William Warwick conseguiu.

— Outra vez esse maldito homem!

— Ele passou um dia a esquadrinhar as cinzas de Limpton Hall e encontrou sessenta e um ganchos para pendurar quadros.

— Isso só prova que os quadros estavam lá na altura do fogo.

— Pelo contrário, ele diz que prova que não estavam. O que é importante não é o que ele encontrou, mas sim o que não encontrou. E antes que diga alguma coisa, Miles, sugiro que fique em silêncio até ter respondido a duas perguntas que tenho a certeza de que o superintendente lhe irá fazer.

Faulkner conteve-se a contragosto.

— Se os quadros estavam pendurados nos ganchos que o Warwick encontrou no meio dos escombros, o que os segurava?

— Arame de quadros, naturalmente. À exceção dos quadros maiores, que teriam precisado de corren… — Parou por alguns instantes antes de dizer: — Ah, sim, agora me lembro! Aqui há uns anos, tinha substituído tudo isso por corda.

— Corda suficiente para se enforcar — disse Booth Watson —, porque a sua ex-mulher afirma…

— Será a palavra dela contra a minha.

— Quem me dera! Mas, infelizmente, o Warwick visitou recentemente o Fitzmolean, onde encontrou o Vermeer que a Christina doou ao museu pendurado por um arame de aço e latão entrelaçado, e tanto o Rembrandt como o Rubens com que você tão generosamente presenteou a galeria no ano passado continuavam pendurados pelas suas correntes de latão originais. Por isso, antes de fixar uma data para o superintendente Lamont vir interrogá-lo, Miles, é melhor arranjar algum argumento mais convincente do que a corda. Caso contrário, a única forma de sair de Pentonville será enfrentar um novo julgamento por fogo posto e roubo de setenta e dois quadros que valem trinta milhões de libras. E, se assim for, as suas presentes instalações podem acabar por se tornar permanentes até bem depois de entrarmos no próximo século.