capítulo 14

– POR QUE VOCÊ ESTAVA me seguindo?

Com o mesmo sorriso de antes, Corey disse:

– Abaixa essa arma, Maya.

Em todas as fotografias de jornal, Corey Rudzinski parecia ser um homem bem-vestido e bem-barbeado, tinha um rosto de bebê. A barba desgrenhada, o boné de beisebol e as calças cafonas eram um ótimo disfarce. Maya manteve a arma apontada. As pessoas começaram a buzinar nos carros de trás.

– Você está atrapalhando o trânsito – disse Corey. – Tire seu carro da frente, depois conversamos.

– Quero saber o que...

– Vai saber. Mas antes tire o seu carro do meio da rua.

Mais buzinas.

Maya estendeu o braço livre e tirou a chave da ignição do Buick. Não tinha a menor intenção de deixar o homem escapar.

– Não saia daqui – disse ela.

– Não é essa a minha intenção.

Maya estacionou seu carro na vaga mais próxima, voltou ao Buick e devolveu a chave.

– Imagino que você esteja confusa – disse Corey.

“Confusa” era pouco. Ela estava completamente desorientada. Feito um pugilista caído na lona, precisava de tempo para se recuperar, ficar de pé antes do nocaute e voltar à luta. Por mais que ventilasse explicações, nenhuma delas tinha vida longa. Nada daquilo fazia sentido.

Ela começou pelo mais óbvio:

– Como você conhece minha irmã?

Ao ouvir a pergunta, Corey apagou seu sorriso do rosto e no lugar dele colocou o que parecia ser um semblante sincero de tristeza. Maya entendeu por quê. Ela havia dito “conhece”, no presente. Corey Rudzinski realmente conhecia Claire. E, ao que parecia, gostava dela.

Ele olhou para frente e disse:

– Vamos dar uma volta por aí.

– Prefiro que você apenas responda minha pergunta.

– Não posso continuar aqui. Exposto dessa maneira. Eles vão acabar tomando alguma providência.

– Eles quem?

Corey não respondeu. Voltou com ela para a Leather and Lace e parou na mesma vaga de antes. Dois outros carros entraram na esteira do Buick e pararam por perto. Fariam parte do entourage do homem? Maya desconfiava que sim.

A entrada dos fundos dispunha de um teclado acoplado. Corey digitou os números de sua senha e Maya logo tratou de memorizá-los, para o caso de precisar deles depois.

– Está perdendo seu tempo – disse ele. – Ainda temos de passar por uma porta com interfone.

– Além da senha, você ainda tem um porteiro?

– Isso mesmo.

– Um exagero, não? Ou uma paranoia.

– Pode ser.

O corredor era escuro e fedia a chulé. Eles atravessaram o salão da boate, onde a música-tema de Aladdin tocava no último volume enquanto uma garota rebolava no palco, vestida de Jasmine. Pelo visto não era só nas creches que as pessoas se fantasiavam de princesa. Corey a conduziu através de uma cortina de contas, do outro lado da qual ficava uma saleta privativa. A decoração era em tons de verde e dourado, talvez inspirada no uniforme de uma chefe de torcida.

– Você já sabia que eu estive aqui agora há pouco, não sabia? – disse Maya. – Sabia que falei com a tal Lulu.

– Sim, sabia.

Ela aos poucos ia juntando os pontos.

– Então provavelmente viu quando saí. Viu que fui bisbilhotar seu carro. Deduziu que eu estaria te seguindo.

Corey permaneceu calado.

– Aqueles dois carros que entraram logo depois... Gente sua, não é?

– Exagero, paranoia, chame como quiser. Por favor, sente-se.

– Nisto aí? Quando foi que limparam da última vez?

– Não se preocupe. Está limpo. Sente-se.

Ambos se acomodaram no sofá da saleta.

– Você precisa entender a natureza do meu trabalho – prosseguiu Corey.

– Sei muito bem o que você faz – devolveu Maya.

– Sabe mesmo?

– Você não gosta de segredos, então “bota a boca no trombone”, indiferente às consequências.

– É mais ou menos isso.

– Então podemos pular essa parte. Vai, diz: como você conhece minha irmã?

– Ela me procurou – disse Corey.

– Quando?

Ele hesitou um instante, depois disse:

– Não sou nenhum anarquista, nenhum radical. Não é bem por aí.

Maya não estava nem um pouco interessada no trabalho do cara. Só queria saber da irmã e por que vinha sendo seguida. Mas também não queria antagonizá-lo, muito menos que ele se fechasse. Então ficou ­calada.

– Você tem razão quanto à minha antipatia pelos segredos – prosseguiu ele. – Comecei como um hacker. Invadia sistemas só pra me divertir. Grandes empresas, governos... Como se fosse um game. Daí comecei a me ligar nos segredos, a enxergar como os poderosos abusam do povo. – De repente ele se deu conta: – Mas você não veio aqui pra ouvir essa ladainha, imagino.

– Imaginou certo.

– Bem, o que eu estou querendo dizer é que parei com essa história de ­hacking. Mas criei uma plataforma para aquelas pessoas que têm alguma denúncia a fazer, uma verdade qualquer a expor. Só isso. Porque as pessoas não conseguem policiar a si mesmas quando o assunto é dinheiro e poder. Assim é a natureza humana. A gente distorce a verdade de acordo com os nossos interesses individuais. Esse pessoal que trabalha nas fábricas de cigarro, por exemplo. Não são pessoas más, inconsequentes. Se não fazem a coisa certa, é porque não é do interesse delas. Nós, humanos, somos ótimos na hora de inventar uma boa desculpa.

Para quem não queria incomodar os outros com uma ladainha...

Uma garçonete entrou na sala, vestindo um top mais ou menos da largura de uma bandana.

– Querem beber alguma coisa? – ofereceu.

– Maya? – disse Corey.

– Não, obrigada.

– Pra mim um club soda com limão, por favor.

A garçonete saiu, e Corey retomou a conversa.

– As pessoas acham que meu objetivo é enfraquecer as empresas e os governos. Na verdade é o contrário. Quero fortalecê-los ao obrigá-los a fazer a coisa certa, a coisa justa. Se uma empresa ou um governo é calcado na mentira, vão ficar mais fortes se forem calcados na verdade. Portanto... nada de segredos. Em lugar nenhum. Se um bilionário qualquer está subornando o governo pra levar esta ou aquela vantagem, as pessoas vão ficar sabendo. No seu caso, se o governo está matando civis numa guerra...

– Não é isso que estávamos fazendo.

– Eu sei, eu sei. Danos colaterais. Uma expressão bastante vaga, não acha? Seja lá o que na sua opinião tenha acontecido, acidente ou não, nós do povo temos o direito de saber. Talvez continuemos a favor da guerra, mas sabendo a verdade. Empresários mentem e roubam. Governos mentem e roubam. Cartolas do esporte mentem e roubam. A gente pode fazer muito pouco. Mas imagine um mundo em que nada disso acontecesse. Imagine um mundo em que todos são obrigados a prestar contas dos seus atos. Imagine um mundo sem abusos e segredos.

– E nesse mundo também haverá unicórnios? – perguntou Maya.

Corey riu e disse:

– Você acha que sou ingênuo, não é?

– Corey... Posso chamar você de Corey, não posso?

– Por favor.

– Como você conhece minha irmã?

– Já disse. Ela me procurou.

– Quando?

– Alguns meses antes de morrer. Mandou um e-mail pro meu site. E acabou me encontrando.

– O que dizia esse e-mail?

– Sua irmã queria falar comigo.

– Sobre...

– O que você acha, Maya? Sobre você.

A garçonete voltou.

– Dois club sodas com limão – disse ela, e lançou uma piscadela na direção de Maya. – Sei que você não pediu, gata, mas se ficar com sede...

Ela deixou as bebidas, despediu-se de Maya com um luminoso sorriso e foi embora.

– Você não está sugerindo que foi a Claire quem te entregou aquela gravação do...

– Não.

– ... porque não há a menor possibilidade de que ela tivesse acesso...

– Não, Maya, não estou sugerindo nada disso. Ela me procurou depois que eu divulguei as suas imagens.

Isso realmente fazia mais sentido, mas não explicava nada.

– Mas o que é que ela queria afinal?

– É por isso que eu quis explicar a você a filosofia do site. A importância de responsabilizar as pessoas em nome de uma liberdade legítima.

– Não estou entendendo.

– Claire me procurou porque tinha medo que eu publicasse o resto da sua gravação.

Silêncio.

– Você sabe do que estou falando, não sabe?

– Sei.

– Você contou tudo à sua irmã?

– Tudo. Não tínhamos segredo uma com a outra. Pelo menos eu pensava que não.

Corey riu e disse:

– Ela queria proteger você. Pediu que eu não postasse o áudio.

– E você não postou.

– É verdade.

– Só porque a Claire pediu.

Ele deu um gole na bebida.

– Conheço um sujeito aí. Na realidade, um grupo. Eles acham que são parecidos comigo, mas não são. Também revelam segredos, porém sempre no âmbito individual. Esposas adúlteras, atletas que tomam bomba, sex tapes, coisas assim. Fraudes e enganações pessoais. Se você tentou fazer alguma coisa anonimamente na internet, alguma coisa antiética, cedo ou tarde esse pessoal vai descobrir. Feito aqueles hackers que invadiram o site de relacionamentos no ano passado.

– E você não concorda com isso?

– Não.

– Por que não? Eles também estão lutando contra os segredos do mundo.

– Engraçado... – disse Corey.

– O quê?

– Sua irmã falou a mesma coisa. Não vou dizer que somos hipócritas, mas temos um pé no oportunismo. Todos nós temos, certo? Não dá pra evitar. Não publiquei o áudio da sua gravação por uma questão de interesse próprio. Minha intenção era publicar mais tarde. Pra maximizar o impacto da revelação. Mais hits na minha página. Mais barulho pra minha causa.

– Então por que não publicou?

– Porque sua irmã me pediu pra não publicar.

– Só por isso?

– Ela foi convincente. Explicou que você é apenas um joguete nas mãos de um sistema corrupto. Apenas obedece às ordens. Por um lado minha vontade é revelar tudo isso porque, como eu disse antes, a verdade liberta, Maya. Mas nesse caso você seria prejudicada de um modo irreparável. Claire me convenceu do seguinte: se denunciasse você, eu não estaria sendo muito melhor do que esses meus colegas que só expõem os peixes pequenos.

Maya começava a impacientar-se com os rodeios.

– Seu real inimigo era a guerra em si, não eu – disse ela.

– Exatamente.

– Então você deu às pessoas a sua própria narrativa. Pra incensá-las contra o governo. Se ouvissem o áudio, talvez elas colocassem a culpa em mim.

– Imagino que sim.

Substituir a verdade por uma narrativa própria, pensou Maya. Basta cavar um pouquinho mais fundo, e somos todos iguais. Mas não havia tempo para ruminar essas questões agora.

– Quer dizer então que minha irmã procurou você pra me proteger.

– Isso.

Maya calou-se um instante. Aquilo fazia todo o sentido, por mais triste e terrível que fosse. Novamente ela se viu atropelada pelos sentimentos de culpa.

– O que foi que aconteceu depois? – perguntou afinal.

Corey sorriu e disse:

– Claire me convenceu da validade do argumento dela, e eu a convenci da validade do meu.

– Como assim?

– Sua irmã trabalhava pra uma empresa grande e corrupta. Tinha acesso à roupa suja.

A ficha não demorou a cair.

– Você convenceu a Claire a passar informações da empresa?

– Ela entendeu a validade da minha causa.

– Quer dizer então que... foi um toma lá, dá cá. Claire ajudou você a atacar as empresas Burkett e em troca você segurou o áudio, é isso?

– Nada tão rudimentar assim.

Ou sim.

– Então.... – disse Maya, raciocinando ao mesmo tempo que falava. – Então você colocou minha irmã pra fazer o seu trabalho sujo e por causa disso ela foi morta.

Uma sombra desceu sobre o rosto de Corey.

– Não apenas ela – disse.

– Como assim?

– Ela trabalhava com o Joe.

Maya deixou a informação assentar por alguns segundos, depois balançou a cabeça, dizendo:

– Impossível. Joe jamais denunciaria a própria família.

– Pelo visto sua irmã pensava de outra forma.

Maya fechou os olhos.

– Pensa bem – insistiu Corey. – A Claire mete o nariz onde não é chamada e aparece morta. Depois o Joe faz a mesma coisa e...

A conexão, pensou Maya. Todo mundo estava procurando por uma conexão. Corey pensava saber o que era. Mas estava enganado.

– Joe me procurou depois que sua irmã morreu.

– O que ele queria?

– Encontrar comigo.

– E?

– Eu não podia. Tive de dar uma sumida rápida. Imagino que você tenha lido a respeito. O governo dinamarquês estava tentando me pegar com uma acusação sem nenhum fundamento. Falei com Joe que havia outras maneiras de nos comunicarmos, mas ele não quis, insistiu em me encontrar pessoalmente. Acho que queria me ajudar. Mais que isso, acho que ele descobriu um segredo grave o bastante pra que o apagassem.

– Mas o que eles estavam investigando afinal? O Joe e a Claire?

– Crimes financeiros.

– Você pode ser mais específico?

– Conhece aquele ditado que diz: “Por trás de toda grande fortuna há sempre uma contravenção”? É verdade. Tenho certeza de que existem exceções por aí, mas geralmente não é preciso ir longe pra descobrir que molharam a mão de alguém ou que intimidaram a concorrência.

– No caso dos Burketts...

– Os Burketts têm um longo histórico de corrupção. Subornam políticos graúdos, não só aqui como no exterior também. Lembra do caso da Ranbaxy, aquele laboratório farmacêutico?

– Lembro muito vagamente – disse Maya. – Remédios ilícitos, alguma coisa assim.

– Mais ou menos isso. Pois os Burketts estão fazendo algo semelhante na Ásia com uma das suas empresas do ramo farmacêutico, chamada EAC. Pessoas estão morrendo porque as drogas não satisfazem as especificações. Mas por enquanto os Burketts têm conseguido se safar, botando a culpa na incompetência local. Em suma, alegam que não sabiam de nada, que fizeram todos os testes necessários etc. e tal. Tudo mentira. Fabricaram os dados, quanto a isso não existe a menor dúvida.

– Mas não havia como provar – disse Maya.

– Exatamente. Precisávamos de alguém de dentro pra conseguir os dados reais.

– Então você cooptou a Claire.

– Não obriguei ninguém a nada.

– Não. Apenas foi... simpático com ela.

– Não menospreze a inteligência da sua irmã, Maya. Ela sabia dos riscos. Era uma mulher corajosa. Não precisei fazer a cabeça dela. Ela queria fazer a coisa certa. Você, mais do que ninguém, devia entender isso: Claire morreu tentando corrigir uma injustiça.

– Não faça isso – disse Maya.

– Isso o quê?

Maya detestava quando faziam analogias com a guerra. Eram sempre condescendentes ou equivocadas. Mas, de novo, não havia tempo para isso agora.

– Então sua tese é que... alguém da família do Joe matou a Claire, depois o próprio Joe, só pra evitar um escândalo?

– Acha que eles não seriam capazes?

Maya refletiu um segundo antes de responder:

– Talvez sejam capazes de matar minha irmã. Mas nunca matariam um dos seus.

– Pode ser. – Corey esfregou o rosto, olhou para o outro lado. Do salão vinha a música “À vontade”, de A Bela e a Fera, dando novo significado ao verso: “À vontade, à vontade, prove a nossa qualidade...” – Mas – prosseguiu ele – parece que a Claire acabou descobrindo outra coisa. Algo ainda mais grave do que manipular testes farmacêuticos.

– Tipo o quê?

Corey deu de ombros, dizendo:

– Sei lá. Lulu contou que você encontrou o telefone clandestino dela.

– Sim, encontrei.

– Não vou entrar nos detalhes de como uma ligação telefônica pode seguir por diferentes rotas na dark web antes de chegar ao seu destino final, mas era assim que nos comunicávamos, eu e a sua irmã. Mesmo assim, só por garantia, tínhamos combinado de nos falar o mínimo possível: ela ligaria apenas quando tivesse algo de concreto pra entregar ou no caso de alguma emergência.

Maya se inclinou para frente.

– E ela ligou.

– Sim. Alguns dias antes de morrer.

– O que foi que ela disse?

– Que tinha encontrado algo.

– Algo que não tinha nada a ver com a manipulação dos testes?

– Sim. Algo potencialmente mais grave. Falou que ainda estava juntando os dados, mas que queria enviar uma amostra inicial. – Corey se calou e por alguns segundos fitou o nada com os olhos muito claros. – Foi a última vez que nos falamos.

– Ela chegou a mandar essa amostra?

– Sim. Aliás, é pra isso que você está aqui.

– Hein?

Mas ela nem sequer precisava de uma resposta. Desde o início Corey sabia de tudo. Sabia que ela havia passado pela boate, que tinha conversado com Lulu, que estava seguindo o Buick na rua. Corey Rudzinski não brincava em serviço. Havia naquilo tudo, desde o início, um propósito muito claro.

– Você está aqui – disse ele – pra que eu possa te mostrar o que a Claire descobriu.

– O cara se chama Tom Douglass. Com dois s. – Corey entregou a ela uma folha impressa. Eles ainda estavam na saleta privativa da boate, ótimo local para um encontro clandestino. Do mesmo modo que ninguém ia a uma boate de strip para chamar atenção sobre si, ninguém estava ali para reparar nos outros. – O nome te diz alguma coisa?

– Não. Por quê? Deveria?

– Só uma pergunta genérica.

– Nunca ouvi falar. Quem é afinal?

Segundo o que estava escrito na folha impressa, pagamentos mensais de nove mil dólares vinham sendo feitos em favor de uma empresa chamada Tom Douglass Security.

Maya imediatamente notou o óbvio: o valor era o mesmo dos supostos pagamentos feitos a Roger Kierce.

Coincidência?

– Tom Douglass trabalhava como detetive particular em Livingston, Nova Jersey. Um negócio pequeno, ele pilotando a coisa sozinho. Basicamente espionava cônjuges e levantava históricos. Ele se aposentou três anos atrás, mas os pagamentos continuam.

– Pode ser um negócio legítimo. De repente ele se aposentou mas manteve o maior cliente.

– É o que eu também acharia se a sua irmã não tivesse visto nisso algo muito maior.

– O que exatamente?

– Não sei.

– Como assim? Você não perguntou?

– Acho que você ainda não entendeu como trabalhamos.

– Claro que entendi. Mas... depois que a Claire foi assassinada por causa dessa descoberta que fez... você procurou a polícia?

– Não.

– Nem pra contar o que ela andava investigando?

– Já disse. Precisei sair de circulação depois que ela morreu.

– Minha irmã não “morreu”. Foi brutalmente assassinada.

– Eu sei. Você pode não acreditar, mas eu gostava da Claire.

– Não o bastante pra ajudar na busca dos assassinos dela.

– Nossas fontes exigem confidencialidade.

– Mas essa fonte específica foi morta.

– Isso não muda em nada o nosso compromisso com ela.

– Chega a ser irônico – disse Maya.

– O quê?

– Você fala tanto de um mundo sem segredos... mas não se importa nem um pouco de manter os seus. Que foi que aconteceu com aquela sua utopia de uma sociedade onisciente?

– Isso não é justo, Maya. Nem sabíamos que o assassinato dela tinha alguma coisa a ver com a nossa história.

– Mas é claro que você sabia. Só que ficou de bico calado porque tinha medo que a coisa ficasse feia pro seu lado se viesse à tona que uma das suas fontes tinha sido assassinada. Tinha medo que alguém tivesse vazado o nome da Claire e que ela tivesse sido morta por causa disso. Tinha medo que a origem desse vazamento estivesse na sua própria organização. Talvez ainda tenha medo.

– O vazamento não saiu da minha organização – afirmou Corey.

– Como você sabe?

– Você agora há pouco me chamou de paranoico. Pois bem. Eu era o único que sabia da Claire. Temos os nossos mecanismos de proteção. É impossível que esse vazamento tenha saído do meu pessoal.

– Você sabe que ninguém acreditaria nisso, não sabe?

Corey pousou a mão no rosto, depois disse:

– Realmente é possível que as pessoas se equivocassem na interpretação dos fatos.

– Culpariam você.

– Nossos inimigos usariam isso contra nós. Outros denunciantes ficariam com medo.

Maya balançou a cabeça, dizendo:

– Você nem percebe o que está fazendo, percebe?

– O quê?

– Está procurando desculpas pra manter os seus segredos. Exatamente como as empresas e os governos que você tanto condena.

– Não é verdade.

– Claro que é. Seu único interesse é proteger seu próprio negócio, custe o que custar. Minha irmã foi assassinada. E você acobertou o assassino dela só pra proteger a sua organização.

Uma faísca se acendeu nos olhos de Corey Rudzinski.

– Maya?

– Hum.

– Você não está em condições de dar lições de moral.

Ok. Ela o havia provocado, talvez mais do que devia. O que era um erro. Ela precisava conquistar a confiança do homem.

– Por que você acha que os Burketts estão pagando esse Tom Douglass?

– Não faço a menor ideia. Alguns meses atrás invadimos o computador dele, conferimos o histórico do navegador de internet, conseguimos até uma lista das buscas dele. Não encontramos nenhuma pista. Fosse lá o que ele estivesse fazendo, não era apenas por debaixo dos panos. Era muito por debaixo dos panos.

– Você não tentou falar com ele?

– Sim, mas ele jamais falaria conosco. E se a polícia o questionasse, ele poderia alegar o direito de confidencialidade dos seus clientes. Todo o resultado das investigações dele passa pelo escritório de advocacia que atende a família Burkett: Howell and Lamy.

O escritório de Heather Howell.

– Então... o que a gente pode fazer pra soltar a língua desse Douglass? – perguntou Maya.

– Fizemos nossa tentativa com ele e demos com os burros n’água – disse Corey. – Talvez você tenha mais sorte.