Foi da vozinha que o menino ouviu pela primeira vez a história de seu antepassado Jean de Fontenelle.
Era de Melun, próximo a Paris, mas de família normanda, gente de Rouen, ligada pelo sangue a Bernard Le Bovier de Fontenelle e aos dois Corneilles. Engenheiro de minas, mandou a Corte de Lisboa que procurasse o ouro e a prata que se dizia haver em abundância na Serra de Ibiapaba. Chegou ao Ceará, mais dois alemães e alguns portugueses, aí pela metade do século XVIII, e não saiu mais do lugar que era um aldeamento jesuítico de índios e que ele ajudaria a transformar em Viçosa. Encontrou algum ouro e o trabalhou em joias, hábil ourives que era. E descobriu outros minérios, como mica, cristal de rocha e malacacheta, para os quais, então, não havia uso. O microclima serrano permitiu-lhe plantar maçãs ao lado das jaqueiras e erguer vinhedos a pouca distância dos taperebás. Criou abelhas, bichos-da-seda e onze filhos de dois casamentos.
O seu nome foi preservado não apenas pelos descendentes masculinos, mas também pelas mulheres, que, em vez dos sobrenomes dos maridos, punham nos filhos o de Fontenelle. Assim, por exemplo, o bisavô do menino era Joaquim Fontenelle Sobrinho, embora de pai chamado Gonçalo José Damasceno.
Só muito mais tarde, o menino veio a saber que havia outros Fontenelles famosos, além do escritor. Como um senhor feudal pirata, que costumava atacar as cidades costeiras da Bretanha, até que não conseguiu vencer uma delas. Capturado, enforcaram-no em Saint-Malo, na praça onde uma placa lhe comemora a infâmia e o esquartejamento.