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A notícia da tomada de Madri já foi ouvida no rádio de ondas curtas que a mãe pusera na sala de jantar, porta aberta para o alpendre e o jardim. Antes, um eletricista instalara, no telhado da casa, três hastes de uns dois metros de comprimento, ligadas por arames, para formar a antena. Podia-se, graças a isso, receber a BBC de Londres e a Rádio de Berlim.

Durante o noticiário, a mãe aumentava o volume do rádio, de modo a ser bem-ouvido pelos que se encontravam sentados na varanda. Tinha, contudo, de ficar próxima ao aparelho, para tentar corrigir a estática excessiva, a interferência de outras estações e as fugas da voz do locutor, que um leve girar, no dial, ia, com sorte, sintonizar um tiquinho adiante. A possibilidade de que um despacho da frente de batalha, um comunicado oficial ou um comentário ficassem incompletos era sempre grande e gerava um diálogo aceso entre vizinhos que se uniam à procura do mundo e se apaixonavam com uma guerra civil num país que a distância fazia quase inexistente. A mãe e a avó torciam pelos republicanos e ao vizinho chamavam, amistosamente, fascista.

Servia-se café, no meio da discussão. Ou refresco. Raramente com gelo, apesar do calor.

Na casa havia geladeira, mas não era elétrica. Grande e branca, com a tampa a abrir-se, como uma arca, por cima, tinha-se por isolada termicamente. Uma vez que não possuía motor, compravam-se grandes barras de gelo, chegadas da fábrica protegidas por serragem, para com elas forrar o chão e as paredes do móvel e, assim, refrigerá-lo. Não se usava a geladeira senão às vésperas de grandes almoços e jantares, quando havia que estocar peixe e carne. No comum dos dias, ela era desnecessária: a água se refrescava em grandes potes de barro e em moringas que dormiam ao relento.