60

Mal começara a aula, sentiu a comichão num dos dedos do pé esquerdo. Com vergonha de desatar o cadarço e tirar a botina para esfregar o artelho, apertou com força contra o bico do calçado a quina do salto do outro pé, exatamente em cima do lugar em que se concentrava, agradável e insistente, a coceira. Duas classes depois, tudo o que desejava era ficar descalço, pois a comichão se tornara insolente e chegava a queimar e a doer. O menino aumentava ou diminuía a pressão da sola de um sapato contra o outro, conforme a intensidade do prurido, doido para se ver em casa e pedir socorro.

Arrancou a botina, ao entrar na copa. No dedo, viu um pontinho minúsculo, menor do que uma cabeça de alfinete, cercado por um estreito anel alvacento. A ama disse logo que era um bicho-de-pé:

— Não coce, que inflama e pode virar ferida ruim! Temos de esperar que amadureça, para então tirá-lo. Bom seria, para passar a comichão, se tivéssemos mijo de vaca.

Não tinham, e ela, após lavar-lhe o pé, friccionou o artelho com água oxigenada e azeite. O alívio foi curto. Logo estava o menino com as unhas a rascarem o dedo avermelhado. Coçou e coçou, durante mais de um dia, o ponto negro. Tanto este quanto o anel branco ao seu redor haviam crescido e mais pareciam um olho arregalado no artelho do menino.

À noitinha, a ama pôs-lhe o pé num balde de água quente. Prendeu numa rolha de garrafa uma agulha de bordado e lhe fez arder a ponta na chama da lamparina. Passou éter no dedo do pé do menino e foi-lhe tirando, devagar e com cuidado — Não te mexas, para que não se parta ou arrebente! —, a pulga com sua bolsa de ovos. Doeu, mas pouco. E, a soprar sobre a pequena ferida, o menino adoçou como pôde o ardor do iodo.