capítulo 1
A Máquina de Formação Docente
N
a última década, em relação à educação superior, especificamente no cenário das limitações existentes na formação inicial de docentes para atuar em qualquer nível de ensino, aprendizagem e avaliação, a fragmentação dos saberes, o surgimento de espaços digitais para a prática da aprendizagem, o acesso à grande rede de informação em oposição à integração parca das tecnologias digitais nos currículos, as propostas de avaliação desequilibradas e descontextualizadas em relação às teorias e às práticas, possibilitam que se perceba a falta de equalização entre o discurso teórico, a prática da docência fundamentada em técnicas e o (des)comprometimento das instituições na formação de licenciandos para atuarem na contemporaneidade e, especificamente, na integração entre TDICs e Docência.
Muitas das mudanças que a sociedade tem apresentado, no decorrer de sua evolução, refletem-se nos relacionamentos humanos de forma muito direta. Observando o fenômeno das relações humanas pela perspectiva das mudanças tecnológicas, especificamente em relação à forma e ao meio de troca de comunicações interpessoais em espaços de sala de aula presencial ou virtual, é possível ter ideia da influência das tecnologias, que aumentaram as trocas de comunicações não presenciais, gerando caminhos de comunicação que são estranhos a muitos de nós, seja pela linguagem utilizada, pelos espaços onde estas comunicações ocorrem, pelos temas que são abordados, pelos assuntos considerados proibitivos pela sociedade, pelo afastamento das interações orgânicas e outro sem número de “porquês” emergentes.
Dessa forma, torna-se um desafio compreender, mormente quando se reduz a uma reflexão simplista, em um curto espaço de tempo, os motivos das instituições formadoras continuarem atuando de maneira defasada em relação às inexoráveis exigências da sociedade tecnológica, mantendo-se longe de estudar as mudanças de relação de poder entre administradores, docentes e discentes em diversos níveis
de ensino e em relação à evidente formação deficitária dos professores que não estudam em suas formações temas vinculados às relações de poder, saber e mercado, criando o foco do trabalho em formações pautadas em uma espécie de “faber” constante, formando o docente na condição de reprodutor de conteúdos mais ou menos fundamentados e desligado de contextos políticos do espaço onde atua.
O desenvolvimento da aprendizagem sobre a docência, quando os licenciandos buscam integrar saberes científicos, pedagógicos e tecnológicos digitais dentro de uma perspectiva transdisciplinar, traduzem um saber necessariamente plural. Tardif (2002) traz a compreensão de que, o licenciando ou o docente, sendo formado pelas relações estabelecidas entre os saberes oriundos da formação profissional e os saberes curriculares, disciplinares e experienciais deveria integrar estas diversidades de saberes e traduzi-las em práticas docentes menos disciplinares.
Isso não significa que incluir mecanicamente os conteúdos dessas naturezas mais sociais, antropológicas e filosóficas em um mesmo currículo satisfaça a necessidade de integração das instituições, dos atores e dos saberes com a sociedade ou com as complexidades da educação contemporânea.
A sociedade atual, na medida em que passamos a entender a profissão docente, o mercado e as relações de saber e poder requerem outro tipo de formação, possivelmente fundamentada a partir de outro paradigma, de outra lógica de estudo das conexões entre estes, de um outro modelo de construção epistemológica dos conhecimentos e não apenas de teorias cognitivas, didático-metodológicas ou mesmo instrumentalistas que não proponham a mudança de paradigma das raízes de construção da identidade do docente tradicional para outra compreensão e modelo sobre sua própria profissão.
Em nosso entendimento, um dos grandes desafios sócio educacionais do século XXI emoldura-se na alfabetização tecnológica de crianças e jovens que estão imersos pelo mercado em uma profusão de possibilidades de expressão, de estabelecimento de contatos, de acesso à informação. Contudo, acredita-se que a formação de licenciandos sugere, tal como está concebida, uma grande carência de formadores nesta área do conhecimento que envolve a integração entre Tecnologia e Docência, principalmente as TDICs. Os docentes formadores não se apropriaram da possibilidade de construir uma gênese da ação e reflexão docente consolidada a partir da integração de diferentes saberes integrados às TDICs. Os
conhecimentos trabalhados na formação docente não enfatizam as condições da tecnologização da sociedade que, por sua vez, irá se constituir em um espaço onde estes sujeitos estarão inseridos.
As transformações que se materializam na sociedade, sem dúvida recebem influência de diversas forças políticas disciplinadoras e controladoras. Se por um lado, pensadores como Lemos (2002), Rheingold (1993) e outros abordam o estabelecimento de outras formas de construção de relações e de integrações entre as pessoas e, por outro lado pensadores como Almeida (2008) e Valente (2002) escrevem com base numa visão “humanizadora” e até “psicologista” das ciências e sua integração com a tecnologia digital, sociedade e meio-ambiente, nenhum dos grupos discute as relações de saber e poder, de fabricação de verdades, do controle e do disciplinamento que são tão significativos para a ação docente crítica e transformadora nas Licenciaturas de maneira que se possibilite o espaço para a formação crítica do docente, fazendo as perspectivas reformadoras permanecerem no domínio de alguns sujeitos privilegiados, que disparam teorias e sugestões didático-metodológicas amparadas nas lógicas de manutenção do poder. Atuam como “válvulas de pressão” que garantem saídas esporádicas para manter revoltas controladas e disciplinadas.
Nenhum dos autores citados discute com profundidade o social na perspectiva da resistência, nem o mercado ou a governamentalidade diretamente vinculada com a "fabricação de alunos reprodutores" de conhecimento e pouco críticos em relação à coletividade; poucos desses autores propõem ações concretas para que as intelectualidades despejadas nos livros possam ser trabalhadas na realidade constituída e concreta das instituições de ensino e, enfim, nenhum dos autores se pauta em aspectos filosóficos da diferença ou em metodologias e didáticas integradas às TDICs que poderiam lhes aproximar um pouco mais de uma outra realidade, que envolve a perspectiva política e de poder, e por isso, muito mais concreta. Sem dúvida, existem autores que consideraram estas perspectivas de integração entre o docente e a sociedade de forma a propor uma prática inovadora. Contudo, a maioria forma professores reprodutivistas ou crítico reprodutivistas. Voltamos a salientar que existem exceções, existem alguns professores resistentes, na maioria das vezes vinculados a partidos políticos ou à Universidade.
Em suma, parece-nos que existe um pacto não contratual, velado, implícito de divisão entre as teorias e as práticas docentes, ainda que em casos pontuais e seguros para manter a governamentalidade vigente, de forma que algumas experiências educacionais “comportadas” e disciplinadas possam ser autorizadas e
realizadas inclusive com patrocínio governamental. Mudanças por inclusão, exclusão ou pendulares são possíveis desde que não se altere o paradigma de saber e poder.
Ora, as relações que se estabelecem não são humanizadoras e sim políticas, pautadas em controle e disciplinamento. São relações cruéis, de segmentação social, de promoção de igualdades de condições fictícias e enganadoras. Propagadas como humanizadoras, estas teorias retiram a compreensão da essência do homem enquanto qualidade de “sapiens” social e consolida o sujeito para “faber”, e para um fazer controlado, disciplinado pelos poderes da intelectualidade neoliberal. Motivo pelo qual esse discurso de pelo menos três décadas em torno da formação docente não gera nenhuma mudança paradigmática revolucionária na docência ou na educação. Como acontece com muita frequência em relação às tecnologias, uma grande parte das mudanças oferece transformações estéticas rasas que tendem a não alterar os paradigmas institucionais.
Nem a prática docente, nem a discente são suficientemente fortes para gerar essa ruptura de paradigma na docência carregada de tradição política reprodutivista quando tratamos de uma formação construída, desvinculada da própria política e da prática social. Talvez, por isso, Tardif (2002) saliente que a concepção dos licenciandos sobre as teorias educativas e sua aplicação na prática de ensino geralmente estão mais próximas de uma visão tradicionalista, distante, portanto, das inovações das pesquisas na área.
Por outro lado, a tecnologização emergente da contemporaneidade acrescenta novos processos e novos atores na docência, de forma direta e indireta como, por exemplo, a presença intensa do uso das TDICs na vida pessoal, tanto dos professores como dos alunos, exigências diferenciadas de mediação e outros profissionais e sistemas organizacionais que não estão presentes no ensino tradicional. Em suma, trata-se de um novo espaço que sem dúvida irá demandar novas atenções e técnicas de compreensão.
Os licenciandos, docentes em formação inicial, com pouca experiência na utilização de recursos tecnológicos digitais no âmbito educacional, apresentam dificuldades em planejar suas aulas contemplando o uso e a integração entre esses recursos tecnológicos digitais e os diferentes contextos, além de compreenderem o ensino de forma fragmentada, provavelmente em razão de sua formação básica, o que diminui as possibilidades de estabelecimento de bases interdisciplinares ou transdisciplinares de compreensão e atuação tecnodocente. Todos esses aspectos
refletem o funcionamento e a estrutura da Universidade, ao formar professores pouco preparados metodologicamente para atender às necessidades de uma sociedade em plena transformação, perpetuando-se a reprodução.
Ocorre a falta de uma formação qualificada do professor como um profissional crítico, coletivo e transformador. Esse modelo de formação é um dos entraves para a promoção de um processo educacional que contemple a aprendizagem do licenciando, principalmente quando se pensa em relação à integração entre TDICs e Docência, a Tecnodocência, de forma crítica, heterogênea, inter ou transdisciplinar, cooperativa e pautada em filosofias, políticas e da diferença contrária ao disciplinamento e controle dos sujeitos.
O modelo de formação de professores, ainda hoje, baseia-se numa proposta aplicacionista do conhecimento. Trata os licenciandos como “espíritos virgens”, desconsiderando suas crenças e conhecimentos prévios (AUSUBEL; NOVAK; HANESIAN, 1980). Essa condição aplicacionista não é ocasional, mas decorrente de uma prática definida para a construção do “homo faber”, dificultando por meio de mecanismos disciplinadores, como por exemplo a “grade” curricular, seriação e outros instrumentos, as possíveis mudanças de abordagem da docência. Dessa maneira, o docente é aprisionado em um jogo de grandes volumes de conteúdo, um tempo escasso para reflexão, uma avaliação indireta de sua qualidade através de macroprocessos (vestibular e ENEM) autofiscalizados pela resposta dos alunos às avaliações a que são submetidos.
Sabe-se que as novas linguagens utilizadas no meio digital, impulsionam fenômenos de comunicação, escritas, consultas a bancos de informação que são interligados ao uso da internet e que sem dúvida mudam as relações interpessoais. Somado a isso, no que se refere à docência, os profissionais lançados no mercado de trabalho mostram-se despreparados para a atuação em sala de aula, desconhecem os papeis que precisam desempenhar; inseguros, não sabem como articular os conhecimentos adquiridos em prol da aprendizagem dos alunos, principalmente na relação com aqueles alunos que estão integrados à sociedade tecnológica. O resultado é a perpetuação de uma ação pouco profissional do docente, com falta de fundamentação para suas escolhas didático-metodológicas, destituído de uma leitura de sua coletividade e das possibilidades de transformação que poderiam ser engendradas se trabalhasse, de fato, junto com seus pares.
Também não estão conscientes das necessidades demandadas pela sociedade
da informação ainda que teorizem sobre esses temas que apontam para um profissional criativo, autônomo e reflexivo (MARTINS, 2009). Essa mistura entre a falta de percepção das relações de poder e saber com a prática de perpetuação de modelo de docência, da fabricação de verdades, resulta nas análises que hoje fazemos das instituições e dos comportamentos de alunos e professores que não conseguem estabelecer integração entre TDICs e Docência.
Um dos elementos de sucesso de um trabalho envolvendo ensino, aprendizagem e avaliação requer a coesão e a integração, politicamente fundamentadas, de condições absolutamente necessárias para o sucesso de uma proposta de formação docente e da relação entre professores e alunos em outra base de poder, muito mais horizontal do que vertical, na valorização de conhecimentos prévios, na mobilização para trabalhos cooperativos e na integração entre TDICs e Docência. Sem níveis de coesão, reconhecidamente consolidados, não é possível a formação deste tipo de grupo, nem no meio presencial ou no espaço virtual. A coesão requer que os sujeitos tenham espaço para o diálogo, para se auto informarem e para informar uns aos outros. Onde arrumar este espaço no currículo e no período de trabalho tal como está concebido na contemporaneidade?
Um grupo dessa natureza precisa se gerir a partir do estabelecimento de interesses, necessidades e mobilizações (impulsos) comuns aos grupos. Requer o estabelecimento de conexões entre os atores e os objetos, destes com os artefatos técnicos disponibilizados e com os conteúdos. Contudo, armadilhas, como, por exemplo a fragmentação curricular, inviabiliza a integração de conteúdos específicos dos saberes científicos e filosóficos com os saberes pedagógicos, bem como dificulta a integração da teoria à prática; a formação que valoriza aulas expositivas e alunos passivos diante do conhecimento; e, a amplitude atribuída ao currículo impossibilitando o aprofundamento de conceitos relevantes para a formação crítica submetidos, ainda à falta de tempo para a reflexão nos espaços de trabalho.
Principalmente, a integração entre Ciência, Tecnologia, Docência, Filosofia e Sociedade, não atinge seu objetivo primordial que é a formação do professor para a promoção do processo de alfabetização científica, filosófica e artística dos alunos da educação básica. Esta percepção última, estudada largamente por Carvalho e Gil-Pérez (2006), especificamente em relação à primeira, indicam evidentemente a falta de interesse na alfabetização científica que passa a ser estimulada de forma a não oferecer grandes possibilidades de transformação
social e a manter um hermetismo dos conhecimentos fechados em áreas demarcadas, um tipo de feudo do saber com a finalidade precípua de reprodução acrítica destes conhecimentos.
Não é por nível de dificuldade, como nos querem fazer acreditar (nós os docentes) que áreas como a matemática e a física formam poucos alunos, que a filosofia é um curso sem futuro para o discente ou que química é um curso que coloca os profissionais mais próximos da indústria. Estas são realidades construídas ao ponto de se ouvir docentes em cargos de coordenação afirmarem sobre as benesses desta seleção rigorosa e desumana com os discentes, sendo que esta condição agressiva de seleção ditatorial serve de argumento para a garantia de qualidade dos profissionais. Observamos que basta olhar para as avaliações de nossos docentes nestas áreas consideradas “nobres” entre os saberes para perceber o quão irreal é esta argumentação de que o terror gera qualidade. Nossos parceiros nas instituições são nossos alunos e não as administrações. É muito importante para a manutenção do poder da prática da governamentalidade que isso não seja compreendido. É perigoso para o sistema que os docentes e discentes funcionem unidos. Esta estratégia de manutenção de desunião utiliza, como uma de suas ferramentas de manutenção da separação, as avaliações insanas que almejam garantir uma qualidade irreal.
Os discentes, saídos destas indústrias de conhecimento são, em geral, conformados (postos em formas), domesticados e premiados por serem excelentes reprodutores para a governamentalidade. Em resumo, grandes candidatos ao “professor e aluno modelo” costumam caracterizar os profissionais mais domesticados, disciplinados e controlados.
Por isso, estes autores afirmam que a formação de professores atualmente instituída promove o desenvolvimento de profissionais com pouca autonomia intelectual. Apoiado nos livros didáticos, o professor se torna um mero transmissor de conteúdos baseando-se muitas vezes nas concepções que desenvolvem a partir do senso comum.
Do nosso ponto de vista, neste momento de nossa argumentação, acreditamos se fazer necessário o desenvolvimento de um fragmento de reflexão que pode servir de portal para um grande aprofundamento. É indubitável que os sujeitos da docência, discência, a sociedade e as relações entre os grupos sofreram transformações intensas com o passar dos séculos. Chega a ser óbvio afirmar isto. Mas, o que queremos propor é a observação de outra faceta destas mudanças que
nos parece ser mantida escondida do senso comum. Em que nível as transformações mudaram as relações entre os múltiplos estratos sociais de forma radical? Neste caminho, sentimo-nos motivados para alertar que uma mudança no pensamento do docente ou do discente deva ser observada pela estética do professor, ou por suas indumentárias e gostos, suas ações mais ou menos permissivas e assim por diante. Este conjunto de características não tende a ser sinônimo de mudança de paradigmas essenciais como as relações de poder. Nossa ideia é colocar um alerta de que uma nomenclatura estrategicamente imposta não significa uma mudança de paradigma de fato, haja vista o uso das inspirações construtivistas ou de outras teorias aplicadas à educação reprodutivista e servil. Não se trata de uma bandeira, nem de um professor que se apresente com roupas fora de padrões considerados normativos, estamos invocando a necessidade de uma transformação ética muito mais profunda.
Nesse sentido, percebe-se a importância de estudar as categorias e as relações construídas por manifestações intangíveis, já que estas são determinantes para garantir altos níveis de coesão, como por exemplo, as empatias, as conexões estabelecidas entre alunos e professores, o engajamento dos atores nos trabalhos, os discursos e as éticas. Estas relações subjetivas, que não estão escritas ou definidas por nenhum “contrato” didático, são determinantes para a construção de um modelo epistemológico interdisciplinar que, ao nosso ver, traduz um dos caminhos possíveis para a integração de trabalhos docentes e discentes e, concomitantemente, ao estabelecimento de resistências à modelagem de pensamento fragmentada proposta ou imposta pelos currículos em favor da governamentalidade.
Trata-se do estabelecimento de ações onde o centro é o outro e ao mesmo tempo o si mesmo, uma vez que se pauta em conexões estabelecidas dos sujeitos em relação ao coletivo e vice-versa, onde a política e o mercado se tornam elementos de diálogo e discussão, a diferença é recebida como marca de humanidade no que se refere à docência. Constitui-se em outra filosofia de ação na educação que possibilita incentivar entre discentes e docentes o estabelecimento de novas relações entre estes e outros envolvidos no processo de ensino, aprendizagem e avaliação, promovendo uma educação mais conectiva, colaborativa e cooperativa.
Na contemporaneidade supõe-se que, além dos docentes e discentes não conhecerem a evolução das raízes epistemológicas do conhecimento científico e filosófico em razão da maneira como ocorrem as suas formações como licenciados
e licenciandos, não são capazes de questionar fora das regras impostas pelas instituições o que lhes é imposto pelo currículo escolar, pelos preconceitos sociais, pelo uso das tecnologias e pelo mercado comercial de produtos para a educação, quebrando as regras de diálogo impostas pela governamentalidade.
Um exemplo bem significativo trata da utilização das máquinas digitais (computadores) oferecidas em projetos como, por exemplo, “Um computador por aluno”. Outro exemplo são os professores que se sentem despreparados para selecionar e adequar conteúdos integrando-os às tecnologias digitais, apresentam dificuldade de explorá-los de forma não-tradicional, de integrar os conhecimentos em trabalhos conjuntos com outros professores sem que esta seja uma prática institucionalizada, em associar o conhecimento do livro didático à realidade dos alunos a partir das experiências destes e da falta de compreensão do que significa a integração entre TDICs e Docência. Apresentam ainda problemas para implementar as pretensas “inovações” curriculares sugeridas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 1997), para inserir o contexto histórico das ciências nas aulas e para desenvolver aulas de campo e outras tantas práticas que são interessantes, mas inviabilizadas pelo sistema dominante.
Morin alerta, em 2010, sobre o desenvolvimento disciplinar do currículo apresentar os mesmos inconvenientes do desenvolvimento disciplinar das ciências baseados na superespecialização, no enclausuramento e na fragmentação do saber. Martins, em 2005, sugere que as interconexões estabelecidas entre os conhecimentos proporcionam relações e complementaridades, ainda que se apresentem de forma convergente ou divergente.
Utilizando-se os pilares da transdisciplinaridade apresentados por Nicolescu (2000) é possível refletir criticamente sobre uma nova lógica que inclui e que, a partir desse processo, gera um novo conhecimento, mobilizando o professor a pensar em novos níveis de realidade, até então incompreensíveis. Pensar as ciências, as humanidades, a filosofia, a tecnologia e os aspectos pedagógicos de forma integrada pode favorecer a compreensão de uma prática docente pautada na aprendizagem significativa do aluno. Pensar as ciências e os aspectos pedagógicos vinculados aos saberes tecnológicos digitais pode ainda contribuir para uma mudança de visão de realidade, promovendo a construção de um saber interdisciplinar. Nesse sentido, a integração entre TDICs e Docência, por exemplo, mobiliza um acesso a outras formas e caminhos para a informação e, dessa forma, altera relações de poder em espaços de aprendizagem. Pensar os saberes e os aspectos pedagógicos vinculados aos saberes tecnológicos digitais pode ainda
contribuir para uma mudança de visão de realidade, promovendo a construção potencial de um saber interdisciplinar em razão das potenciais formas e agilidades de comunicação e acesso à informação. Além disso, diante da experiência da complexidade, um dos pilares da transdisciplinaridade, os professores podem compreender melhor a mobilização do conhecimento. Esta forma de trabalho entre os atores se aproxima da perspectiva de formação das comunidades de aprendizagem que podem ser um caminho para o desenvolvimento inter ou transdisciplinar e colaborativo, retirando a ênfase do aspecto competitivo e individual tão veementemente implantado nos processos educativos.
Neste aspecto, Miranda (2008) procura explicitar que as trocas comportamentais e o estabelecimento de relações interessantes e construtivas não necessitam de um meio absolutamente adequado para que elas aconteçam. De fato, acontece o contrário. Quando nos damos conta da necessidade de estabelecimento de uma resistência a algum ato de controle ou disciplinamento, as comunidades presenciais tendem a se estruturar justamente porque estes espaços seriam considerados inóspitos para tal tipo de formação. Trata-se de uma tentativa de mobilização para a sobrevivência. Por outro lado, meios considerados absolutamente adequados para a formação de comunidades tendem a não se consolidarem como tal. Lembramos que em espaços virtuais desenvolvidos pelas empresas de educação, a necessidade de disciplinamento e controle são muito mais evidentes aumentando consideravelmente as forças coercitivas e compulsórias que encontram um meio adequado para se fortalecerem em espaços de comunidades.
Miranda (2000, p. 18) afirma que:
Seja qual for o caso, há uma evidência incontestável: as chances de sucesso aumentam muito (...) para vencer as dificuldades de um ambiente inóspito (...). Quando duas ou mais pessoas estão unidas harmonicamente, nasce uma força maior, que é o espírito de equipe. Para se alcançar bons resultados pessoais ou organizacionais, deve-se compartilhar o interesse em atingir o mais alto nível de qualidade nos serviços oferecidos, e isso se consegue através do trabalho conjunto. A interação em situações de trabalho dá-se num ciclo de "atividade-interação-sentimentos", não tendo relação direta com a competência técnica de cada um.
O foco desta análise é a necessidade de reconhecimento de mudança nos paradigmas epistemológicos da ação docente e discente e o fato de que estamos inseridos em um ambiente educacional inadequado para ser utilizado como mobilizador e para dar força a essa transformação. Sem o estabelecimento desta percepção sobre as ações de controle e disciplinamento exercidas com amplitude sobre a docência, este tipo de união entre os atores não acontecerá. Manter este estado de ignorância através de atitudes que inspirem o terror sobre a necessidade de mudança, que instiguem o pensamento a não querer alterar a ordem existente ou a manutenção necessária da sobrevivência econômica é a contrapartida de dominação da governamentalidade.
Prepondera-se o fato de o professor compreender seu conhecimento específico a partir de outros conhecimentos produzidos em um contexto antropossocial (MORIN, 2010), fazendo com que o docente se aproprie da necessidade de atualização e não da manutenção de estados de relação que perpetuem uma contrarresistência à mudança. Voltamos a salientar que a instituição, como um dos espaços de disciplinamento, não estará, verdadeiramente, interessada na possibilidade de mobilizar mudanças que alterem os paradigmas instituídos no nível das raízes de influência que criaram esta mesma entidade. Essa certeza momentânea se fundamenta, por exemplo, na percepção da origem dos mantenedores das instituições e na sua inclusão e pertencimento a um mercado neoliberal e capitalista. Mudar de paradigma, para a governamentalidade, só será digno de apoio se não oferecer perigo à lógica de dominação praticada.
Mas, na contemporaneidade, estas entidades dependem de pessoas e estas, por sua vez, precisam estabelecer relações e interagir entre si para estabelecerem comunicação. As formas como estas comunicações se consolidam é crucial para as formas de discurso que irão se estabelecer. Processos inter e transdisciplinares também se pautam nas relações interpessoais. Com a ênfase na relação interpessoal, consolida-se esta perspectiva sociológica e pedagógica, evitando-se uma leitura excessivamente tecnicista ou tecnocrática (ROSZAK, 1972) já que qualquer um destes modelos epistemológicos decorrentes de influências mais técnicas tende a deixar menos espaços para as subjetividades, que se trata do meio mais adequado para a mobilização da resistência.
Trata-se de valorizar os relacionamentos interpessoais e de valorizar o espaço como um dos elementos definidores do grau de interação, um espaço de força da
coletividade. Salienta-se que é muito comum, na educação apoiada na tecnologia, a crença de que a solução dos impasses está mais próxima de ações envolvendo os softwares e a eletrônica utilizada nestes processos, envolvendo técnicas importadas de ação ou mesmo quimeras intelectuais de especialistas que desconhecem a construção das realidades das instituições que desejam alterar. Isso é um enorme engano. A longitudinalidade da história das instituições demonstra claramente este equívoco. Neste sentido, como afirma Carvalho (2008), a formação do professor deve ser pensada também a partir de seus saberes para que sejam capazes de conviver com as crises da educação em um movimento de reflexão, crítica e superação diante de uma visão diferente sobre aprendizagem. As revoluções e transformações são éticas, são empreendidas por sujeitos e coletividades e, pelo menos, por enquanto, não são originadas pelos artefatos tecnológicos. Mudar o fazer vinculado à tecnologia digital significa muito pouco se não ocorrer uma mudança ética e humana.
Se a busca é pela integração dos saberes, a partir da compreensão das relações entre ciências, filosofias, artes e sociedade, o contexto cultural e social que nos dias atuais se apresenta diretamente relacionado à tecnologia digital, enquanto saber, então é condição inevitável que o docente se aproprie destas tecnologias para poder almejar a mudança paradigmática. Ao mesmo tempo, deve estar ciente de que se estas mudanças advêm de meios representantes da governamentalidade, portanto, a chance de ser uma mudança de fato é diminuída. O governo não compactua com a perda de poder. Sendo assim, pensar criticamente o uso das TDICs, sua influência no processo de ensino e aprendizagem é uma tarefa imprescindível.
Tratamos esta integração como um processo de interiorização pessoal e coletiva da necessidade de interação com o outro, e isso ultrapassa limitações técnicas das ferramentas e até mesmo as próprias ferramentas de controle e disciplinamento utilizadas pelas instituições, já que os atores, uma vez conectados nas redes, digitais ou orgânicas, podem utilizar diversos meios para estabelecerem as comunicações entre si, indo muito além das ferramentas eletrônicas e burocráticas oferecidas pelos tecnólogos. A economia de mercado exige o desenvolvimento da indústria computacional, enquanto as pessoas se sentem na obrigação de adquirir os produtos que lhes são oferecidos, são dominadas pelo desejo imposto pelas propagandas midiáticas, são dominadas pelo desejo de possuir aquilo que todos estão rapidamente adquirindo (KERCKHOVE, 2009; LIMA, 2014) sem uma reflexão crítica em relação ao “ter” que passa a ser um elemento
capital na escala de avaliação do sucesso do indivíduo. Esta crítica e apropriação das TDICs podem ser fundamentos para a mudança na docência.
Este tipo de manobra disciplinadora que impele os docentes a um processo de cerceamento do uso destas tecnologias por parte dos discentes e consolida a sua própria rejeição a reflexões mais maduras sobre a tecnologia na sociedade, são oriundas de pensadores e legalistas que querem a reconstrução das “paredes das salas de aula” que durante tanto tempo foram criticadas. Um dos adventos da rede de comunicações digitais foi exatamente a criação de um caminho de se estar em outro espaço sem a necessidade de locomoção física, sem que os espaços concretos precisassem ser destruídos. Obviamente, uma das repercussões compreendidas como negativas é a possibilidade de o discente não estar mentalmente e emocionalmente aprisionado em um espaço que não valora como importante, o mesmo acontecendo aos docentes, principalmente quando percebemos em reuniões a franca utilização da web durante os discursos dos pares.
A tendência ingênua, reprodutivista de uma disciplina incoerente, leva a bloquear a integração destas tecnologias na docência, bem como proibir o uso destas tecnologias na formação dos discentes, revelando a intenção de bloquear possibilidades comunicacionais. O uso destas tecnologias no ensino fundamental será um risco para a consolidação autoritarista do professor. Esta ação pode se perpetuar nos espaços da universidade e em cursos específicos. Um dos mecanismos de ação do disciplinamento emergente é a manutenção da defasagem entre a prática de integração das tecnologias no ensino, aprendizagem e avaliação ou a sua utilização de forma a reproduzir modelos tradicionalmente pautados nos interesses de controle e disciplinamento. As paredes das salas de aula que poderiam ter sido derrubadas digitalmente e, o discurso das aberturas que antes não oferecia perigo real às instituições em razão de inviabilidades técnicas e econômicas, passa a ser perigoso, pois a tecnologia está mais acessível em razão de necessidades do mercado e do lucro.
Assim, como muitas das evoluções tecnológicas da humanidade, a educação, de fato, não muda sua prática em termos de paradigma. A massa crítica de intelectuais para esse tipo de mudança tende a ser fortemente evitada em razão das impossibilidades aparentemente intransponíveis para quem quer transformar seguindo as “regras do jogo”. É preciso subverter a forma da docência dentro de um sistema que não deseja, de fato, uma mudança de paradigma e de metacontextos.
Coll (2009) afirma que, em geral, o uso das TDICs na prática pedagógica é coerente com os pensamentos pedagógicos do docente. São utilizadas para apresentação e transmissão de conteúdos por profissionais que valorizam a prática centrada no professor, isto é, profissionais que tendem à reprodução acrítica das vontades de uma governamentalidade dominante. São utilizadas para promover atividades de exploração e questionamentos por profissionais que apresentam uma visão mais ativa do ensino. Com isso, o autor infere que a incorporação das TDICs à prática docente não garante uma transformação pedagógica e integradora de fato, apenas reforça uma prática vigente.
Contudo, os processos de ensino e de aprendizagem podem ser influenciados pelas TDICs, proporcionando o uso de diferentes recursos com a ampliação de novas possibilidades de experimentação. Ramos e Struchiner (2009) salientam que a utilização de materiais educacionais informatizados aproxima os conteúdos à realidade dos alunos com incentivo às estratégias de resolução de problemas. Logo, trata-se de apropriação do uso destes artefatos digitais que mobilizam as dinâmicas e não os artefatos em si. A grande transformação é do humano, do profissional e não dos equipamentos. Tratamos de posturas muito mais do que de ferramentas. Essa integração entre saberes e tecnologia, pautada na necessidade de contextualização e aplicação social, possibilita a potencial melhoria da reflexão sobre a educação, desde que sejam considerados quesitos como interdisciplinaridade, interação, crítica, conexão, reflexão e comunicação.
O sentido que se deseja explicitar é que, conforme o olhar do observador e da linha de observação, que é influenciada por políticas, ideologias, pela formação pessoal e coletiva do sujeito, obter-se-á uma das possíveis visões da “realidade” que nem sempre é unificada com outras, mas é plenamente válida. Conforme o conceito de docência, de tecnologia, de integração entre TDICs e Docência (a Tecnodocência), metodologias, práticas e sociedade é que se irá construir ou evidenciar os parâmetros emergentes para análise da realidade e da mudança de paradigma, que podem ser mais ou menos significativos, enquanto fundamento de resistência aos dispositivos de controle e disciplinamento que não desejam uma mudança na educação e no social.
Diante de uma proposta de trabalho pautada na transdisciplinaridade e interdisciplinaridade, os aspectos pedagógicos da docência precisam ser estudados para que sejam integrados aos saberes vinculados às TDICs. Percebe-se que a aprendizagem não ocorre isoladamente e só é possível a partir das relações
que se estabelece com as estratégias de mediação docente. No contexto da utilização e da produção da tecnologia digital, o professor também se torna um aprendiz, construindo com seus alunos uma relação de parceria e mediação diante das interações estabelecidas entre os diferentes saberes (FAGUNDES,1999; PAPERT, 2008), em suma, as relações de poder são alteradas, as “certezas” do saber do professor são questionadas e a realidade que é narrada para os alunos e para os próprios professores passa a ser necessariamente palco de reflexões e questionamentos. Relações de saber e poder são evidentemente alteradas.
Observamos que existe uma diferença muito grande entre um docente que sabe suas especialidades e abre mão do status de poder garantido por sua especialização que detém e, o outro caso, onde, ainda que o docente seja uma figura de autoridade, não detém o poder sobre as TDICs e daí é levado a ter de abrir mãos do controle em razão de sua ignorância tecnológica docente ou de coibir o uso das TDICs em “sua sala de aula”.
Outra construção de modelos que explicitem a realidade, que estimulem a não reprodução, que proponha a reflexão crítica deverá ser implementada dentro se um sistema criado para controle e disciplinamento das mentes. Será possível? Teremos força para realizar esta empreitada? Como podemos multiplicar as nossas forças para incentivar a quebra de um paradigma e a construção de outro?
No sentido de exemplificar o que estamos afirmando, podemos refletir sobre o papel de uma das teorias de aprendizagem que utilizamos para pautar as nossas escolhas metodológicas como docentes. Esse é um dos sentidos régios sobre o estudo das grandes teorias cognitivas, ou seja, criar um caminho para compreender a aprendizagem do outro, além da nossa própria, que possa servir como fio condutor das metodologias e didáticas aplicadas. Assumimos que para promover uma aprendizagem significativa é absolutamente imprescindível prezar pela conexão, ressignificação, inter-relacionamento e integração dos saberes dos alunos entre si e dos professores.
Por outro lado, dentro desta proposta teórica, a aprendizagem dos alunos é pensada a partir da compreensão que se tem sobre os princípios utilizados pelo aprendiz para relacionar e organizar os novos conceitos em sua estrutura cognitiva. Sendo assim, encontramos, por exemplo, na teoria ausubeliana, Teoria da Aprendizagem Significativa, condições para que o professor aprenda o que lhe é imprescindível na preparação de aulas que proporcionem a aprendizagem com sentido e significado, pautando-se no aprofundamento teórico, a partir da
compreensão da essência dos conceitos abordados e na organização desses conceitos de forma programática.
Portanto, acreditamos que a ação docente em sala de aula deve ser pensada a partir de uma teoria que sistematize uma proposta sobre a compreensão do processo de aprendizagem do aluno e sobre uma filosofia política que irá reger as suas coerências teóricas e práticas. Com isto, é necessário estabelecer, na formação do professor, uma relação entre ensino e aprendizagem, a partir de discussões teóricas e vivências da prática, que permita, por exemplo, ao licenciando, compreender a importância desta mencionada relação, sob o foco de diferentes referenciais.
Como pode-se perceber, a escolha de uma base teórica de ação surge como uma opção às necessidades e às condições da educação de hoje que, em geral, segue um modelo muito mais centrado na competição do que na colaboração, na formação do sujeito crítico, e, pouco ou nada fundamentado. É importante salientar que a prática de ensino, aprendizagem e avaliação, utilizando a perspectiva da aprendizagem significativa repercute na educação de forma muito mais direta, já que a educação também é um fenômeno social e não está alheia aos fenômenos sociológicos, psicológicos e filosóficos entre outros, que a humanidade vivencia através dos tempos.
O docente passa a ter, por meio das teorias de aprendizagem, fontes de fundamentação para suas escolhas metodológicas por meio do conhecimento e apropriação de uma teoria cognitiva. Ganha, dessa forma, mais tecnicidade no trabalho. Isto também significa, nesse contexto, que análises diversas podem coexistir na fundamentação das ações em razão das diferenças e espaços multirreferenciados em que os atores estão inseridos. Estabelece-se outra forma de convivência entre os atores. As produções podem ainda ser compartilhadas virtualmente, estreitando as relações telecolaborativas estabelecidas entre professores e alunos de diferentes culturas, ampliando os tempos e os espaços geográficos.
Considerando-se que a superação da fragmentação pode ser minimizada por meio da integração de diferentes saberes, pautada nos pressupostos da inter ou transdisciplinaridade compreende-se a necessidade de formar os licenciandos estabelecendo relações e integrações entre estes saberes científicos, tecnológicos e tecnodocentes voltados para o ensino, aprendizagem e avaliação. Trata-se da construção de aprendizagens amparadas em fundamentações sociointerativas e
construtivas, sem serem, necessária ou obrigatoriamente, pautadas em bases fundamentais de teorias de aprendizagem sociointeracionistas ou construtivistas. Trata-se de pensar e fundamentar a ação técnica docente em algum tipo de fundamento teórico de interação social que possibilite uma educação mais efetiva, crítica, reflexiva e integradora das diversidades. A docência como apropriação de um ambiente para a ciência, para a filosofia, para a diferença, para a “virtual sociedade conectada” e para a aprendizagem significativa são espaços que precisam ser abertos como resistência a modelos fundamentalmente caracterizados como dispositivos de controle e disciplinamento historicamente atribuídos como uma das características da ação dos docentes.
Escrever sobre aprendizagens pode nos levar à uma dimensão dos conteúdos a ser expandida e balanceada por meio do uso das TDICs. Estas podem ser um caminho para a derrubada dos muros ou paredes das salas de aula, de isolamentos teóricos e de autoritarismos. Este discurso, que foi uma “bandeira” de discussão durante a década de 1980 e 1990 tem agora os artefatos tecnológicos e os meios para ser concretizado. Mas, o docente precisa estar preparado para este rompimento com estas barreiras e ao nosso ver, isto só é possível com uma modificação do foco das formações de docentes e discentes.
Os conceitos podem ser estudados conjuntamente com os procedimentos. Experiências podem ser desenvolvidas no contexto digital e, posteriormente, comparadas no contexto concreto, integrando-se, assim, vivências diferenciadas que podem contribuir para o desenvolvimento de outras compreensões sobre ciências, arte, filosofia e outros campos de conhecimentos. Outras experiências, no entanto, podem ser desenvolvidas apenas no contexto digital, devido às peculiaridades impossíveis de serem testadas em ambiente concreto, como por exemplo, experimentos cujo grau de periculosidade ou a dificuldade de acesso a materiais com custos altos e difíceis de serem encontrados tornaria o exercício inviável. Em qualquer um destes casos, o risco da “quebra das paredes da sala de aula”, os riscos de expansão descontrolada de interesses e o alardeio de que as TDICs desconcentram os alunos são ações desesperadas da sociedade de controle e disciplinamento tentando manter as paredes da sala de aula intransponíveis e garantindo o movimento de dominação.
Na prática, uma das situações que acontece considera que expandir a possibilidade ao acesso de informação representa um risco de “nossos” alunos adquirirem condições de questionar os saberes docentes gerando um abalo na “autoridade” pautada, por exemplo, no terror. A amplitude de acesso a conceitos
que podem trazer diferenças entre os discursos dos professores e as informações da internet podem gerar focos de tensão onde o risco de aparecer que a autoridade está enganada, é muito alto, gerando grande exposição dos erros da governamentalidade controladora e disciplinadora em relação ao grupo discente.