Todos estávamos assistindo a Caras & Caretas. A família toda junta, até mesmo Greta, que estivera mais emburrada do que o normal desde o episódio com Annie. Era muito gostoso e parecia acontecer apenas em noites quando Caras & Caretas e The Cosby Show estavam passando. Eu tinha bastante certeza de que Greta só assistia porque achava Alex Keaton, interpretado por Michael J. Fox, bonitinho. Eu a ouvi dizer isso ao telefone uma vez.
– Pipoca? – minha mãe disse depois do programa.
– Sim – falei.
– Eu também quero.
Meu pai havia comprado a pipoqueira no Natal e todos nós adoramos. Observar os grãos estourados se empilharem até ter uma quantidade suficiente para eles forçarem caminho até a tigela era um show por si só.
O noticiário começou e o cheiro quente da manteiga derretida misturou-se com fatos sobre os crimes de guerra de Klaus Barbie e o caso Irã-Gate.
– Então, como a boa e velha Ao Sul do Pacífico está indo? – meu pai perguntou.
Greta encolheu os ombros.
– Bem, eu acho. Tanto faz.
Ele pareceu estar esperando por mais, mas Greta logo pegou o guia da TV e começou a folheá-lo.
Minha mãe entrou, segurando uma enorme tigela de alumínio lotada de pipoca.
– Duas levas – ela disse. – E mais manteiga do que estou disposta a contar.
Sorriu e apoiou a tigela. Estendemos os braços, agarrando a pipoca com a mão cheia.
O noticiário local começou com uma história sobre um incêndio em Mount Kisco que destruiu um prédio de apartamentos. Depois disso, vi uma reportagem sobre um juiz em Yonkers que transferiu toda a sala do tribunal para o estacionamento porque o cara que ele estava sentenciando tinha AIDS. “Ar fresco e luz do sol”, o juiz dissera, afirmando que achava mais seguro para os funcionários do tribunal não ficarem em uma sala apertada com germes como aqueles. Entrevistaram pessoas na rua para ver se elas achavam que o juiz estava sendo razoável. Uma mulher disse que não tinha certeza, mas achava que era melhor prevenir do que remediar. Depois, veio um homem que disse que não era o juiz que era louco, era a AIDS que era louca.
Seguiram com uma reportagem mais geral sobre a AIDS. Como sempre, começaram com imagens de algum tipo de clube noturno quente e abafado na cidade com vários homens gays dançando e usando roupas idiotas com penas. Eu não conseguia nem começar a imaginar Finn dançando a noite toda como um tipo de caubói meio vestido. Teria sido bom se, pelo menos uma vez, mostrassem alguns caras sentados em suas salas de estar tomando chá e conversando sobre arte ou filmes ou qualquer outra coisa. Se mostrassem isso, talvez as pessoas dissessem: “Ah, tudo bem, não é tão estranho”.
Eu estava prestes a subir para o quarto quando o âncora apareceu com uma reportagem sobre o AZT, que, aparentemente, era uma droga que ajudava as pessoas a sobreviverem com AIDS. Sentei-me de novo, esperando para ouvir o que ele tinha a dizer e, depois, não consegui voltar a me levantar. O FDA tinha acabado de aprová-la, o âncora disse. A droga estaria disponível para o público em seis meses.
Nenhum de nós disse nada. A injustiça do que ouvimos nos deixou mudos. Meus punhos se fecharam no tecido do sofá. Finn tinha acabado de perder aquilo. Mais alguns meses e...
Minha mãe ficou em pé e saiu da sala sem olhar para trás, mas eu estava congelada no sofá. Um repórter de ciência apareceu, dando mais detalhes de como o AZT funcionava exatamente, mas parecia que eu não ouvia nada daquilo. Meu pai, geralmente o mais silencioso, gritou “chega” para a tela. Depois, atravessou a sala com passos pesados, bateu no botão de desligar com a palma da mão e saiu.