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Histórias de Fogueira
MUITAS VEZES, POR
causa da distância, ou pelo cair da noite, não valia a pena voltar para casa. Nesses dias, os exploradores montavam acampamento diante de uma fogueira de nós de pinho e grimpa. Eram momentos grandiosos. Riam-se dos fracassos, discutiam vários temas, alguns elevados, a maioria nem tanto. Aos goles de vinho tinto e salame com pão, a piada, essa singularidade humana, corria em abundância. Também falavam de política. As histórias da guerra surgiam em profusão da boca de João.
— Era comum os cachorros chegarem em casa trazendo pedaços de corpo humano. Ninguém podia comer porco na época, pois eles viviam devorando cadáveres.
Geovane fingia certa indiferença, mas vez ou outra perguntava sobre Adeodato Ramos, o jagunço mais temido que existiu.
— É verdade que ele matou a própria esposa pra ficar com a comadre por quem era apaixonado?
— Sim, dizem que sim. Mas antes deu fim do compadre, o Chico Alonso, mandando ele lutar contra uns polacos no Rio das Antas. Ele que autorizou o ataque, mas antes avisou eles. Quando o homem chegou, os polacos já estavam esperando, armados até os dentes — E a conversa de que ele matou uma mulher que não conseguia dar à luz porque a criança estava atravessada?
— Verdade também, filho. Teria dito que seria melhor os dois morrerem porque não teria leite pra criança.
— Minha nossa!
— Mas non
há ninguém tão ruim que não tenha uma bondade, e nem pessoa tão boa que não tenha uma ruindade, como dizia teu nono. Muitos gostavam dele, era um guerreiro destemido.
Geovane entornou mais um gole de vinho antes de falar:
— Ele foi morto em Florianópolis! Lá eu ouvi também, de um historiador, que o primeiro dos monges, o João Maria D’Agostini…
— Sim, o monge bom, profeta e curandeiro…
— Ele mesmo. Existem documentos nos Estados Unidos que comprovam que ele foi enterrado lá, numa cidade do Novo México.
— Menzognero!
— Vero
! Pra ver como esse homem andou… Assassinaram ele na tal cidade, não me lembro o nome… Bicho, ninguém sabe disso por aqui. Nem o senhor, depois de tanto escutar causos antigos.