{O efeito da rotação sobre a produção de mais-valor, ou seja, de lucro, foi mencionado no Livro II. Podemos resumi-lo dizendo que, em decorrência do período requerido para a rotação, o capital inteiro não pode ser simultaneamente empregado na produção; que, portanto, uma parte do capital é continuamente imobilizada, seja na forma de capital monetário, de matérias-primas em estoque, de capital-mercadoria acabado, porém ainda não vendido, seja na forma de títulos de crédito ainda não prescritos; que do capital operante na produção ativa, ou seja, na criação e na apropriação de mais-valor, subtraia-se continuamente essa parte e que o mais-valor criado e apropriado seja continuamente reduzido na mesma proporção. Quanto mais curto o tempo de rotação, tanto menor se torna essa parte imobilizada do capital em comparação com o todo; tanto maior, também, torna-se o mais-valor apropriado, conservando-se inalteradas as demais circunstâncias.
Já no Livro II[a], desenvolvemos em detalhes como o encurtamento do tempo de rotação ou de uma de suas duas seções, o tempo de produção e o tempo de circulação, aumenta a massa do mais-valor produzido. Mas, como a taxa de lucro expressa apenas a relação entre a massa de mais-valor produzido e o capital total engajado em sua produção, é evidente que todo encurtamento desse tipo aumenta a taxa de lucro. O que desenvolvemos na segunda seção do Livro II com relação ao mais-valor vale igualmente para o lucro e para a taxa de lucro e, por isso, não precisa ser aqui reiterado. Vale destacar apenas alguns elementos centrais.
O principal meio do encurtamento do tempo de produção é o aumento da produtividade do trabalho, que se costuma chamar de progresso da indústria. Se esse encurtamento não provoca um incremento significativo do desembolso total de capital mediante o emprego de maquinaria cara etc. e, com isso, uma queda da taxa de lucro a ser calculada sobre o capital total, então essa taxa de lucro tem necessariamente de aumentar. Esse é, de fato, o caso de muitos dos mais recentes progressos da metalurgia e da indústria química. Os métodos recém-descobertos de produção de ferro e aço de Bessemer, Siemens, Gilchrist-Thomas, entre outros, encurtam a um mínimo, com custos relativamente baixos, processos que antes eram extremamente longos. A obtenção da alizarina ou da garancina a partir do alcatrão de hulha proporciona em poucas semanas, e com as mesmas instalações fabris atualmente utilizadas para os corantes de alcatrão de hulha, o resultado que antes exigia muitos anos; a garança precisava de um ano para crescer e, então, suas raízes tinham ainda de amadurecer por vários anos, antes de ser tingidas.
O principal meio para o encurtamento do tempo de circulação é a melhoria das comunicações, e nisso os últimos cinquenta anos acarretaram uma revolução, comparável apenas à revolução industrial da última metade do século anterior. No campo, a estrada macadamizada foi suplantada pela estrada de ferro; no mar, a lenta e irregular navegação a vela cedeu lugar às velozes e regulares linhas da navegação a vapor, e o globo terrestre inteiro foi atravessado por cabos de telégrafo. O canal de Suez integrou a Ásia oriental e a Austrália ao tráfego dos navios a vapor. O tempo de circulação de uma encomenda para a Ásia oriental, que em 1847 era de no mínimo doze meses (cf. Livro II, p. 235 [347-8]), pode ser agora reduzida a aproximadamente doze semanas. Por essa revolução dos meios de transporte, os dois grandes focos de crises de 1825-1857, a América e a Índia, tornaram-se de 70% a 90% mais próximos dos países industrializados e, com isso, perderam grande parte de sua capacidade explosiva. O tempo de rotação do comércio mundial encurtou-se na mesma medida, e a capacidade de ação do capital nele empenhado mais do que dobrou ou triplicou. É evidente que isso não deixou de provocar um efeito sobre a taxa de lucro.
Para expor, em sua forma pura, o efeito da rotação do capital total sobre a taxa de lucro, temos de, nos dois capitais a ser comparados, supor todas as demais circunstâncias como iguais. Que, além da taxa de mais-valor e da jornada de trabalho, seja também igual, portanto, a composição percentual desses capitais. Suponhamos, então, um capital A de composição 80c + 20v = 100C, o qual, com uma taxa de mais-valor de 100%, efetua duas rotações no ano. Nesse caso, o produto anual é 160c + 40v + 40m. Porém, a fim de investigar a taxa de lucro, calculamos esses 40m não sobre o valor-capital rodado de 200, mas sobre o valor-capital adiantado de 100, e obtemos, assim, l’ = 40%.
Comparemos com isso um capital B = 160c + 40v = 200C, que roda com a mesma taxa de mais-valor de 100%, porém somente uma vez no ano. Nesse caso, o produto anual é, como antes, 160c + 40v + 40m. Dessa vez, no entanto, os 40m devem ser calculados sobre um capital adiantado de 200, o que dá uma taxa de lucro de apenas 20%, ou seja, apenas a metade da taxa para A.
Disso resulta, portanto, que, em capitais de igual composição percentual, taxa igual de mais-valor e igual jornada de trabalho, a relação entre as taxas de lucro de dois capitais é inversa à relação entre seus tempos de rotação. Se nos dois casos comparados apresenta-se uma desigualdade, seja na composição, ou na taxa de mais-valor, ou na jornada de trabalho ou no salário, é verdade que desse modo também se produzem diferenças subsequentes na taxa de lucro; mas tais diferenças são independentes da rotação e, por isso, não nos importam aqui. Elas também foram mencionadas no capítulo 3.
O efeito direto do tempo reduzido de rotação sobre a produção de mais-valor – portanto, também do lucro – consiste na eficácia aumentada que, desse modo, se confere à parte variável do capital; sobre isso, cf. Livro II, capítulo 16, “A rotação do capital variável”. Lá mostramos que um capital variável de 500 que efetue dez rotações no ano apropria nesse tempo tanto mais-valor quanto um capital variável de 5.000 que, com a mesma taxa de mais-valor e o mesmo salário, efetue apenas uma rotação no ano.
Tomemos um capital I, composto de 10.000 de capital fixo (cuja depreciação anual seja de 10% = 1.000), 500 de capital constante circulante e 500 de capital variável. Suponhamos que, com uma taxa de mais-valor de 100%, esse capital efetue dez rotações no ano. Para simplificar, partamos do pressuposto de que, em todos os exemplos a seguir, o capital constante circulante efetua, no mesmo tempo, igual número de rotações que o capital variável, o que, na maior parte das vezes, é o que ocorre na prática. Nesse caso, o produto de um desses períodos de rotação será:
100c (depreciação) + 500c + 500v + 500m = 1.600
O produto de um ano inteiro, de dez dessas rotações:
1.000c (depreciação) + 5.000c + 5.000v + 5.000m = 16.000
C = 11.000, m = 5.000, l’ = 5.000/11.000 = 456/11%
Tomemos agora um capital II, com capital fixo de 9.000 (com depreciação anual de 1.000), capital constante circulante de 1.000, capital variável de 1.000, taxa de mais-valor de 100% e número de rotações anuais do capital variável: 5. O produto de cada um dos períodos de rotação do capital variável será, portanto:
200c (depreciação) + 1.000c + 1.000v + 1.000m = 3.200
O produto total anual, em cinco rotações:
1.000c (depreciação) + 5.000c + 5.000v + 5.000m = 16.000
C = 11.000, m = 5.000, l’ = 5.000/11.000 = 456/11%
Tomemos, além disso, um capital III, no qual não se encontra nenhum capital fixo, mas 6.000 de capital constante circulante e 5.000 de capital variável. Suponhamos que, com uma taxa de mais-valor de 100%, ele efetue uma rotação no ano. O produto total no ano é, então:
6.000c + 5.000v + 5.000m = 16.000
C = 11.000, m = 5.000, l’ = 5.000/11.000 = 45/11%
Temos, portanto, nos três casos, a mesma massa anual de mais-valor = 5.000 e, como nos três casos também o capital total é igual, a saber = 11.000, temos a mesma taxa de lucro de 455/11%.
Se no capital I, ao contrário, há, em vez de 10, apenas 5 rotações anuais de sua parte variável, então a situação é diversa. O produto de uma rotação é, então:
200c (depreciação) + 500c + 500v + 500m = 1.700
O produto anual:
1.000c (depreciação) + 2.500c + 2.500v + 2.500m = 8.500
C = 11.000, m = 2.500, l’ = 2.500/11.000 = 228/11%
A taxa de lucro caiu pela metade porque o tempo de rotação dobrou.
A massa de mais-valor apropriada no curso do ano é, assim, igual à massa do mais-valor apropriada num período de rotação do capital variável multiplicada pelo número dessas rotações no ano. Se chamamos de M o mais-valor ou o lucro anualmente apropriado, de m o mais-valor apropriado num período de rotação e de n o número das rotações anuais do capital variável, então M = mn, e a taxa anual de mais-valor M’ = m’n, tal como já foi desenvolvido no Livro II, capítulo 16, item 1[b].
Naturalmente, a fórmula da taxa de lucro l’ = m’ v/C = m’ v/c + v só é correta quando o v do numerador é o mesmo que o do denominador. No denominador, v é a parte total inteira, empregada em média como capital variável, para o salário. Inicialmente, o v do numerador é determinado apenas pelo fato de ele ter produzido e apropriado certa quantidade de mais-valor = m, cuja relação com v é m/v, isto é, a taxa de mais-valor m’. Apenas desse modo a equação l’ = m/c + v se transformou em l’ = m’ v/c + v. O v do numerador é, agora, determinado pelo fato de que ele tem de ser igual ao v do denominador, isto é, à parte variável inteira do capital C. Em outras palavras, a equação l’ = m/C só pode ser transformada sem erros na equação l’ = m’ v/c + v, se m significa o mais-valor produzido em um período de rotação do capital variável. Se m abarca apenas parte desse mais-valor, então m = m’v é decerto correto, mas esse v é aqui menor que o v em C = c + v, porquanto no salário foi desembolsado menos do que o capital variável inteiro. Mas, se m abarca mais que o mais-valor de uma rotação de v, uma parte – ou a totalidade – desse v funciona duas vezes, a saber, na primeira e na segunda rotações e, eventualmente, em rotações subsequentes; o v que produz o mais-valor e que é a soma de todos os salários pagos é, assim, maior que o v em c + v, e o cálculo se revela errado.
Para que a fórmula da taxa anual de lucro seja correta, é preciso que nela lancemos, em vez da taxa simples de mais-valor, a taxa anual do mais-valor, ou seja, M’ ou m’n no lugar de m’. Em outras palavras, temos de multiplicar m’, a taxa de mais-valor – ou, o que resulta no mesmo, a parte variável de capital v contida em C –, por n, o número das rotações desse capital variável no ano; obtemos, assim, l’ = m’n v/C, que é a fórmula para o cálculo da taxa de lucro anual.
Mas quão grande é o capital variável num negócio é algo que o próprio capitalista, na maior parte dos casos, não sabe. No Livro II, capítulo 8, vimos – e ainda veremos adiante – que a única diferença no interior de um capital que se impõe ao capitalista como essencial é a diferença entre capital fixo e circulante. Do caixa que contém a parte do capital circulante que se encontra em suas mãos na forma de dinheiro – na medida em que esse capital não esteja no banco –, o capitalista retira o dinheiro para o salário, o dinheiro para as matérias-primas e os materiais auxiliares e lança esses débitos numa mesma conta. Ainda que ele tivesse de manter uma conta separada para os salários pagos, no final desse ano essa conta mostraria apenas a soma paga para esse item, isto é, vn, mas não o próprio capital variável v. Para investigar isso, ele teria de realizar um cálculo próprio, do qual daremos aqui um exemplo.
Para tanto, tomemos a fiação de algodão de 10.000 fusos descrita no Livro I (p. 209/201 [295]) e suponhamos que os dados que lá correspondiam a uma semana de abril de 1871 conservam seu valor para o ano inteiro. O capital fixo contido na maquinaria era de £10.000. O capital circulante não foi fornecido, mas suponhamos que fosse de £2.500, um volume bastante alto, que, no entanto, é justificado pelo pressuposto de que temos sempre de partir aqui, a saber, de que não ocorrem quaisquer operações de crédito, ou seja, nenhum emprego duradouro ou momentâneo de capital alheio. O produto semanal era, quanto ao valor, composto de £20 para o desgaste da maquinaria, £358 de adiantamento do capital constante circulante (aluguel, £6; algodão, £342; carvão, gás, óleo, £10), £52 de capital variável desembolsado em salário e £80 de mais-valor, portanto:
20c (depreciação) + 358c + 52v + 80m = 510
O adiantamento semanal de capital circulante era, assim, 358c + 52v = 410, e sua composição percentual = 87,3c + 12,7v. Isso, calculado sobre todo o capital circulante de £2.500, resulta em £2.182 de capital constante e £318 de capital variável. Como o desembolso total para o salário no ano era de 52 vezes £52, logo, £2.704, o resultado é que o capital variável de £318 no ano efetuou quase 8½ rotações. A taxa do mais-valor era de 80/52 = 15311/13%. A partir desses elementos, calculamos a taxa de lucro, inserindo na fórmula l’ = m’n v/C os valores m’ = 15311/13, n = 8½, v = 318, C = 12.500; portanto:
l’ = 15311/13 × 8½ × 318/12.500 = 33,27%
A prova disso fazemos mediante o uso da fórmula simples l’ × m/C. O mais-valor ou o lucro total no ano é de [£]80 × £52 = £4.160; essa soma, dividida pelo capital total de £12.500, tem como resultado, tal como antes, 33,28%, uma taxa de lucro anormalmente alta, que só se explica com base em circunstâncias momentâneas extremamente favoráveis (algodão muito barato, acompanhado de preço muito alto do fio) e que, na realidade, certamente não valia ao longo de todo o ano.
Na fórmula l’ = m’n v/C, m’n é, como dito, aquilo que no Livro II foi calculado como a taxa anual do mais-valor. Esta é, no caso citado, 15311/13% × 8½ ou, calculado com exatidão, 1.3079/13%. Se, portanto, um certo Biedermann[c] ficou horrorizado com a monstruosidade de uma taxa anual de mais-valor de 1.000%, tal como foi apresentada em exemplo no Livro II[d], talvez ele agora se tranquilize com uma taxa anual de mais-valor acima de 1.300%, fato que se lhe apresenta a partir da prática de Manchester. Em épocas de extrema prosperidade, como há muito tempo não vivenciamos, uma taxa assim não é de modo algum uma raridade.
De passagem, temos aqui um exemplo da composição factual do capital no interior da grande indústria moderna. O capital total de £12.500 divide-se em £12.182 de capital constante e £318 de capital variável. Percentualmente, 97½c + 2½v = 100C. Apenas a quarta parte do total serve para o pagamento de salário, porém retornando mais que oito vezes no ano.
Como apenas a poucos capitalistas ocorre efetuar tais cálculos sobre o próprio negócio, a estatística silencia quase absolutamente sobre a relação entre as partes constante e variável do capital social total. Apenas o censo norte-americano fornece aquilo que é possível sob as atuais condições: a soma dos salários pagos em cada ramo de negócio e dos lucros obtidos. Por mais suspeitos que esses dados possam ser, já que se baseiam apenas sobre informações fornecidas pelos próprios industriais e não posteriormente controladas, eles são, de qualquer modo, extremamente valiosos, a única coisa de que dispomos sobre o assunto. Na Europa, somos demasiado ternos para confrontar nossos grandes industriais com revelações desse tipo. – F. E.}
[a] Cf. Karl Marx, O capital: crítica da economia política, Livro II: O processo de circulação do capital (trad. Rubens Enderle, São Paulo, Boitempo, 2014), p. 391-5. (N. T.)
[b] Cf. Karl Marx, O capital, Livro II, cit., p. 391. (N. T.)
[c] Referência a Karl Biedermann, historiador e jornalista liberal. Engels faz aqui um jogo de palavras com Biedermann, que significa “filisteu”, “pequeno-burguês”. (N. T.)
[d] Cf. O Capital, Livro II, cit., p. 392 e seg. (N. T.)