“O grande regulador da velocidade da circulação é o crédito. Assim se explica por que as crises agudas do mercado monetário costumam coincidir com uma abundância da circulação” (The Currency Theory Reviewed, p. 65). Isso deve ser entendido em dois sentidos: por um lado, todos os métodos para poupar meios de circulação se baseiam no crédito; por outro, tomemos, como exemplo, uma cédula de £500. A entrega essa cédula hoje a B em pagamento a uma letra de câmbio; B a deposita, no mesmo dia, em seu banco; este desconta, ainda no mesmo dia, uma letra com ela em favor de C; C paga com ela seu banco, que, por sua vez, a adianta ao bill-broker para que a desconte etc. A velocidade com que a cédula circula nesse caso, servindo de meio de compras e de pagamentos, é mediada pela velocidade com que sempre retorna a alguém na forma de depósito e com que se transfere a outrem na forma de empréstimo. A mera economia de meios de circulação aparece desenvolvida ao máximo na Clearing House, no intercâmbio de letras vencidas e na função predominante do dinheiro como meio de pagamento simplesmente para compensação de saldos. A existência dessas letras repousa, por sua vez, sobre o crédito que os industriais e os comerciantes se concedem mutuamente. Se esse crédito diminui, cai o número de letras de câmbio, sobretudo das de longo prazo, e, com elas, cai a eficácia desse método de compensação. Essa economia, que consiste em eliminar o dinheiro das transações e que se baseia inteiramente na função do dinheiro como meio de pagamento, a qual, por sua vez, repousa sobre o crédito, só pode ser (se abstrairmos da técnica mais ou menos desenvolvida de concentrar esses pagamentos) de duas espécies: créditos recíprocos, representados por letras ou cheques, que ou se compensam com o mesmo banqueiro, o qual se limita a transferir o crédito da conta de um cliente à de outro, ou são compensados pelos diversos banqueiros entre si[11]. A concentração de 8 milhões a 10 milhões de letras de câmbio nas mãos de um bill-broker – por exemplo, a firma Overend, Gurney & Co. – foi um dos principais meios empregados para expandir localmente a escala dessa compensação. Tal economia aumenta a eficácia do meio de circulação na medida em que, graças a ela, uma quantidade menor desse meio é exigida para a simples liquidação do saldo. Por outro lado, a velocidade do dinheiro que gira como meio de circulação (e com esse giro ele também é economizado) depende inteiramente do fluxo de compras e vendas, ou seja, da concatenação dos pagamentos, à medida que se efetuem uns após os outros em dinheiro. No entanto, o crédito medeia esse processo e, assim, aumenta a velocidade da circulação. Cada peça monetária pode, por exemplo, efetuar apenas cinco rotações e permanece mais tempo em cada mão – como mero meio de circulação, sem interferência do crédito –, se A, o possuidor originário, compra de B; B, de C; C, de D; D, de E; E, de F, ou seja, se sua passagem de mão em mão se realiza apenas por meio de compras e vendas reais. No entanto, se B deposita com seu banqueiro o dinheiro recebido em pagamento de A, e este o entrega a C como desconto de uma letra, C compra de D, este o deposita com seu banqueiro, que o empresta a E, que compra de F, então até mesmo sua velocidade como mero meio de circulação (meio de compra) é mediada por várias operações de crédito: o depósito que B efetua em seu banco e o desconto que este faz a C, o depósito de D com seu banqueiro e o desconto deste em favor de E; portanto, quatro operações de crédito. Sem elas, a mesma peça monetária não teria efetuado cinco compras sucessivas no mesmo período. O fato de que tenha mudado de mãos sem a mediação de compra e venda reais – como depósito e desconto – foi o que acelerou aqui sua troca de mãos numa série de transações reais.
Já vimos anteriormente como a mesma cédula bancária pode criar depósitos em poder de diversos banqueiros. Do mesmo modo, ela pode criar distintos depósitos nas mãos de um mesmo banqueiro. Este desconta, com a cédula depositada por A, a letra de B; B paga a C; e C deposita a mesma cédula no mesmo banco que a desembolsou.
* * *
Ao examinar a circulação simples do dinheiro (Livro I, capítulo 3, item 2), demonstramos que a massa realmente circulante, supondo-se dadas a velocidade da circulação e a economia dos pagamentos, é determinada pelo preço das mercadorias e pela massa das transações – e a mesma lei vale para a circulação de cédulas.
No quadro seguinte, está indicada a quantidade média anual das cédulas do Banco da Inglaterra, na medida em que elas se encontram nas mãos do público, especificamente as de £5 e £10, as de £20 a £100 e as cédulas mais altas, de £200 a £1.000, assim como a porcentagem que cada uma delas representa na circulação total. As quantidades são dadas em milhares, omitindo-se as últimas três casas.
Ano |
Cédulas de £5-£10 |
Cédulas de £20-£100 |
Cédulas de £200-£1.000 |
Total |
|||
£ |
% |
£ |
% |
£ |
% |
£ |
|
1844 |
9.263 |
45,7 |
5.735 |
28,3 |
5.253 |
26,0 |
20.241 |
1845 |
9.698 |
46,9 |
6.082 |
29,3 |
4.942 |
28,6 |
20.723 |
1846 |
9.918 |
48,9 |
5.771 |
28,5 |
4,590 |
22,6 |
20.286 |
1847 |
9.591 |
50,1 |
5.498 |
28,7 |
4.066 |
21,2 |
19.155 |
1848 |
8.732 |
48,3 |
5.046 |
27,9 |
4.307 |
23,8 |
18.085 |
1849 |
8.692 |
47,2 |
5.234 |
28,5 |
4.777 |
24,3 |
18.403 |
1850 |
9.164 |
47,2 |
5.587 |
28,8 |
4.646 |
24,0 |
19.398 |
1851 |
9.362 |
48,8 |
5.554 |
28,5 |
4.557 |
23,4 |
19.473 |
1852 |
9.839 |
45,0 |
6.161 |
28,2 |
5.856 |
26,8 |
21.856 |
1853 |
10.699 |
47,3 |
6.393 |
28,2 |
5.541 |
24,5 |
22.653 |
1854 |
10.565 |
51,0 |
5.910 |
28,5 |
4.234 |
20,5 |
20.709 |
1855 |
10.628 |
53,6 |
5.706 |
28,9 |
3.459 |
17,5 |
19.793 |
1856 |
10.680 |
54,4 |
5.645 |
28,7 |
3.324 |
16,9 |
19.648 |
1857 |
10.659 |
54,7 |
5.567 |
28,6 |
3.241 |
16,7 |
19.467 |
(Report on Bank Acts, 1858, p. i e ii.)
O total das cédulas em circulação diminuiu, portanto, efetivamente entre 1844 e 1857, embora nesse período o tráfico comercial tenha mais que duplicado, como demonstram as exportações e as importações. As cédulas pequenas, de £5 a £10, aumentaram, como indica a tabela, de £9.263.000 em 1844 para £10.659.000 em 1857. Isso ocorreu simultaneamente ao forte aumento da circulação do ouro, que se acentua de modo considerável nessa mesma época. Em contrapartida, houve um decréscimo das cédulas de valores maiores (de £200 a £1.000), de £5.856.000 em 1852 para £3.241.000 em 1857 – decréscimo, portanto, de mais de £2,5 milhões. Isso se explica do seguinte modo:
“Em 8 de junho de 1854, os bancos privados de Londres permitiram aos bancos por ações participar da Clearing House e, pouco depois, estabeleceu-se o clearing final no Banco de Inglaterra. Os saldos diários passaram a ser liquidados mediante transferência nas contas-correntes que os diversos bancos possuem no Banco da Inglaterra. Esse sistema fez com que se tornassem supérfluas as cédulas de alto valor que os bancos antes utilizavam para cobrir suas contas recíprocas.” (Ibidem, p. V)
Até que ponto o emprego do dinheiro no comércio atacadista foi reduzido a um mínimo está demonstrado pela tabela que reproduzimos no Livro I, capítulo 3, nota 103 [p. 213] e que foi fornecida à Comissão Bancária por Morrison, Dillon & Co., uma das mais importantes casas de Londres, onde um varejista pode adquirir seu estoque completo de mercadorias de todos os tipos.
Segundo o depoimento de W.[illiam] Newmarch perante a Comissão Bancária (Report on Bank Acts, 1857, n. 1.741), houve ainda outras circunstâncias que contribuíam para a economia de meios de circulação: o porte de 1 penny para o franqueamento das cartas, das ferrovias, dos telégrafos – numa palavra, o progresso dos meios de comunicação –, o que permite que a Inglaterra possa agora fazer um volume de negócios de cinco a seis vezes maior que antes, com mais ou menos a mesma circulação de cédulas bancárias. Isso se deveu também, essencialmente, segundo tal testemunho, à retirada de circulação das cédulas de mais de £10. Isso parece uma explicação natural para o fato de que na Escócia e na Irlanda, onde circulam também cédulas de £1, a circulação de cédulas tenha aumentado em aproximadamente 31% (1.747). A circulação total de cédulas no Reino Unido, incluindo as de £1, seria de £39 milhões (1.749). A circulação de ouro = £70 milhões (1.750). Na Escócia, a circulação de cédulas foi de £3.120.000 em 1834, de £3.020.000 em 1844 e de £4.050.000 em 1854 (1.752).
Isso já basta para evidenciar que não está de modo nenhum ao alcance dos bancos emissores aumentar a quantidade de cédulas em circulação, enquanto elas forem a qualquer momento conversíveis em dinheiro. {Aqui não se trata de papel-moeda inconversível; as cédulas inconversíveis só podem funcionar como meio geral de circulação onde são efetivamente respaldadas pelo crédito do Estado, como ocorre hoje na Rússia. Isso as coloca sob as leis que regulam o papel-moeda inconversível estatal, que já foram examinadas (Livro I, capítulo 3, item 2, subitem c: “A moeda. O signo de valor”). – F. E.}
A quantidade de cédulas em circulação é regulada pela necessidade de circulação, e cada cédula supérflua retorna imediatamente às mãos de seu emissor. Como na Inglaterra apenas as cédulas do Banco da Inglaterra circulam em geral como meio legal de pagamento, podemos abstrair aqui da circulação insignificante e puramente local das cédulas emitidas pelos bancos provinciais.
O sr. Neave, governador do Banco da Inglaterra, declara perante a Comissão Bancária, B. A., 1858, n. 947: (Pergunta:) “O senhor diz que, quaisquer que sejam as medidas que adote, o montante de cédulas que se encontra nas mãos do público é sempre o mesmo, ou seja, £20 milhões aproximadamente? – Em tempos normais, as necessidades do público parecem exigir cerca de [£]20 milhões. Em certas épocas do ano, que se repetem periodicamente, essa cifra aumenta em [£]1 milhão ou [£]1½ milhão. Se o público necessita de mais, pode sempre obter, como afirmei, no Banco da Inglaterra”. – 948. “O senhor disse que, durante o pânico, o público não queria permitir-lhes reduzir a quantidade de cédulas em circulação; o senhor poderia justificar isso? – Em épocas de pânico, o público tem, a meu ver, plenos poderes para obter cédulas; e, naturalmente, enquanto o banco tem uma obrigação, o público pode amparar-se nessa obrigação para retirar as cédulas do banco.” – 949. “Quer dizer que são constantemente exigidos £20 milhões em cédulas do Banco da Inglaterra? – 20 milhões de cédulas nas mãos do público; a cifra varia. Às vezes são 18½ milhões; outras vezes, 19 milhões ou 20 milhões etc.; mas, em média, pode-se falar de 19 milhões a 20 milhões.”
Depoimento de Thomas Tooke perante a comissão da Câmara dos Lordes sobre a Commercial Distress (C. D., 1848-1857), n. 3.094: “O banco não tem poder para aumentar como bem entender a quantidade de cédulas nas mãos do público; o que ele pode fazer, e apenas mediante uma operação muito violenta, é reduzir essa quantidade”.
J. C. Wright, há trinta anos banqueiro em Nottingham, depois de expor em detalhes a impossibilidade de os bancos provinciais manterem em circulação mais cédulas do que aquelas de que o público precisa e deseja, declara, referindo-se às cédulas do Banco da Inglaterra (C. D., 1848-1857), n. 2.844: “Não conheço nenhum limite” (à emissão de cédulas) “por parte do Banco da Inglaterra, mas todo excesso de circulação passa para os depósitos, assumindo, assim, outra forma”.
O mesmo pode ser aplicado à Escócia, onde quase só circula papel, pois lá, como na Irlanda, são permitidas também as cédulas de £1, e the Scotch hate gold [os escoceses odeiam dinheiro]. Kennedy, diretor de um banco escocês, declara que os bancos não podem sequer reduzir sua circulação de cédulas e é “da opinião de que, pelo fato de as transações internas exigirem cédulas ou ouro para se realizarem, os banqueiros têm de fornecer os meios de circulação necessários para essas transações – seja por demanda de seus depositantes, seja de outra maneira. […] Os bancos escoceses podem restringir seus negócios, mas não podem exercer nenhum controle sobre sua emissão de cédulas” (ibidem, n. 3.446 e 3.448). Em termos parecidos se expressa Anderson, diretor da Union Bank of Scotland (ibidem, n. 3.578): “O sistema do intercâmbio mútuo de cédulas” {entre os bancos escoceses} “impede que um banco emita mais cédulas do que as necessárias? – Sim, mas temos um meio mais eficaz que a troca de cédulas” (que, na realidade, nada tem a ver com isso, mas confere às cédulas de qualquer banco a capacidade de circular por toda a Escócia) “, e na Escócia há o costume geral de manter uma conta bancária; qualquer pessoa que possui dinheiro tem também uma conta num banco e nele deposita diariamente a quantia de que não precisa de imediato, de modo que, ao fim de cada dia útil, todo o dinheiro esteja nos bancos, com exceção daquele que cada um leva no bolso”.
O mesmo ocorre na Irlanda, segundo depoimentos do governador do Banco da Irlanda, MacDonnel, e do diretor do Provincial Bank of Ireland, Murray, perante a mesma comissão.
A circulação de cédulas é não apenas independente da vontade do Banco da Inglaterra, mas também do volume das reservas de ouro nos porões do banco, que assegura a conversibilidade dessas cédulas.
“Em 18 de setembro de 1846, a circulação de cédulas do Banco da Inglaterra era de £20.900.000, e sua reserva metálica era de £16.273.000; em 5 de abril de 1847, a circulação era de £20.815.000, e a reserva metálica, de £10.246.000. Isso significa que, apesar da exportação de £6 milhões de ouro e prata, a circulação de cédulas bancárias não foi reduzida.” (J.[ohn] G.[ardner] Kinnear, The Crisis and the Currency, Londres, [J. Murray,] 1847, p. 5)
É claro, no entanto, que isso só tem validade sob as condições atualmente existentes na Inglaterra e, mesmo assim, apenas na medida em que as leis não disponham de outra maneira sobre a proporção entre a emissão de cédulas e a reserva metálica.
Portanto, são apenas as necessidades dos próprios negócios que influem na quantidade de dinheiro circulante – cédulas e ouro. A esse propósito, é preciso levar em conta, antes de mais nada, as flutuações periódicas que se repetem todos os anos, qualquer que seja a situação geral dos negócios, de tal modo que, há vinte anos, “a circulação é, em determinados meses, alta e, em outros, baixa, ao passo que em certos meses ela apresenta um nível médio” (Newmarch, B. A., 1857, n. 1.650).
Assim, todos os anos, no mês de agosto, saem do Banco da Inglaterra alguns milhões, a maior parte em ouro, para a circulação interna, a fim de pagar os custos da colheita; como se trata principalmente de atender ao pagamento de salários, as cédulas da Inglaterra são menos utilizáveis. Antes do fim do ano, todo esse dinheiro retorna aos cofres do banco. Na Escócia, em vez de sovereign, quase só existem cédulas de 1 libra; nessas situações, a circulação de cédulas se expande – precisamente duas vezes por ano, em maio e novembro, de 3 milhões para 4 milhões; 14 dias depois já começa o refluxo, e em um mês ele está quase concluído (Anderson, [C. D., 1848-1857, cit., n. 3.595-3.600).
A circulação de cédulas do Banco da Inglaterra também experimenta uma flutuação trimestral, provocada pelo pagamento a cada três meses dos “dividendos”, isto é, dos juros da dívida pública, o que faz com que cédulas sejam retiradas de circulação para logo voltar a circular entre o público, retornando em seguida a seu ponto de partida. Weguelin (B. A., 1857, n. 38) calcula em 2½ milhões a flutuação assim ocasionada na circulação de cédulas. Em contrapartida, o sr. Chapman, da conhecida firma Overend, Gurney & Co., estima em proporções muito mais altas a perturbação causada dessa forma no mercado monetário. “Se o senhor retira da circulação 6 milhões ou 7 milhões para impostos a fim de, com esse valor, pagar os dividendos, então é preciso haver alguém que, nesse ínterim, ponha esse montante à disposição” (B. A., 1857, n. 5.196).
Muito mais importantes e duráveis são as flutuações no volume do meio circulante, que correspondem às diversas fases do ciclo industrial. Ouçamos o que diz a respeito disso outro associé [sócio] daquela firma, o venerável quacre Samuel Gurney (C. D., 1848-1857, n. 2.645): “No fim de outubro” (de 1847) “, havia nas mãos do público £20.800.000 em cédulas. Naquele momento, era muito difícil obter cédulas bancárias no mercado monetário. Isso se devia ao temor geral de que não seria possível obtê-las em virtude da restrição imposta pela lei bancária de 1844. Atualmente” (março de 1848) “, o montante das cédulas bancárias que se encontra nas mãos do público […] é de £17.700.000, mas como agora não há nenhum alarme comercial, essa quantidade é muito maior do que a necessária. Em Londres, não há nenhum banqueiro nem negociante de dinheiro que não tenha mais notas de banco do que pode empregar.” – 2.650. “O montante das cédulas bancárias […] que se encontram fora da custódia do Banco da Inglaterra constitui um indicativo totalmente insuficiente da situação ativa da circulação, se ao mesmo tempo se leva em conta […] a situação ativa do mundo comercial e do crédito.” – 2.651. “A sensação de que o montante atual de meios de circulação nas mãos do público é mais do que o necessário decorre em grande medida de nossa situação de intensa estagnação. Com preços altos e negócios animados, as £17.700.000 nos causariam uma sensação de escassez.”
{Enquanto a situação dos negócios fizer com que os adiantamentos deem com regularidade um retorno e o crédito permaneça inabalado, a expansão e a contração da circulação simplesmente se ajustarão às necessidades dos industriais e dos comerciantes. Como, pelo menos na Inglaterra, o ouro não desempenha nenhum papel no comércio atacadista, e a circulação de ouro, abstraindo de suas flutuações sazonais, pode ser considerada uma grandeza relativamente constante durante um longo tempo, temos que a circulação de cédulas do Banco da Inglaterra constitui um indicador bastante exato dessas mudanças. Nos períodos de calmaria que sucedem às crises, a circulação se reduz ao mínimo e, ao reanimar-se a demanda, surge uma necessidade maior de meios de circulação, que se acentua à medida que aumenta a prosperidade; a massa dos meios de circulação chega a seu apogeu nos períodos de excesso de tensão e de superespeculação – então volta a estourar a crise e, da noite para o dia, desaparecem do mercado as cédulas bancárias que na véspera circulavam com tamanha abundância e, com elas, os descontadores de letras, os que concedem adiantamentos sobre papéis de crédito, os compradores de mercadorias. O Banco da Inglaterra deve agir para remediar a situação, mas suas forças logo se esgotam, pois a lei bancária de 1844 o obriga a restringir sua circulação de cédulas justamente no momento em que todo mundo clama por elas, em que os possuidores de mercadorias não podem vender e, no entanto, têm de efetuar pagamentos, o que faz com que estejam dispostos a qualquer sacrifício para obter papel-moeda. “Durante o alarme”, diz o supracitado banqueiro Wright (ibidem, n. 2.930), “o país precisa do dobro de meios de circulação que em épocas normais, pois o meio de circulação é entesourado por banqueiros e outros”.
Quando estoura a crise, interessam apenas os meios de pagamento. Como um depende do outro para obtê-los, e ninguém sabe se o outro estará em condições de pagar no dia do vencimento, começa uma verdadeira correria pelos meios de pagamentos existentes no mercado, isto é, pelas cédulas bancárias. Cada um se dedica a entesourar o máximo que pode, o que faz com que as cédulas desapareçam de circulação justamente quando mais se precisa delas. Samuel Gurney (C. D., n. 1.116) declara que, em outubro de 1847, num momento de pânico, foi retirada de circulação uma quantidade de cédulas no montante de £4 milhões a £5 milhões. – F. E.}
A esse respeito, é especialmente interessante o interrogatório do associé de Gurney, o já mencionado Chapman, perante o bank committee de 1857. Reproduzo aqui a principal parte de suas declarações, embora nelas haja alguns pontos que só examinaremos adiante.
O sr. Chapman declara o seguinte:
4.963. “Não hesito em dizer que não me parece correto que o mercado de dinheiro se encontre nas mãos de qualquer capitalista individual (como alguns que há em Londres), que possa provocar uma enorme escassez de dinheiro e uma crise justamente nos momentos em que a circulação está num nível muito baixo. […] Isso é possível […] porque existe mais de um capitalista que pode retirar da massa dos meios de circulação £1 milhão ou £2 milhões em cédulas bancárias, desde que disso consiga extrair algum benefício.” 4.995. Um grande especulador pode vender consolidados[a] no valor de [£]1 milhão ou [£]2 milhões e, com isso, retirar o dinheiro do mercado. Algo semelhante ocorreu não faz muito tempo, “gerando uma crise extremamente violenta”. 4.967. Nesse caso, porém, as cédulas são improdutivas. “Isso não os preocupa, contanto que sirva para atingir um grande objetivo; esse grande objetivo é derrubar o preço dos fundos, provocar um aperto monetário, e eles têm nas mãos todos os meios para fazer isso.” Um exemplo: certa manhã, havia grande demanda de dinheiro na bolsa de fundos; ninguém sabia a causa; alguém propôs a Chapman que lhe emprestasse £50.000 a 7%. Chapman surpreendeu-se, pois sua taxa de juros era muito mais baixa, e aceitou a proposta. Pouco depois, a mesma pessoa voltou, contratou outro empréstimo de £50.000 libras a 7½%; em seguida, outro de £100.000 a 8% – e ainda queria obter outro a 8½%. Então, o próprio Chapman ficou com medo. Mais tarde, averiguou-se que uma considerável soma de dinheiro havia sido subitamente retirada do mercado. Porém, diz Chapman, “apesar disso, emprestei uma soma considerável a 8%; senti medo de ir mais longe, pois não tinha ideia do que viria depois”.
Não se deve esquecer que, embora nas mãos do público se encontrem, com certa constância, de 19 milhões a 20 milhões de cédulas, por um lado, a parte dessas cédulas que efetivamente circula e, por outro, a parte que fica ociosa como reserva em poder dos bancos variam constantemente uma em relação à outra, em proporções consideráveis. Se essa reserva é grande e, portanto, a circulação real é baixa, isso significa, do ponto de vista do mercado monetário, que a circulação está repleta (the circulation is full, money is plentiful); se a reserva é pequena e, portanto, a circulação real está repleta, o mercado monetário diz que esta última é baixa (the circulation is low, money is scarce); quer dizer, é baixa a parte que constitui capital de empréstimo ocioso. A expansão ou a contração reais da circulação, independentes das fases do ciclo industrial – mas de modo que permaneça a mesma a quantidade de que o público necessita –, só ocorrem por motivos técnicos, por exemplo, nos momentos em que vence o prazo de pagamento dos impostos ou dos juros da dívida pública. O pagamento dos impostos faz com que cédulas e ouro afluam aos cofres do Banco da Inglaterra numa quantidade superior à normal e realmente contrai a circulação, sem considerar as necessidades desta última. O contrário se dá quando se pagam os dividendos da dívida pública. No primeiro caso, contraem-se empréstimos junto ao banco para obter meios de circulação. No segundo, cai a taxa de juros nos bancos privados devido ao aumento momentâneo de suas reservas. Isso nada tem a ver com a massa absoluta dos meios de circulação, apenas com a firma bancária que lança no mercado esses meios de circulação e para a qual esse processo se apresenta como um processo de alienação de capital de empréstimo e que, por isso, embolsa o lucro correspondente.
Num caso, produz-se apenas um deplacement [deslocamento] temporário do meio de circulação, compensado pelo Banco da Inglaterra por meio de adiantamentos em curto prazo e a juros baixos, pouco antes de vencerem os impostos trimestrais e os dividendos também trimestrais; essas cédulas excedentes, assim gastas, completam primeiro a lacuna produzida pelo pagamento dos impostos, ao passo que, pouco depois, seu retorno ao banco faz com que reflua o excedente de cédulas que o pagamento dos dividendos lançou ao público.
No outro caso, a circulação baixa ou plena significa tão somente outra distribuição da mesma massa de meios de circulação em circulação ativa e depósitos, isto é, em instrumento de empréstimos.
Por outro lado, quando, por exemplo, aumenta o número de cédulas emitidas em troca do ouro que aflui ao Banco da Inglaterra, essas cédulas ajudam a realizar os descontos fora do banco e refluem para ele na forma de pagamentos de empréstimos, de modo que a massa absoluta das cédulas circulantes só aumenta momentaneamente.
Se a circulação está plena devido à expansão dos negócios (o que também é possível com preços relativamente baixos), a taxa de juros pode estar relativamente alta devido à demanda de capital de empréstimo decorrente da alta dos lucros e do aumento de novos investimentos. Se a circulação é baixa devido à contração dos negócios ou à grande fluidez do crédito, a taxa de juros pode ser baixa também, ainda que os preços sejam altos. (Ver Hubbard.)
A quantidade absoluta da circulação só influi de maneira determinante sobre a taxa de juros em épocas de aperto. Nesses casos, ou a demanda de circulação repleta expressa apenas a demanda de meios de entesouramento (abstraindo da velocidade reduzida com que circula o dinheiro e com que as mesmas peças monetárias convertem-se constantemente em capital de empréstimo), devido à falta de crédito, como ocorreu em 1847, quando a revogação da lei bancária não ocasionou expansão alguma da circulação, mas bastou para trazer de novo à luz as cédulas entesouradas e lançá-las na circulação, ou, em algumas circunstâncias, podem-se realmente exigir mais meios de circulação, como ocorreu em 1857, quando, depois de revogada a lei bancária, a circulação de fato aumentou por algum tempo.
Fora desses casos, a massa absoluta da circulação não tem influência sobre a taxa de juros, porquanto – supondo-se como constantes a economia e a velocidade da circulação – ela é determinada, primeiro, pelo preço das mercadorias e pela massa das transações (desses dois fatores, um neutraliza quase sempre os efeitos do outro) e, por fim, pelo estado atual do crédito, ao passo que o inverso não é de modo nenhum verdadeiro: a massa da circulação não determina o estado do crédito; e uma vez que, em segundo lugar, não existe conexão entre preço de mercadorias e juros.
Enquanto o Bank Restriction Act[b] (1797-1820) vigorou, houve um excesso de currency, e a taxa de juros passou a ser muito mais alta que tinha sido desde a retomada dos pagamentos em espécie. Mais tarde, essa taxa voltou rapidamente a cair, com a restrição da emissão de cédulas e o aumento da taxa de câmbio. Em 1822, 1823 e 1832, a circulação geral era baixa, e baixa também era a taxa de juros. Em 1824, 1825 e 1836, a circulação era alta, e a taxa de juros subiu. No verão de 1830, a circulação era alta, e a taxa de juros, baixa. A partir das descobertas das minas de ouro, houve uma expansão da circulação de dinheiro em toda a Europa e uma elevação da taxa de juros. Esta última não depende, portanto, da quantidade de dinheiro circulante.
A diferença entre a emissão de meios de circulação e os empréstimos de capital fica mais bem evidenciada no processo real de produção. Ao examiná-lo (Livro II, seção III), vimos o intercâmbio que se estabelece entre os diversos componentes da produção. O capital variável, por exemplo, consiste materialmente [sachlich] nos meios de subsistência dos trabalhadores, numa parte de seu próprio produto, mas que lhes foi paga parceladamente em dinheiro. Este tem de ser adiantado pelo capitalista, e o fato de na semana seguinte ele poder desembolsar o novo capital variável empregando para isso o dinheiro desembolsado na semana anterior é algo que depende em grande parte da organização do sistema de crédito. O mesmo se dá nos atos de intercâmbio entre os diversos componentes de um capital social considerado em sua totalidade, por exemplo, entre os meios de consumo e os meios de produção de meios de consumo. O dinheiro necessário para pô-los em circulação tem de ser adiantado, como sabemos, por um dos participantes no intercâmbio ou por ambos ao mesmo tempo. Esse dinheiro permanece, então, em circulação, mas, depois de realizado o intercâmbio, retorna sempre àquele que o adiantou, uma vez que o adiantou além do capital industrial que realmente empregou (ver Livro II, capítulo 20). Com um sistema desenvolvido de crédito, em que o dinheiro se concentra nas mãos dos bancos, são estes que o adiantam, pelo menos nominalmente. Esse adiantamento diz respeito apenas ao dinheiro que se encontra em circulação. É adiantamento de circulação, e não adiantamento dos capitais postos em circulação.
Chapman: 5.062. “Pode haver épocas em que as cédulas bancárias que se encontram nas mãos do público representam uma soma muito grande e, apesar disso, seja impossível obtê-las.” O dinheiro também existe durante o período de pânico, mas todos evitam convertê-lo em capital emprestável, em dinheiro emprestável; cada um procura reservá-lo para as necessidades reais de pagamento.
5.099. “Os bancos nos distritos agrícolas mandam seus excedentes ociosos para o senhor e outras firmas? – Sim.” – 5.100. “Por outro lado, os distritos de Lancashire e Yorkshire solicitam descontos de letras em seu banco para suas necessidades comerciais? – Sim.” – 5.101. “Isso quer dizer que o dinheiro excedente numa região do país se põe a serviço das necessidades de outra região? – Exatamente.”
Chapman declara que, nos últimos tempos, diminuiu muito o costume dos bancos de investir seu capital monetário excedente por breve tempo na compra de consolidados e títulos do Tesouro, a partir do momento em que passou a ser usual emprestar esse dinheiro at call (de um dia para o outro, com a obrigação de devolvê-lo a qualquer momento). Ele mesmo considera a aquisição desse tipo de papéis como altamente inadequada para seu negócio. Por isso, investe-o em boas letras, algumas das quais vencem diariamente, de modo que ele sempre sabe de quanto dinheiro líquido pode dispor todo dia (5.101-5).
Mesmo o aumento da exportação se expressa em grau maior ou menor para cada país, sobretudo para aquele que concede o crédito como demanda crescente no mercado interno de dinheiro, mas que só se faz sentir como tal em épocas de aperto. Em períodos de aumento das exportações, as mercadorias inglesas enviadas em consignação são sacadas com letras geralmente de longo prazo, pelos fabricantes sobre o comerciante exportador (5.126). 5.127. “Não se dá frequentemente o caso de que exista um acordo estabelecendo que essas letras sejam renovadas de tempos em tempos?” – {Chapman:} “Isso é algo que ocultam de nós; jamais aceitaríamos uma letra assim. […] É certo que isso pode ocorrer, mas sobre esse assunto nada posso dizer.” (O inocente Chapman) 5.123. “Quando há grande aumento das exportações, como o de £20 milhões só no ano passado, isso não gera uma grande demanda de capital para o desconto das letras que representam essas exportações? – Sem dúvida.” – 5.130. “Uma vez que a Inglaterra costuma conceder crédito ao exterior para todas as suas exportações, isso não exigiria a absorção de um capital adicional correspondente durante o tempo que essa situação se mantenha? – A Inglaterra concede enormes créditos; em contrapartida, toma crédito para suas matérias-primas. Da América sempre sacam sobre nós a 60 dias, e de outros países, a 90. Por outro lado, abrimos crédito aos outros; quando enviamos mercadorias à Alemanha, concedemos de 2 a 3 meses.”
Wilson pergunta a Chapman (5.131) se letras sobre a Inglaterra não são sacadas simultaneamente ao embarque dessas matérias-primas e mercadorias coloniais importadas e se essas letras não são recebidas junto com os conhecimentos de embarque. Chapman acredita que sim, mas, por não estar ciente dessas operações “comerciais”, recomenda que se consultem pessoas mais bem informadas na matéria. – Nas exportações para a América, observa Chapman, “as mercadorias estão simbolizadas no trânsito” [5.133]; esse palavrório significa que o exportador inglês saca contra essas mercadorias letras com prazo de quatro meses sobre uma das grandes casas bancárias americanas em Londres, ao mesmo tempo que essa firma recebe cobertura da América.
5.136. “Como regra geral, os negócios com países mais longínquos não costumam ser conduzidos pelo comerciante, que espera por seu capital até que as mercadorias sejam vendidas? – É possível que existam firmas extremamente ricas, capazes de investir seu próprio capital sem que nada lhes seja adiantado pelas mercadorias; na maior parte dos casos, porém, essas mercadorias se convertem em adiantamentos por meio dos aceites de firmas bem conhecidas.” – 5.137. “Essas firmas estão estabelecidas […] em Londres, Liverpool e outros lugares.” – 5.138. “É indiferente, portanto, que o fabricante tenha de pôr seu próprio dinheiro ou que encontre em Londres ou Liverpool um comerciante que se encarregue de adiantá-lo? Continua a ser um adiantamento feito na Inglaterra? – Exatamente. O fabricante nada tem a ver com isso, a não ser em uns poucos casos” (em 1847, pelo contrário, em quase todos os casos). “Um comerciante de artigos manufaturados, por exemplo, em Manchester, compra mercadorias e as embarca por meio de uma firma respeitável de Londres; tão logo essa firma esteja convencida de que tudo foi embalado como convinha, ele saca sobre esta última letra de seis meses contra essas mercadorias que se destinam à Índia, à China ou para onde quer que seja; em seguida, o mundo bancário intervém e desconta-lhe essas letras, de maneira que, quando chega o dia de pagar as mercadorias em questão, ele já dispõe do dinheiro, graças ao desconto daquelas letras.” 5.139. “Mesmo que disponha do dinheiro, ainda assim o banqueiro não teve de adiantá-lo? – O banqueiro tem a letra, pois a comprou; ele investe seu capital bancário nessa forma, isto é, no desconto de letras comerciais.” {O que quer dizer que também Chapman considera o desconto de letras não um adiantamento, mas compra de mercadorias. – F. E.} 5.140. “Isso constitui sempre parte das demandas sobre o mercado monetário de Londres? – Sem dúvida; essa é a ocupação essencial do mercado monetário e do Banco da Inglaterra. O Banco da Inglaterra fica tão contente quanto nós ao receber essas letras, pois sabe que são um bom investimento.” – 5.141. “À medida que aumentam as exportações, aumenta também a demanda no mercado monetário? – À medida que cresce a prosperidade no país, nós” (isto é, os Chapman) “participamos dela.” – 5.142. “Quando esses diversos campos de investimento de capital se expandem subitamente, a consequência natural disso é a alta da taxa de juros? – Sem dúvida.”
Em 5.143, Chapman diz: “Não consigo compreender plenamente como, com nosso grande volume de exportações, tenhamos tanto campo de emprego para o ouro”.
Em 5.144, pergunta o respeitável Wilson: “A explicação não estaria no fato de que abrimos maior crédito sobre nossas exportações do que tomamos sobre nossas importações? – Eu mesmo tenho minhas dúvidas quanto a isso. Se alguém faz aceitar letras contra suas mercadorias enviadas de Manchester para a Índia, então o senhor não pode aceitá-las por menos que 10 meses. Com absoluta certeza, temos de pagar à América por seu algodão, e isso antes de a Índia nos pagar; mas examinar o efeito disso é um ponto bastante delicado”. – 5.145. “Se, como no ano passado, tivemos um aumento nas exportações de artigos manufaturados no valor de £20 milhões, então devemos ter experimentado já antes um aumento muito considerável da importação de matérias-primas” (colocado desse modo, a superexportação é idêntica à superimportação, e a superprodução, idêntica ao supercomércio) “para poder produzir essa quantidade maior de mercadorias? – Sem dúvida.” – [5.146.] “Tivemos certamente de saldar uma balança muito considerável; isto é, durante esse tempo a balança deve ter sido desfavorável para nós, mas, no longo prazo, o curso das trocas com a América nos favorece, e desde há muito temos recebido desse país quantidades consideráveis de metais preciosos.”
Em 5.148, Wilson pergunta ao arquiusurário Chapman se ele não considera seus altos juros um sinal de grande prosperidade e lucros elevados. Chapman, visivelmente surpreso com a ingenuidade revelada por esse sicofanta, responde com naturalidade que sim, mas é sincero o bastante para acrescentar: “Há alguns que não dispõem de alternativa, que têm obrigações a cumprir e devem cumpri-las, seja isso lucrativo ou não; mas quando” {a alta taxa de juros} “perdura, isso indica prosperidade”. Ambos se esquecem de que também pode indicar, como ocorreu em 1857, que os cavaleiros andantes do crédito espalham insegurança pelo país, podendo pagar altos juros porque o fazem à custa do bolso alheio (contribuindo, assim, para determinar a taxa de juros para todos) e porque, entretanto, vivem com folga na base de lucros antecipados. Ao mesmo tempo, isso é justamente o que pode permitir aos fabricantes etc. realizar negócios de fato lucrativos. O sistema de adiantamentos faz com que os retornos se tornem completamente enganosos. Isso explica também a seguinte declaração, que, no que diz respeito ao Banco da Inglaterra, não precisa ser explicada, uma vez que este último, com alta taxa de juros, desconta a uma taxa mais baixa que os demais.
5.156. “Creio poder dizer”, esclarece Chapman, “que nossas somas de desconto no momento atual, em que tivemos taxa alta de juros há tanto tempo, chegaram a seu máximo.” (Isso foi dito por Chapman no dia 21 de julho de 1857, poucos meses antes do crash.) 5.157. “Em 1852 [quando a taxa de juros estava baixa], nem de longe eram tão grandes”. Porque, de fato, naquela época os negócios estavam muito mais sólidos.
5.159. “Se houvesse no mercado uma superabundância de dinheiro […] e o desconto bancário fosse baixo, teríamos uma diminuição de letras. […] Em 1852, estávamos numa fase completamente diversa. Naquele tempo, as exportações e as importações do país não eram nada em comparação com o que são hoje.” – 5.161. “Com essa alta taxa de descontos, nossos descontos estão hoje no mesmo nível de 1854” (quando a taxa de juros era de 5% a 5½%).
No interrogatório de Chapman, é muito divertido ver como essa gente, de fato, considera o dinheiro do público propriedade sua e se crê no direito de obter a conversibilidade perpétua das letras que desconta. A ingenuidade das perguntas e das respostas é grande. Torna-se dever do legislador fazer com que sejam sempre conversíveis as letras aceitas pelas grandes firmas e providenciar que o Banco da Inglaterra, sob quaisquer circunstâncias, volte a descontá-las para os bill-brokers. Mesmo assim, em 1857, três desses bill-brokers ainda foram à falência, com dívidas de cerca de [£]8 milhões e um capital próprio insignificante em comparação com essas dívidas. 5.177. “Quer o senhor dizer com isso que, em sua opinião, eles” (os aceites de Baring ou Loyd) “devem ser obrigatoriamente descontáveis, do mesmo modo que hoje uma cédula do Banco da Inglaterra é obrigatoriamente conversível em ouro? – Penso que seria algo deplorável se não fossem descontáveis; seria uma situação muito extraordinária que alguém tivesse de suspender os pagamentos porque possui aceites de Smith, Payne & Co. ou de Jones Loyd & Co. e não pode descontá-los.” – 5.178. “O aceite de Baring não constitui uma obrigação de pagar determinada soma de dinheiro no vencimento da letra? – Exatamente, mas, quando assumem essa obrigação, os srs. Barings, como quaisquer outros comerciantes, nem em sonho pensam que terão de pagá-la com sovereign; eles estão certos de que poderão pagá-la na Clearing House.” – 5.180. “O senhor acredita que se deveria criar um sistema que dê ao público o direito de receber o dinheiro antes do vencimento da letra, pelo fato de um terceiro ser obrigado a descontá-la? – Não, não pelo aceitante, mas, se com isso o senhor quer dizer que não deveríamos contar com a possibilidade de que nos descontassem letras comerciais, então teríamos de mudar toda a estrutura das coisas.” 5.182. “O senhor acredita, pois, que” {a letra comercial} “deveria ser conversível em dinheiro do mesmo modo que uma cédula do Banco da Inglaterra é conversível em ouro? – Claro, em certas circunstâncias.” – 5.184. “O senhor crê, portanto, que as instituições de currency deveriam estar organizadas de tal modo que uma letra comercial de solidez incontestável pudesse ser convertida em dinheiro a qualquer momento, com a mesma facilidade que uma cédula bancária? – Sim, é o que penso.” 5.185. “O senhor não chega a dizer que o Banco da Inglaterra, ou outra instituição qualquer, seja obrigado por lei a descontar essas letras? – Chego, em todo caso, a ponto de sustentar que, se fizermos uma lei para regular a currency, deveremos adotar as medidas necessárias para evitar a possibilidade de uma inconversibilidade das letras comerciais emitidas dentro do país, sempre que essas letras forem incontestavelmente sólidas e legítimas.” Tal é a conversibilidade da letra comercial diante da conversibilidade da cédula bancária.
5.189. “Os negociantes do país representam, de fato, somente o público”, como o sr. Chapman, mais tarde, perante o tribunal no caso Davidson. Vejam os Great City Frauds[c].
5.196. “Ao fim de cada trimestre” (quando se pagam os dividendos) “é […] absolutamente necessário que recorramos ao Banco da Inglaterra. Se o senhor retira da circulação [£]6 milhões ou [£]7 milhões de receita pública como antecipação dos dividendos, é preciso que, nesse ínterim, alguém recoloque esse montante à disposição.” (Nesse caso, trata-se, pois, de fornecimento de dinheiro, e não de capital ou capital de empréstimo.)
5.169. “Quem conhece nosso mundo comercial deve saber que, quando se apresenta uma dessas situações em que os títulos do Tesouro se tornam invendáveis, em que as obrigações da Companhia das Índias Orientais perdem todo seu valor, em que não se podem descontar as melhores letras comerciais, tem de reinar necessariamente uma grande preocupação entre aqueles cujos negócios os obrigam a realizar pagamentos à vista por meio de simples ordem, no meio de circulação corrente, que é o caso de todos os banqueiros. Como consequência, todo mundo duplica suas reservas. Agora imagine o senhor as consequências disso em todo o país, se cada um dos banqueiros de província, dos quais há uns 500, tem de encarregar seu correspondente em Londres de remeter-lhe £5.000 em cédulas bancárias. Ainda que tomássemos por média uma soma tão reduzida, o que já é completamente absurdo, chegamos a £2½ milhões retiradas de circulação. Como repor essa soma?”
Por outro lado, os capitalistas privados etc., que têm dinheiro, não o cedem a juros nenhum, pois dizem, de acordo com Chapman, 5.194: “Preferimos não cobrar juros a ficar em dúvida se poderemos recuperar o dinheiro caso dele necessitemos”.
5.173. “Este é o nosso sistema: temos obrigações no montante de £300 milhões, cujo pagamento em moeda corrente nacional podemos reclamar em momento dado; e essa moeda, se a investimos toda para esse fim, chega a £23 milhões ou quanto quer que seja. Não é essa uma situação que a qualquer momento pode arrastar-nos em convulsões?” Daí que, nas crises, o sistema de crédito se converta repentinamente no sistema monetário.
Abstraindo do pânico interno que se produz nas crises, só se pode falar de quantidade de dinheiro no que se refere ao metal, ao dinheiro mundial. É isso justamente o que Chapman exclui, ao referir-se apenas a [£]23 milhões em cédulas bancárias.
O mesmo Chapman, 5.218: “A causa original das perturbações produzidas no mercado monetário” {em abril e mais tarde, em outubro de 1847} “residia, sem dúvida, na quantidade de dinheiro requerida para regular as taxas de câmbio, em virtude do volume extraordinário das importações efetuadas durante o ano”.
Em primeiro lugar, essa reserva de dinheiro do mercado mundial estava reduzida, naquele momento, a seu mínimo. Em segundo lugar, ela servia ao mesmo tempo como garantia para a conversibilidade do dinheiro creditício, das cédulas bancárias. Reunia, assim, duas funções completamente distintas, mas ambas decorrentes da natureza do dinheiro, uma vez que o dinheiro real é sempre dinheiro do mercado mundial, e o dinheiro creditício tem sempre como base o dinheiro do mercado mundial.
Em 1847, não fosse a revogação da lei bancária de 1844, “as clearing houses não teriam liquidado seus negócios” (5.221).
Chapman intuía a crise iminente. 5.236. “Há certas situações do mercado monetário (e a atual não está muito longe disso) em que o dinheiro é muito difícil de conseguir, e torna-se necessário recorrer aos bancos.”
5.239. “No que se refere às somas que retiramos do banco na sexta-feira, no sábado e na segunda-feira, dias 19, 20 e 22 de outubro de 1847, teríamos ficado muito gratos se, na quarta-feira seguinte, pudéssemos recuperar as letras; tão logo passou o pânico, o dinheiro retornou instantaneamente para nossas mãos.” Com efeito, na terça-feira, 23 de outubro, foi suspensa a lei bancária; com isso, a crise foi detida.
No n. 5.274, Chapman crê que as letras sobre Londres simultaneamente em curso somam cerca de £100 milhões ou £120 milhões. Nessa soma não estão incluídas as letras locais sobre localidades nas províncias.
5.287. “Embora em outubro de 1856 o montante de cédulas bancárias nas mãos do público tivesse subido para £21.155.000, havia uma dificuldade extraordinária para obter dinheiro; mesmo havendo tanto dinheiro nas mãos do público, não podíamos pôr as mãos nele.” Isso era consequência do aperto em que o Eastern Bank se encontrava durante algum tempo (março de 1856).
5.190-2. Uma vez passado o pânico, “todos os banqueiros, que fazem lucro com os juros, começam imediatamente a empregar seu dinheiro”.
5.302. Segundo Chapman, a inquietação que se produz ao diminuir as reservas bancárias não se deve ao medo com relação aos depósitos, mas ao fato de que todos aqueles que subitamente podem ser obrigados a pagar grandes somas estão perfeitamente conscientes de que o aperto no mercado monetário talvez os obrigue a recorrer ao banco, como último recurso; e, “quando o banco dispõe de uma reserva muito pequena, ele não fica contente em nos receber, muito pelo contrário”.
Além disso, é lindo ver como a reserva desaparece como grandeza efetiva. Os banqueiros retêm um mínimo para seus negócios correntes, parte em suas mãos, parte em poder do Banco da Inglaterra. Os bill-brokers retêm “o dinheiro bancário solto do país” sem reserva nenhuma, e o Banco da Inglaterra possui para fazer frente a suas obrigações em depósitos apenas a reserva dos banqueiros e de outros, além dos public deposits [depósitos estatais] etc., que deixa cair ao nível mais baixo, por exemplo, até [£]2 milhões. Além desses [£]2 milhões em papel, toda essa especulação, em épocas de aperto (e isso diminui a reserva, uma vez que as cédulas bancárias, que entram em troca dos metais que saem, têm de ser anuladas), não conta com nenhuma outra reserva além do Tesouro metálico, e por isso cada decréscimo deste último, pela drenagem de ouro, não faz nada além de acentuar a crise.
5.306. “Se não houvesse dinheiro para operar as compensações na Clearing House, não vejo que outra solução nos restaria senão nos reunirmos e fazermos nossos pagamentos em letras de primeira categoria, letras sobre o Tesouro, sobre Smith, Payne & Co. etc.” – 5.307. “Então, se o governo deixasse de vos prover com meios de circulação, os senhores criariam um para si mesmos? – Que poderíamos fazer? O público chega e nos toma das mãos o meio de circulação; este não existe.” – 5.308. “Portanto, os senhores se limitariam a fazer em Londres o que diariamente se faz em Manchester? – Sim.”
É muito boa a resposta de Chapman à pergunta que Cayley (de Birmingham, da escola de Attwood[d]) lhe formula a respeito da ideia que Overstone tem do capital. 5.315. “Perante a comissão, declarou-se que, numa crise como a de 1847, não se procura dinheiro, mas capital; o que o senhor acha disso? – Não entendo. Operamos apenas com dinheiro; não entendo o que o senhor quer dizer com isso.” – 5.316. “Se entende por isso” (por capital comercial) “a quantidade de dinheiro que um homem tem em seu negócio e da qual ele é o proprietário, se é isso que o senhor chama de capital, então essa soma quase nunca representa mais que uma parte muito pequena do dinheiro com que opera em seu negócio, graças ao crédito que o público lhe concede” – por intermédio dos Chapmans.
5.339. “A suspensão de nossos pagamentos em espécie é devida à falta de riqueza? – De modo nenhum; […] não nos falta riqueza, mas nos movemos dentro de um sistema altamente artificial, e quando há uma demanda enormemente ameaçadora (superincumbent) de meio de circulação, podem dar-se circunstâncias que nos impedem de obter este último. É essa uma razão para que se paralise toda a atividade comercial do país? Vamos fechar por isso todos os canais de investimento?” – 5.338. “Se nos fosse dada a alternativa de manter uma das duas coisas, os pagamentos em dinheiro ou a indústria do país, sei muito bem qual das duas eu sacrificaria.”
Acerca do entesouramento de cédulas bancárias, “com a intenção de agravar o aperto e aproveitar-se das consequências” {5.358}, diz que isso pode ocorrer muito facilmente. Bastaria que três grandes bancos decidissem fazê-lo. 5.383. “Como homem familiarizado com os grandes negócios de nossa metrópole, o senhor deve saber que os capitalistas utilizam essas crises para obter enormes lucros com a ruína daqueles que se tornam suas vítimas. – Sem a menor dúvida.” E podemos acreditar nas palavras do sr. Chapman, embora ele mesmo tenha comercialmente quebrado a cara no intento de “obter enormes lucros com a ruína daqueles que se tornaram suas vítimas”. Pois, enquanto seu associé Gurney diz que “toda mudança nos negócios é vantajosa para quem está bem informado”, Chapman afirma: “Uma parte da sociedade não sabe nada da outra; aqui temos, por exemplo, o fabricante que exporta mercadorias ao continente ou importa matéria-prima de lá; ele nada sabe do outro fabricante, que negocia com barras de ouro”. (5.046.) Assim sucedeu que, um belo dia, Gurney e Chapman não “estavam bem informados” e acabaram numa falência infame.
Já vimos que a emissão de cédulas não significa sempre adiantamento de capital. O seguinte depoimento de Tooke perante a comissão de Commercial Distress da Câmara dos Lordes, em 1848, demonstra simplesmente que o adiantamento de capital, mesmo quando realizado pelo banco mediante a emissão de novas cédulas, não representa apenas um aumento da quantidade de cédulas em circulação:
3.099. “O senhor crê que o Banco da Inglaterra, por exemplo, possa aumentar significativamente seus adiantamentos sem com isso aumentar a emissão de cédulas? – Há fatos de sobra que demonstram isso. Um dos exemplos mais evidentes é o do ano de 1835, quando o banco lançou mão dos depósitos das Índias Ocidentais e do empréstimo da Companhia das Índias Orientais para aumentar seus adiantamentos ao público; ao mesmo tempo, houve uma diminuição real do montante das cédulas nas mãos do público […]. E uma discrepância semelhante pode ser observada em 1846, quando se fizeram no banco os depósitos ferroviários; os títulos” (em desconto e em depósito) “elevaram-se a cerca de [£]30 milhões, sem que se produzisse nenhum efeito perceptível sobre o importe de cédulas nas mãos do público.”
Além das cédulas bancárias, o comércio atacadista tem outro meio de circulação, muito mais importante para ele: as letras de câmbio. O sr. Chapman nos mostrou o quão essencial é, para a marcha regular dos negócios, que letras sólidas sejam aceitas em pagamento por toda parte e em quaisquer circunstâncias: “Gilt nich mehr der Tausves-Jontof, was soll gelten, Zeter, Zeter!”[e]. Ora, que relação guardam entre si esses dois meios de circulação?
A esse respeito, Gilbart diz: “Ao limitar-se o importe da circulação de cédulas bancárias, aumenta-se regularmente a circulação de letras. As letras são de dois tipos: comerciais e bancárias. [...] Se o dinheiro escasseia, os prestamistas dizem: ‘Saque sobre nós, e aceitaremos a letra’. Quando um banqueiro provincial desconta uma letra a um cliente, não lhe dá dinheiro em espécie, mas sua própria letra a 21 dias sobre seu agente de Londres. Essas letras servem de meio de circulação” (G. W. Gilbart, An Inquiry into the Causes of the Pressure etc., [Londres, Longman, Orme, Brown, Green, & Longmans, 1840,] p. 31).
O que é confirmado, de forma um pouco diferente, por Newmarch, B. A., 1857, n. 1.426.
“Não há nenhuma conexão entre as flutuações no montante das letras em circulação e as que afetam o montante das cédulas bancárias em circulação […]. O único resultado bastante uniforme é […] que, assim que se apresenta a menor pressão sobre o mercado monetário, como indicada pela alta da taxa de desconto, o volume da circulação de letras experimenta um aumento considerável, e vice-versa.”
No entanto, as letras sacadas em tais momentos não se resumem de modo nenhum às letras bancárias de curto prazo a que se refere Gilbart. Pelo contrário. Na maioria das vezes, são letras de acomodação que não representam um negócio real ou negócios iniciados apenas para que se pudessem sacar letras sobre eles; já demos exemplos suficientes de ambos os casos. Por isso, diz o Economist (Wilson), comparando a segurança dessas letras com a das cédulas bancárias:
“As cédulas bancárias pagáveis à vista nunca podem circular em excesso, pois o excedente refluiria sempre ao banco para ser trocado, enquanto as letras a dois meses podem ser emitidas com grande excesso, uma vez que não há meio que permita controlar a emissão até que vençam e, então, já estejam repostas por outras. Para nós, é totalmente incompreensível que um país admita a segurança da circulação de letras pagáveis em data futura e, por outro lado, levante todo tipo de objeções contra a circulação de papel-moeda pagável à vista.” (Economist, 1847, p. 572)
Portanto, a quantidade de letras em circulação, como a das cédulas bancárias, é determinada exclusivamente pelas necessidades da circulação; em tempos normais, na década de 1850, circulavam no Reino Unido, além de 39 milhões de cédulas bancárias, cerca de 300 milhões de letras de câmbio, das quais 100 milhões a 120 milhões somente em Londres. O volume da circulação de letras não exerce influência sobre o volume da circulação de cédulas bancárias, e esta só influi sobre aquela em épocas de escassez de dinheiro, quando aumenta a quantidade das letras e sua qualidade piora. Por fim, em momentos de crise, falha completamente a circulação de letras; as pessoas só aceitam pagamentos à vista, e as promessas de pagamento não servem para nada; apenas a cédula bancária conserva sua capacidade de circulação, pelo menos até agora na Inglaterra, pois a nação, com toda a sua riqueza, dá cobertura ao Banco da Inglaterra.
* * *
Vimos como até o sr. Chapman, que, afinal, era ele próprio um magnata do mercado monetário em 1857, reclama amargamente de que existam em Londres alguns grandes capitalistas monetários suficientemente fortes para levar a desordem, em dado momento, a todo o mercado de dinheiro, sangrando, assim, do modo mais infame, os operadores monetários menores. Segundo ele, haveria, pois, vários desses grandes tubarões, capazes de agravar consideravelmente qualquer crise ao vender consolidados no valor de [£]1 milhão ou [£]2 milhões e, com isso, subtraindo ao mercado um montante igual de cédulas bancárias (ao mesmo tempo, de capital de empréstimo disponível). A ação conjunta de três grandes bancos, por meio dessa mesma manobra, bastaria para transformar uma crise num pânico.
Em Londres, a maior potência de capital é evidentemente o Banco da Inglaterra, o qual, no entanto, devido a sua posição de instituto semigovernamental, encontra-se impossibilitado de manifestar seu poder de modo tão violento. Apesar disso, ele também conhece suficientemente os meios – sobretudo desde a lei bancária de 1844 – para tirar proveito da situação.
O Banco da Inglaterra tem um capital de £14.553.000 e, além disso, dispõe de cerca de £3 milhões de “saldo”, isto é, de lucros não distribuídos, além de todo o dinheiro que o governo recebe a título de impostos etc. e que tem de ser depositado no banco até ser utilizado. Se a isso acrescentarmos a soma dos outros depósitos (que, em tempos normais, chegam a uns £30 milhões) e das cédulas emitidas a descoberto, verificaremos que a estimativa de Newmarch é bastante moderada, quando diz (B. A., 1857, n. 1.889): “Estou convencido de que a soma total dos fundos continuamente ocupados no mercado monetário” {de Londres} “pode ser estimada em cerca de £120 milhões, soma da qual o Banco da Inglaterra dispõe de parte muito considerável, entre 15% ou 20%”.
Quando o banco emite cédulas não cobertas pela reserva metálica acumulada em seus cofres, ele cria signos de valor que constituem para ele não apenas meios de circulação, mas também capital adicional, ainda que fictício, no valor nominal dessas cédulas não cobertas. Esse capital adicional rende ao banco um lucro adicional. – Em B. A., 1857, Wilson pergunta a Newmarch, 1.563: “A circulação das cédulas próprias de um banco, isto é, o montante delas que em média permanece nas mãos do público, complementa o capital efetivo desse banco, não é? – Certamente”. 1.564. “Todo o lucro que o banco obtém dessa circulação é, portanto, derivado do crédito, e não de um capital que ele realmente possui? – Certamente.”
O mesmo se aplica, claro, aos bancos privados que emitem cédulas. Nas respostas n. 1.866-8, Newmarch considera ⅔ de todas as cédulas bancárias emitidas por essas instituições (já que, para o outro ⅓, esses bancos têm de manter reservas metálicas) “criação da mesma quantidade de capital”, pois se poupa moeda metálica nesse mesmo montante. O lucro do banqueiro pode, por isso, não ser maior que o lucro de outros capitalistas. Permanece o fato de que ele extrai seu lucro dessa poupança nacional de dinheiro metálico. Que uma poupança nacional apareça como lucro privado não choca em nada aos economistas burgueses, uma vez que o lucro em geral não é senão apropriação do trabalho nacional. Há algo mais absurdo do que, por exemplo, o Banco da Inglaterra, cujas cédulas bancárias só gozam de crédito graças ao Estado e que, entre 1797 e 1817, se faz pagar na forma de juros pelos empréstimos públicos pelo Estado – portanto, pelo público, pelo poder que o próprio Estado lhe confere de transformar essas mesmas cédulas de papel em dinheiro – e, em seguida, emprestá-las ao Estado?
Além disso, os bancos dispõem de outros meios de criar capital. Ainda segundo Newmarch, os bancos provinciais, como dissemos antes, têm o costume de enviar seus fundos excedentes (isto é, as cédulas do Banco da Inglaterra) aos bill-brokers de Londres, que, em troca, devolvem-lhes suas letras descontadas. Com essas letras, os bancos servem aos clientes, pois têm como norma não reemitir as letras recebidas de seus clientes locais para que as operações comerciais desses clientes não se tornem conhecidas em sua vizinhança. Essas letras recebidas de Londres não servem apenas para ser emitidas para clientes, que devem fazer pagamentos diretamente em Londres, a menos que estes prefiram que o banco emita uma ordem de pagamento direta sobre Londres; servem também para efetuar pagamentos na província, pois o endosso do banqueiro lhes garante o crédito local. Assim, em Lancashire, por exemplo, retiraram de circulação todas as cédulas emitidas pelos bancos provinciais e grande parte das cédulas do Banco da Inglaterra (B. A., 1857, n. 1.568-74).
Vemos aqui, pois, de que modo os bancos criam crédito e capital: 1) emitindo cédulas bancárias próprias; 2) emitindo ordens de pagamento sobre Londres com vencimento em até 21 dias, mas que lhes são imediatamente pagas ao ser emitidas; 3) pagando com letras descontadas, cuja dotação de crédito é garantida primordial e essencialmente pelo endosso do banco – ao menos no respectivo distrito local.
O poder do Banco da Inglaterra se revela em sua regulação da taxa de mercado dos juros. Em épocas de normalidade dos negócios, pode ocorrer de o Banco da Inglaterra não conseguir impedir uma evasão moderada de ouro de sua reserva metálica mediante o aumento da taxa de desconto[12] porque a necessidade de meios de pagamento é satisfeita pelos bancos privados e por ações e pelos bill-brokers, cuja potência de capital aumentou consideravelmente nos últimos trinta anos. Nesse caso, tem de lançar mão de outros recursos. Porém, para os momentos críticos, continua a valer o que o banqueiro Glyn (da firma Glyn, Mills, Currie & Co.) declarou perante a comissão de C. D., 1848/1857. 1.709. “Em épocas de grande recessão no país, o Banco da Inglaterra comanda a taxa de juros.” – 1.710. “Em épocas de recessão extraordinária, […] quando os descontos dos banqueiros privados ou dos brokers são relativamente restringidos, eles recaem sobre o Banco da Inglaterra, que tem, então, o poder de fixar a taxa de mercado dos juros.”
No entanto, como instituição pública sob proteção governamental e gozando de privilégios correspondentes, ele não pode explorar esse seu poder de maneira tão inescrupulosa como o fazem os negócios particulares. Por essa razão, Hubbard declara perante a comissão bancária, B. A., 1857, 2.844: (Pergunta:) “Não ocorre que, quando a taxa de desconto atinge o máximo, é o Banco da Inglaterra quem serve mais barato e que, quando essa taxa atinge o mínimo, são os bill-brokers os mais baratos?”. – (Hubbard:) “Isso sempre será assim, pois o Banco da Inglaterra jamais desce tanto quanto seus concorrentes, tampouco sobe tanto quanto eles quando a taxa de juros atinge o máximo.”
Apesar disso, tem-se um forte abalo no mundo dos negócios quando o banco, em épocas de crise, aperta os cintos, como se costuma dizer, isto é, eleva ainda mais a taxa de juros, que já se encontra acima da média.
“Assim que o Banco da Inglaterra aperta os cintos, cessam todas as compras destinadas à exportação […]. Os exportadores esperam até que a depressão dos preços tenha atingido seu ponto mais baixo e, só então, nunca antes, põem-se a comprar. Quando se chega a esse ponto, o saldo da balança comercial já está de novo reequilibrado: o ouro deixa de ser exportado antes que se chegue a esse ponto máximo de depressão. É possível que compras de mercadorias para a exportação possam trazer de volta uma parte do ouro enviado ao exterior, mas elas chegam tarde demais para impedir a drenagem.” (G. W. Gilbart, An Inquiry into the Causes of the Pressure etc., cit., p. 37)
“Outro efeito da regulação do meio de circulação mediante o comércio exterior é que tal regulação, em tempos de crise, provoca uma enorme subida da taxa de juros” (ibidem, p. 40). “Os custos que decorrem do reequilíbrio do saldo da balança comercial recaem sobre a indústria produtiva do país, enquanto, no decorrer desse processo, o lucro do Banco da Inglaterra aumenta positivamente pelo fato de realizar suas operações com uma quantidade menor de metais preciosos” (ibidem, p. 52).
Porém, diz o amigo Samuel Gurney, “as grandes flutuações na taxa de juros são favoráveis aos banqueiros e agentes monetários; todas as flutuações nos negócios favorecem quem está bem informado”. Mesmo que os Gurneys fiquem com a melhor parte na exploração inescrupulosa da situação de penúria dos negócios, coisa que o Banco da Inglaterra não se pode permitir com a mesma liberdade, não resta dúvida que também este último obtém com isso belos lucros, sem falar dos lucros privados que caem no colo dos senhores diretores, graças à posição excepcional em que se encontram para se informar sobre a situação geral dos negócios. De acordo com dados apresentados à Comissão dos Lordes, em 1817, ao retomarem-se os pagamentos em espécie, esses lucros do Banco da Inglaterra, para todo o período de 1797 a 1817, foram os seguintes:
Bonuses and increased dividends |
[£]7.451.136 |
New stock divided among proprietors |
[£]7.276.500 |
Increased value of capital |
[£]14.553.000 |
Total: |
[£]29.280.636 |
sobre um capital de £11.642.400 em 19 anos. (D.[aniel] Hardcastle, Banks and Bankers, 2. ed., Londres, 1843, p. 120). Estimando-se o lucro total do Banco da Irlanda, que também suspendeu os pagamentos em espécie em 1797, segundo o mesmo método, obtém-se o seguinte resultado:
Dividends as by returns due 1821 [Dividendos com vencimento em 1821] |
[£]4.736.085 |
Declared bonus [Bonificações declaradas] |
[£]1.225.000 |
Increased assets [Aumento do ativo] |
[£]1.214.800 |
Increased value of capital [Aumento do valor do capital] |
[£]4.185.000 |
Total: |
[£]11.360.885 |
sobre um capital de £3 milhões (ibidem, p. 163).
E ainda se fala em centralização! O sistema de crédito, cujo núcleo são os supostos bancos nacionais e grandes prestamistas e usurários de dinheiro a seu redor, constitui uma enorme centralização e confere a essa classe parasitária um poder fabuloso – não só de dizimar periodicamente os capitalistas industriais, mas de intervir da maneira mais perigosa na produção real, da qual esse bando não sabe absolutamente nada e com a qual não tem nenhuma relação. As leis de 1844 e 1845 provam o poder crescente desses bandidos, com os quais se aliam financistas e stock-jobbers.
Se alguém ainda duvida que esses honoráveis bandidos exploram a produção nacional e internacional apenas no interesse da produção e dos próprios explorados, acabará certamente convencido do contrário ao ler a seguinte digressão acerca da alta dignidade moral do banqueiro:
“Os estabelecimentos bancários são […] instituições religiosas e morais [...]. Com quanta frequência o medo de ser observado pelo olho vigilante e reprobatório de seu banqueiro fez com que um jovem comerciante se afastasse da companhia de amizades turbulentas e pródigas! Que angustiosa preocupação a dele, de não perder a estima do banqueiro, de guardar as aparências da respeitabilidade! O temor de que o banqueiro venha a lhe franzir o cenho tem sobre ele influência maior que as prédicas morais de seus amigos; ele treme diante da possibilidade de cair na suspeita de ter cometido uma fraude ou incorrido no mais leve falso testemunho, receando que disso possam brotar suspeitas que acabem por restringir ou eliminar seu crédito. Para ele, o conselho de seu banqueiro é mais importante que o do sacerdote.” (G.[avin] M.[ason] Bell, diretor de um banco escocês. The Philosophy of Joint Stock Banking, Londres, [Longman, Orme, Brown, Green, and Longmans,] 1840, p. 46-7)
[11] Número médio de dias em que uma nota de banco permaneceu em circulação:
Ano |
£5 |
£10 |
£20-£100 |
£200-£500 |
£1.000 |
1798 |
? |
236 |
209 |
31 |
22 |
1818 |
148 |
137 |
121 |
18 |
13 |
1846 |
79 |
71 |
34 |
12 |
8 |
1856 |
70 |
58 |
27 |
9 |
7 |
(Dados apresentados pelo caixa do Banco da Inglaterra, Marshall. Report on Bank Acts, 1857, v. 2, apêndice, p. 301-2.)
[12] Em 17 de janeiro de 1894, na assembleia geral dos acionistas do Union Bank de Londres, o presidente, sr. Ritchie, relatou que em 1893 o Banco da Inglaterra elevara o desconto de 2½% (em julho) para 3% e 4% em agosto; como, apesar disso, ele perdera £4½ milhões em ouro em quatro semanas, para 5%; consequentemente, o ouro refluiu e a taxa do banco foi rebaixada para 4% em setembro e para 3% em outubro. Essa taxa do banco não foi reconhecida no mercado. “Quando a taxa do banco era de 5%, a taxa do mercado era de 3½%, e a taxa para dinheiro de 2½%; quando a taxa do banco caiu para 4%, a taxa de desconto era de 2⅜% e a taxa de dinheiro de 1¾%; quando a taxa do banco era de 3%, a taxa de desconto era de 1½% e a taxa de dinheiro um pouco mais baixa.” (Daily News, 18 jan. 1894.) (F. E.)
[a] Títulos da dívida pública. (N. T.)
[b] Em maio de 1797, o governo inglês promulgou uma lei que estabelecia um curso forçado para cédulas bancárias e proibia o Banco da Inglaterra de converter cédulas em ouro. Em 1819, essa restrição foi novamente revogada por lei, e até 1821 a conversão de cédulas em ouro foi plenamente retomada. (N. E. A.)
[c] Marx se refere à obra de Seton Laing, A New Series of the Great City Frauds of Cole, Davidson & Gordon [5. ed., Londres, W. Hopcraft, 1869], que trata do processo contra Davidson e outros, por enormes fraudes com letras de câmbio. (N. E. A.)
[d] Escola de Attwood ou little-shilling-men (“homens do pequeno xelim”) de Birmingham. Na primeira metade do século XIX, eles propagavam a doutrina de uma medida monetária ideal e consideravam, em conformidade com isso, o dinheiro meramente como entidade de cálculo. Os representantes dessa escola, os irmãos Thomas e Mathias Attwood, Spooner e outros, apresentaram um projeto sobre a baixa do conteúdo de ouro da unidade monetária, na Inglaterra, que foi denominado como “projeto do xelim pequeno”. Daí se originou a denominação da própria escola. Ao mesmo tempo, “os homens do xelim pequeno” se voltaram contra as medidas do governo que visavam ao rebaixamento da massa de dinheiro em circulação. Eles defendiam que a aplicação de sua teoria contribuiria, por meio de um aumento artificial dos preços, para reanimar a indústria e assegurar a prosperidade geral do país. No entanto, a proposta desvalorização do dinheiro podia servir simplesmente para amortizar as dívidas do Estado e dos grandes empresários, que eram os principais tomadores dos mais diferentes créditos. Sobre os “homens do xelim pequeno”, Marx fala também em seu trabalho Zur Kritik der politischen Ökonomie (Berlim, [F. Duncker,] 1859) [ed. bras.: Contribuição à crítica da economia política, cit.]. (N. E. A)
[e] “Se não vale mais o Tausves-Jontof, o que deve valer? Lamento. Lamento.” Citação do poema satírico “Disputation”, de Heinrich Heine, no qual se apresenta uma disputa entre um monge capuchinho e um rabino. Quando este último invoca o livro judeu Tausves-Jontof, o monge manda o livro “para o diabo”. Nesse momento, o rabino sai fora de si e profere a exclamação citada por Marx. (N. E. A.)