Tudo ao redor já estava completamente escuro. Não era um preto monocromático, mas uma sobreposição de espessas camadas de tinta, espalhadas como manteiga.
Com o rosto encostado à janela do táxi, fui olhando essa escuridão por todo o caminho. Era curiosamente plana, como uma matéria sem substância cortada por uma faca muito afiada. A sensação de perspectiva era estranha. Um enorme pássaro noturno bloqueava minha visão, com as asas estendidas diante dos meus olhos.
Conforme avançávamos, as casas ficavam cada vez mais esparsas, até que ao nosso redor havia apenas pradarias e bosques, de cujo chão brotavam as vozes de dezenas de milhares de insetos. As nuvens baixas pareciam rochedos, e tudo sobre a terra se encolhia calado, no escuro. Apenas os insetos se alastravam pelo solo.
Eu e o professor de espanhol não dissemos mais nenhuma palavra, só fumávamos, em turnos. O motorista também fumava, com o olhar fixo nas luzes dos faróis. Eu tamborilava com a ponta dos dedos nos joelhos, involuntariamente. Volta e meia era tomado pelo impulso de escancarar a porta do táxi e sair correndo.
Quadros de distribuição, tanques de areia, campos de golfe, suéteres descosturando, máquinas de pinball… Até onde será que preciso ir? Eu estava completamente desnorteado, com a mão cheia de cartas desconexas. Queria desesperadamente voltar para casa. Tomar um banho, uma cerveja, e me enfiar o mais rápido possível na minha cama aconchegante, com meus cigarros e meu Kant.
Por que será que eu estou aqui, atravessando essa escuridão? Cinquenta máquinas de pinball, é idiota demais. É um sonho. É só mais um sonho sem substância alguma.
E, no entanto, a Spaceship de três flippers continuava me chamando.
*
O professor de espanhol mandou o taxista parar em um terreno baldio a uns quinhentos metros da estrada. O terreno era plano e coberto por uma relva que roçava em nossos tornozelos, como a parte rasa do mar. Eu desci do táxi, me espreguicei e respirei fundo. Senti cheiro de galinheiro. Não havia nenhuma luz à vista, só a iluminação da estrada ao longe delineava os contornos indistintos da paisagem. O canto de infinitos insetos nos rodeava. Pareciam querer nos arrastar pelos pés para algum lugar longe dali.
Passamos algum tempo calados, acostumando os olhos à escuridão.
— Ainda estamos em Tóquio?
— Claro. Não parece?
— Parece o fim do mundo.
O professor de espanhol assentiu com ar muito sério e não disse nada. Fumamos um cigarro sentindo o perfume da relva e o cheiro de titica. A fumaça pairava densa e baixa como antigos sinais de fumaça.
— Tem um alambrado ali.
Ele apontou para dentro da noite, esticando o braço reto diante do rosto como se estivesse num estande de tiro. Eu apertei os olhos e enxerguei algo que parecia um alambrado.
— Siga em frente por uns trezentos metros ao longo desse alambrado. No final, vai encontrar um armazém.
— Um armazém?
Ele concordou sem se voltar.
— Isso. É bem grande, você vai ver logo. Era o armazém frigorífico de uma granja, mas não é mais usado. A granja faliu.
— Mas continua com cheiro de galinha.
— Cheiro? … Ah, é que já ficou impregnado no terreno. Quando chove é pior ainda. Parece que você ouve até o barulho das asas.
Não dava para ver nada depois do alambrado, só aquele escuro assustador. Até o canto dos insetos era sufocante.
— A porta do armazém está destrancada. O dono deixou aberta pra você. A máquina que você procura está lá dentro.
— Você entrou lá?
— Sim, ele me deixou entrar. Uma vez só — assentiu ele, com o cigarro na boca. A brasa laranja se agitou no escuro. — O interruptor da luz fica do lado direito da porta, dentro do armazém. Cuidado com os degraus.
— Você não vem?
— Não, vá sozinho. Foi esse o combinado.
— Combinado?
Ele jogou o cigarro no chão e o esmagou com cuidado no meio da relva.
— Isso. Ele disse que você pode ficar quanto tempo quiser. Quando sair, apague a luz.
O ar estava ficando gelado, pouco a pouco. O frio emanava do chão e nos envolvia.
— Você conheceu o dono?
— Conheci — respondeu ele, depois de uma pausa.
— Como ele é?
O professor encolheu os ombros, tirou um lenço do bolso e assoou o nariz.
— Não tinha nenhuma característica muito marcante. Nada visível, pelo menos.
— E porque ele juntou mais de cinquenta máquinas de pinball?
— Bom, tem todo tipo de gente no mundo. Só isso.
Eu não achava que fosse só isso. Mas agradeci ao professor, me despedi, e caminhei ao longo da cerca do armazém. Não é só isso, pensei. Colecionar cinquenta máquinas de pinball não é bem a mesma coisa que colecionar cinquenta rótulos de vinho.
O armazém parecia um animal enrodilhado. Nas paredes cinza, que se erguiam bruscamente em meio ao mato alto e cercado, não havia nenhuma janela. Era uma construção melancólica. Acima das portas duplas de ferro havia algo escrito, provavelmente o nome da granja, que fora recoberto por tinta branca.
Parei a uns dez metros do prédio e o observei por algum tempo. Por mais que eu me esforçasse, não me vinha nenhum pensamento inteligente. Desisti, caminhei até a entrada e empurrei a porta de ferro fria como gelo. Ela se abriu sem fazer barulho, e um outro tipo de escuridão se revelou diante dos meus olhos.