Deve-se levar em conta, por isso, o “paciente padrão razoável” – aquele que a informação é capaz de ser entendida e que possa satisfazer às expectativas de outros pacientes nas mesmas condições socioeconômico-culturais. Não há necessidade de que essas informações sejam tecnicamente detalhadas e minuciosas. Apenas que sejam corretas, honestas, compreensíveis e legitimamente aproximadas da verdade que se quer informar. O consentimento presumido é discutível por uns e radicalmente inaceitos por outros.

Se o paciente não pode falar por si ou é incapaz de entender o ato que se vai executar, estará o médico obrigado a conseguir o consentimento de seus responsáveis legais (consentimento substituto). Necessário saber também o que é representante legal, pois nem toda espécie de parentesco qualifica um indivíduo como tal.

O Conselho Federal de Medicina, na Resolução CFM n.º 1.995/2012, abordou a questão da vontade antecipada do paciente, quando posteriormente estiver incapacitado de expressar livre e autonomamente a sua vontade – no que se chamou de “testamento vital”. Diz a resolução que o médico deve considerar a vontade do seu assistido, suas diretivas antecipadas de vontade. Afirma, ainda, que, caso o paciente tenha designado um representante para tal fim, suas informações serão levadas em consideração pelo médico (consentimento substituto). Todavia, o médico deixará de levar em consideração as diretivas antecipadas de vontade do paciente ou representante se, em sua análise, estiverem em desacordo com os preceitos ditados pelo Código de Ética Médica.

As diretivas antecipadas do paciente prevalecerão sobre qualquer outro parecer não médico, inclusive sobre os desejos dos familiares, diz a citada Resolução. E, não sendo conhecidas as diretivas antecipadas de vontade do paciente, nem havendo representante designado, familiares disponíveis ou falta de consenso entre estes, o médico recorrerá ao Comitê de Bioética da instituição, caso exista, ou, na falta deste, à Comissão de Ética Médica do hospital ou ao Conselho Regional e Federal de Medicina para fundamentar sua decisão sobre conflitos éticos, quando entender esta medida necessária e conveniente.

Registre-se, ainda, que o primeiro consentimento (consentimento primário) não exclui a necessidade de consentimentos secundários. Desse modo, por exemplo, um paciente que permite seu internamento num hospital não está, com isso, autorizando o uso de qualquer meio de tratamento ou de qualquer procedimento.

Sempre que houver mudanças significativas nas condutas terapêuticas, deve-se obter o consentimento continuado (princípio da temporalidade), porque ele foi dado em relação a determinadas circunstâncias de tempo e de condições. Por tais razões, certos termos de responsabilidade exigidos no momento da internação por alguns hospitais, em que o paciente ou seus familiares atestam anuência aos riscos dos procedimentos que venham a ser realizados durante sua permanência nosocomial, não tem nenhum valor ético ou legal. E se tal documento foi exigido como condição imposta para o internamento, numa hora tão grave e desesperada, até que se prove o contrário, isso é uma indisfarçável coação.

Admite-se também que, em qualquer momento da relação profissional, o paciente tem o direito de não mais consentir uma determinada prática ou conduta, mesmo já consentida por escrito, revogando, assim, a permissão outorgada (princípio da revogabilidade). O consentimento não é um ato irretratável e permanente. E ao paciente não se pode imputar qualquer infração de ordem ética ou legal.

Por outro lado, há situações em que, mesmo existindo a permissão consciente, tácita ou expressa, não se justifica o ato permitido, pois a norma ética ou jurídica pode impor-se a essa vontade e a autorização não outorgaria esse consentimento. Nesses casos, quem legitima o ato é a sua indiscutível necessidade, e não a discutida permissão (princípio da não maleficência).

O mesmo se diga quando o paciente nega autorização diante de imperiosa e inadiável necessidade do ato médico salvador, frente a um iminente perigo de vida. Nesses casos estaria justificado o chamado tratamento arbitrário, no qual não se argui a antijuridicidade do constrangimento ilegal nem se pode alegar a recusa do consentimento. Diz o bom senso que, em situações dessa ordem, quando o tratamento é indispensável e o paciente se obstina, estando seu próprio interesse em risco, deve o médico realizar, por meios moderados, aquilo que aconselha sua consciência e o que é melhor para o paciente (princípio da beneficência).

Não podemos esconder o fato de serem estas questões, na prática, muito delicadas e, em até certo ponto, confusas, cabendo, assim, à nossa consciência saber aplicar todos os princípios a cada caso que se apresente a nossa consideração ou a nossa deliberação. Também fica claro que o consentimento esclarecido não legitima condutas culposas.

A tendência é se aceitar a tese de que a não advertência ao paciente dos riscos de uma conduta ou de uma intervenção e suas alternativas faz com que seja o médico o único responsável pelos riscos, em lugar do paciente ou de alguém que o representasse quando chamado a dar seu consentimento após informação devidamente esclarecida.

A questão do consentimento livre e esclarecido é um fato que está bem equacionado no que diz respeito a nossas normas deontológicas, a partir do Código de Ética Médica e dos pertinentes Pareceres e Resoluções do Conselho Federal de Medicina. Todavia, não há uma regulamentação específica em nosso sistema jurídico.

O consentimento, visto sob o prisma geral, tem na ordem jurídica uma longa tradição, porém visto como a manifestação da vontade e da livre concordância das vontades entre as partes de uma relação, ou seja, a autonomia própria das relações jurídico-privadas que caracterizam o contrato. Deve-se considerar, ainda, que a capacidade de o indivíduo consentir não tem a mesma proporção entre a norma ética e a norma jurídica. A reflexão sobre o prisma ético não apresenta a inflexibilidade da lei, pois certas decisões, mesmo as de indivíduos considerados civilmente incapazes, devem ser respeitadas principalmente quando se avalia uma situação de per si.

Assim, por exemplo, os portadores de transtornos mentais, mesmo quando legalmente incapazes, não devem ser isentos de sua capacidade de decidir. Mesmo se constituindo numa infração ético-moral, como forma de agressão à autonomia do paciente e, como tal, uma ofensa aos diretos da personalidade, isto não quer dizer que exista uma responsabilidade quanto ao aspecto integral do dano. Para alguns, se não existir relação de causalidade entre o dano e a falta de obtenção do consentimento esclarecido, inexiste a responsabilidade. Entendem que a não advertência ao paciente sobre possíveis riscos numa conduta médica só pode ser entendida como de relevante importância se ficar provado que a omissão de informações poderia ter evitado um determinado dano. Mesmo assim, o paciente seria ressarcido não pelos danos em si, mas pela ofensa a sua autonomia quando omitidas as devidas informações. Não há como se admitir a responsabilidade integral pelo dano quando não se provou a culpa profissional.

É preciso ficar bem clara a relação de nexo causal entre a falta de informação e o dano. Por exemplo: deixar o médico de informar ao paciente sobre condutas a serem seguidas pelo próprio paciente.

Assim, foi quando o Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou um hospital e um médico a indenizarem, solidariamente, uma paciente pelo fato de não ter sido informada sobre a possibilidade de poder engravidar após cirurgia de laqueadura de trompas.

O relator do processo no Tribunal deixou claro que a condenação “não decorreu de erro no procedimento cirúrgico adotado pelo médico quando da laqueadura das trompas da paciente, mas sim do fato de que o profissional não esclareceu a ela que haveria possibilidade de engravidar novamente, mesmo que minimamente, denotando a existência de falha no dever de informação associado à atividade do profissional” (Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 11.ª Câmara Cível, Número do processo: 1.0431.06.030997-5/001(1), Relator: Afrânio Vilela). Para outros, sempre se pode arguir a responsabilidade quando da falta de informações sobre riscos consistentes, pois o paciente poderia recusar determinado ato médico notadamente se ele é eletivo. Para estes, quando o médico intervém sem os devidos esclarecimentos sobre riscos – o que é diferente de intervir sem sua permissão –, assume com isso, unilateralmente, os riscos próprios da intervenção.

Outra coisa importante é saber se o paciente de fato não foi informado sobre determinados riscos, levando em conta ter um grau de cultura capaz de entender razoavelmente os riscos inerentes a determinada conduta ou enfermidade. Em situações muito raras, um paciente com mediana compreensão, ou a de seus próprios familiares, iria para uma sala de cirurgia sem nenhum tipo de informação ou conhecimentos, principalmente quando seu mal é de certa gravidade ou de conhecimento generalizado.

Duas coisas devem ficar bem claras em tais ocorrências quando da avaliação judicial: o consentimento esclarecido não suprime nem ameniza a culpa médica por negligência ou imprudência; e o que verdadeiramente legitima o ato médico é a sua indiscutível, imediata e inadiável intervenção. Em suma: entender que mesmo tendo o médico um termo escrito de consentimento do paciente, isto, por si só, não o exime de responsabilidade se provados a culpa e o dano em determinado ato profissional.

Ter em conta, ainda, que um termo de consentimento mesmo por escrito, por si só, como muitos pensam, não é bastante para garantir uma situação mais tranquila frente às demandas que venham ocorrer diante de um mau resultado. Também não se deve simplesmente pensar que a mística da profissão embasada no velho paternalismo vai isentar alguém de culpa ou torná-lo imune às queixas. E o que fazer quando no transcurso de uma intervenção surge uma nova situação que exige conduta emergencial ante a gravidade do caso, porém não conhecida pelo paciente? O médico não poderia ter outra conduta senão intervir tendo em vista o indiscutível interesse do paciente. Estaria legitimado e obrigado a intervir. Todavia, deve-se entender que a solução em tais casos é sempre caso a caso.

10.16. RESPONSABILIDADE FUNCIONAL DO ESTUDANTE

Conceituava-se o estudante de Medicina como o indivíduo dedicado a adquirir experiência e uma forma de conduta que permitisse, no futuro, tratar dos doentes e promover a saúde. Hoje não se pode ter mais essa concepção.

A Medicina, de uma arte solitária e íntima, passou, nestes últimos tempos, a assimilar e solicitar a extraordinária contribuição decorrente do avanço galopante das ciências em geral.

Assim, criou-se uma nova forma de exercício funcional, circunscrevendo-lhe um maior campo de atuação – uma verdadeira área médica, onde sociólogos, economistas, enfermeiros, estatísticos, assistentes sociais, bioquímicos, farmacêuticos e engenheiros, dentre outros, passaram a contribuir decisivamente para uma forma de Medicina que alcança o homem em seu mais amplo sentido. Chega-se à conclusão de que a Medicina não é apenas da exclusiva responsabilidade do médico, mas da responsabilidade de todas as pessoas capazes de contribuírem efetivamente em sua acepção mais vasta.

Os próprios médicos deixaram de atuar isoladamente, unindo-se em equipes, pois não se pode conceber que, em determinadas formas de atividades médicas, possa o profissional da Medicina continuar individualmente, quando essa conduta isolada de atividade, nas instituições hodiernas, é insuficiente e limitada.

Estamos numa época em que, além da responsabilidade pessoal de cada médico, existe também uma nova espécie de responsabilidade coletiva de equipe, onde as obrigações são divididas conforme a graduação hierárquica e a capacidade de seus componentes.

Antigamente, por exemplo, numa sala de operações, era o cirurgião responsável por tudo que pudesse ocorrer. Hoje isso não é mais admitido. Os componentes desse grupo são pessoas de plena capacidade, e, se um deles vier a causar danos por culpa própria, é claro que responderá por si. Se a tarefa é de todos, haverá a divisão dessa responsabilidade.

O estudante de Medicina dos últimos anos também se incorporou a essa nova realidade e passa a ter, nos hospitais ou serviços médicos, seus encargos específicos, com a realização de alguns “atos profissionais”, de maneira autônoma ou sob velada supervisão.

Antes, era ele objeto apenas da nossa preocupação no sentido de formá-lo. Vivia sob uma vigilância constante, como uma verdadeira “sombra” do médico, considerado, inclusive, por todos, como um ser em formação e, por isso, irresponsável, a não ser em fatos a que viesse a dar causa por pérfidos desejos.

A responsabilidade por atitude negligente ou imprudente do estudante imputada sistematicamente ao médico ou ao hospital é conceito que não pode prevalecer tão absolutamente.

Dizia-se, outrossim, que o médico vivia para o hospital, assim como todo pessoal técnico, pois o que eles recebem é tão insignificante que não pode ser confrontado com o que oferecem. Somente o estudante, afirmava-se, é aquele que vive do nosocômio. Alegava-se que servem todos os doentes e os educandos vão deles servir-se.

Atualmente, essa concepção não pode ser mais endossada, visto que é notável e eficaz a participação do aluno na vida de um hospital, principalmente quando ele desenvolve suas atividades em grupo. Aquelas afirmativas não podem ser aclamadas quando os estudantes passaram a contribuir decididamente no esquema medicina-paciente.

É nosso pensamento que aquela irresponsabilidade total pela culpa não pode ser admitida nos dias que correm. O estudante de nossos tempos não pode ser comparado ao de outrora. Participa ele dos fatos gerais, critica e discute, defendendo conscientemente seus interesses. Houve, é inegável, uma fantástica revolução na mentalidade do jovem brasileiro, provando que ele foi sensibilizado mais precocemente para uma tomada de posição, adquirindo condições de adaptação às exigências dessa nova ordem imposta pela evolução da “Medicina Moderna”. Houve, indubitavelmente, uma admirável conscientização. Portanto, não se pode considerar os jovens estudantes irresponsáveis. Em contrapartida, somos obrigados a começar a exigir-lhes um meio de tributo em caráter de responsabilidade.

Qualquer que seja a estrutura de uma instituição médica, existem sempre normas e regulamentos para um perfeito entrosamento funcional e ético.

É certo que os estudantes não têm vinculação profissional com o hospital, mas há obrigações funcionais que poderão responder pela infração penal.

Quem tem direitos e vantagens deverá aceitar as obrigações e os deveres.

Destarte, chegou a hora de requestar-se deles uma forma de responsabilidade, que chamaríamos de responsabilidade funcional do estudante, não somente de cunho administrativo ou escolar, mas, também, dentro dos princípios da responsabilidade culposa.

Isso, à primeira vista, poderia parecer uma satisfação descabida; no entanto, o que se propõe é tão somente cobrar do estudante uma responsabilidade atinente à sua habilidade e à sua formação, acordando-o, desde cedo, para as exigências necessárias que, por certo, deverá ter no desempenho de sua futura profissão.

Desta forma, não há por que negar a responsabilidade do estudante de Medicina que se incorpora, por seus próprios méritos e capacidade, às tarefas específicas de sua habilidade, trabalho esse próprio de sua atividade, quando se sabe que o médico, nas suas múltiplas ações, não poderia se dividir ou ter a onipresença de Deus em todos os acontecimentos e situações que se possam verificar no âmbito de uma instituição com centenas de doentes.

Isso não quer dizer que deva o médico omitir-se de suas obrigações, explorando os alunos em atividades suas ou que mereçam sua supervisão. Em assim agindo, estaria cometendo a negligência do superior hierárquico, que a doutrina moderna consagrou na expressão “responsabilidade vicariante”.

Imputa-se ao estudante apenas a responsabilidade por aquilo que obviamente lhe cabe, dentro de sua competência e sua obrigação funcional.

Dizer que o estudante é totalmente irresponsável é simplesmente desconhecer o que ele conseguiu, honestamente, em termos de conscientização e de habilidade. É menosprezar sua capacidade e seu valor.

Por outro lado não poderíamos deixar de cobrar-lhe uma quota de responsabilidade. Isso é um fato que se impõe a qualquer pessoa. Por exemplo, um estudante que presta serviço em um banco de sangue de um hospital, sendo responsável por esse setor, e, quando solicitado urgentemente para uma reclassificação de um sangue, não o faz por descaso, e disso resulta dano ao paciente: não se pode deixar de configurar nessa situação a negligência por não ter feito o exigido, e a imprudência por ter afirmado aquilo que não fez.

Finalmente, somos favoráveis a um Código de Ética do Estudante de Medicina, com dispositivos, sempre que possível, disciplinadores de suas atividades. Sentimos ser ele elemento indispensável em determinadas circunstâncias do exercício médico, principalmente no tocante à responsabilidade e ao segredo. A Ley de Ejercicio de la Medicina da Venezuela, em seu artigo 15, assim estatui: “... Os estudantes de Medicina estão igualmente obrigados a guardar segredo sobre o que veem, ouvem ou descobrem em sua função”.

10.17. RESPONSABILIDADE MÉDICA DERIVADA

O progresso do sistema médico trouxe, para todos nós, por incrível que pareça, uma cota de maior responsabilidade. Há determinados setores da Medicina cuja segurança e produtividade levaram ao espírito de muitos a certeza de sua infalibilidade. Todavia, por mais eficientes que sejam esses meios, eles não afastam a necessidade, cada vez maior, da contribuição de outros técnicos que se incorporam gradativamente a nós.

A Medicina começa a fugir das mãos dos médicos.

Essa nova concepção entende que sua ação deve abranger um maior raio de atividade, constituindo uma verdadeira área da saúde, onde outros profissionais, diferentes do médico, possam contribuir decisivamente em favor do homem.

Essa solidariedade profissional, além de concentrar maiores recursos, traz, além das vantagens econômicas, uma melhor qualidade de trabalho e uma maior segurança operacional, pelas quais o paciente será cada vez mais beneficiado.

Sendo assim, além da responsabilidade pessoal de cada um, existe também uma forma de responsabilidade compartida entre todos os membros de uma equipe, embora a graduação hierárquica e a capacidade de cada componente influam, decididamente, na responsabilidade individual. Se a tarefa é de todos, é justo que exista a divisão dessa responsabilidade.

Atualmente, farmacêuticos, bioquímicos, enfermeiros, administradores, assistentes sociais, engenheiros, psicólogos, odontólogos, entre outros, participam, com os médicos, de muitas tarefas, no sentido de proteger o enfermo.

Esses outros profissionais da saúde, não médicos, passaram na hora presente a incorporar-se a essa nova realidade, assumindo, desta maneira, nos hospitais e serviços especializados, encargos próprios, de forma independente, embora algumas determinações ainda permaneçam na exclusiva dependência do médico. Isso, é claro, não poderia deixá-los destituídos de sua responsabilidade. Ao contrário, estão incluídos no rol da responsabilidade médica.

Desta forma, à negligência num exame subsidiário, realizado por um bioquímico, cuja falsidade de resultado acarrete um dano grave ao paciente, não se pode atribuir outra forma de responsabilidade a não ser a própria responsabilidade médica. O mesmo se diga do engenheiro biomédico que imprudentemente coloca à disposição do médico determinado instrumental sem condições de um registro mais fiel, disso resultando um resultado lesivo ao doente. Não há por que negar a configuração da responsabilidade médica.

Tão evidente tem sido a contribuição daqueles profissionais na vida de um hospital, que os mesmos passaram a ser indispensáveis para uma contribuição mais efetiva no rendimento do sistema médico. Por outro lado, nas atividades mais subjetivas da Medicina, onde ainda se reluta em aceitar aquela contribuição, quase nada se tem oferecido a mais em favor da saúde do homem.

Houve uma verdadeira mudança e uma fantástica evolução, cada vez mais imperativas, exigidas por essa nova ordem imposta pela Medicina moderna. E nos setores onde essa evolução foi mais mercante, pela disponibilidade de promover um atendimento mais efetivo e mais benéfico ao paciente, foi justamente onde se verificou a aceitação de outros técnicos.

Aceitando-se o fato de que outras profissões paralelas à Medicina clássica participam decididamente num só sentido, chega o momento de exigir de cada um desses elementos uma forma única de responsabilidade, que não pode ter apenas um posicionamento de ordem administrativa, senão, também, a mesma obrigatoriedade, chamada responsabilidade médica.

Isso, antes de constituir-se numa modalidade odiosa e descabida, ou numa maneira mais extravagante de exigência, nada mais representa senão a aceitação da atividade de todos que, de uma ou outra forma, possam somar esforços, em termos funcionais, em favor do paciente. Como não há direitos sem obrigações, requeste-se uma exigência única, designada por nós como responsabilidade médica derivada ou responsabilidade médica convergente.

10.18. SOCIALIZAÇÃO DO RISCO MÉDICO

Há certas profissões, e a Medicina é uma delas, que, por sua natureza e circunstâncias, criam riscos de danos a outrem. Não existe médico, por menos experiente que seja, ou paciente, por mais ingênuo que possa parecer, que não estejam cientes do risco gerado na tentativa de salvar uma vida ou restabelecer uma saúde. Mesmo o mais tímido e discreto ato médico é passível de risco.

Esse é o preço que vem pagando o paciente pelos mais espetaculares progressos que a tecnologia tem emprestado à Medicina. Assim, tem sido o tributo de todas as comunidades beneficiadas pela civilização hodierna. São as vantagens do risco-proveito.

A Medicina nada mais é do que uma sucessão de riscos.

O grande arsenal tecnológico, de que a ciência médica atualmente dispõe, trouxe para o homem inestimáveis proveitos. Por outro lado, essa nova ordem não pôde evitar que surgissem mais acidentes no exercício da profissão.

O homem vive a era do risco.

Ainda que a relação médico-paciente seja um contrato de meios e não de resultados, o equilíbrio só seria restituído se o paciente, vítima de um acidente médico, pudesse ser ressarcido no seu dano.

O acidente médico é, não raro, inevitável e inesperado, e suas causas são, sob o ponto de vista subjetivo, dificilmente determinadas. Por isso, a tendência contemporânea, no que se refere ao aspecto civil do dano médico, é substituir a noção de responsabilidade médica pela noção de risco. Acreditamos que, no futuro, toda questão de responsabilidade será simplesmente um caso de reparação, embora ela não venha a representar uma indenização total do dano sofrido. É preciso salvar o dano.

O médico compromete-se a utilizar todos os meios e recursos ao seu alcance, com a maior prudência e a melhor diligência, no intuito de atingir um bom resultado. Todavia, incerta e conjecturalmente.

A Medicina antiga, inibida, solitária e quase espiritual, incapaz de grandes feitos, era menos danosa, porque gerava pouco risco. Nos nossos dias, há uma possibilidade tão grande de risco e dano que, em certas ocasiões, o médico passou a omitir-se. Criou-se uma medicina defensiva.

A falibilidade do médico e da Medicina é inquestionável. É ela aceita pela doutrina, pela lei e pela jurisprudência, principalmente sob os ângulos penal e moral. No entanto, quanto à responsabilidade civil, esta chega a ser quase ilimitada. Os tribunais passaram a entender que a reparação civil do dano é algo indiscutível. Já afirmaram que, assim como é injusto o médico responder pela falibilidade da ciência ou pela sua própria limitação, mais injusto é deixar o paciente à sua própria sorte, quando, buscando um bem, encontrou um mal.

Outros admitem que, da mesma maneira como a sociedade é beneficiada pelo progresso das ciências médicas, essa mesma coletividade deve aceitar as falhas oriundas desse mesmo progresso.

O certo é que em todo contrato que pressupõe um perigo existe, de início, uma obrigação de garantia.

A socialização dos riscos e danos médicos, ao contrário do que muitos pensam, não é simplesmente a posse de uma apólice de seguro de responsabilidade civil. É muito mais. É um programa voltado para uma proposta político-social, solidária e responsável, em favor do médico e da comunidade, e, por isso, em favor da ordem pública e do equilíbrio social, não se resumindo ao pagamento de indenizações, mas ainda em patrocinar assessoria jurídica em ações administrativas, civis e penais do médico, estabelecer projetos voltados à prevenção do risco e do dano, e também ao infortúnio do paciente.

Socializar o risco e o dano médico, no sentido de reparar civilmente o prejuízo, é o único instrumento viável e suscetível de assegurar tranquilidade no exercício profissional e garantir uma reparação mais imediata e menos confrontante com o médico. É também uma forma de corrigir algumas distorções da medicina dita socializada, cada vez menos amistosa, cada vez mais hostil.

A socialização do risco é a que melhor atende à justiça coletiva. Não se pode esconder o fato de que a Medicina é a profissão que mais absorve os impactos das novas concepções sociais. Negar essa realidade, somente por caprichos ideológicos, além de egoísmo, é colocar-se distante do presente. Esta é a única forma que dá ao responsável condições de responder pelo ônus do dano causado, quase sempre distante de suas reais possibilidades. Para o paciente: o sistema de seguro também significa livrar-se de um processo penoso e confuso, e a proteção contra a deficiência técnica, contra seus riscos e contra a eventual falibilidade do profissional.

Este seguro seria parte de um conjunto de benefícios em favor do médico, desde a assistência advocatícia em ações que viesse a responder nas instâncias penais, civis e administrativas, podendo até mesmo contribuir na liquidação pecuniária por danos em processos indenizatórios, a partir de um fundo mutuário construído de forma universal e compulsória.

Mas esses seguros não podem nem devem, sob qualquer pretexto, ser feitos por empresas de seguro privado. Devem, isto sim, realizar-se por uma instituição estatal ou pela classe médica, como, por exemplo, sob a responsabilidade da Associação Médica Brasileira ou da Federação Nacional dos Médicos, como mutualizadora ou como concessionária exclusiva do estado. Em vez dos possíveis lucros passarem às mãos ávidas das empresas particulares, seriam utilizados em benefício da própria classe médica, com a instituição da assistência mutuária, da assistência judiciária, da previdência médica, do estímulo à pesquisa médico-científica, do aprimoramento profissional, de taxas módicas de seguro, entre outros.

Em todos os países onde o sistema securitário falhou, estavam as empresas de seguro nas mãos de grupos particulares, que não conhecem os limites de ter lucro nem resistem à tentação de aumentá-lo.

Alguém poderia insinuar que a socialização do risco médico é a simples aceitação da existência de danos causados a pacientes, ou uma maneira de delegar direitos inalienáveis. Argumentar-se-ia, ainda, que essa forma de seguro deixaria o médico indiferente à sua responsabilidade, pois teria naquelas instituições o instrumento legal de reparo. Ou, finalmente, uma cômoda maneira de transferir uma obrigação pessoal para a comunidade.

Tais argumentos não convencem. Primeiro, não se cogita da imunidade moral ou penal que possa existir em cada dano. Depois, não se pode ocultar a existência do risco e, consequentemente, a tendência crescente de resultados danosos. É inadmissível que um profissional venha a negligenciar seu trabalho simplesmente por existir alguém capaz de reparar materialmente determinado dano. Não. Além da consciência do homem e do profissional, prevalece ainda a vaidade natural de acertar sempre que possível. Esse tipo de seguro leva o médico mais facilmente a agir em favor do paciente, aumentando-lhe seu rendimento e fazendo com que ele atenda melhor aos interesses da comunidade.

A compensação do seguro não cobre os danos provocados por atos ilícitos ou criminosos, como, por exemplo, as consequências advindas da prática de uma laqueadura tubária sem indicação médica ou de um aborto não consentido.

Conquanto a fiscalização do exercício profissional tenha seus órgãos próprios, sua ação faz se sentir apenas em termos de resguardar o bom nome da Medicina. No máximo, defender o médico indiretamente quando, envolvido num processo ético-profissional, for absolvido. Tem, portanto, uma proteção ético-moral, jamais uma função seguradora contra a responsabilidade civil. E não se pode falar da existência de legislação específica capaz de amparar o médico diante de um dano resultante de um fato inevitável. Não é justo deixar-se o profissional à sua própria sorte.

Assim como a socialização do risco foi a maneira mais justa e humana de resolver os graves conflitos nos acidentes de trabalho, seria esta a fórmula ideal para evitar o desequilíbrio social e sanar o dano sofrido pelo paciente, através da reparação por um instrumento estatal de seguro.

Quando a Medicina colocou, entre o médico e o paciente, todo esse fabuloso instrumental tecnológico, criou um relacionamento mais frio e mais impessoal. Se o médico pudesse deixar os sinuosos corredores que o levam aos laboratórios mais sofisticados ou às salas de computação, e voltar ao seu antigo lugar – o pé do leito, onde a doença tinha um território delimitado e sentia-se a doença viver, talvez seu calor e sua sentimentalidade desencorajassem o paciente de pleitear junto a um tribunal. Onde há confiança e afeto, existe sempre o perdão.

Infelizmente, nem tudo depende da consciência e da vontade do médico. Mas, sobretudo, da determinação e da conscientização que começam a surgir de uma sociedade utilitarista e pragmática, que se preocupa demasiadamente com os índices de produção.

O médico que exercia uma medicina-arte, de forma quase artesanal a quem individualmente conhecia, transformou-se num executivo, aplicador de normas científicas e tecnológicas a grupos de doentes, como quem dirige uma empresa. Ou numa medicina de sintomas. No dizer de alguém, uma medicina de olhar de jardineiro: voltada para a variedade das aparências.

“Vítima, agente e sociedade (assegura Hermes Rodrigues de Alcântara) são beneficiados com a socialização do risco: o primeiro porque vê a sua indenização independente da situação financeira de seu prejudicador; o segundo porque não arca sozinho com o ônus da indenização de um dano, cuja participação pessoal, às vezes, é mínima; e a última porque não sofre o impacto do desequilíbrio patrimonial de qualquer de seus integrantes. O sistema funciona como na hidráulica se comportam os vasos comunicantes” (op. cit.).

• Desvantagens do seguro de responsabilidade civil do médico:

1. Interfere negativamente na relação médico-paciente.

2. Estimula os processos contra os médicos.

3. Eleva os custos dos serviços médicos.

4. Pode facilitar o erro médico.

5. Facilita a indústria das indenizações.

6. Fornece uma proteção aparente para o profissional.

7. Cria um cenário cativo para o médico.

8. Não cobre o dano moral.

• Vantagens do seguro de responsabilidade civil do médico:

1. Melhor modalidade de liquidação do dano.

2. Melhor condição de liberdade e segurança no trabalho.

3. Assegura o equilíbrio social e a ordem pública.

4. Melhor forma de justiça social.

5. Melhor forma de previdência propriamente dita.

6. Livra médico e paciente de processos penosos e demorados.

7. Evita explorações, ruínas, injustiças e iniquidades.

8. Independe da situação econômica do causador do dano.

9. Corrige o aviltamento patrimonial da vítima.

10. Contribui com o superávit do sistema em programas de prevenção do dano.

11. Estimula a solidariedade social.

12. Apresenta falhas, mas tem o maior número de benefícios e vantagens.

13. Corrige o fato de o paciente ser totalmente esquecido e o médico falsamente lembrado.

10.19. POLÍTICA DE PREVENÇÃO DE RISCO DE ERRO MÉDICO

Ainda que não exista uma fórmula mágica e infalível para evitar o erro médico, mister se faz envidar todo esforço no sentido de se criar condições e mecanismos capazes de contribuir de forma efetiva pelo menos na diminuição desses maus resultados, pois eles não interessam a ninguém.

A primeira providência neste sentido é desarmar as pessoas de um certo preconceito de que todo resultado atípico e indesejado no exercício da medicina é da responsabilidade do médico, quando em algumas vezes ele é também vítima. Por isso, impõe-se centrar nossa compreensão na montagem de um desenho epidemiológico do mau resultado, no sentido de apontar não apenas seu diagnóstico, mas também fomentar a promoção de uma política de condutas, meios e mecanismos que seja eficaz na correção destes desvios.

Qualquer que seja a proposta nesta direção, mesmo aquelas que trazem embutidos alguns interesses profissionais no “gerenciamento de risco” por empresas especializadas, deve ser analisada como meio de contribuição a este problema.

A verdade é que a medicina atual nada mais é do que uma sucessão de riscos. O grande arsenal tecnológico de que a ciência médica atualmente dispõe trouxe, para o homem, inestimáveis proveitos. Por outro lado, essa nova ordem não pode evitar que surgissem mais acidentes no exercício da nossa profissão. Vivemos a era do risco.

O acidente médico é, não raro, inevitável e inesperado, e suas causas são, sob o ponto de vista subjetivo, difíceis, mas com possibilidades de serem determinadas.

Todavia, é necessário ficar bem claro que tal projeto não se destina apenas a identificar os fatores potenciais de risco em face das demandas por responsabilidade civil, penal e ético-administrativa, mas, sobretudo, melhorar as condições de trabalho médico e as perspectivas de vida e de saúde da população.

10.19.1. Fatores de risco

Como se vê na prática do exercício médico, muitos são os fatores de risco que levam ao mau resultado. Podemos classificá-los em fatores não assistenciais e fatores assistenciais.

Entre os fatores não assistenciais, destacamos:

1. O sistema de saúde. A primeira coisa que chama nossa atenção no exercício da medicina é o distorcido e desorganizado sistema de saúde pública. A chamada socialização da medicina com a expansão dos serviços de saúde e a criação das instituições prestadoras da assistência médica colocou entre o médico e o paciente certos conflitos, os quais quase sempre com complexas implicações de ordem ética e legal. Por outro lado, as políticas sociais e de saúde não se efetivaram como instrumento de redistribuição de renda e de atenuação das desigualdades sociais. Não se atende ao princípio da universalização e da equidade, e passam ao longe da discussão e da participação democrática dos setores organizados da sociedade. O modelo de desenvolvimento econômico e social imposto durante as quatro últimas décadas mostrou-se excessivamente concentrador, propiciando níveis de vida e de saúde que não correspondem às necessidades da população. Isto teve um reflexo muito negativo na organização e na estruturação dos serviços prestadores de assistência médica. E é neste ambiente de penúria e precariedades que o médico exerce suas atividades.

2. A falta de compromisso do médico. Há motivos políticos e sociais que começam a reclamar dos médicos posições mais coerentes com a realidade que se vive. Um modelo capaz de revelar o melhor papel que essa postura venha desempenhar no complexo projeto de direitos e deveres, e que possa apontar, com justiça e conveniência, o caminho ideal na realização do ato médico e nas exigências do bem comum. Por isso ele não pode ficar indiferente, pois o exercício da medicina é um ato político em favor da saúde individual e coletiva e também na tentativa da busca da cidadania. O próprio Código de Ética do médico deve estar voltado para isso; se não, que ética é esta que não enxerga tais necessidades, principalmente quando elas atingem os mais desfavorecidos e os mais necessitados, tantas vezes deserdados da sorte? Portanto, é dever do médico lutar organizadamente em favor das melhores condições de atendimento e não considerar a doença como um resultado da fatalidade. Não basta modificar a relação entre o homem e a natureza, mas, também, mudar as relações sociais.

3. A não participação da sociedade. Esta, por sua vez, também deve compreender que a questão da melhoria das condições de saúde e dos níveis de vida não deve se concentrar apenas nas mãos dos médicos. É preciso que a sociedade se manifeste sempre que necessário, salientando o seu inconformismo e sua revolta com a disparidade reinante entre as condições de saúde da coletividade e as disponibilidades cada vez mais crescentes da ciência e da tecnologia. Deve entender ainda que a luta contra o mau resultado na assistência médica passa por propostas e encaminhamentos das políticas sociais públicas e que esse resultado tão indesejado não tem como causa única os erros dos médicos. Por isso, quando assistimos aos movimentos de organização e de mobilização de segmentos sociais contra o “erro médico”, não podemos ficar contrários a isso, desde que tal encaminhamento tenha como proposta a prevenção de resultados indesejáveis e não o simples desejo de vingança patrocinado por parentes de vítimas de resultados atípicos. O ideal seria que esses grupos se aliassem aos médicos e a todos aqueles que se interessam pela luta em favor da boa assistência médica, pois aí se concentra certamente o embasamento para uma política de prevenção de riscos de maus resultados.

4. A não revisão do aparelho formador. Nenhum analista desta questão deixa de apontar o nível do ensino médico brasileiro como um dos causadores da sofrível formação profissional pela maioria das escolas médicas e, consequentemente, fator preponderante na eclosão do mau resultado. Além das péssimas condições de ensino e de aprendizagem, dos baixos salários dos professores, da falta de uma estratégia para um perfil de médico que se precisa e da falta de recursos para a pesquisa e a extensão, não existe uma revisão sobre essa qualidade de ensino, mas tão somente as decisões açodadas e irresponsáveis de criação de novas escolas médicas. Além disso, as manobras astuciosas de sucateamento das escolas com o propósito de colocá-las no lote das privatizações inconsequentes, o que, no mínimo, sugere cumplicidade.

5. A falta do ensino continuado. Entre nós não é exagero afirmar que para se exercer a profissão médica não basta uma habilitação legal, representada pela posse de um diploma e seu registro nos Conselhos de Medicina. É necessária a continuada habilitação profissional constituída de um permanente aprendizado. A verdade é que não existe entre nós nenhuma norma ou nenhuma exigência obrigando o médico a se atualizar sempre. Também raríssima é a instituição pública ou privada que se dedica ou que apresenta um projeto dedicado ao ensino continuado, dando oportunidade de reciclagem médica ou estimulando o profissional na perspectiva de acompanhar razoavelmente os passos de sua ciência.

6. A precária fiscalização do exercício profissional. Embora os Conselhos de Medicina tenham como objetivos primeiros as tarefas pedagógicas e doutrinárias, não se pode omitir como papel significativo a fiscalização do exercício da medicina, como forma de ajustar o profissional aos ditames consagrados no seu Código de Ética, “cabendo-lhe zelar e trabalhar por todos os meios ao seu alcance, pelo perfeito desempenho ético da medicina e pelo prestígio e bom conceito da profissão e dos que a exerçam legalmente”. Os Conselhos não podem ficar apenas nas intermináveis reuniões onde são discutidos assuntos de menor interesse ou de se destinar tão só à expedição de carteiras. Devem partir para uma ofensiva mais positiva, a exemplo de alguns Regionais que estão indo aos estabelecimentos de saúde conferir a qualidade da assistência.

No tocante aos fatores assistenciais, podemos apontar:

1. O desgaste da relação médico-paciente. Não é só pelo fato de se conter a demanda judicial por erro médico, mas todos sabem que uma boa relação entre o médico e seu paciente é uma forma de melhor entrosamento, de melhor percepção dos problemas do assistido e uma maneira de estimular o interesse e a dedicação profissional. Uma relação médico-paciente amistosa deixa o assistente e o assistido em condições de exercer tranquilamente seus papéis. Infelizmente, por fatos os mais variados, esta relação, embora não generalizada, vem se transformando numa tragédia, ou no mínimo num encontro desconfortável. Lamentavelmente, a deterioração da relação médico-paciente se apresenta como o motivo mais forte do aumento de ações de responsabilidade profissional. Há de se encontrar um caminho para se reverter esta situação e fazer com que esta relação volte a ser a qualidade que colocou a medicina num lugar de respeito e consideração.

2. A falta de condições de trabalho. Ninguém desconhece também que muitos destes maus resultados tenham como origem as péssimas e precárias condições de trabalho, numa atenção à saúde cada vez mais decadente e anárquica como projeto, mesmo que tenhamos um número razoável de médicos em relação à nossa população. Os serviços públicos, com honrosas exceções, estão desmantelados por uma política dirigida pela própria estratégia de poder, como forma deliberada de desmoralizá-los e entregá-los à iniciativa privada, a exemplo do que vem se fazendo açodadamente como política de privatização. A verdade é que os profissionais da saúde sentem em seu dia a dia cada vez mais dificuldades em exercer suas atividades, em face das indigentes condições de trabalho. Neste cenário perverso é fácil entender o que vem acontecendo nos locais de trabalho médico, onde se multiplicam os danos e as vítimas, e onde o mais fácil é culpar os médicos como primeiros responsáveis.

3. O abuso de poder. É necessário, também, saber se o profissional atuou com a cautela devida e, portanto, descaracterizada de precipitação, de inoportunismo ou de insensatez. Uma das formas mais comuns de desvio de poder é a prática médica realizada por profissionais que não estão capacitados para realizar determinada especialidade médica. Outra forma condenável e por isso agravante numa avaliação por suposto erro é o procedimento desnecessário.

4. A falsa garantia de resultado. Mesmo que o médico deva ser otimista quando da sua participação junto ao doente, ele não deve garantir certos resultados, principalmente se este procedimento é complexo e de risco, como na cirurgia estritamente estética. O que se recomenda é o uso adequado dos meios e condutas que venham favorecer o paciente e uma palavra de estímulo que não signifique promessa, pois, em determinados instantes, esta garantia de resultado sempre favorável significa uma violação ao dever de informar devida e corretamente.

5. A falta do consentimento esclarecido. Com o avanço cada dia mais eloquente dos direitos humanos, o ato médico, em regra, só alcança sua verdadeira dimensão e o seu incontrastável destino quando se tem o consentimento do paciente ou de seus responsáveis legais. Assim, grosso modo, todo procedimento profissional necessita de uma autorização prévia. Além disso, exige-se não só o consentimento puro e simples, mas o consentimento esclarecido. Entende-se como tal o consentimento obtido de um indivíduo capaz civilmente e apto para entender e considerar razoavelmente uma proposta ou uma conduta, isenta de coação, influência ou indução. Não pode ser obtido através de uma simples assinatura ou de uma leitura apressada em textos minúsculos de formulários a caminho das salas de operação. Mas por meio de linguagem acessível ao seu nível de convencimento e compreensão (princípio da informação adequada). Mesmo que o consentimento esclarecido seja um instrumento de defesa numa alegação de erro, ele tem como sentido maior a dignificação da pessoa. O consentimento não é um ato irretratável e permanente (princípios da revogabilidade e da temporalidade). Por outro lado, deve ficar bem claro que o fato de se ter um consentimento esclarecido, isto, por si só, não isenta o médico quando da existência de outras faltas no cumprimento dos deveres de conduta.

6. O preenchimento inadequado de prontuários. Um dos elementos mais valorizados quando da avaliação do erro médico é o prontuário do paciente. Neste documento devem estar de forma legível não apenas a anamnese, mas todo acervo documental padronizado, ordenado e conciso, referente ao registro dos cuidados médicos prestados e aos documentos anexos. Consta de exame clínico, suas fichas de ocorrências e de prescrição terapêutica, os relatórios de enfermagem, os relatórios da anestesia e da cirurgia, a ficha de registro de resultados de exames complementares e, até mesmo, cópias de atestados e solicitações de exames. Constitui o prontuário um verdadeiro dossiê que tanto serve para análise da evolução da doença como para fins estatísticos que alimentam a memória do serviço e como defesa do profissional, caso ele venha ser responsabilizado por algum resultado atípico e indesejado. Pelo visto, sua não existência ou seu incompleto preenchimento pode constituir-se num fator negativo nos procedimentos de prova. Acreditamos que o prontuário é a melhor arma quando de uma avaliação judicial.

7. A precária documentação dos procedimentos. Todo projeto de gerenciamento ou administração de risco de erro médico deve contar com a adequada orientação da documentação dos procedimentos realizados. Não é demasiado dizer que em nosso sistema processual é sempre muito importante a prova documental. Como as ações judiciais são demasiadamente morosas, e como os demandantes têm um prazo até certo ponto longo para pleitear a ação, é importante que toda documentação referente à assistência contestada seja guardada, pelo menos por dez anos, para as exigências do Conselho Federal de Medicina, e, por vinte anos, para a prescrição da obrigação contratual.

8. O abandono de paciente. A regra é que o médico não pode abandonar seu paciente, a não ser em situações muito especiais, apontadas no Código de Ética Médica, onde ele pode até renunciar ao tratamento, desde que isso seja levado ao conhecimento do seu assistido ou dos seus familiares, e que não haja prejuízo neste afastamento. Por outro lado, é muito natural que numa relação profissional, não existindo mais a confiança do paciente, ou quando ele não atende às recomendações e à prescrição médicas, cheguem as partes a um acordo, em que o médico venha ser dispensado de sua assistência.

10.20. DEVERES DE CONDUTA DAS ENTIDADES PRESTADORAS DE SERVIÇOS MÉDICOS

A vida e a saúde figuram entre os valores mais significativos do ser humano e, desse modo, quando da prestação da assistência médica, deve-se ter em conta seus vínculos e suas condições. No caso dos convênios e planos de saúde, entre outros, não se pode perder de vista certas medidas impeditivas, como algumas cláusulas que eximem a responsabilidade do prestador de serviços em acordos e convenções.

Destarte, não é exagero lembrar que todo contrato de seguro, como o de convênio de saúde, não pode nem deve afastar-se dos princípios elementares que regulam o regime contratual (princípio da autonomia da vontade, princípio do consensualismo, princípio da força obrigatória e o memorável princípio da boa-fé), sem deixar de levar em conta a transparência das informações e a vulnerabilidade do paciente, sempre hipossuficiente economicamente e menos informado.

A utilização dos contratos de assistência médica vem se propagando de forma vertiginosa, trazendo na sua esteira um número impressionante de questionamentos nos aspectos dos interesses, não tanto da área dos profissionais médicos, mas, sobretudo, da relação entre o usuário e a administração dos estabelecimentos e planos de saúde. Basta ver o número de contestações que se avolumam mais e mais na Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor, nos Juizados Especiais de Pequenas Causas e nas Varas Especializadas, a despeito da existência entre nós do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990), certamente a maior revolução jurídica verificada nesses últimos 50 anos em nosso país.

Levando-se em conta a importância da vida e da saúde das pessoas, não se pode dizer que tais cuidados sejam exagerados, sendo, portanto, justo que se estabeleçam seus vínculos e suas condições de atendimento.

Os principais deveres de conduta desses prestadores são:

1. Dever do atendimento prometido. Esse é o primeiro dos deveres de conduta das entidades prestadoras de serviços de saúde. Qualquer pessoa que é assistida por um serviço de saúde ou aderente de um plano de saúde tem o direito de ser atendido na medida das cláusulas convencionadas, seja no modo, na forma, local e qualidade previamente prometidos no contrato celebrado. O contrato não pode conter cláusulas que permitam rescisões unilaterais ou de qualquer modo subtraia sua eficácia e validade, além das situações já previstas em lei.

2. Dever de informação. Exige-se também que haja transparência nas informações da prestação de serviços. Os estabelecimentos de saúde devem cumprir tudo que foi prometido na assinatura do contrato, de forma clara e objetiva. Os planos de saúde devem ser bem claros principalmente sobre os períodos de carência, exclusão de doenças, conceito de patologias preexistentes e abrangência da assistência. Todas as informações sobre os pacientes devem ser registradas nos prontuários médicos. As informações necessárias devem ser repassadas aos pacientes ou familiares, no sentido de se obter deles um consentimento esclarecido. Excluem-se apenas os casos de iminente perigo de vida e quando o procedimento eleito seja o único meio de salvar a vida do paciente.

3. Dever de cuidados. As entidades prestadoras de serviços médicos têm obrigação da supervisão do material e equipamentos, da qualidade do serviço prestado, da proteção física e moral dos pacientes internos e da escolha e da supervisão de pessoal, tendo em conta a obrigação da qualificação e do aprimoramento dos componentes do quadro de pessoal.

4. Dever de abstenção de abusos ou de desvio de poder. Os contratos de adesão celebrados pelas entidades prestadoras da assistência médica devem ser sempre por escrito e não devem ultrapassar as bases do Código de Defesa e Proteção do Consumidor. Devem ser evitadas as cláusulas unilaterais, a propaganda enganosa e o induzimento desleal. No contrato de adesão, diz o bom senso que toda cláusula de interpretação duvidosa deva ser sempre em favor do assistido ou do aderente. O pacto de limitação da responsabilidade, quando o assistido abre mão antecipadamente de alguns direitos, deve sempre respeitar o princípio da autonomia das vontades, naquilo que é lícito pelos costumes e não defeso em lei. Assim, por exemplo, a Lei n.º 9.656, de 3 de junho de 1998, que trata dos planos e seguros privados de assistência médica, no seu artigo 12, II, a, proíbe o contrato que limita o prazo de internação. A empresa que explora plano ou seguro de saúde e aceita contribuições de associado, sem submetê-lo a exame prévio, não pode escusar-se ao pagamento de sua contraprestação, alegando omissão nas informações do segurado. Assim foi entendido no Recurso Especial n.º 86.095-SP, Registro n.º 96.0003009-0, Relator Min. Ruy Rosado de Aguiar.

5. Dever de respeito à independência do profissional. A empresa não pode restringir a independência técnica do profissional, notadamente se uma opção está embasada naquilo que recomenda a lex artis, como no que se refere à restrição de exames, de procedimentos e de medicamentos. O médico, desde que se abstenha do abuso, deve ter a liberdade de optar pelo que é melhor, em benefício do paciente.

10.21. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES DE SAÚDE DO HOSPITAL E BANCO DE SANGUE

Mais recentemente, vem-se cuidando com mais rigor da responsabilidade dos hospitais, clínicas, laboratórios e bancos de sangue, através do ajustamento do ordenamento jurídico civil à realidade social que vivemos e às transformações sofridas na recente implantação entre nós da política de saúde. E mais precisamente com o advento da extensão do credenciamento das instituições de saúde privadas, como órgãos conveniados ao Poder Público.

Tal fato estimulou os pacientes ou seus representantes a cobrarem a devida reparação dos danos quando diante de um resultado atípico ou indesejado na assistência nosocomial.

Por outro lado, observa-se que a ordem jurídica civil constituída começa a se organizar em torno de um elenco de normas em busca da equidade e em favor dos reclamos da sociedade. Dentro dessa ordem, o que mais se evidencia é a reparação dos danos produzidos nos estabelecimentos de saúde.

As bases dessa forma de responsabilidade estão centradas no instituto da culpa, onde a determinação da reparação do dano se justifica pela ação culposa do agente.

O hospital como pessoa jurídica não deixa de responder civilmente e, pelo que adota o nosso Código, sua responsabilidade inclui-se no sistema subjetivo da culpa. Quem responde civilmente, é claro, não é o hospital nem seus diretores, mas a pessoa jurídica que mantém o hospital, seja uma associação, uma sociedade ou uma fundação. É evidente que a pessoa jurídica não pode reclamar para si a profissionalidade do ato, como o fazem o médico, o dentista ou o enfermeiro.

Mesmo que o hospital responda pelo sistema subjetivo da responsabilidade, ele não está nas mesmas condições da responsabilidade do médico. Por mais que se insinue serem os hospitais regidos pelo princípio da “responsabilidade sem culpa”, em face da presunção de culpabilidade em relação aos seus empregados ou prepostos, o que tem prevalecido é que sua responsabilidade há de ser avaliada no princípio subjetivo da culpa.

Assim, fica entendido que a responsabilidade do hospital, igualmente do médico, impõe uma obrigação de meios e não de resultado. Não se pode, portanto, exigir que no hospital o paciente se cure sempre e que tenha remediadas todas as suas doenças. Sua obrigação é no sentido de oferecer todas as condições e todos os recursos técnicos e terapêuticos disponíveis e necessários.

Quando se confirmar o autor da culpa, deve-se saber seu estado funcional como agente do hospital, a fim de se arguir a responsabilidade civil. Se é servidor com vínculo empregatício, o hospital responde segundo a Súmula 341 do STF: “É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”. Ainda que tenha ele o direito de recesso em relação ao agente faltoso.

Se o agente não tem nenhuma relação profissional e utiliza apenas a instituição nosocomial, a situação é outra. Quanto mais complexa for a relação do agente com o hospital, mais difícil será avaliar a responsabilidade. Em síntese, saber se a responsabilidade é exclusiva do agente sem ligação com a estrutura nosocomial, ou se a responsabilidade é da pessoa jurídica por culpa in eligendo na negligência da escolha ou da seleção do funcionário ou preposto. Sob o ponto de vista da responsabilidade civil, fica difícil saber até onde a responsabilidade é do profissional que age por omissão de socorro, por exemplo: se é do agente ou do hospital a responsabilização. Hoje, a tendência é admitir a responsabilidade do hospital quando a culpa é do médico diretor, médico chefe ou médico empregado. O mesmo não se dá quando o médico presta serviço a pedido do paciente, pois apurar-se-á a culpa de cada qual.

Os médicos residentes são os menos vulneráveis à questão da responsabilidade civil, em virtude da sua condição de aprendizagem e pela necessidade da presença obrigatória dos preceptores em seus atos. Ainda assim, não podem deixar de serem diligentes e cuidadosos, sob o risco do ônus da responsabilidade.

A tendência dos atos dolosos com dano moral, como, por exemplo, um estupro de uma paciente por um funcionário, é considerar como da responsabilidade contratual do hospital por culpa in eligendo e in vigilando. O dano em tais situações é evidente e indispensável, e a responsabilidade do nosocômio é indiscutível.

Entende-se hoje que, se um paciente procura a emergência de um hospital para ser atendido pelo médico plantonista e este lhe presta socorro, não há que se cogitar se este era ou não assalariado. Assim, estando de alguma forma ligado ao hospital, a instituição responderá pelos danos que seu profissional causar. Esse entendimento está em consonância com a jurisprudência do STJ, que considera que a responsabilidade do hospital é objetiva quanto à atividade de seu profissional plantonista. Dessa forma, fica dispensada a demonstração da culpa do hospital relativamente a atos lesivos decorrentes de culpa de médico integrante se seu corpo clínico no atendimento (Súmula n.º 7/STJ).

Outro ponto discutível nesta questão é o da queda de pacientes do leito hospitalar, vindo ele sofrer danos à vida ou à saúde. O difícil, neste caso, é confirmar se houve ou não caso fortuito. Se a causa decorrente de queda era imprevisível e inevitável, ou se foi por ato da vítima ou de terceiro, não há o que se imputar de responsabilidade. O mesmo se verifica quando dos atos praticados de um paciente contra o outro. Aqui, somente quando se tratar de pacientes com transtornos mentais e de conduta, a responsabilidade hospitalar fica mais exposta, em face das cláusulas de incolumidade implícitas nos contratos manicomiais pela culpa in vigilando.

O Hospital, na sua relação de trabalho, pode responder também por dano moral que venha a atingir tanto uma pessoa na sua individualidade como no seu grupo de trabalho. Foi assim que decidiu o TRT 3.ª Região ao julgar uma ação trabalhista em favor de uma enfermeira que denunciou o comportamento abusivo de sua coordenadora que submetia de forma frequente todos os membros da equipe a humilhações, constrangimentos e discriminações, inclusive sobre supostos envolvimentos sexuais de enfermeiras e técnicas de enfermagem com outros funcionários.

Para o julgador, ficou demonstrado, de forma inequívoca, a existência do dano moral no tratamento ofensivo dado pela coordenadora aos seus subordinados, ficando claro que ela não sabia lidar com eles, o que ficou demonstrado pelo juízo de valor preconceituoso e denegridor de toda uma classe.

Concluiu também que esta conduta desagregadora e injustificável tumultuou tanto o ambiente de trabalho, o que redundou grave desestruturação coletiva no rendimento hospitalar. E mesmo que a ofensa tenha sido feita de forma coletiva àquela equipe e não diretamente à reclamante, isto não exclui a ilicitude do ato, pois, enquanto indivíduo componente daquela coletividade, ela foi atingida em sua honra subjetiva, de modo a fazer jus à reparação pleiteada. O Hospital foi condenado a pagar uma indenização por danos morais fixada em R$ 4.000,00, e no apelo ao TRT este deu provimento ao recurso, modificando o valor da indenização para R$ 25.000,00.

Nas questões ligadas às práticas hemoterápicas, pode-se avaliar a responsabilidade em dois tempos: na coleta e na transfusão do sangue.

Na coleta, é possível surgirem danos ao doador, caso não estivesse ele em condições dessa doação. Mesmo sendo a doação um ato espontâneo e altruísta, ela tem a natureza contratual, e o conteúdo da obrigação é de resultado e não de meios, pois o que se pretende é colher uma relativa quantidade de sangue sem molestar o doador. Por isso, é necessário que ele seja devidamente examinado por médicos, os quais também deveriam estar presentes na coleta.

Na transfusão de sangue, podem surgir também inúmeras consequências danosas para o paciente, capazes de redundarem numa arguição de responsabilidade civil. Complicações essas que vão desde as perturbações imediatas da infusão sanguínea até a transmissão de doenças graves. O controle e a fiscalização da qualidade do sangue são do estado, conforme prevê a Lei n.º 7.649, de 25 de janeiro de 1988. A tendência tem sido aceitar-se a obrigação de resultado nas transfusões de sangue, componentes ou hemoderivados, ficando por isso invertido o ônus da prova, cabendo à instituição provar que não agiu culposamente. No entanto, num caso de extrema complexidade, onde o sangue foi usado como tentativa para salvar uma vida, pode-se considerar que a obrigação era de meio e isentar o caráter culposo.

Após as atribuições constitucionais que outorgam ao Estado controlar, fiscalizar e participar da transfusão de sangue, componentes e derivados, e a Lei n.º 7.649/1988 obrigar o cadastramento dos doadores, assim como a realização de exames de laborató rio no sangue coletado, pode-se celebrar com certeza uma melhoria inestimável na prestação desses serviços.

Com a implantação do Sistema Único de Saúde e sua competência sobre esse setor, verificou-se uma mudança bem significativa na dinâmica da responsabilidade civil por dano ao paciente, quando deixou, em parte, de ser dos médicos, passando essa responsabilidade objetiva para o Estado por deficiência do serviço. Assim, por exemplo, a contaminação do sangue transfundido é sempre do Banco, por meio da pessoa jurídica que o mantém ou o conveniou. E mais: de forma alguma se pode atribuir culpa ao médico que indicou uma transfusão de sangue.

Mesmo assim, não podem ser omitidos os riscos e complicações, apesar do máximo zelo e dos redobrados cuidados na avaliação dos doadores e receptores e dos métodos de coleta e estocagem, maus resultados esses que vão desde as reações hemolíticas até as contaminações do sangue e de seus derivados por malária, hepatite ou AIDS.

Os danos produzidos, geralmente por negligência, nas transfusões de sangue podem ser ressarcidos por meio de ações civis de indenização contra o Estado, baseadas na culpa in eligendo ou in vigilando. A prática hemoterápica é entendida por muitos como uma obrigação de resultado, por sua indicação precisa e indiscutível a um bom resultado.

Depois da vigência da Lei n.º 8.079, de 11 de setembro de 1990, que instituiu o Código de Proteção e Defesa do Consumidor, questões como estas ficaram mais claras.

Por fim, não se deve esquecer que o receptor não é o único sujeito aos riscos da transfusão, mas, também, o próprio doador, em decorrência da inaptidão para a doação dessa ou daquela quantidade de sangue, ou por contaminação nas transfusões diretas, embora esporádicas, entre ele e o receptor.

10.22. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS LABORATÓRIOS E DE DIAGNÓSTICO POR IMAGEM

A responsabilidade civil dos laboratórios de patologia clínica, anatomia patológica, bioquímica e congêneres, assim como das clínicas de radiologia e diagnóstico por imagem, sob a visão da maioria dos doutrinadores e da jurisprudência, tem a qualificação de uma obrigação de resultado. Isto é sempre justificado pela exatidão dos resultados que se espera de cada um desses exames, os quais trazem na sua exatidão rumo de cada decisão na prática profissional da saúde.

Há de se considerar que determinados resultados devem ser esperados com precisão, como, por exemplo, os exames de dosagem bioquímica rotineira no sangue ou na urina.

A verdade é que em cada desses setores analisados há situações muito complexas, como, por exemplo, o resultado de exames anatomopatológicos decorrentes de um material indevidamente retirado e enviado à análise (V. Ferreyra, Daños e prejuicios en el ejercicio de medicina, Buenos Aires: Mammurabi, 1992).

Vejamos esta decisão:

“Responsabilidade civil – Exame laboratorial – Câncer – Dano moral. Reconhecido no laudo fornecido pelo laboratório a existência de câncer, o que foi comunicado de modo inadequado para as circunstâncias, a paciente tem o direito de ser indenizada pelo dano moral que sofreu até a comprovação do equívoco do primeiro resultado, no qual não se fez nenhuma ressalva ou indicação da necessidade de novos exames. Recurso conhecido e provido” (Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n.º 241. 373-SP, 4.ª Turma, Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJU 15.05.2000, RJ 272/136).

Outra situação que tem se verificado não tão raramente é o do resultado “falso positivo” ou “falso negativo” em exames para detecção do vírus HIV e quando existe a recomendação para novo exame, principalmente quando positivo. O Tribunal do Rio Grande do Sul em caso desta natureza não reconheceu no laboratório a obrigação responsabilidade do laboratório, ainda mais quando toda técnica utilizada não mereceu qualquer censura (apud Kfouri Neto, Direito médico: implicações éticas e jurídicas na prática médica, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009). Diferente, no entanto, quando se comprova a falsa positividade em exame repetido e confirmado. Nisto fica provada a deficiência do laboratório e portanto sua responsabilidade de indenizar.

Assim se vê em:

“Responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do serviço – AIDS – Exame laboratorial que apontou falso positivo. A responsabilidade civil dos laboratórios por suposto defeito na prestação de serviços sujeita-se à norma disposta no artigo 14 do CDC, que oferece disciplina específica para o assunto. A noção de defeito na Lei n.º 8.078/1990 está diretamente relacionada à legítima expectativa de segurança do consumidor e, consequentemente, aos riscos que razoavelmente se esperam de um serviço. Nessa medida, não se considera defeituoso um exame laboratorial que, embora equivocado, adverte em seu resultado a respeito da necessidade de repeti-lo (...)” (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 10.ª Câmara, Apelação Cível n.º 700002399590, Relator Desembargador Luiz Ary Vessini de Lima, j. 06.12.2001).

A 4.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás emitiu o seguinte Acórdão em caso de erro de Exame em DNA:

Ementa: “Apelação cível. Ação de indenização por danos morais e materiais. Primeiro recurso. Inexistência de cerceamento de defesa. Exame de DNA. Erro no resultado. Ilícito comprovado. Danos morais e materiais demonstrados. Fixação. Segundo Recurso. Juros e Correção Monetária. 1 – Constando dos autos elementos de prova aptos e suficientes a formar a convicção do julgador, inexiste cerceamento do direito de defesa em face do julgamento antecipado da lide. 2 – Comprovada inadequação na informação prestada ao autor/apelado acerca do exame de DNA, acusando não ser ele o pai biológico do menor, resultado este que se comprovou posteriormente errôneo, aflora daí o direito à indenização por dano moral, ante os aborrecimentos e desconfortos por ele sofridos. 3 – A fixação dos danos morais se radica com o prudente arbítrio do julgador, em função das circunstâncias e particularidades da ocorrência, não podendo ser fixado em valor elevado que importe em enriquecimento em causa da parte ofendida, devendo ater-se aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, motivo pelo qual impõe-se a minoração do quantum fixado. 4 – Demonstrados nos autos os danos materiais sofridos pela parte autora, correta a sentença que condena o réu ao pagamento da verba indenizatória correspondente. 5 – Os juros de mora incidem a partir da citação válida e a correção monetária a partir do evento danoso. Assim, merece reparo a sentença na parte que considerou como termo inicial para incidência daquela última o ajuizamento da ação. Apelações conhecidas e providas parcialmente”. Apelação cível n.º 103.952-4/188 (200603084146).

No que diz respeito à radiologia e aos demais diagnósticos por imagem, pode-se dizer, grosso modo, que os tribunais brasileiros têm decidido no sentido de considerar responsabilidade civil objetiva quando diante de danos produzidos aos pacientes. Assim a obrigação aqui arguida é a de resultado. Afirma Oscar Ivan Prux: “Trazendo para a prática, podem ser listados, exemplificativamente, alguns casos de obrigações de resultado que são contratadas pelos diversos tipos de profissionais liberais. (...) o “radiologista” que contrata a feitura ou análise de uma ultrassonografia ou tomografia computadorizada” (A responsabilidade civil do profissional liberal no Código de Defesa do Consumidor, Belo Horizonte: Del Rey, 1998). Os serviços de radiologia, respondem pelos danos causados por erros dos radiologistas, e outros profissionais, que tenham atividade nestas clínicas.

Segundo Neri (Responsabilidade civil e penal do médico, 2. ed., Campinas: LZN, 2006, l ): “No que se refere aos radiologistas como também médicos de outras especialidades, que não possuam vínculo trabalhista com estas empresas, os serviços de radiologia poderão não conseguir se eximir, em juízo, da responsabilidade de ressarcir os pacientes que sofrerem dano em virtude das características das atividades profissionais destes nestas empresas de saúde. Isto porque, o preposto, médico radiologista ou não, estará sempre executando atividades com um objetivo específico: realizar exames médicos especializados na área da radiologia oferecidos por estas entidades”.

10.23. COMO PROCEDER DIANTE DA ALEGAÇÃO DE ERRO MÉDICO

Estima-se existirem atualmente tramitando em nossos tribunais cerca de cinco mil processos contra médicos, por alegadas más práticas no exercício profissional. Grande parte deles inclui a arguição de responsabilidade civil. Se não houver um trabalho bem articulado, os médicos, num futuro não muito distante, vão trabalhar pressionados por uma sociedade de inclinação litigiosa, voltada para a compensação, toda vez que os resultados não forem absolutamente perfeitos.

Há dois fatos que não podem passar despercebidos numa discussão como essa: primeiro, nem todo mau resultado é sinônimo de erro médico; segundo, não se deve omitir que a má prática médica exista e que os pacientes deixem de ser justamente reparados.

É também importante salientar que a boa prática médica é, sempre e sempre, decorrente de um equilíbrio entre as disponibilidades da técnica e da ciência e a arte do relacionamento médico-paciente. Nem sempre a solicitação de exames de alta complexidade é tudo. Isso não quer dizer que se deva deixar para trás o que existe de mais moderno e apropriado no atendimento às necessidades do paciente. Mas que toda essa “medicina armada”, quando é exercida sem os cuidados de um bom relacionamento profissional – notadamente quando há um resultado adverso –, não evita que o paciente busque compensação nos tribunais.

Com certeza, um paciente que tem no médico um amigo ou no profissional um confidente terá mais compreensão diante de um resultado atípico ou inesperado.

Quando o paciente diz que seu médico “não o vê como pessoa”, isto é um meio-caminho para uma possível alegação de má prática se esse resultado está aquém do desejado.

10.23.1. Algumas advertências

A primeira coisa que não deve ser esquecida pelo médico é a permissão que se passou a chamar de “consentimento esclarecido”. Nesse caso, leva-se em conta o “padrão do médico razoável” – que é o nível de informações daquilo que é comum para os outros médicos; e o “padrão do paciente razoável” – que é a informação capaz de ser entendida e que satisfará as expectativas dos pacientes nas mesmas condições socioculturais.

Desse modo, não é apenas a obtenção da assinatura do paciente, muitas vezes quando este está a caminho de uma sala de operações, mas a revelação com detalhes compreensíveis e necessários, mesmo sabendo-se que um consentimento totalmente esclarecido nem sempre é possível. O que se espera é uma explicação do diagnóstico, dos procedimentos planejados, dos potenciais de risco e benefícios, dos tratamentos alternativos e do resultado esperado. É claro que a melhor forma de ter-se um consentimento correto é através das boas relações que se venham estabelecer numa harmônica convivência médico-paciente.

Entre outros cuidados, frente às possíveis alegações de má prática médica, está a obrigação de o médico registrar os eventos e informar aos pacientes ou seus familiares, toda vez que alguma complicação de tratamento ou da prática propedêutica possa ocorrer.

Se aberto o processo judicial, mesmo que o seu andamento seja demorado, não deve ser negligenciado. A situação de revel é muito comprometedora e desfavorável. Mais: o médico não pode considerar a existência de uma alegação de má prática como sinônimo de incompetência profissional. Nem, por outro lado, deve considerar o processo uma coisa sem importância, devendo ter em todos os casos um procurador legal, sabendo que as coisas do Direito são relativas à especialidade do advogado.

Os depoimentos das testemunhas e dos especialistas são muito importantes e constituem-se em evidências que certamente serão consideradas no julgamento.

Em alguns países, diante da possibilidade de maiores prejuízos emocionais ou financeiros e do risco de condenação no julgamento, é comum as partes serem motivadas a um acordo fora do tribunal. Nem sempre é recomendável esperar pelo “dia de julgamento” para provar que não se cometeu nenhum erro. Mesmo assim, isso é uma decisão muito pessoal, devendo ser analisada caso a caso e sempre com a orientação de um procurador jurídico.

Lá, também, dá-se muito valor a testemunho dos peritos médicos, levados por ambas as partes e representados por especialistas no assunto em litígio. Ainda que em alguns casos surjam os “peritos profissionais” – que sempre estão testemunhando em tribunais e sejam bastante conhecidos dos juízes e advogados –, em tese, podem eles contribuir decisivamente nos aspectos técnicos da questão, mesmo que o mérito da causa em análise seja da livre convicção do magistrado. Entre nós, eles são chamados de “assistentes técnicos”, agora disciplinados pelas inovações da Lei n.º 8.455, de 24 de agosto de 1992. Excluíram-se desses assessores a suspeição e os impedimentos, a não ser por “evidentes e especiais motivos”; e, durante a audiência de instrução e julgamento, o juiz poderá apenas inquiri-los, optando pelos esclarecimentos diretos.

O pior de tudo é que as possibilidades crescentes de queixas contra má prática já começam a perturbar emocionalmente o médico, e que a sociedade passou a entender que isso vai redundar no aumento do custo financeiro para o profissional e para o paciente. Além disso, também se começa a notar, entre outros, a aposentadoria precoce, o exagero dos pedidos de exames subsidiários mais sofisticados e a omissão em procedimentos de alto risco, contribuindo mais e mais para a consolidação da “medicina defensiva”.

Mesmo que seja uma alternativa viável e honesta, a criação dos fundos mutuários coletivos para ressarcimento de dano não contribui para a melhoria das relações médico-paciente nem para a qualidade da assistência médica. Apenas protege os interesses patrimoniais do médico e do cliente, o que, em parte, já é alguma coisa.

10.23.2. Afinal, o que se deve fazer?

Falando sinceramente, não se tem ainda uma “receita” perfeita e acabada para solucionar tais problemas a curto prazo. Os pacientes estão sendo rejeitados, a medicina defensiva dobra seus custos de tratamento e o relacionamento do médico com seu paciente pode transformar-se numa tragédia.

Não será também por meio da criação de leis que tal questão será resolvida, nem com o protecionismo do chamado “espírito de corpo”. Infelizmente os erros existem e os pacientes não podem ser mais vítimas do que são, em consequência dos danos causados por essa forma de má prática, principalmente quando ela traz o traço indelével da negligência e da imprudência.

Todavia, pode-se afirmar que é muito importante melhorar a relação médico-paciente, pois de um relacionamento afetivo e fraterno dificilmente sai uma demanda judicial. Ela é movida pelo doente ou seus familiares, quase sempre, como uma resposta às hostilidades de uma convivência tumultuada. Depois, fazer ver à sociedade que a saúde não é uma questão exclusiva dos médicos e que deve lutar pela melhoria das condições dos níveis de vida, manifestando-se seriamente frustrada ante a crescente disparidade entre as possibilidades da ciência e o bem-estar real.

Os médicos também terão de se orientar na profissão como quem exerce um ato político, em favor dos direitos que a cidadania conquistou nas lutas organizadas. Não basta apenas modificar a relação entre o homem e a natureza, mas mudar as relações sociais. O aparelho formador, por seu turno, necessita de reformas profundas e imediatas e saber-se, pelo menos, que tipo de médico nós estamos formando. E buscar ainda as condições necessárias para um ensino público e gratuito de boa qualidade, voltado para as aspirações da hora presente.

Outra inovação advinda de países ditos avançados é o incentivo às equipes de saúde assumirem as falhas que motivaram determinado dano. Tal conduta pode mostrar-se importante como inibidora num percentual bem significativo de demandas judiciais indenizatórias. Assim, vem agindo desde 2001 o Sistema de Saúde da Universidade de Michigan.

É claro que nem sempre é fácil se admitir o erro, principalmente numa profissão em quem não se admite um mau resultado que tenha como origem a negligência e a imprudência. Todavia, verificou-se no exemplo citado uma queda bem acentuada das ações indenizatórias e a diminuição dos conflitos entre as partes.

Há quem admita que a admissão da culpa pode promover mais pendências judiciais e, por isso, a tendência é esconder os erros. Sob o ponto de vista moral, não há o que discutir no que diz respeito à aceitação da responsabilidade pelo mau resultado com pedidos de desculpas e uma possível compensação financeira ao paciente. Não há dúvida de que tal modelo traz de início uma grande rejeição por parte dos médicos, inclusive com o argumento de se estar criando uma “indústria de indenizações” e um estímulo permanente de conflitos, além do temor das punições éticas e legais ao confessarem seus próprios erros, incluindo ainda o desgaste de suas reputações. Isto certamente estimula a ocultação dos erros.

Outros entendem que admitir seus próprios erros estimula uma atitude compreensiva por parte dos pacientes e de seus familiares, criando, desse modo, uma relação de maior confiança e de maior apreço. E mais: que este procedimento seja feito não no sentido de conter uma contestação indenizatória, mas como forma correta de agir em respeito à dignidade de cada cidadão.

10.24. MEDIAÇÃO, CONCILIAÇÃO E ARBITRAGEM MÉDICA E DE SAÚDE

Muitos são os países que já adotam, como método preliminar de avaliação do mau resultado médico e de saúde, a mediação, a conciliação e a arbitragem como pressuposto dos conflitos a resolver em demandas judiciais, por livre disposição das partes.

Por mediação se entende um sistema extrajudicial e alternativo de negociação assistida, de caráter privado e informal, mediante a qual um terceiro imparcial denominado mediador ajuda as partes envolvidas em um conflito na tentativa de um acordo.

Na arbitragem, na maioria das vezes criada pelo Poder Público, existe a presença de um árbitro, tem caráter semiformal e decisão em favor de uma das partes.

Na conciliação, que pode ser privada ou pública, o conciliador funciona no sentido de ajustar os ânimos daqueles que se opõem entre si. Seus requisitos são: ato voluntário, existência da boa-fé, negociação assistida e busca de um acordo.

Os que defendem tais modelos asseguram que eles têm muitas vantagens em relação ao procedimento judicial tradicional, pois a transação é um processo inclinado a resolver um conflito fora do contencioso legal, com economia de custos processuais, respeito à confidencialidade e rapidez de resolução. Em suma, um procedimento mais rápido, mais econômico, mais discreto e mais técnico.

Os mediadores, conciliadores e árbitros, portanto, não seriam mandatários das partes, mas pessoas experimentadas e conhecedoras destes conflitos, que tentam um acordo da lide, embora as partes possam não aceitar suas razões e sua arbitragem. Todavia, quando as partes chegam a um acordo, a ata disto resultante é fundamental e decisiva na homologação do magistrado.

Na Argentina existe o Tribunal de Mediação, Conciliação e Arbitragem Médico e de Saúde, sob os auspícios do Tribunal Internacional de Conciliação e Arbitragem do Mercosul (TICAMER), com as funções de prevenção e auxílio nos conflitos na prestação de um serviço médico ou de saúde, desde que seja fundado no acordo das partes.

Estes árbitros, mediadores e conciliadores são escolhidos pelas partes. Hoje, todas as legislações arbitrais modernas impõem a mediação como etapa preliminar do processo. Também, muitos são os contratos que já incluem cláusulas com promissórias e cláusulas de compromisso arbitral que impõem às partes se submeterem à mediação e à conciliação antes de recorreram à instância judicial.

Na ata a ser firmada desta conciliação, mediação ou arbitragem deve constar: identificação das partes, capacidade que têm de contratar as questões mediadas, nome do conciliador, mediador ou árbitro, estipulação da indenização ou sua isenção.

10.25. A PERÍCIA DO ERRO MÉDICO

Certamente a avaliação do erro médico é a mais complexa e delicada tarefa da legisperícia. Os objetivos essenciais dessa avaliação pericial resumem-se em considerar o dano, estabelecer o nexo causal, considerar a existência de concausas, caracterizar as circunstâncias do ato médico, avaliar o estado anterior da vítima e estabelecer o padrão médico-legal. Já os objetivos essenciais desta avaliação pericial resumem-se em considerar o dano, estabelecer o nexo causal ou concausal e avaliar as circunstâncias e os fatores de risco em que se procedeu o ato médico. Nos casos de morte, é imprescindível a prática de uma necropsia cuidadosa, detalhada e cientificamente subsidiada por exames complementares disponíveis e aplicáveis caso a caso, em que se destaque o de natureza anatomopatológica.

Segundo o Conselho Federal de Medicina, através de seu Parecer-Consulta 19/1999, “somente o Poder Judiciário (magistratura) e os Conselhos Regionais de Medicina têm competência para, firmando o convencimento, julgar – aquele, a existência da culpa, estes, o delito ético que envolve também a ação ou omissão culposas. Sendo assim, ‘exorbita competência’ o médico legista emitir parecer, ainda que por indícios, da existência, ou não, de negligência, imperícia ou imprudência praticadas por médico, pois isto é um julgamento, missão privativa de juiz ou dos Conselhos Regionais de Medicina”.

Na avaliação qualitativa e quantitativa do dano deve-se utilizar uma metodologia onde se usem os meios médico-legais convencionais, os exames subsidiários necessários e se considerem todas as partes constitutivas do laudo pericial.

Este dano pessoal aqui considerado não é apenas aquele cujo resultado se traduz pela alteração anatômica ou funcional de uma estrutura, mas a qualquer desordem da normalidade individual. Todavia, o Conselho Federal de Medicina, através do Parecer-Consulta CFM n.º 19/1999, recomenda que os peritos “não emitam parecer, ainda que por indícios, da existência de negligência, imperícia ou imprudência, pois isto é um julgamento, missão privativa de juiz ou dos Conselhos de Medicina”. Devem, sim, analisar os resultados, de acordo com os padrões médico-legais voltados para cada pleito requerido, caracterizando o dano e avaliando suas consequências.

10.25.1. O nexo causal

A relação entre o dano e a agressão é um pressuposto de ordem técnica imprescindível e, por isso, muitas vezes a natureza do pleito não reside na qualificação ou na quantificação da lesão, mas essencialmente nas condições em que se deu a relação entre o dano e o evento lesivo.

O sentido etimológico da palavra nexo é o mesmo que se deve ter em legisperícia sobre o nexo causal. Ou seja, uma condição lógica de vínculo, de conexão, de liame ou de eminente coesão entre a ação e o resultado. Logo, não é uma situação de imperiosa certeza ou de um diagnóstico de absoluta precisão. Basta apenas que exista ligação e coerência.

Também não há necessidade que se tenha prova ou testemunho de que o evento alegado tenha existido. Enfim, se o estágio evolutivo da lesão está de acordo com a causa em questão, se este evento é idôneo para produzir tal dano e se não há outra causa aparente, em tese existe um nexo.

Entre as teorias da causalidade, a mais aceita é a da causalidade adequada (da decorrência natural e razoável das coisas ou do resultado mais provável). Esta teoria afasta as causa fortuitas e de força maior pelo seu caráter de anormalidade, atipia e imprevisibilidade. Há outras teorias: a teoria da equivalência das condições (condição sine qua non) e a teoria da última condição (verdadeira causa o efeito produzido).

O nexo de causalidade é portanto de exclusiva competência médico-legal. Assim, para se estabelecer o nexo de causalidade na avaliação do dano corporal é necessário que: a) a lesão seja produzida por determinado traumatismo, portanto, que seja real e apropriada àquelas circunstâncias; b) a lesão tenha efetivamente uma etiologia traumática; c) o local do traumatismo tenha relação com a sede da lesão; d) haja relação de temporalidade (um prazo legal e um prazo clínico), ou seja, exista uma coerência entre a idade da lesão e a ocorrência dos fatos; e) exista uma lógica anatomoclínica de sinais e sintomas típicos; f) haja exclusão da preexistência de danos relativamente ao traumatismo; g) inexista uma causa estranha à ação traumática.

10.25.2. As concausas

Deve-se entender como causa a condição provável, idônea e motivadora do resultado (imputabilidade total). Diferente, pois, da concausa, que é uma condição preexistente, concomitante ou superveniente, para que ocorra a ação de um agente ou de uma forma de energia causadora de dano (imputabilidade parcial). Na concausalidade há uma concorrência de causas, algumas delas presentes no traumatismo e outras que sobrevêm a este, quando o dano passa a ser parcialmente responsável pela ação traumática. Destarte, não se deve afastar da avaliação do nexo de causalidade o agravamento do estado mórbido anterior (úlcera gastroduodenal), os efeitos traumáticos potencializados por patologias anteriores (hemofilia) e as perturbações ou patologias por superveniência (tétano).

Há ainda situações, embora raras, em que o trauma não tem nenhuma ação sobre o mal, pois este já se encontrava em um estágio muito avançado para ser agravado (inimputabilidade).

10.25.3. Os aspectos circunstanciais do ato médico

Vale a pena afirmar que nem todo mau resultado pode ser rotulado como erro médico. Desta forma é fundamental que a perícia possa determinar se certo dano foi resultante de uma forma anômala ou inadequada de conduta profissional, contrária à lex artis, ou se isso deveu-se às precárias condições de trabalho ou à penúria dos meios indispensáveis para o tratamento ou a atenção das pessoas.

A verdade é que houve um aumento considerável da demanda dos serviços de saúde com suas mais diferentes deficiências no modo de atender, e isso não recebeu ainda por parte dos responsáveis um tratamento mais sério e mais justo. Não existem condições dignas de trabalho, o salário do médico é aviltante, a deterioração da saúde do povo é cada vez mais alarmante.

Nestes últimos anos, mesmo tendo-se com precisão o diagnóstico do processo saúde/doença do povo brasileiro, pouco se tem feito no sentido de reverter as condições de vida e de saúde da nossa população, principalmente aquela mais vitimada pelas doenças, algumas delas endemias históricas recrudescidas, diretamente vinculadas à pobreza e à miséria.

Assim, o resultado não poderia ser outro: uma qualidade de vida e uma péssima condição de trabalho.

Não quer dizer que tais condições sejam generalizadas e que todos os maus resultados sejam da responsabilidade exclusiva do sistema de saúde. Cabe, portanto, caso a caso, ter-se a devida consciência de onde surgiu o alegado resultado indesejado.

10.25.4. O estado anterior do paciente

Há casos em que, na avaliação e na valorização do dano corporal, são importantes o estudo e o registro das condições físicas e psíquicas anteriores do examinado, antes da ofensa recebida.

Assim, deve-se determinar: 1. se o trauma não agravou o estado anterior nem teve influência negativa sobre as consequências daquele; 2. se o estado anterior teve influência negativa sobre as consequências do trauma; 3. se o trauma agravou o estado anterior ou exteriorizou uma patologia latente.

Sem dúvida, a questão da avaliação do dano corporal atual sobre sequelas anteriores antigas; em certos casos, como nas questões cíveis, pode se constituir numa tarefa complexa e difícil.

10.25.5. Os padrões médico-legais

Os padrões médico-legais utilizados na perícia do erro médico variam de acordo com os interesses analisados, podendo ser de natureza penal, civil ou administrativa.

1.1. Nas questões de natureza penal buscam-se evidenciar o corpus criminis (corpo da vítima), o corpus instrumentorum (o meio ou a ação que produziu o dano) e o corpus probatorum (o conjunto dos elementos sensíveis do dano causado).

Em princípio, não se deve confundir corpo da vítima com corpo de delito. O corpo da vítima, agora considerado, tem o sentido apenas antropológico no que se refere à sua identidade. E corpo de delito como uma metáfora supondo o conjunto de elementos materiais interligados, dos quais se compõem as provas ou vestígios do fato ilícito.

O meio ou ação que produziu o dano está sempre representado por uma das modalidades de energias, destacando-se entre elas as mecânicas, físicas, químicas, físico-químicas, bioquímicas, biodinâmicas e mistas.

Por tratar-se de lesões de natureza culposa, não há necessidade de elaboração e repostas aos quesitos direcionados ao interesse do estudo das lesões de natureza dolosa. Todavia, alguns admitem que a capitulação da natureza das lesões é uma atribuição do juiz, não cabendo ao perito fazer de plano essa distinção. E por isso aconselham responder aos quesitos clássicos constantes dos formulários de laudos de exame de lesão corporal dolosa, embora muitas repartições médico-legais contem com dois modelos: A e B, sendo o primeiro referente às lesões culposas; 5.º) Se resultou debilidade permanente ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função; 6.º) Se resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou deformidade permanente. Assim, para a caracterização da quantidade e da qualidade do dano é necessário que se responda sobre as seguintes eventualidades:

1.1.1. Se do dano resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta (30) dias. Esta incapacidade não precisa ser total, bastando que restrinja o indivíduo naquilo que ele faz por hábito, independente que isto lhe traga ou não prejuízo econômico. Ela deve ser apenas real e não hipotética.

1.1.2. Se do dano resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função. Deve-se entender tal condição como um enfraquecimento ou debilitação da capacidade funcional ou de uso de um membro, de um sentido ou de uma função. A debilidade transitória não caracteriza tal situação. Assim, a avaliação do membro, sentido ou função tem um significado fisiológico e não anatômico.

1.1.3. Se do dano resultou incapacidade permanente para o trabalho. Aqui se deve considerar se o indivíduo em virtude do dano recebido está ou não privado de exercer qualquer atividade lucrativa. Ou seja, se existe uma invalidez total e permanente para exercer um ofício ou uma atividade laborativa. Também há de se distinguir se esta invalidez total e permanente é para o trabalho específico ou para o trabalho genérico. Vale apenas o trabalho genérico.

1.1.4. Se do dano resultou uma enfermidade incurável. Nesta situação, deve-se entender que o indivíduo após o dano apresentou ressentimento ou perturbação de uma ou mais funções orgânicas e de grave comprometimento à saúde, em caráter permanente.

1.1.5. Se do dano resultou perda ou inutilização de membro, sentido ou função. Agora não se considera apenas a debilidade, mas uma contingência mais grave acarretando o comprometimento máximo da funcionalidade daquelas estruturas. Tanto faz que isto seja pela perda ou ablação da estrutura lesada, como pelas suas permanências inúteis.

1.1.6. Se do dano resultou deformidade permanente. Considera-se deformidade como toda alteração estética capaz de reduzir, de forma acentuada, a estética individual. É a perda do aspecto habitual. Este dano é antes de tudo um dano moral. Suas razões são sociais e morais em razão da sua forma visível e deprimente. São características agravantes: a localização, a extensão e o aspecto. Em questões de direito público, o sexo e a profissão da vítima têm um sentido relativo.

1.2. Nas questões de natureza civil procura-se estimar o dano sofrido como bem pessoal patrimonial, a fim de reparar através de um montante indenizatório as perdas físicas, funcionais ou psíquicas causadas à vítima.

Os parâmetros desta avaliação devem incidir sobre as seguintes eventualidades:

1.2.1. Se do dano resultou incapacidade temporária. Esta incapacidade corresponde a um tempo limitado de inaptidão que vai desde a produção do dano até a recuperação ou a estabilização clínica e funcional das lesões verificadas. No primeiro caso, há a cura. E, no segundo, a consolidação. Esta forma de incapacidade pode ser total ou parcial e se traduz pelo tempo necessário para o tratamento clínico, cirúrgico ou reparador, seja em regime hospitalar ou ambulatorial.

1.2.2. Se do dano resultou quantum doloris. Durante o período de incapacidade temporária é importante que se determine o tempo de dor física resultante das lesões e de suas consequências, assim como o sofrimento moral traduzido pela angústia, ansiedade e abatimento, em face do risco de morte, a expectativa dos resultados e os danos psicológicos ante as intervenções e o destino dos negócios da vítima. Esta avaliação é eminentemente subjetiva, mas pode ser motivo da apreciação pericial e ser quantificada em níveis de pouco significante, significante, moderado, importante e muito importante. Ou ser calculado numa escala de valores que varie de 1 a 5.

1.2.3. Se do dano resultou incapacidade permanente. Este parâmetro permite consignar se o prejuízo anatomofuncional ou psicossensorial é de caráter permanente e se total ou parcial. Ela é parcial quando o dano embora duradouro não torna a vítima inválida e definitivamente incapaz para as suas ocupações ou trabalho. É total quando a vítima passa a ser assistida de forma permanente por alguém. Hoje, a tendência nas lides cíveis é avaliar o que o indivíduo ainda é capaz de produzir, dentro de uma política de “capacidades possíveis”, em vez de se fixar em tabelas em busca das chamadas “taxas de incapacidade permanente”.

1.2.4. Se do dano resultou prejuízo estético. Aqui, diferente da avaliação de natureza penal, leva-se em conta a personalização do dano, no que diz respeito ao sexo, idade, estado civil, profissão, situação anterior e comportamento da vítima em relação ao dano estético. Pode ser avaliado este dano em grau mínimo, moderado ou grave. Pode também ser classificado em prejuízo estético, deformidade e aleijão. Ou se estabelecer uma escala de valores que varie de 1 a 7.

1.2.5. Se do dano resultou prejuízo de afirmação pessoal. Significa no que alguém foi prejudicado em suas realizações pessoais e é tanto mais grave quanto mais jovem é o indivíduo e quanto mais intensas forem suas atividades de lazer, de dotes artísticos e de capacidade intelectual. Alguns admitem que este parâmetro de avaliação não é da competência pericial, deixando este “préjudice d’agrément” para a consideração do magistrado. No entanto admitimos que a escusa da avaliação pericial em tal circunstância é perder uma face muito importante da questão. Deve-se também quantificar este prejuízo através de uma escala de valor que vá de 1 a 5.

1.2.6. Se do dano resultou prejuízo futuro. Pode-se aferir também o que se chama de “prejuízo do futuro”, desde que esta avaliação não seja hipotética, mas certa. Assim, no caso de uma criança vítima de um dano por erro médico não é difícil dizer-se dos seus prejuízos e de suas frustrações, do atraso escolar e das perdas na sua formação.

1.2.7. Se do dano resultou perda de chance. Na avaliação do dano corporal de natureza civil, dentro dos chamados danos existenciais, pode ser considerada pela perícia a perda de chance (perte d’une chance). É diferente do prejuízo futuro (préjudice d’avenir), onde o dano é tido como certo, enquanto naquela o prejuízo é tão somente eventual ou hipotético. Um tipo de dano, pois, projetado no futuro.

Esta teoria é muito invocada no campo da responsabilidade médica quando se analisa a “perda de uma chance de cura ou sobrevivência”, desde que se tenha a clareza de sua efetivação futura, que exista a caracterização do nexo causal e que se possa quantificar os danos.

Sendo assim, a perícia pode apontar, até com certa precisão, as razões médico-legais que favoreçam a vítima numa perda de chance real de êxito de obter alguma vantagem.

10.26. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA

Diz-se que há responsabilidade solidária ou solidariedade passiva quando qualquer um dos sujeitos passivos venha responder juntamente com os demais com mesma intensidade em um determinado ato.

Entre os profissionais da saúde este fato tem muita importância pois se pode caracterizar ou não a existência de responsabilidade solidária entre os membros de hospital, clínica, planos de saúde, cooperativa médica, entre outros.

De forma clara enfatiza o Código Civil em seu artigo 932: “São também responsáveis pela reparação civil: (...); III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele”.

Diz ainda o artigo 7.º do Código de Defesa do Consumidor, referente à responsabilidade solidária: “Os direitos previstos neste Código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costume e equidade. Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo”.

Estabelece também o artigo 25: “É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas Seções anteriores. § 1.º Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas Seções anteriores”.

E mais no artigo 34 deste CDC: “O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos”.

Vejamos algumas situações:

1. Quando o médico faz parte do corpo clínico do hospital, o estabelecimento de saúde responde pelos danos. Esta responsabilidade do hospital pode ser vista nas seguintes situações: a) se o médico é empregado do hospital; b) se o médico é credenciado pela instituição para atender a convênios e não tem qualquer vínculo ou relação com o paciente; c) se o médico é profissional autônomo, contratado pelo próprio paciente como seu assistente particular e apenas utiliza o hospital para as atividades profissionais.

Ruy Rosado Aguiar (Responsabilidade civil do médico, RT 718/33-53, ago. 1995, p. 41) sobre tal responsabilidade do hospital diante danos causados pelos seus empregados, diz:

“O hospital firma com o paciente internado um contrato hospitalar, assumindo a obrigação de meios consistente em fornecer hospedagem (alojamento, alimentação) e de prestar serviços paramédicos (medicamentos, instalações, instrumentos, pessoal de enfermaria etc.); (...) Pelos atos culposos de médicos que sejam seus empregados, ou de seu pessoal auxiliar, o hospital responde como comitente, na forma do artigo 1.521, III, do CC. (...)”

“Em relação aos médicos que integram o corpo clínico da instituição, não sendo assalariados, é preciso distinguir: se o paciente procurou o hospital e ali foi atendido por integrante do corpo clínico, ainda que não empregado, responde o hospital pelo ato culposo do médico, em solidariedade com este; se o doente procura o médico, e este o encaminha à baixa no hospital, o contrato é com o médico e o hospital não responde pela culpa deste (...). A responsabilidade pela ação do integrante do corpo clínico, na situação primeiramente referida, explica-se porque a responsabilidade por ato de outro, prevista no artigo 1.521, III, do CC (é responsável o patrão, amo ou comitente, por seus empregados, serviçais e preposto), abrange também aquelas situações onde não existe uma relação de emprego, bastando que a pessoa jurídica utilize serviços de outra através de uma relação que gere o estado de subordinação (Orlando Gomes, Obrigações, Forense, 1978, p. 362). É o caso do hospital, que para seu funcionamento necessita do serviço do médico, o qual, por sua vez, fica subordinado, como membro do corpo clínico, aos regulamentos da instituição”.

2. Quando o médico não tem nenhum vínculo com o hospital e apenas usa suas dependências: o hospital não responde. Nesta situação “o hospital só é parte legítima para responder pelos danos sofridos por paciente que se submeteu a intervenção cirúrgica em suas dependências, e da qual resultaram sequelas, em razão de erro médico, se o profissional mantiver vínculo de preposição ou integrar a estrutura hospitalar. Médicos que foram escolhidos pelo paciente e que não possuem vinculação com o nosocômio, além do credenciamento para utilização de suas dependências”. Neste caso, o hospital não responde pelo ato danoso do médico (TJRS, AI 70023449812, 24.03.2008). Todavia, há posições contrárias:

“Processual civil. Tutela antecipada. Ação de indenização por danos morais e materiais – Lesão decorrente de cirurgia – Dano físico irreparável – Tratamento psicológico – Pensionamento – Pagamento de prótese – Trocas frequentes – Lesão decorrente de erro médico – Mera locação pelo hospital do espaço e dos equipamentos – Culpa inconteste do estabelecimento – Agravo provido – Unânime. (...) Lastimável a tentativa do hospital de se caracterizar como simples locador de espaços e equipamentos. Sua atividade, frise-se, envolve, também, o fornecimento de pessoal, de medicamentos, de exames, de portaria, de segurança, de higiene e limpeza, de alimentação e outros itens necessários à realização da sua atividade fim, que é a assistência à saúde, de interesse público, como preconizado no artigo 197 da Constituição Federal, e isso mediante remuneração. Resta, pois, inconteste a culpa do hospital, bem como sua legitimidade para figurar no polo passivo da ação, sendo defeso a este tribunal, no momento, analisar as demais questões versadas no recurso, eis que dependentes de provas, a serem produzidas na ação principal” (TJDF, 4.ª Turma Cível, AGI 20000020035717, Ac. 137648/DF, Rel. Des. Lecir Manoel da Luz, j. 02.04.2001) (g.m.).

Kfouri Neto (Responsabilidade civil do médico, 6. ed., São Paulo: RT, 2007) não concorda com essa “extensão desmesurada da responsabilidade dos hospitais”. Segundo ele, se o hospital não prestou nenhum serviço ao paciente, a não ser recebê-lo, e não resultou nenhum dano – sem se configurar defeito do serviço pela instituição –, torna-se inviável, portanto, atribuir-lhe responsabilidade solidária.

Nestes casos, o que se verifica é tão só a responsabilidade do profissional que simplesmente se utilizou das instalações do hospital. Em sendo assim nada mais justo quem exigir-se deste profissional o cumprimento de seus deveres e obrigações de conduta quando do exercício de suas atividades.

3. Quando da relação cooperativa médica-cooperado: responsabilidade solidária. Nos danos causados no paciente pelo médico cooperado responde a cooperativa, principalmente tendo em conta a relação de especialistas que esta instituição coloca à disposição dos aderentes de seus planos. Ela passa a ser uma verdadeira fornecedora de serviços de saúde e, portanto, não pode fugir do polo passivo da ação indenizatória. Com muita mais razão se o paciente foi atendido em prédio da cooperativa, por médico em regime de plantão ou de ambulatório e vinculada a tal instituição.

“Responsabilidade civil. Erro médico. UNIMED. Legitimidade. Dever de indenizar. Inocorrência. Tendo sido o autor atendido na sede da cooperativa demandada (UNIMED), em regime de plantão, por médico a ela vinculado, é possível considerá-la como parte legítima para responder por eventual dano sofrido por aquele. No caso concreto, no entanto, ainda que o profissional da medicina não tenha realizado o diagnóstico correto, não houve prejuízo à recuperação do paciente, considerando, inclusive, a prudente recomendação de retorno para atendimento por médico especialista. Preliminar rejeitada. Apelo improvido” (TJRS, 10.ª Câmara Cível, Apelação Cível n.º 70017627001, Rel. Luiz Ary Vessini de Lima, j. 22.03.2007).

No STJ:

“Civil e processual. Ação de indenização. Erro médico. Cooperativa de assistência de saúde. Legitimidade passiva. CDC, artigos 3.º e 14.

I. A Cooperativa que mantém plano de assistência à saúde é parte legitimada passivamente para ação indenizatória movida por associada em face de erro médico originário de tratamento pós-cirúrgico realizado com médico cooperativado.

II. Recurso especial não conhecido”.

Cooperativa e hospital: ambos respondem.

Tanto o hospital que presta os serviços de saúde como a cooperativa que os contrata respondem solidariamente.

“Responsabilidade civil. Erro médico. Legitimidade. Hospital. Verificação. Dever de indenização. Inocorrência. O hospital que fornece serviço de plantão é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda indenizatória promovida em razão de suposto erro médico, ainda que, formalmente, este profissional esteja vinculado apenas ao convênio (UNIMED) e não pertença ao seu quadro funcional. Teoria da aparência, em que o consumidor dos serviços procurou o nosocômio, sendo que o profissional da saúde que o atendeu, embora vinculado ao plano de saúde, utilizou-se de toda a estrutura lá existente. No mérito, entretanto, o médico demonstrou que agiu de modo prudente, sem incidir em qualquer das modalidades culposas (negligência, imprudência ou imperícia), com o que se afasta a responsabilidade do profissional liberal (CDC, artigo 14, § 4.º). Em sendo assim, considera-se que inexistiu defeito na prestação do serviço, com o que se afasta a responsabilidade do hospital (CDC, artigo 14, § 3.º, I). Preliminar acolhida. Apelo parcialmente provido” (TJRS, 10.ª Câmara Cível, Apelação Cível n.º 70017188277, Rel. Luiz Ary Vessini de Lima, j. 08.03.2007).

4. Quando o médico trabalha em hospital público como empregado ou de forma conveniada. Ao se tratar de médico que trabalha em hospital público, dispõe o artigo 37, § 6.º, da Constituição Federal: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa” e diz o artigo 43 do Código Civil em vigência: “As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos de seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo”. A não ser que exista um dos excludentes da responsabilidade: culpa da vítima ou de terceiros, caso fortuito, ausência de nexo causal e força maior.

Diz Ruy Rosado de Aguiar: “Os hospitais públicos, da União, Estados, Municípios, suas empresas públicas, autarquias e fundações, estão submetidos a um tratamento jurídico diverso, deslocadas suas relações para o âmbito do direito público, especificamente ao direito administrativo, no capítulo que versa sobre a responsabilidade das pessoas de direito público pelos danos que seus servidores, nessa qualidade, causem a terceiros. (...) Adotou-se o princípio da responsabilidade objetiva, cabendo ao Estado o dever de indenizar sempre que demonstrada a existência do fato, praticado por agente do serviço público que, nessa qualidade, causar dano (é a responsabilidade pelo fato do serviço), eximindo-se a Administração, total ou parcialmente, se provar a força maior, o fato necessário ou inevitável da natureza, ou a culpa exclusiva ou concorrente da vítima. (...)”.

Todavia, a jurisprudência não é tão pacífica a este respeito, mesmo que a maioria fique do lado da responsabilidade objetiva.

No STJ:

“1 – A responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação técnico-profissional dos médicos que neles atuam ou a eles sejam ligados por convênio, é subjetiva, ou seja, dependente da comprovação de culpa dos prepostos, presumindo-se a dos preponentes. Nesse sentido são as normas dos artigos 159, 1.521, III, e 1.545 do Código Civil de 1916, e, atualmente, as dos artigos 186 e 951 do novo Código Civil, bem com a súmula 341 – STF (É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.). 2 – Em razão disso, não se pode dar guarida à tese do acórdão de, arrimado nas provas colhidas, excluir, de modo expresso, a culpa dos médicos e, ao mesmo tempo, admitir a responsabilidade objetiva do hospital, para condená-lo a pagar indenização por morte de paciente. 3 – O artigo 14 do CDC, conforme melhor doutrina, não conflita com essa conclusão, dado que a responsabilidade objetiva, nele prevista para o prestador de serviços, no presente caso, o hospital, circunscreve-se apenas aos serviços única e exclusivamente relacionados com o estabelecimento empresarial propriamente dito, ou seja, aqueles que digam respeito à estada do paciente (internação), instalações, equipamentos, serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia) etc. e não aos serviços técnico-profissionais dos médicos que ali atuam, permanecendo estes na relação subjetiva de preposição (culpa). 4 – Recurso especial conhecido e provido para julgar improcedente o pedido” (STJ, REsp 258.389-SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 22.8.2005, p. 275).

No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

“(...) Restou decidido ser prescindível, para caracterizar a responsabilidade do fornecedor, nos termos do que estabelece o citado artigo, que tenha ocorrido defeito relativo à prestação do serviço, ou seja, a culpa do preposto do estabelecimento que forneceu o atendimento, notadamente no ramo da atividade médica, que é uma obrigação de meios, não de resultado. Tal fundamento há de ser igualmente aplicado às pessoas jurídicas de direito público no caso específico dos estabelecimentos hospitalares, que são fornecedores de serviços de saúde, que é essencial e constitucionalmente protegido – artigo 198 da CF. Trata-se de direito de todos e dever do Estado, a ser executado pelas empresas públicas ou privadas pelo comando constitucional. (...). A responsabilidade dos hospitais será objetiva somente no que se refere diretamente aos serviços prestados pelo estabelecimento, ou seja, aqueles que digam respeito à internação, às instalações físicas, aos equipamentos, aos serviços auxiliares, como enfermagem, exames, radiologia etc., e não aos serviços profissionais dos médicos que ali atuam ou que prestem serviços ao estabelecimento. Para estes, a responsabilidade será subjetiva, isto é, dependerá da comprovação da culpa no procedimento médico. Assim, o dever de indenizar da entidade empregadora, em princípio, apenas pode ocorrer quando provada a culpa ou o dolo do profissional de saúde, o nexo causal e o dano. (...)” (TJRJ, 5.ª Câm. Cív., Ap. Cív. n.º 2007.001.49752, Rel. Des. Antonio Saldanha Palheiro).

10.27. RESPONSABILIDADE DO PACIENTE OU DE TERCEIROS

Dentro do universo da responsabilidade médica, seja ela de ordem legal ou ética, há de provar o dano ao paciente, a culpa do profissional e o nexo de causalidade. Todavia, pode ocorrer, mesmo em situações mais raras, que a culpa alegada seja do próprio paciente ou de terceiros.

Sendo assim, registram-se situações em que o resultado adverso do tratamento médico teve como causa o descumprimento às recomendações sobre cuidados ou procedimentos que seriam imprescindíveis e incondicionais para a devida cura, que vão desde uma alta por abandono a uma suspensão precoce de remédios, entre outros.

Não é exagerado dizer-se que, assim como os médicos têm obrigações a cumprir dentro da relação profissional, o paciente também tem suas obrigações no cumprimento de cuidados com as condutas e prescrições a seguir. Até já se disse que, igual aos médicos, os pacientes têm obrigação de meios, contribuindo para a obtenção de um bom resultado em favor de sua vida e de sua saúde. Ou seja, a obrigação dos pacientes é no sentido de criar as melhores condições possíveis para a cura de suas doenças. É claro que o paciente não pode assumir uma obrigação de resultado.

Na obrigação do paciente, deve-se incluir o fiel cumprimento da prescrição quanto à dosagem, ao horário e ao tempo de medicação, as medidas e cuidados recomendados, a dieta prescrita e a orientação tanto na sua duração como na forma de internamento.

Com esse pensamento, toda vez que o paciente cobrar do médico por um mau resultado deve deixar claro que cumpriu todas as orientações de procedimentos e condutas recomendados e que não teve nenhuma responsabilidade por tal resultado. Por outro lado, quando se culpar o paciente por um resultado atípico ou indesejado, é sempre necessário que se prove o dano, a culpa e o nexo de causa e efeito devidamente comprovado.

Uma das formas de negligência do paciente é a suspensão ou a alteração da prescrição médica ou o abandono dos cuidados e das condutas prescritos, seja por deliberação própria ou por sugestão de terceiros, muitas vezes, diante dos primeiros sinais de melhora.

O elemento mais significativo na avaliação da responsabilidade do paciente ou de terceiros é a comprovação da existência do nexo de causalidade. A existência ou o agravamento de um dano após a realização de um ato médico não é suficiente para se atribuir culpa sua.

Esta relação entre o dano e o ato praticado é um pressuposto de ordem técnica e de imprescindível apreciação médico-pericial. Deve ser uma condição lógica de vínculo, de conexão, de liame ou de eminente coesão entre a ação e o resultado. Mesmo que não seja uma situação de imperiosa certeza ou de um diagnóstico de absoluta precisão, exige-se que existam ligação e coerência. Para se provar que houve culpa do paciente ou de terceiros, é necessário que se prove que a sua ação é a responsável pelo dano surgido ou agravado, pois só assim far-se-á a prova da excludente de responsabilidade do médico.

O Código Civil em vigor, em seu artigo 945, leva em conta a responsabilidade da vítima de erro médico quando diante de uma pretensa indenização: “Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”.

Desta forma, fica bem evidente que, existindo culpa do paciente, isto será levado em conta na quantificação indenizatória em ação contra médico, sendo esta sua responsabilidade parcial ou total.

Por fim, fica claro que, comprovada a responsabilidade do paciente ou de terceiros, fica o médico demandado isento de reparação dos danos materiais e existenciais. E, se o médico se julgar ofendido pelos danos patrimoniais ou extrapatrimoniais causados pela falsa imputação, acreditamos que tem ele o direito de pleitear uma indenização contra o paciente.

10.28. RESPONSABILIDADE TRABALHISTA E RESIDÊNCIA MÉDICA

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou nula a condenação imposta pela Justiça do Trabalho a uma Clínica de Campinas (SP), em reclamação trabalhista movida por médica residente para o pagamento de bolsa-auxílio. Nesta decisão o argumento foi de que a residência médica é atividade vinculada ao ensino, e não uma relação de trabalho – fora, portanto, da competência da Justiça do Trabalho, definida no artigo 114, inciso I, da Constituição Federal. O Tribunal Regional do Trabalho da 15.ª Região (Campinas/SP) havia entendido de forma diferente e, por isso, concluiu pela condenação da clínica ao pagamento de bolsa mensal de residência médica, no valor de R$ 1.916,45, parcelas vencidas e vincendas, até a conclusão do programa, nos termos do artigo 38 da Resolução n.º 02/2005 e do art. 3.º, § 3.º, da Resolução n.º 3/2007 da Comissão Nacional de Residência Médica, do Ministério da Educação.

O Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, relator do recurso, buscou embasamento no artigo 1.º da Lei n.º 6.932, de 1981, que define a residência médica como modalidade de ensino de pós-graduação, sob a forma de curso de especialização. O relator observou que, sendo essa uma atividade vinculada ao ensino, “não reúne trabalhador à pessoa física ou jurídica que o remunere, essencialmente, pelo serviço prestado, assim recusando a qualificação de relação de trabalho”.

A Terceira Turma, convencendo-se da incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a ação, conheceu do recurso da clínica e determinou o encaminhamento dos autos à Justiça Comum do Estado de São Paulo.

10.29. RESPONSABILIDADE DOS BANCOS DE DADOS DE DNA

Mesmo que não seja da responsabilidade direta do médico, pois esses bancos de dados de DNA sempre fazem parte de uma política de governo, podem ter entre seus operadores profissionais médicos em suas coletas e práticas laboratoriais.

Já circulam em nossas casas legislativas federais alguns desses projetos permitindo armazenar material genético em banco de dados de suspeitos, indiciados ou autores de crimes mais graves e que tenham seu DNA disponibilizado às autoridades que conduzem o Inquérito Policial. Há até quem proponha que não apenas autores de crimes hediondos devam ser submetidos a esse tipo de coleta, pois “poderia soar discriminatório e muito restritivo”.

Para muitos, esse projeto é inconstitucional a partir da coerção para se obter aquelas amostras, pois ninguém é obrigado a criar provas contra si mesmo fornecendo, numa investigação criminal que se inicia, material orgânico que possa fazer prova em seu desfavor. Na realidade, a Convenção de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, em 1969, pontificou em seu artigo 8.º que ninguém é obrigado a “depor contra si mesmo nem confessar-se culpado”. A Constituição Federal segue esta mesma linha.

Em tese, o que se discute não é o uso adequado do perfil genético de um indivíduo numa investigação criminal, mas a sua guarda em um banco de dados que permanecerá até terminar o prazo de prescrição do crime atribuído ao identificado. Assim, por exemplo, se alguém foi acusado de crime de homicídio, seu material genético ficará armazenado por, no mínimo, 20 anos.

Como se deve proceder quando o indivíduo alvo deste método de armazenamento não aceitar ou resistir à coleta do material orgânico? Constrangê-lo pela força bruta? Há um dos textos, em parte já aprovado numa das casas legislativas, admitindo que os investigados por crimes violentos ou hediondos sejam “obrigatoriamente” identificados por meio da coleta de material genético por meio de “técnica adequada e indolor”.

O indivíduo não está obrigado a fornecer provas contra si mesmo, mas, a exemplo da prova de paternidade, tem-se considerado a recusa como uma confissão de culpa. Isto não é de todo correto, pois, em outro tipo de processo, o julgador deve se convencer com outras provas dentro do processo. Não seria nenhum favor se o magistrado viesse a proceder da mesma forma nos casos de paternidade.

Muitos até chegam a propor um banco de dados de DNA para todos os cidadãos brasileiros e estrangeiros naturalizados ou com visto de permanência em nosso país, mesmo que para tanto se alterassem algumas garantias constitucionais. Isto, para seus defensores, “traria soluções não só para crimes, mas para outros tipos de problema”. E ainda defendem a criação desses bancos de dados com o argumento da possibilidade da identificação de pessoas vítimas de acidentes coletivos e catastróficos. Não se deve esquecer, no entanto, que quanto mais bancos de dados de perfis genéticos forem criados, maiores serão os riscos de violação do sigilo e do uso indevido das informações.

Mesmo que a sociedade venha exigindo das autoridades competentes meios e instrumentos de investigação mais eficientes na luta contra uma delinquência tão assustadora e progressiva, isto não justifica a utilização de meios arbitrários e ilegais que outra coisa não fariam senão aumentar esta mesma violência.

Não se pode dizer também, como quem procura aliviar a consciência, que esta metodologia de armazenamento de dados seja apenas uma leve ofensa ao direito de intimidade de um indivíduo em troca de uma série de ofensas que a sociedade tem sofrido. A criação desses bancos de dados, mesmo com o intuito de inibir e reprimir a criminalidade, por meio de coleta obrigatória, é uma prática que deve ser bem profundamente avaliada, pois pode colidir frontalmente com as liberdades individuais.

Na época da coleta do material genético, quando o indivíduo é ainda suspeito ou indiciado, faz-se com que a norma proposta permita a “punição por prevenção”. E ainda dar a entender ao investigado e à sociedade que as pessoas estão sempre propensas ou na iminência de cometerem outras infrações. Incluir alguém suspeito em um banco de dados de DNA afronta o princípio da presunção da inocência.

Algumas entidades de direitos humanos discordam desta política de retenção de material genético em bancos de dados. Em 2008, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos decidiu por unanimidade que a prática do Reino Unido de manter amostras genéticas de presos invade a privacidade do indivíduo e de sua família e que parte considerável desses suspeitos, no final da apuração, era de pessoas sem qualquer culpa.

Há ainda aqueles que condenam a prática de armazenamento do perfil genético mesmo a partir de amostras biológicas provenientes de provas encontradas no local do delito e que este material venha a ser incorporado a uma base de dados para seu uso em qualquer tipo de investigação.

10.30. ALTA HOSPITALAR

A alta hospitalar é um ato médico de tanta importância quanto os demais no conjunto da atividade deste profissional junto aos seus pacientes. Esta assistência compreende um período de tempo que vai desde a primeira consulta até a tomada de decisão de o paciente continuar seu tratamento em domicílio, ambulatório ou no próprio consultório de seu médico assistente.

O responsável por esta alta deve ser o médico assistente. Acreditamos que, mesmo que o paciente esteja provisoriamente aos cuidados de outro profissional especializado, como, por exemplo, de um intensivista, a alta final é daquele que começou o tratamento, A não ser que ele tenha transferido o paciente para outro colega. Quando internado nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), o paciente deve ter um médico responsável, além do intensivista, e cada medida tomada, entre elas a alta, deve ter também sua participação (ver Parecer-Consulta CFM n.o 04/1990).

Deve-se levar em conta ainda que o paciente tem o direito de solicitar sua transferência para outro hospital, cabendo ao médico assistente apenas avaliar suas condições, ponderar essa alta aceitando-a ou advertindo a respeito de sua inconveniência (Código de Ética Médica: É vedado ao médico: Artigo 24. Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo; e Artigo 31. Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte).

É consenso que o paciente, não estando em perigo de vida ou com risco de agravamento de seu estado quando de sua transferência ou alta, sendo ele maior de idade e tendo plena capacidade de autodeterminar-se, não há o que se opor. Pode exigir dele ou dos familiares um termo de responsabilidade, depois de informações claras sobre possíveis consequências. Deve-se também registrar em prontuário tal ocorrência.

Nos casos de perigo de vida ou sério agravamento das condições do assistido, pode o médico usar os meios moderados e necessários para impedir essa alta. Não se constitui constrangimento ilegal “a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida” (CP, art. 146, § 3.º, I). Tratando-se de menores de idade, deve o hospital notificar tal procedimento ao Conselho Tutelar e ao Juízo da Infância e Juventude que, por certo, tomarão uma decisão que venha atender da melhor forma aos interesses do menor.

Entendemos que a chamada “alta a pedido” tecnicamente não existe, pois, quando o paciente contraria orientação médica, deixando o hospital, deve ser considerado esse gesto como “abandono do tratamento”. E assim deve ser registrado no prontuário. Quando o médico aceita as ponderações do paciente ou de seus familiares, e após avaliação criteriosa der a alta, não há que negar tratar-se de uma “alta médica”. E mais: se a alta é permitida pelo médico, dispensa-se o chamado “termo de responsabilidade”.

Deve ficar bem claro que a finalidade do consentimento livre e esclarecido tem como proposta a proteção dos direitos de cidadania do paciente e jamais para ser utilizado como meio de suprimir a responsabilidade do médico ou do hospital. No Parecer-Consulta CFM n.º 30/2000, sobre “consentimento pós-informado” (documento assinado pelo paciente ou seus responsáveis legais, consentindo ao médico a realização de determinado procedimento ou conduta após haver recebido informações), o Conselho Federal de Medicina mantém uma postura respeitosa e compreensiva com os médicos e sociedades de especialidade que adotem o consentimento pós-informado, mas não recomenda o seu uso como norma.

Por outro lado, certos termos de responsabilidade exigidos no momento da internação por alguns hospitais, em que o paciente ou seus familiares atestam anuência aos riscos dos procedimentos que venham a ser realizados durante sua permanência nosocomial, não têm nenhum valor ético ou legal. E, se tal documento foi exigido como condição imposta para o internamento, numa hora tão grave e desesperada, até que se prove o contrário, isso é uma indisfarçável coação.

No que se refere ao consentimento livre e esclarecido, duas coisas devem ficar bem claras quando da avaliação judicial: 1. o consentimento esclarecido não suprime nem ameniza a culpa médica por negligência ou imprudência; 2. o que verdadeiramente legitima o ato médico não é apenas sua indiscutível, imediata e inadiável intervenção. Em suma: entender que, mesmo tendo o médico um termo de responsabilidade escrito, isto, por si só, não o exime de responsabilidade, se provados a culpa e o dano em determinada alta.

A questão do consentimento livre e esclarecido entre os médicos é um fato que está bem equacionado no que diz respeito a nossas normas deontológicas, a partir do Código de Ética Médica e dos pertinentes Pareceres e Resoluções do Conselho Federal de Medicina. Todavia, não há uma regulamentação específica em nosso sistema jurídico. No que diz respeito à ordem jurídica, ele é visto como uma manifestação da vontade e da livre concordância entre as partes de uma relação, ou seja, a autonomia que têm as partes nas relações jurídico-privadas que caracterizam um contrato.

Para alguns, se não existir nexo causal entre o dano e a falta de obtenção do consentimento esclarecido, inexiste a responsabilidade. Entendem que a não advertência ao paciente sobre possíveis riscos numa conduta médica só pode ser entendida como de relevante importância se ficar provado que a omissão de informações poderia ter evitado um determinado dano.

No entanto, há registro em nossa jurisprudência que médicos foram condenados em ações civis por não terem informado aos seus pacientes os riscos de uma conduta ou de uma intervenção médica mesmo que não tenha se verificado nenhum dano. O paciente seria reparado não pelos danos físicos ou psíquicos, mas pela ofensa a sua autonomia quando omitidas as devidas informações. Por exemplo: deixar o médico de informar ao paciente sobre condutas a serem seguidas pelo próprio paciente. Assim ocorreu quando o Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou um hospital e um médico a indenizarem, solidariamente, uma paciente pelo fato de não ter sido informada sobre a possibilidade de poder engravidar após cirurgia de laqueadura de trompas, mesmo sem ter engravidado.

O relator do processo no Tribunal deixou claro que a condenação “não decorreu de erro no procedimento cirúrgico adotado pelo médico quando da laqueadura das trompas da paciente, mas sim do fato de que o profissional não esclareceu a ela que haveria possibilidade de engravidar novamente, mesmo que minimamente, denotando a existência de falha no dever de informação associado à atividade do profissional” (TJMG, 11.ª Câmara Cível, Número do processo: 1.0431.06.030997-5/001(1), Relator Afrânio Vilela).

10.31. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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