5

Família

LEVAR AS COISAS PARA O LADO PESSOAL

Pergunta:

Tenho muita prática em não tomar as coisas pelo lado pessoal. No entanto, continuo a ter problemas quando dizem algo negativo ou ofensivo sobre um membro da minha família ou algum amigo íntimo. Imediatamente começo a entrar numa atitude defensiva. Como posso lidar com isso?

Resposta:

As pessoas muito ligadas à família têm um sentimento abrangente de identificação com os parentes. Isso pode torná-las mais sensíveis ou defensivas com relação a pretensas ameaças ou agressões aos familiares, embora essas coisas já não sejam ameaças para você, pessoalmente. Contudo, esse apego também é um desvio do ego. Nós ainda baseamos nossa identidade em nossa família, nossa tribo, nossa nação, nossa religião etc. Quando já não temos mais nenhuma necessidade de nos defender da negatividade ou das ofensas, isso mostra que não nos identificamos com esse aspecto de nós que está sendo atacado. Sabemos que somos a testemunha silenciosa que não pode ser afetada por uma agressão ou ameaça. Portanto, para perder a atitude defensiva sobre a família ou qualquer outra área de identificação do ego, precisamos encontrar essa testemunha silenciosa que transcende todas as identificações limitantes. A partir deste ponto, nós conhecemos nosso verdadeiro Ser e sabemos que essa parte verdadeira de nós não pode ser ferida; portanto, não precisa de defesa.

MEDO DE MUDAR

Pergunta:

Quero me mudar para um país estrangeiro e construir um lar. Sou um norte-americano mais velho. Tenho muitos medos e vou ficar longe da minha família.

Como tomar uma decisão que não tenha por base o medo, mas o bom senso e a realização dos meus desejos?

Resposta:

Para começar, pode ser interessante ter clareza sobre o que exatamente o motiva a se mudar para um país estrangeiro e por que vale a pena deixar a família e superar o medo envolvido na mudança. Ter consciência do motivo pelo qual a mudança é importante para você pode tornar mais fácil dar os passos necessários para realizá-la. Também pode ser que descubra que para você a mudança não é tão importante quanto viver perto da família. O segredo é ter clareza sobre seu propósito e basear sua decisão nele, e não no medo.

PREOCUPAÇÃO

Pergunta:

Como podemos não ter preocupação pelas pessoas que amamos? Essa época do ano é cheia de reuniões de família e de amigos e, apesar dos muitos momentos felizes, não consigo deixar de me preocupar com a saúde, os relacionamentos e os problemas financeiros enfrentados por minha irmã, minha mãe, meu sogro e outros. A preocupação com essas coisas não resolve nada, mas não consigo evitá-la. Alguma sugestão?

Resposta:

Quando se preocupa com adultos por quem você já fez tudo o que podia, então, apesar de amá-los, você também acredita que o projeto de vida deles está errado. Quando você se preocupa nessas circunstâncias, revela uma desconfiança intrínseca sobre a capacidade da inteligência cósmica do universo para dar a seus amados exatamente o que eles precisam na hora certa. A preocupação mostra que, se alguma coisa desagradável ou complicada acontecer a seu sogro, isso deve ser um sinal de que algo está errado. Na verdade, muitas vezes as maiores alegrias, conquistas e forças nos vêm de enfrentar os desafios da vida quando eles surgem.

Dessa forma, da próxima vez que começar a se preocupar, analise o que você está presumindo sobre a vida deles: que você sabe mais do que o Ser maior deles sobre o que eles precisam agora. Isso pode ser verdadeiro no caso dos pais de uma criança pequena, mas essa não é sua situação. Mesmo que você não acredite que a vida deles está sendo guiada por uma inteligência maior que a sua, pelo menos reconheça que você na verdade não sabe quais são as experiências de vida mais necessárias para a evolução espiritual deles. Portanto, não adianta ter medo de que aconteçam as experiências erradas. Saiba que seu amor é um bem garantido na vida deles, portanto dê-lhes muito amor, em vez de preocupação.

IRMÃO MAIS NOVO

Pergunta:

Há mais ou menos dois anos recebi o diagnóstico de tumor cerebral maligno grau 3. Depois de muitos meses numa jornada muito esclarecedora, felizmente meu câncer entrou em remissão, pois adotei a sabedoria encontrada em muitos dos seus livros maravilhosos, principalmente A cura quântica e SynchroDestiny. Li muito sobre o assunto, investigando a teoria das cordas/supercordas e a teoria “M”, o que evoluiu para uma teoria pessoal das cordas que sugere uma re-harmonização da alma; depois disso as células do corpo podem receber a saúde e a cura. Nada de novo aí, mas por ter experimentado pessoalmente o poder da cura, estou convencido da existência do mundo maior invisível a centímetros da nossa visão. Acredito que redescobri meu equilíbrio e que a cura foi a recompensa que recebi quando pedi.

Infelizmente, a doença levou meu irmão mais novo a tal estado de sofrimento e impotência que sua raiva e sua dor são dirigidos a mim e a meus pais. Ele é uma boa pessoa, mas uma infância difícil endureceu seu coração para o amor, o maior presente de Deus para o homem. Temo que muito em breve ele seja levado pelo ego e pelo medo a se afastar de mim, de minha mulher, de nossa família e, finalmente, de todos os que o amam muito, mas são incapazes de lhe tocar o coração para expressar amor e ajudá-lo nesse momento difícil. Ele parece me culpar por ter ficado doente e, embora ele reconheça a possibilidade de sua má vontade causar danos a outra pessoa, não sei como alcançá-lo sem deixá-lo ainda mais decidido a desaparecer intencionalmente de nossas vidas. Sei que cada um de nós tem um caminho a seguir e talvez esse seja o dele, portanto, existe uma maneira de reacender o amor dele para que, mesmo decidido a levar a vida sem nós, ele saiba que o amor existe?

Além disso, tenho uma teoria maluca de que meu câncer na verdade passou do meu irmão para mim para que eu pudesse salvá-lo e começar minha própria jornada. Sempre digo que somos as diferentes faces da mesma moeda e que ele é o lado escuro, e gostaria de saber se em toda a sua vasta experiência você encontrou uma história como essa. Meu pobre irmão está tão cheio de ódio que só posso rezar para que nenhuma doença nova surja em nenhum de nós dois, já que agora preciso me afastar dele para minha própria proteção.

Resposta:

Espero que você possa continuar sua plena recuperação da saúde. Parece que seu irmão precisa se afastar da família nesse momento, e você também diz no final de sua carta que tem de se distanciar dele para seu próprio bem. Tudo isso está perfeitamente correto. Às vezes essas são as circunstâncias necessárias para a cura, mesmo que elas não combinem com a imagem da família feliz e apoiadora que gostaríamos de ter. É suficiente você ter expressado todo o seu amor e apoio a seu irmão, seja qual for o caminho que ele escolha. Você não tem o poder de remover a raiva, o medo e a má vontade dele, e é assim que as coisas devem ser. Elaborar essas questões é parte do crescimento dele, e então ele instintivamente sabe que precisa delas até que o processo se complete. Ele vai se ressentir da interferência de qualquer um, mesmo você, que procure resolver esses “problemas” antes que ele tenha chegado à posição de estar realmente pronto para lidar com essas coisas nos próprios termos. Naturalmente, é mais fácil quando os parentes reconhecem que precisam de ajuda e quando pedem ajuda, mas quando eles negam essa necessidade e nos afastam deliberadamente, é importante que você receba a mensagem e carinhosamente dê a eles o espaço de que precisam.

PAIS INSANOS

Pergunta:

Já ouvi dizer que os amigos são a maneira pela qual Deus se desculpa pelos parentes que nos deu. Nesse momento, nada me parece mais verdadeiro.

No outono vou sair da casa dos meus pais para começar a universidade. Por alguma razão, essa transição não está acontecendo de forma suave — pelo menos para meus pais. Nos últimos tempos, parece que não conseguimos levar uma simples conversa sem alguém ficar furioso e gritar; quase sempre alguém acaba chorando. Eles parecem estar sempre pisando em ovos, e ficam muito perturbados se eu saio de casa para resolver qualquer problema. Nós discutimos pelas questões mais ridículas. Minha mãe chegou a jogar meu telefone celular em mim quando cheguei em casa, pois eu havia esquecido de ligar para ela. Antes, eles nunca foram assim. Eu acredito que o real motivo desses choques recentes (isso começou há alguns meses e está ficando cada vez pior) é a dificuldade que eles sentem porque estou me mudando. Sou o filho mais novo, e sei que eles devem estar muito emotivos nesse momento, mas as atitudes deles têm prejudicado seriamente nosso relacionamento. De início, eles me disseram que queriam que eu estudasse sem sair de casa, mas consegui uma bolsa de estudos que paga as anuidades e (contra a vontade deles) preferi usar minha reserva de dinheiro para morar fora de casa.

Eu me lembro de que quando meu irmão saiu de casa, há alguns anos, aconteceu a mesma coisa, só que agora parece que eles estão piores. Quando meu irmão saiu, todas as emoções culminaram numa discussão violenta que terminou com uma porta sendo batida, e nenhum de nós teve notícias de meu irmão durante vários meses. Eles o obrigaram a ficar em casa e frequentar uma universidade próxima, portanto ele só se mudou quando tinha 22 anos. Mesmo agora, dois anos mais tarde, o relacionamento do meu irmão com meus pais continua difícil, e tudo parece ter sido causado por aquela discussão. Estou decidido a não deixar que o mesmo aconteça entre mim e meus pais. Eu os amo muito, e sempre fomos muito próximos. No entanto, nos últimos tempos eles têm procurado tanto se apegar a mim que nunca me senti tão distante dos dois. Nós costumávamos nos comunicar bem.

Toda vez que tento discutir essas coisas, eles reagem de uma das seguintes maneiras: ficam zangados e dizem que não vão discutir a questão; ou afirmam que não estão nem um pouco incomodados com a mudança. Para mim, a segunda resposta parece insana. Ultimamente, nos raros momentos em que nos damos bem, eles me lembram: “Quando você for embora, não vai poder fazer essas coisas conosco.” É como se eles quisessem me causar culpa. Eles agem como se eu fosse morrer ou coisa parecida!

O que posso fazer para melhorar meu relacionamento com essas pessoas que estão rapidamente virando estranhos para mim? Até os últimos meses, eles eram bastante normais! Não sei como me comunicar com meus pais, e não quero acabar perdendo contato com eles, mas não sei como vou levar essa situação por mais sete semanas (estou fazendo a contagem regressiva). Começar a universidade é uma experiência emocionante e um tanto assustadora para mim. Preciso do apoio deles nesse período. Há algo que eu possa fazer para ajudá-los (e me ajudar?)

Resposta:

Seus pais com certeza estão passando por um mau momento com essa transição na vida, mas não estão malucos. Eles o amam muito, mas não sabem como manifestar esse amor na forma de um apoio incondicional a você e a sua decisão de estudar longe de casa.

Apesar de nesse momento eles não conseguirem discutir a questão de forma racional, aparentemente está caindo sobre você a responsabilidade de ser a pessoa madura para falar sobre as preocupações de todos.

Diga a eles que você sabe que vai ser difícil viver longe de casa, mas essa experiência o deixará mais forte. Explique por que é importante para você ir para a universidade de sua escolha. Diga que os ama muito, que sempre amará e que a distância não vai mudar isso. Seu relacionamento com seus pais está mudando, agora que você está se tornando adulto. Para esse relacionamento crescer, você precisa sentir que está sendo apoiado em suas decisões de pessoa adulta. Afirme que você ainda valoriza a orientação e entende as preocupações deles. Explique por que você está pronto para essa mudança e para os desafios decorrentes, bem como para as maneiras pelas quais ainda vai precisar do apoio deles. Se possível, dê-lhes uma visão de um relacionamento íntimo e significativo que você consegue visualizar quando estiver na universidade e vier para casa nas férias. Essa imagem será muito diferente do que aconteceu entre eles e seu irmão mais velho, e poderá dar a eles um incentivo para aceitar a mudança, em vez de combatê-la.

ISENÇÃO

Pergunta:

Quando um parente tem um problema sério e não consegue resolvê-lo sozinho, como é possível permanecer isento, sem tentar ajudar essa pessoa a resolver o problema? Como devemos agir numa situação dessas?

Resposta:

Quando você pergunta como é possível não se envolver quando alguém precisa resolver um problema, entendo que esteja perguntando como ajudar sem se tornar parte do problema e esperar que ele se defina. Às vezes nosso envolvimento avança até a percepção de que a outra pessoa está defeituosa e precisa ser “consertada”. Para nós nos envolvermos ativamente em ajudar um membro da família com um problema, primeiro é preciso que essa pessoa reconheça que tem um problema. Depois, ela precisa querer sua ajuda. Até lá, você não precisa sentir que é obrigada a abrir mão de seu amor por ela. Na verdade, amor incondicional é só o que se pode oferecer nessa situação.

MORAR PERTO DA MÃE

Pergunta:

Sinto por minha mãe uma mistura de raiva, tristeza e compaixão. Vivemos longe uma da outra, mas estou pensando em voltar para minha cidade natal e morar perto dela. À distância, sinto uma certa objetividade e compaixão por ela, mas na presença física da minha mãe toda a minha infância retorna, perco a objetividade e sinto que poderia explodir, tamanha é a raiva que sinto dela. Um dos problemas com que preciso lidar é sua crise financeira crônica. Ela vive muito acima de suas posses, acho que principalmente para parecer melhor aos olhos dos outros. Apesar de sentir pena da falta de autoestima dela, não gosto do fato de ter que ajudá-la ocasionalmente, e temo que a situação piore à medida que ela envelhece. Sempre vivi de acordo com minhas posses e não sou rica, portanto estou com dificuldade para aceitar essa situação. Também não estou segura de que viver perto dela seja uma boa ideia. Tenho medo de morar mais perto e não ser capaz de lidar com as emoções que sinto quando estou com ela e que são muito fortes. Ficarei muito grata por qualquer sabedoria que você possa compartilhar nessa questão.

Resposta:

Parece que você está muito consciente das possíveis desvantagens de se mudar para sua cidade natal e viver perto de sua mãe. Você não mencionou a idade e a condição de saúde dela, e também se existe mais algum parente por perto, ou se existem outros motivos pelos quais você queira voltar. No entanto, parto do princípio de que ela tem saúde e que seu principal motivo para se mudar é dar a ela algum contato familiar mais próximo e cuidar das necessidades dela mais de perto.

Entendo as preocupações práticas que você tem com os gastos excessivos de sua mãe, mas isso não vai mudar se você estiver perto ou longe. Talvez essa mudança seja uma oportunidade de curar o relacionamento e superar a raiva que caracterizou suas interações com ela no passado. Só você pode saber se está pronta para isso. Veja se você pode reconhecer que sua raiva foi deflagrada por sua mãe durante muitos anos, mas que ela não é a fonte da raiva. Se você puder descobrir uma maneira de entender e processar sua raiva em seus próprios termos, sem culpa, então essa mudança pode lhe reservar bênçãos ocultas. Se você descobrir que ainda não está preparada para se sentir honestamente dessa maneira, então, tudo bem também; nesse caso pode ser mais sensato adiar a mudança por algum tempo.

CURAR O RELACIONAMENTO COM A MÃE

Pergunta:

Como posso focalizar minha intenção de corrigir a experiência bastante negativa com minha mãe e recriar com ela um verdadeiro relacionamento, mas sem ser manipulada nem ferida?

Resposta:

Faça do objetivo da intenção uma decisão consciente de perdoar. Primeiro, perdoe a si mesmo. Isso envolve reconhecer e aceitar a parte de você que desempenhou o papel de oponente na experiência negativa com sua mãe. Ao perdoar-se, você reconhece que na época fez o melhor que podia ter feito. Reconheça que a parte de você que se sente ferida ou manipulada não é seu verdadeiro Ser, é só um papel que você desempenhava. Não é quem você realmente é. A partir daí, você pode estender o perdão também para sua mãe. Ao perdoar e integrar a energia que foi mantida entre vocês como ressentimento e raiva, essa energia pode ser transmutada em amor, respeito e generosidade.

ENTREGAR-SE OU RESISTIR

Pergunta:

Escrevi uma carta muito negativa para meu irmão. Eu estava com raiva. Eu o acusei de destruir meu relacionamento com minha mãe. Ainda acho que minhas acusações eram pertinentes. Analisei tudo isso em minha mente muitas vezes. Estou muito cansado e zangado porque meu desejo e minha vontade muitas vezes não estão alinhados com os planos de Deus para mim. Como posso saber se preciso me render e abandonar uma esperança/sonho ou se preciso resistir e não desistir? Já tentei ioga e meditação, mas não encontro paz. Em vez disso, sinto remorso e ressentimento. Sinto que talvez eu pudesse ter escrito com mais diplomacia. Infelizmente, acho que piorei as coisas. O que devo fazer?

Resposta:

O mais simples é pegar o telefone e pedir desculpas. Diga a seu irmão que você estava falando sob influência de raiva e ressentimento. Depois disso você precisa entender que ninguém, nem mesmo seu irmão, pode arruinar seu relacionamento com sua mãe; só você pode fazer isso. Diga a ele que você está assumindo a responsabilidade por isso agora. Então peça o perdão dele.

Sobre a questão de se render ou resistir, não acho que você esteja vendo suas opções com clareza. A rendição espiritual não é uma resignação passiva. Não é desistir da vida. É deixar de lado a necessidade do ego de ter as coisas à sua maneira; é deixar que o impulso de ação, criatividade e inspiração de sua alma se revele com mais força. A rendição espiritual na verdade requer mais força, amor, coragem e honestidade do que aquilo que o ego vê como sua luta por justiça, respeito e reconhecimento.

A SOGRA ESTRANHA

Pergunta:

Como posso lidar com uma sogra hostil? Até agora, não a enfrentei, mas estou perto disso. Ela invadiu meu espaço de muitas maneiras. Meu marido a confrontou sobre seu comportamento, mas ela continua a fazer comentários depreciativos toda vez que nos encontramos ou por e-mail. Quando faz isso, ela sempre sorri. Ela agiu assim não só comigo, mas também com meus pais. Sei que ela nunca aprovou o fato de termos nos casado tão depressa, depois de nove meses. (Nós temos mais de 35 anos; somos adultos, afinal!)

Meu marido e eu temos uma filha de 1 ano, e ele tem uma filha de 6 de um casamento anterior. Ela nos visita de vez em quando. Minha sogra mostra favoritismo pela neta mais velha toda vez que ela vem nos visitar. Na verdade, ela também toma o partido do filho. Nenhum dos dois jamais está errado. Recentemente, ela até mesmo disse a meu marido que a menina de 6 anos era sua favorita. Meu marido e eu estamos nos mudando para a Califórnia, e quando minha sogra conversou conosco sobre a mudança, não deu o menor apoio nem disse que estava feliz por nós. Nós tivemos um ano terrível do ponto de vista financeiro, perdemos duas casas e meu emprego, e meu marido sofreu um acidente de trabalho. Ela sabe disso tudo e não disse nada para apoiar nossa decisão de mudança. Ela é uma mulher estranha, mas o que mais me irrita são seus comentários irônicos e sua atitude crítica. Quero ser honesta com ela e fazer com que saiba que está abusando com seus comentários. Meu marido tem outros dois irmãos cujas mulheres também têm problemas com ela. Às vezes isso realmente afeta nossos relacionamentos. Cheguei a um ponto em que não consigo suportá-la, e detesto dizer isso. Já fui casada antes e tinha uma sogra maravilhosa, sem problemas. No entanto, a minha sogra atual é uma criatura estranha, e me sinto mal quando ela está por perto. Nunca encontrei alguém igual. Em geral, meu marido me apoia, mas recentemente ele disse que eu preciso abrir mão do meu ego. Fiquei chocada, e agora estou mais perturbada do que nunca. Sei que ela sempre será a mãe do meu marido, mas como posso ser apoiada por ele e fazer minha sogra entender que ele e eu agora somos uma família?

Resposta:

Não posso garantir que este seja um problema do seu ego, mas acho que é seguro dizer que você não vai conseguir paz nessa questão se isso depender de que sua sogra mude para atender a suas expectativas. Ela é quem é, e isso provavelmente não vai mudar. Além disso, você não pode controlá-la. O que você pode controlar é sua reação ao comportamento dela. É seu papel encontrar uma forma de manter um senso de equilíbrio e harmonia interna diante de qualquer coisa que ela diga ou faça.

Como você e seu marido estão enfrentando desafios para criar uma família em meio a dificuldades financeiras, é natural esperar apoio dos parentes, mas se isso não acontecer, não se deixe perturbar e siga em frente. O mesmo se aplica aos comentários irônicos de sua sogra e ao favoritismo pela neta mais velha. Essas são limitações dela, e você não ganha nada se ficar infeliz por causa das deficiências sociais da mãe de seu marido.

Acerte os ponteiros com seu marido e, juntos, expliquem da forma mais delicada possível que vocês percebem e identificam a ação destrutiva dela e a tentativa de separá-los. E que, enquanto ela continuar com isso, deve entender que você, como mãe, naturalmente precisará tanto quanto possível proteger sua família das atitudes perniciosas dela. Diga-lhe que não está pedindo que ela mude, que ela pode dizer e fazer o que quiser, mas que suas responsabilidades são para com sua família. Se ela insistir em sabotar seu relacionamento, será preciso minimizar a influência dela.

Ao mesmo tempo que explica a sua posição nesses termos simples, dê a ela também uma opção positiva. Diga-lhe que tipo de influência positiva você gostaria que ela tivesse em sua família. Dê-lhe uma visão de como seria para ela ser um membro bem-vindo da família. Finalmente, peça-lhe que avalie se esse tipo de relacionamento com todos vocês não seria muito mais agradável e gratificante para ela do que o relacionamento atual. Se ela for receptiva e quiser buscar uma maneira honesta de avançar nessa situação, pergunte como você e seu marido podem ajudá-la a realizar isso.

PASSIVIDADE DISFUNCIONAL

Pergunta:

Meu pai e minha mãe eram alcoólatras. Eu não bebo, mas vejo que sou realmente passivo e tendo a ser influenciado com facilidade (a agradar aos outros). Nos últimos dois anos, evitei deliberadamente me envolver num relacionamento para procurar me desenvolver espiritualmente. Penso que não ser egoísta muitas vezes significa ceder ou se acomodar diante dos outros, procurando esquecer os próprios desejos. No entanto, parece que muitas vezes me comprometo com coisas que acho certas e mais tarde descubro que não sou bastante forte para levar aquilo adiante. Minhas intenções são boas, mas às vezes o tiro sai pela culatra.

Minha aventura mais recente envolve um possível casamento com uma mulher 15 anos mais nova e estrangeira para dar a ela uma vida melhor. Ela quer muito vir para os Estados Unidos. Eu ainda não a conheci, mas ela é sobrinha de meu mestre espiritual, e eu já me convenci parcialmente de que não faz diferença quem ela seja ou o que eu quero, porque minhas intenções são boas e realmente desejo ajudar, portanto isso deve estar certo. Não fiz promessas, mas parece que a família está bastante desesperada com as condições difíceis de seu país. Parece que quando eu manifesto como gostaria de fazer as coisas devagar antes de me comprometer, a mensagem que recebo é: “Em nossa cultura é importante que a decisão seja rápida para que a comunidade possa ser informada de que a jovem já não está disponível, portanto, se você mudar de ideia depois, isso será uma catástrofe.” Eu me sinto pressionado por meu instrutor, mas preciso assumir a responsabilidade. É possível amar alguém e assumir um compromisso com essa pessoa mesmo sem conhecê-la, ou estou me iludindo na esperança de agradar meu mestre espiritual e sua família? Será que isso é outro indício de minha passividade disfuncional? Será que o amor mais realista não envolve conhecer alguém com os mesmos interesses, estilo de vida e metas espirituais?

Resposta:

Parece que sua passividade e seu desejo de agradar podem estar levando você a uma decisão importante sem uma avaliação adequada. O casamento não deve ser assumido como um favor qualquer feito a alguém, por mais que você admire essa pessoa. O casamento envolve o amor de duas almas que se ajudam a descobrir a própria condição divina. Se você deseja sinceramente uma esposa e sente que essa mulher pode ser a companheira ideal, passe algum tempo tratando de conhecê-la e deixando que ela o conheça. Contudo, se a situação deles é tão premente que o casamento deva ser realizado rápido, então você saberá que ela não é a pessoa certa. Com certeza muitos casais encontraram um grande amor por meio de casamentos arranjados em que os noivos não se conheciam previamente. No entanto, o conhecimento envolvido em um casamento arranjado avalia muitas variáveis de personalidade e compatibilidade para aumentar as chances de sucesso conjugal. Parece que nenhuma análise desse tipo está envolvida nesse arranjo. Como você localiza em si um padrão de deixar que os outros se aproveitem de sua generosidade, deve duvidar de que esse casamento proporcione uma felicidade duradoura para qualquer um dos envolvidos. Sua tarefa não é tentar ser mais generoso para ser menos egoísta. Concentre-se em saber o que é o seu verdadeiro Ser. Veja se você pode permitir que sua motivação para ajudar os outros venha de uma percepção de sua ligação espiritual com eles, e não da necessidade de tentar deixá-los mais felizes ou numa situação melhor.

UM IRMÃO IMPOSSÍVEL

Pergunta:

Desde que me lembro, tenho um relacionamento difícil ou até mesmo impossível com meu irmão mais velho. Sinto que sempre o perdoei pelas coisas que fez, mas ele está decidido a me detestar. Ao longo dos anos, perguntei a ele por que me detesta, mas ele não diz. A última vez que lhe perguntei isso foi há um ano.

Enquanto crescíamos, os abusos dele foram de bater em mim a deixar que outros me batessem, de sabotar meu relacionamento com terceiros a me xingar. Depois de adultos, só nos falamos em reuniões de família (de tempos em tempos), e depois de cinco minutos ele está me xingando. Eu não o detesto. Até onde sei, ele é uma boa pessoa, e gentil com os outros. Acho que ele é um homem divertido, inteligente e talentoso. Adoro a mulher dele. No entanto, parece que ele não deixa que ela fale comigo. Durante os últimos cinco anos, tentei esperar para ver no que isso daria, mas senti que precisava traçar um limite quando ele começou a falar mal de mim para meu filho de 5 anos (que na época tinha 4). Eu disse a meu irmão que, enquanto ele achasse que podia fazer aquilo, eu não o queria perto do meu filho. Meus pais ficaram indignados.

E isso cria tensão no meu relacionamento com meu marido e meus pais. Sendo assim, pergunto: como o perdão se encaixa num relacionamento em que tantas pessoas estão sendo feridas?

Resposta:

Acho que você agiu de forma correta quando deixou claro que não é certo seu irmão falar mal de você para seu filho pequeno. Não sei por que seus pais não conseguem ver isso, e por que eles se indignam por você não querer seu irmão perto de seu filho, pois isso me parece razoável. Como já tentou várias vezes descobrir a fonte da hostilidade dele para com você e só teve como resposta mais agressões, você precisa aceitar que essa dificuldade não pode ser resolvida pela interação direta. O que vou dizer pode não parecer uma solução muito boa, mas às vezes, em casos como esse, o melhor recurso é abandonar a luta. Sei que existem tensões familiares causadas por seu relacionamento com seu irmão, mas em seu coração, pare de ver isso como um problema ou como algo que deva ser consertado ou mudado. Aceite a ideia de que os sentimentos dele estão certos exatamente como são, mesmo que jamais mudem e mesmo que você nunca venha a saber por que ele a detesta. Como qualquer outra pessoa, ele tem direito aos próprios sentimentos, e você pode respeitar esse direito dele desde que fique claro que você também tem o direito de preferir não vê-lo. Muitas vezes, quando alguém solta sua ponta da corda nesse cabo de guerra de prolongado antagonismo, o velho padrão se rompe e são criadas as condições para uma mudança no relacionamento.

FAZER AS PAZES COM PAPAI

Pergunta:

Tenho 45 anos e não falo com meu pai há vinte. Sou a mais nova de quatro filhos. Fui a primeira filha a interromper o contato com ele, mas em poucos anos fui seguida por minhas irmãs mais velhas. Meu irmão continuou em contato com ele e conosco. Às vezes meu pai não era razoável, e quando bebia criava situações incômodas. Quando fiz 25 anos, achei que já bastava e pedi a ele para ficar longe. Recentemente, vi o endereço eletrônico dele numa mensagem de minha cunhada para mim e, depois de muito pensar, mandei um e-mail para ele. Junto com algumas informações básicas a meu respeito e a respeito de meus filhos, inclui o seguinte:

“Aceito o passado sem negá-lo e sem apagá-lo, e entendo que em cada momento as pessoas fazem o possível com o que têm. Vendo o passado pela perspectiva de uma mulher de 45 anos, sei que teria agido de outra maneira se na época tivesse a capacidade que tenho agora de entender e lidar com as situações. Também acredito que tudo acontece por uma razão. Estou feliz com quem sou e onde estou agora.”

Recebi um telefonema de minha cunhada hoje à tarde e, depois de mais ou menos meia hora, contei a ela o que tinha feito. Ela disse que já sabia, e que meu pai repassara o e-mail para meu irmão, pedindo a opinião dele (meu irmão não se manifestou sobre a questão); então meu irmão mostrou a mensagem para minha cunhada. Estou plenamente consciente de que meu Ser condicionado está sofrendo novamente a rejeição, os segredos e a sensação de que ninguém se preocupa com meu bem-estar. Entendo isso e consigo superar. Minha dificuldade é com o relacionamento que meu irmão manteve com meu pai e comigo e com o fato de que em vinte anos ele nunca tenha falado de mim, nem sequer para dizer a meu pai que eu tive um segundo filho. Não sei qual será o resultado ou se terei uma resposta. Estou com muita dificuldade para processar tudo isso.

Resposta:

O simples ato de mandar uma mensagem para seu pai depois de tantos anos foi uma iniciativa importante para sua psique. Sua referência ao passado foi elaborada de forma tão cuidadosa para parecer filosófica, neutra e isenta de acusações que, em minha opinião, seu pai realmente precisa de ajuda para decodificar e interpretar quais podem ser as suas intenções por trás desse e-mail. Por exemplo, será que sua expressão “estou feliz com quem sou e onde estou” significa que você não tem interesse em dar o próximo passo para vê-lo ou falar com ele, ou significa simplesmente que você está feliz com quem é e onde está?

Não é surpresa que essa abertura de sua parte, depois de duas décadas de silêncio e segredos, suscite fortes sentimentos de rejeição e sofrimento. Isso muitas vezes acontece quando voltamos ao passado e começamos a processar aquelas partes anestesiadas e desprezadas de nosso Ser. No entanto, é uma evolução positiva e saudável. Aconselho que você dê prosseguimento a ela. Talvez você queira mandar outro e-mail apenas para explicar a seu pai seu impulso inicial de escrever. Se achar bastante seguro, pode incluir alguns de seus sentimentos. Se quiser explorar a ideia de vê-lo ou se souber que ainda não quer vê-lo, ou mesmo se ainda não tiver certeza — vá em frente e diga isso. Deixe claro o que você sente sobre a direção que quer dar ao seu relacionamento e ao de seus filhos com ele.

Se seu pai realmente não estiver confuso com a resposta e tiver de fato rejeitado a possibilidade de reatar relações, pelo menos você saberá em que pé estão as coisas e poderá seguir em frente com sua própria cura, e não ficar esperando por ele em algum nível. No entanto, como foi sua a iniciativa de interromper o contato, acho que ele gostará de fazer parte de sua vida, se isso lhe for oferecido.

CUIDAR DE UM PAI CRUEL

Pergunta:

Fui criada por um pai insensível, sem amor, cruel e egoísta — que era deliberadamente mau e gostava disso. Ele me causou muito sofrimento por não me dar o amor e os cuidados que eu merecia. Estou doente e cansada.

Ele é um homem velho e doente, que teve uma boa vida, e agora me vejo sentindo pena dele. Ele ainda me trata sem respeito, mas eu o ajudo, porque meu irmão, a quem ele deu tudo (porque é homem, e também é cruel e egoísta), não ajuda em nada, só tira dinheiro de meu pai.

Eu não recebo e não peço nada. Sinto que deveria fazer isso, mas não sei por quê. Não gosto de estar com ele porque ele ainda não é gentil. Só sinto pena dele. Estou fazendo o que é certo ou apenas me ferindo ao ficar perto de uma pessoa tão negativa, que me faz sentir que sou inferior e não sou amada, mas usada? Isso vai ajudar ou prejudicar meu crescimento espiritual?

Resposta:

Eu não aconselho que você faça isso por piedade ou obrigação, principalmente se essa atitude só a deixa se sentindo desprezada e inferior. Por outro lado, você diz que sente compaixão por ele e não quer nada dele. Para ver as coisas com clareza, acho que você deve avaliar mais atentamente suas motivações básicas. Se na verdade seu impulso de ficar perto dele não está baseado numa esperança secreta de que ele a compense por sua infância sem amor, se esse impulso vem de um local de compaixão e aceitação por quem ele é, independente de seu comportamento e suas crenças, então eu diria que cuidar dele é simplesmente sua natureza, e é saudável para os dois. Mais do que isso, é uma demonstração de que sua verdadeira força, beleza e bondade cresceram e floresceram apesar do início de vida doloroso.

O lótus que cresce no lodo é um símbolo de como nossa essência espiritual e nossa beleza não são limitadas ou definidas pelas circunstâncias de nossa origem.

MÃE DESAMOROSA

Pergunta:

Minha irmã e eu sempre acreditamos que nossa mãe nunca nos amou. Ela jamais mostrou interesse por nosso bem-estar, nosso desenvolvimento ou nosso futuro. De muitas maneiras, às vezes triviais, ela mostra que não tem amor ou interesse por nós. Hoje tenho 49 anos, e minha irmã, 52, e só agora percebi e aceitei o fato de que ela não acredita em família e amor. Embora eu tenha tentado mostrar-lhe amor, ela não mudou. Portanto, cheguei à conclusão de que ela não precisa de amor, pelo menos não do meu ou da minha irmã. Ela também não acredita em manter a família unida. Ela quer alguma coisa diferente do amor e da família. Agora que estou mais madura, também percebi que não é apenas uma questão de amor, mas também uma questão de ódio. Nossa mãe nos odeia e nos trata como inimigas. Acho que ela é narcisista, porque deixou escapar mais de uma vez que ninguém se compara a ela (é constrangedor!). No entanto, ela nunca se dedicou a nenhum de seus talentos (canto, teatro, moda, ciências etc.). Sim, ela era linda quando jovem, e creio que é por isso que agiu como agiu — não cuidou de nós, nos maltratou e nos rejeitou diariamente —, porque vivia num mundo de fantasia onde se agarrava à sua coroa para que ninguém a roubasse. Parece muito estranho, mas é o que penso.

Foi então que concluí: sim, ela não precisa de amor e de família, ela precisa da coroa da beleza. E sua vida diária e trivial não é real para ela. Pergunto: como posso lidar com isso? Tenho que viver com ela porque estou desempregada, e ela tem 79 anos. Em minha cultura você tem que cuidar dos mais velhos. Não consigo tirar isso da cabeça, e quero resolver esse caso.

Resposta:

Talvez você tenha razão de achar que sua mãe não a ama e que a odeia, mas você e sua irmã não podem ter certeza disso e viver com essa ideia, que claramente deixa as duas muito infelizes. Por que não levar a vida a partir da posição de que a realidade de sua mãe sempre será um mistério impenetrável? Examine seu pressuposto sobre a família e o comportamento narcisista e por que você acha que sua única reação possível é a infelicidade. Nós somos socialmente condicionados para acreditar que as mães sempre devem pensar e agir com altruísmo e amor para com a família. Com certeza, esse é um comportamento materno admirável, mas sempre que uma mulher se afasta dessa imagem idealizada, a reação convencional é achar que alguma coisa está terrivelmente errada com ela. Talvez algo esteja errado, talvez não. O que você precisa ver é que sua mãe não tem que atender a suas expectativas para que você fique bem. Ela pode ser egocêntrica e mesquinha, e você ainda assim ficará bem consigo mesma se entender que seu estado interno de bem-estar está sob seu controle, e não sob o controle dela. Se esquecer essa história que criou sobre sua mãe, você vai trazer o foco para onde ele deve estar — em si mesma e em como você pode ser feliz onde está neste exato momento.

ESQUECER O ABUSO

Pergunta:

Meus pais não eram ignorantes. Minha mãe era professora de música e meu pai, engenheiro civil. É difícil saber quando o abuso começou, mas ele assumia diversas formas. Por exemplo, eles deixavam que eu ficasse suja quando era criança — tão suja que algum adulto acabava por tomar a melhor providência que podia. Minha mãe pode ter sido maníaco-depressiva, porque só me lembro de seus ataques de fúria, quando ela me batia até eu apagar mentalmente — ao menos acho que apagava, pois me lembro de sensações flutuantes. Eu me escondia durante horas em qualquer lugar, e achava o depósito de lixo um lugar seguro, porque, se eu me escondesse nos armários, ela ficava ainda mais furiosa quando me encontrava. Não havia outro motivo para isso senão suas próprias frustrações. Ela arrancava mechas do meu cabelo, e uma vez, quando eu ia fazer a fotografia da escola, minha mãe agarrou e cortou uma mecha acima da minha orelha. Creio que as pessoas perceberam, mas não tenho certeza, porque só havia silêncio por onde eu passava. A certa altura, também não lembro quando, meu pai começou a abusar sexualmente de mim. Como às vezes ele fazia isso ao lado de minha mãe, sei que ela sabia. Talvez também tenha sido por isso que ela me deixava tão malcuidada e comprava roupas grandes demais para mim. Acredito que toda vez que um professor, os vizinhos ou alguém começava a achar que alguma coisa estava errada, nossa família se mudava.

Por um curto período, meus irmãos também abusaram sexualmente de mim, mas depois os dois pararam porque imagino que eles também morressem de vergonha. Meu pai era um homem muito forte, e provava isso apertando os braços e as mãos de meus irmãos com tanta força que eles se ajoelhavam e imploravam misericórdia. Acho que, de todas as coisas que aconteceram, isso ainda é o que me deixa mais enojada e furiosa. Ver outro ser humano ser humilhado é indescritivelmente revoltante. Havia mais, mas com certeza isso já é suficiente. Muita gente via meu pai como uma pessoa generosa e boa, pronta a sair de seu caminho para ajudar alguém. Em casa, ele ficava a maior parte do tempo ao ar livre com seus cavalos, enquanto nos seus bons dias minha mãe permanecia no aconchego do lar, lendo ou corrigindo os exercícios dos alunos, mas não me lembro muito bem do interior da residência. Não faz diferença se me lembro ou não, mas ser espancada até perder a consciência não era nada em comparação com o sofrimento emocional de ficar em pé em frente ao espelho e ouvir minha mãe dizer como eu era feia, ou de ver meus irmãos serem humilhados. Houve ocasiões em que minha mãe me amarrou durante horas a qualquer coisa. O lugar mais tranquilo do mundo era embaixo dos imensos galhos de um carvalho à beira do rio Missouri. Lá eu me sentia segura. Enquanto estivesse longe das vistas e esquecida, as coisas não seriam tão más.

Os psicoterapeutas não arranharam nem a superfície; eles nunca entenderam nada e, pelo que me diz respeito, a maioria não passa de um poste para quem você fala de seus problemas, e alguns pareciam em pior condição emocional do que eu. Sempre senti uma atração por curar, porque é claro que isso vinha em meu benefício. Perdi meu cachorro e chamei por ele durante semanas, até que um dia senti uma paz maravilhosa. Uma presença prateada apareceu atrás do meu ombro direito e, sem a menor emoção, eu soube com uma certeza que jamais havia sentido o que aconteceu a meu cachorro. Era pura paz, sem emoção. Fui direto para casa, disse à minha mãe que sabia o que havia acontecido e saí. Ela havia atirado em meu cachorro porque ele mordeu alguém. Não senti tristeza nem raiva, só paz e alegria. Em outras ocasiões, cheguei muito perto da morte e sempre disse: “Ok, Deus, se é isso o que você quer, que seja.” Cada vez que isso aconteceu, fui tomada por essa paz maravilhosa.

Comecei a ler seus livros e ouvir suas fitas. De certa forma, eles trazem uma suavidade ao momento. Nessa época, eu ouvia e lia seus trabalhos, que capturavam minha atenção com tanta graça que eu ficava completamente imersa neles. Que dom você tem! Eu passava de carro pelo centro da Meditação Transcendental e acreditava que podia ver uma luminosidade em torno do edifício, e quase dava meia-volta.

Depois de me mudar 33 vezes antes de terminar o segundo grau, cresci cercada por caixas de papelão que, por alguma razão, me causavam bem-estar. Acho que cada vez que nos mudávamos, eu deixava a vergonha para trás e esperava que alguma coisa melhor acontecesse, mas nada mudava. De repente, um dia há não muito tempo, fiquei obcecada com a ideia de me livrar do entulho; fui esvaziando as caixas, e elas diminuíram. Quando fiz isso, voltei a ter sentimento. Parece estranho, mas agora tenho esse nó de medo na boca do estômago, que é tangível e concreto. Para alguns, isso pode parecer ridiculamente trivial, mas aquelas caixas tinham um grande significado, e ser capaz de ter uma sensação de medo é algo positivo. Aquelas caixas foram o começo da cura do meu chakra básico, e agora eu sinto o medo bem dentro do plexo solar. Então, talvez a cura esteja ascendendo. Agora estou ouvindo seu CD The Spontaneous Fulfillment of Desire e perguntando que mantra você acha melhor para remover meu medo. Acho que o mantra certo poderá fazer maravilhas por mim. Como acredito, tenho certeza de que fará. Não sinto necessidade de humilhar ou ferir ninguém, só de levar minha vida com coragem, em vez de medo, já que você mostrou que o medo atrapalha o destino da alma.

Resposta:

Eu quis publicar a sua carta na íntegra para divulgar sua história notável. Meu coração se volta para o seu e para os de todos os que sofreram esses abusos terríveis na infância. Parabéns por ter descoberto o caminho para uma cura tão expressiva. Sua história é um verdadeiro testemunho do triunfo do espírito humano.

Existem muitos mantras que podem ser usados para dissipar o medo. Para você, recomendo o mantra Shri Dum Durgayei Namaha. Ele pode ser dito em voz alta ou pensado em silêncio, sempre que você quiser e quantas vezes desejar. A pronúncia é “Xri dum durgaiê namarrá”. Boa sorte.

COMO PERDOAR ABUSOS

Pergunta:

Como posso perdoar meu pai pelas agressões? Fico em melhor condição espiritual se mantiver o relacionamento com meu pai, apesar do comportamento dele? Já li suas respostas a perguntas semelhantes no passado, e sinto muito se parecer imbecil, mas simplesmente não entendo suas respostas. Não consigo me ver ao mesmo tempo como vítima e algoz. Entendo que escolhemos nossos pais, e percebo que possa ter escolhido esse relacionamento para aprender a perdoar. Eu gostaria de perdoar meu pai, mas não entendo com base em quê. Meu pai não me protegeu de minha mãe violenta e não providenciava um remédio adequado para minhas cólicas menstruais, que eram tão fortes que me impediam de me levantar. Ele me tratava como se tudo o que eu fizesse fosse errado. Ele agora admite seus erros e diz que lamenta muito, mas que não sabia agir de outra forma. Meu pai é um homem de negócios brilhante e bem-sucedido, e acho difícil acreditar que seu egocentrismo fosse tão grande que o impedisse de perceber minhas necessidades, como afirma.

Compreendo que uma pessoa espiritualmente madura não se importa com a opinião dos outros. Também entendo que é melhor se cercar de gente positiva. A situação é agravada pelo fato de meu pai ser intolerante, conservador e truculento, e eu ser tolerante, liberal e sensível. Nos últimos anos, a meu pedido, nos comunicamos somente por e-mails porque, quando falamos frente a frente, sempre acabamos discutindo. Para ser honesta, nos últimos dois anos meu pai me tratou com respeito. Apesar disso, acho difícil fingir que tudo está bem.

Resposta:

Sua situação mostra bem como o perdão não pode ser acelerado só porque sabemos que essa é nossa meta espiritual. O processo de cura para as feridas do passado não é intelectual. Conseguir perdoar, assumir a responsabilidade pela própria vida e abrir mão do sofrimento não é um procedimento para curar o passado, mas um lugar ao qual se chega quando a cura se completa. De muitas formas, o processo de cura é semelhante ao luto pela perda, porque quando lamentamos uma perda, estamos liberando a dor represada. Nós estamos acostumados a lamentar a morte de uma pessoa amada, a perda de dinheiro ou de uma casa. Somos menos hábeis em curar as perdas que experimentamos pela falta de amor, saúde, respeito e controle, e pelas experiências da infância ou outras inúmeras maneiras pelas quais uma versão de nosso Ser é roubada de nós.

A falta de cuidados e proteção da parte de seu pai sempre vai justificar sua raiva e sua dor enquanto você continuar a viver essa deficiência a partir da perspectiva da criança que passou pelo que não deveria ter passado. Você também pode descobrir que alguns sentimentos com relação à sua mãe também precisam ser curados. Agora que você sobreviveu e cresceu, esses sentimentos podem finalmente emergir e ser curados. A primeira atitude deve ser reconhecer que o ressurgimento desses velhos sentimentos é um sinal positivo e saudável de que você agora está bastante forte para curar as velhas feridas. Deixe que elas venham à tona, não as evite nem procure afastá-las. Mas também não cultive nem exagere esses sentimentos. Deixe que eles sejam o que são.

Devemos permitir que todos os sentimentos envolvidos no processo de luto — pretextos, acusações, desculpas, raiva, ressentimento, mágoa, amargura e, finalmente, aceitação — venham à tona espontaneamente. Você precisa reconhecer que as experiências e perdas ficaram no passado, você sobreviveu e agora está no presente, segura e protegida. A partir desse ponto de vista, suas velhas feridas podem dizer o que lhe causa dor. Você não precisa saber os detalhes exatos do que aconteceu ou quando aconteceu. Você pode ter apenas uma vaga sensação dos fatos, principalmente se eles ocorreram quando você era muito pequena. Basta haver uma disposição para ver e sentir o que houve. Descubra por que o que perdeu era tão importante para você e por que isso tem tanto poder sobre você.

Você vai aprender como lidar com a perda quando entender como evitou a perda no passado, e também quais situações deflagram lembranças de perdas passadas. É assim que se ajuda a reação natural de cura. Não existe um tempo previsto para o processo de cura; tudo depende da perda sofrida, e ninguém pode saber a profundidade do sentimento a não ser você. Por meio desse processo, descarregamos nossa carga emocional e estabelecemos espontaneamente um ser espiritual mais forte no presente. A partir daí, aprendemos a aceitar a perda, a perdoar e a seguir em frente na vida. Quando conseguimos sentir as perdas e deixá-las para trás, não estamos apenas fingindo que as coisas estão bem; nós ficamos bem. Nós não tiramos a responsabilidade de quem abusou de nós, mas finalmente superamos nossa participação naquele relacionamento, e avançamos na direção de um Ser mais poderoso e amoroso no presente.

A meditação pode ajudar a desenvolver e fortalecer o Ser espiritual como base para a cura, a aceitação e o perdão, mas não necessariamente nos dá a coragem, a honestidade e a paciência necessárias para o processo de cura. Essas qualidades você precisa localizar e cultivar dentro de si para que elas possam ajudá-la a concretizar esse processo.

PAIS POUCO ESPIRITUAIS

Pergunta:

Estou no caminho espiritual há muitos anos e entendo que tudo acontece por um motivo. Tenho 40 anos, e ainda me causa espanto pensar em como dentro de toda a população do mundo posso ter escolhido meus pais como o casal perfeito para me criar. Tudo neles grita materialismo — seus péssimos hábitos alimentares, seu vício em álcool e cigarros, sua visão política limitada e beligerante, e seu medo e desespero com relação ao dinheiro e à perda de suas posses. Eu os amo pelo que são por dentro, mas sinto que não tenho nada em comum com seus valores, e me pergunto se estou deixando de ver alguma coisa.

Resposta:

Como tantos aspectos do carma, nossas famílias podem parecer incompreensíveis para nós se tentarmos entendê-las de acordo com nossas preferências do presente. “Perfeito” não significa que você pediu um jardim de rosas e foi atendido. Significa que, no nível da alma, existia uma correspondência entre a imensa complexidade do seu carma e a do carma de todos os que desempenham um papel importante em sua vida. É possível que você tenha pedido esses pais para receber um incentivo necessário para superar esses valores materiais e encontrar o amor que lhe permite apreciá-los apesar das diferenças superficiais entre vocês. É bom lembrar que a perspectiva da alma não é igual à perspectiva do ego.

CULPA

Pergunta:

Sempre achei que quem pede perdão está disposto a mudar. Eu saí de casa relativamente jovem, e agora acho que fiz isso porque sentia inconscientemente que jamais seria capaz de corresponder à minha ideia das responsabilidades envolvidas na condição de filho mais velho. De vez em quando, telefono para minha mãe (meu pai já morreu), e alguns de nós nos comunicamos por e-mail. Eu gostaria de me livrar do sentimento de culpa causado por essa situação, mas tenho que encarar meu próprio egoísmo.

Resposta:

Acho que você está sendo muito rigoroso consigo por uma escolha que fez há muitos anos, quando era bem diferente da pessoa que é hoje. Talvez agora, nas mesmas circunstâncias, você tomasse uma decisão diferente da que tomou quando era mais jovem, mas na época você fez o melhor que podia. Isso é o máximo que podemos fazer. Você não pode voltar atrás e mudar o passado, mas pode aprender com ele, e parece que isso está acontecendo. Você pode deixar a culpa para trás, perdoando-se e reconhecendo que isso foi parte do processo de aprendizagem da vida que o trouxe até onde você está agora; portanto, nesse sentido, sua escolha certamente não foi errada — simplesmente foi. O que você controla hoje é esse momento do tempo, e esse é seu espaço de liberdade para agir. Assuma o momento presente e crie com sua família o relacionamento que você deseja.

CONFISSÃO

Pergunta:

Tenho 17 anos, e recentemente comecei a trilhar o caminho espiritual. Até agora, sinto que cometia muitos erros e não vivia uma vida de completa honestidade. Eu costumava mentir para meus pais para conseguir o que queria. Agora vejo como fui egoísta. Por isso contei a verdade a meus pais. No entanto, desde essa confissão eles estão muito transtornados. Meu pai não fala comigo, e minha mãe e minha avó insistem em lembrar que eu pequei e destruí a reputação delas. Estou muito feliz com minha decisão de dizer a verdade a eles, mas tenho problemas com o sentimento de culpa. Sinto que agi mal com eles e comigo. Há pouco tempo, comecei a meditar e descobri que, no nível do silêncio, não sinto culpa, mas quando perco aquela tranquilidade, eu me sinto extremamente ferida, culpada e solitária. O que posso fazer para aliviar esses sentimentos?

Resposta:

Não sei que mentira você confessou para seus pais, mas uma vez que admitiu seu erro para sua família com a intenção de ser mais honesta, parece excessivamente duro da parte deles afastarem-se de você. Dê tempo ao tempo e pergunte-lhes o que pode fazer para melhorar a situação. Os adolescentes vêm manipulando a verdade diante dos adultos há milhares de anos; isso não é o fim do mundo. Nenhuma reputação familiar foi irremediavelmente perdida por sua causa, portanto não assuma essa culpa. Você fez o que era certo quando pôs as cartas na mesa com sua família, e com o tempo eles admitirão isso. Até lá, continue a praticar meditação, e o sofrimento e a culpa logo serão dissipados.

SEGREDOS, VERGONHA E AMOR

Pergunta:

Sou uma mulher de 30 anos e vivo com meus pais. Minha vida não tem direção. Não fiz nada da minha existência. Não estudei, só terminei o ensino médio. Trabalho em um escritório como secretária. Não sou boa no que faço, pois não sei onde encontrar tempo para fazer tudo o que precisa ser feito, não sei o que fazer primeiro, a quem obedecer primeiro ou como cumprir bem minhas tarefas.

Costumava chegar cedo e não sair para almoçar, mas sempre me davam mais tarefas, portanto, não faço mais isso. Também sinto que no trabalho sou explorada, não sou apreciada e respeitada, e não tenho tempo suficiente para cumprir bem meus afazeres. Não sei como agir nem como melhorar. É muito importante para mim desempenhar meu trabalho, e não estou conseguindo isso. Não estudei nada, e acho que, se deixar esse emprego, não conseguirei outro. Não tenho facilidade de relacionamento. Acabo criando inimigos em todo lugar.

Não tenho amigos, não tenho namorado, e também não quero ter. Não fico à vontade com as pessoas. Não gosto de estar perto delas. Não quero que os outros vejam as coisas que já fiz (falei mal de quase todo mundo pelas costas), não quero que vejam que sou fria, não tenho sentimentos calorosos por ninguém e não gosto de ninguém. Não quero que vejam que sou uma fraude (eu finjo que gosto dos outros). Não quero que os outros descubram que não tenho namorado e também não quero ter. (Não sou gay, mas algumas pessoas acham que sou e dizem isso para me insultar, gente que mal conheço!) Não quero que os outros saibam que sou esquisita, que as pessoas me tratam mal e que não tenho amigos. Não quero que ninguém saiba que não tenho personalidade.

Quando estava na escola, tinha alguns amigos que eram gente muito boa. (Agora não tenho mais, eu ofendi a maioria deles; perdi a conta das bobagens que fiz, e é por isso que fujo das pessoas.) Eu era mais agradável, e os outros costumavam gostar de mim. Tinha meus valores e meus ideais, tinha sonhos sobre o que gostaria de fazer no futuro. Eu era uma excelente aluna e estudava muito, e sabia que podia conseguir o que quisesse.

Eu queria ter uma família um dia, e pensava em todas as coisas que faria ou deixaria de fazer. Prometi a mim mesma nunca mentir para meus filhos, sempre agir de acordo com meus valores para não precisar mentir para eles; eu achava que, se mentisse, um dia eles iriam descobrir, porque a verdade sempre aparece, e eles nunca mais acreditariam ou confiariam em mim; e os outros também não confiariam em mim, e eu não queria que isso acontecesse.

Eu era infeliz em minha casa. Detestava meu pai. O que eu mais queria era ter idade suficiente para ir embora, e prometi a mim mesma não esconder segredos dos outros e dos meus filhos, como meu pai fazia. Prometi que nunca seria cruel com meus filhos, nem despótica. Prometi nunca desistir da vida, como ele fez. Nunca trabalhar em excesso para realizar meus sonhos.

Depois da puberdade, descobri a masturbação. Quando soube o nome daquilo, não gostei. Não queria que os outros soubessem o que eu tinha feito, ou que meus filhos viessem a saber, portanto agora eu tinha segredos! Sou como meu pai! E eu havia prometido que não seria igual a ele, que se eu descobrisse que era igual a ele não teria filhos, por mais que os quisesse, para não acabar com a vida deles. E isso dói, porque eu realmente queria ter minha própria família e muitos filhos. E também pensava que, se eu fosse como meu pai, quem poderia me amar? Ninguém. (Eu achava que minha mãe vivia com ele porque era burra.) Eu nunca me casaria. Além disso, quem me levaria a sério se soubesse que eu não queria ter filhos? Eu queria morrer. Então pensei que não podia deixar ninguém se aproximar e ver quem eu realmente era, porque nesse caso eu não teria amigos. E concluí que, se estudasse ou trabalhasse, outras pessoas me enxergariam, isso seria inevitável. Não via uma saída. Havia algo que eu não estava enxergando?

Durante toda a infância, desejei que meus pais se divorciassem. Meu pai tratava minha mãe muito mal. Ela não se defendia, e ele a insultava. Perguntei a ela por que não o deixava, e ela respondeu que era apaixonada por ele. Portanto, entendi que se apaixonar era a pior coisa, a maior burrice que uma mulher podia fazer, a melhor maneira de estragar a própria vida, como minha mãe tinha feito. Assim, jurei para mim mesma que nunca me apaixonaria. Nunca perderia a cabeça por alguém, pelo bem dos meus filhos (já que eu pensava que era tão infeliz tendo que viver com meu pai por causa da escolha idiota da minha mãe), e ao primeiro sinal de um defeito importante, eu deixaria meu marido, por mais que o amasse. Pelo bem dos meus filhos eu seria forte — ao contrário de minha mãe.

Quando criança, eu também achava que o suicídio era imperdoável. Sentia que esse era o desejo do meu pai, que era tão deprimido, e achava que minha mãe não ia embora por isso — por temer o que ele poderia fazer. Ela também pensava (e disse isso muitas vezes) que o divórcio não era bom para os filhos, que ficariam com “problemas psicológicos”.

Ao concluir que não havia mais nada para mim na vida (eu não me casaria nem teria filhos ou amigos, portanto, para que estudar? Algum dia eu teria que me matar), fiquei com raiva de meus pais porque me tiveram. Eu estava furiosa com eles e com a vida. Com o tempo, comecei a ser má comigo mesma e com os outros, de propósito. Eu queria me destruir, e passei a ser contra praticamente tudo o que considerava certo, de modo a não haver uma saída para mim. Sendo assim, agora tenho muito mais coisas que não quero que os outros descubram. Eu traí pessoas. Fico longe delas porque não quero que descubram e me rejeitem. Na época em que eu era uma boa pessoa, teria rejeitado quem fosse como sou agora.

E eu queria tanto ter alguém com quem pudesse conversar, porque pensava que não fazia sentido estar viva. Ao mesmo tempo, sabia que não havia nada para mim na vida, só do outro lado. Era assim que eu via. Não confiava em ninguém. Achava que meu segredo era horrível demais e doentio, e que não podia revelá-lo a ninguém, porque, se fosse revelado, poderia se espalhar, e todo mundo saberia. E isso seria insuportável.

Eu fazia uma cara feliz e representava para a família, mas sentia que estava me afastando de todos. Nunca disse a meus pais que desde aquela época (14 anos) eu queria morrer. No entanto, precisava ter muito cuidado. Não quero que os outros saibam.

Tentei fazer terapia, mas não funcionou. Eu sabia que não funcionaria, porque não podia falar do que realmente conta, do motivo de minha depressão. Esse era meu grande segredo.

Mais tarde, desenvolvi ódio pelos psicólogos, porque senti que eles não me ajudaram — e poderiam ter ajudado se quisessem, mas só se importavam com dinheiro.

Agora sinto que, se não fizer o que é exigido em meu trabalho, posso ser demitida. Às vezes sinto que o que me pedem está errado, mas sei que não vou conseguir outro emprego, e não tenho certeza de que irei me matar.

De início, eu não queria trabalhar porque sabia que não tinha bom senso, não sabia como me relacionar e não me sairia bem, não era mais capaz de aprender e não seria uma boa profissional; e tudo isso se mostrou verdadeiro. Além do mais, não sei como melhorar no trabalho. Estou sempre estressada.

De qualquer maneira, a vida não faz sentido. Não tem jeito — minha vida não existe. Apesar de agora me sentir melhor do que me sentia, por exemplo, entre os 15 e os 25 anos, ainda penso em me matar porque não vejo como fazer bem meu trabalho, e isso é importante para mim. Não sei como fazer coisa alguma — como dar conta das tarefas, o que dizer e o que deixar de dizer —, e já não me sinto bem perto de outras pessoas.

Resposta:

Essa é uma carta extensa, e muita coisa está acontecendo. Ao ler o que você escreveu, a primeira coisa que me chama a atenção é que você é uma boa pessoa, com ideais elevados, mas extremamente crítica de si mesma. Você se ressente de já não ser mais sociável e se sente desonesta quando tenta se enturmar. No entanto, você estabelece para si padrões inatingíveis e acredita que os outros vão julgá-la de acordo com esses padrões, se você deixar. Por essa razão, acredita que, se evitar relacionamentos, poderá se proteger da rejeição e do sofrimento de ser rejeitada. Se você recuar um pouco e examinar sua situação, acho que poderá ver que ao se isolar você conseguiu exatamente aquilo que estava tentando evitar.

Você deu um passo importante quando superou sua preocupação com segredos e escreveu essa carta para mim. É importante ser capaz de falar sobre as coisas de que não temos orgulho e descobrir que isso não faz mal. Seu verdadeiro Ser é puro amor, puro conhecimento e pura alegria. As imperfeições e idiossincrasias de nossas personalidades não fazem parte dele. Essas características podem fazer parte do Ser mais amplo, mas não nos definem. Você ainda é uma boa pessoa, que merece amor e respeito, quer seja sociável, quer não. Sua vida tem um valor e um objetivo, mesmo que seu ego se sinta confuso e estressado.

Você pode começar a se perdoar. Não faz mal não ser perfeita. Na verdade, a vida é muito mais rica se houver vulnerabilidade, espontaneidade e até mesmo um pouco de desordem. É uma ilusão pensar que se sentirá segura se controlar as situações ou as pessoas.

Parte da alegria e da aventura da vida é não saber o que está por vir. Perdoar a si mesma é saber que você é uma boa pessoa, mesmo que não seja sempre a mãe perfeita ou a secretária perfeita. Essas coisas são apenas papéis que desempenhamos. Elas não nos definem.

Quando você mencionou a masturbação, percebi que você tem muita vergonha de seus desejos sexuais. A masturbação fez você pensar que tinha segredos a esconder dos outros e concluir que não merecia ter filhos. Não há nada errado ou vergonhoso em ter uma natureza sexual. E isso certamente não nos desqualifica como pais. Tudo indica que você funciona de acordo com uma lógica pessoal segundo a qual, se tiver segredos, automaticamente será desonesta; que guardar segredos dos filhos tornará a vida deles infeliz. Todo pai ou mãe sabe que nem sempre é preto no branco o que é adequado dizer aos filhos em diferentes idades.

Você também formou muitos de seus ideais de criação de filhos como reação a seu pai. Você prometeu que com seus filhos não seria despótica, cruel, falsa, ou sem esperança na vida. No entanto, em seu autorretrato podemos ver que você não foi generosa com os amigos e colegas de trabalho, nem honesta sobre quem você é. E sua ideia de suicídio desde a adolescência mostra que muitas vezes você pensou em desistir da vida. Portanto, fossem quais fossem as limitações de seu pai, suas queixas parecem estar mais relacionadas com seus próprios medos da vida do que com ele. Portanto, no momento certo você provavelmente o perdoará também. Além disso, você viu o amor de sua mãe por seu pai como uma idiotice, e a permanência dela ao lado dele como um indício de fraqueza.

Isso também mostra que você vê a entrega, a sensibilidade e a vulnerabilidade do amor como um defeito ou fraqueza. Isso não é real, o amor é o tempero da vida, mas você jamais saberá disso se não assumir o risco com alguém.

Você não quer um namorado e não quer amigos, mas diz que deseja demais ter com quem conversar. Seu coração está implorando por contato humano, mas você julga não merecê-lo porque não é bastante agradável ou bastante boa. Você merece esse contato. O milagre do amor humano e da amizade é não depender do quanto somos críticos com relação a nós mesmos.

Apesar de sua experiência com a terapia não ter sido positiva, eu gostaria que você continuasse tentando. Agora que descobriu como é saudável e libertador ser capaz de expressar as coisas de que tem vergonha, continue a procurar até encontrar alguém com quem se sinta à vontade para rever todo esse material.

Essa deve ser sua prioridade nesse momento, e não o esforço para melhorar no trabalho. Quando você se aceitar e se amar, estará em condições de pensar sobre o que realmente quer fazer. A partir daí, poderá até decidir voltar a estudar e ter um diploma em alguma carreira que torne sua vida mais significativa.