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Capítulo 28

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Ele olhou e olhou e olhou e olhou

Impressionado, maravilhado, deslumbrado, surpreso.

—Robert Browning

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Calum abriu a porta o mais silenciosamente que pôde. Os olhos de Amy continuavam fechados. Parecia que ela não tinha se movido nem um centímetro. Ele se perguntou se uma ferida superficial como aquela podia ser mais séria em uma mulher, especialmente uma mulher tão pequena e vulnerável como Amy.

George levantou os olhos da vigília ao lado da cama.

"Ela ainda está dormindo?" Ele perguntou.

Ela assentiu.

Ele atravessou o quarto até a cama e ficou ali por um momento. Seu olhar foi de Amy para essa mulher de cabelos negros que se chamava George. Um nome tão estranho para uma mulher. George. Quem poderia chamar uma garota de George?

Ele tinha que admitir que ela tinha boa aparência. Ela era o tipo de mulher que podia virar a cabeça da maioria dos homens. Mas beleza não lhe chamava atenção. Educação sim.

Ela o assustou a princípio. Ela era alguém que ele preferia ficar o mais longe possível. Mas parecia que ela era apenas rabugenta com Eachann. Ela era bastante civilizada com ele, o que tinha sido uma surpresa.

Ele não podia culpá-la pelo jeito que ela estava agindo. Ela não estava aqui por vontade própria. Eachann merecia mais do que alguns socos.

Mas além das circunstâncias, George ganhou sua gratidão quando insistiu em ficar ao lado de Amy nas últimas horas.

Calum enfiou as mãos nos bolsos e ficou ali parado, sentindo-se burro, grande e desajeitado. Ele não sabia o que dizer para ela.

Ela olhou para ele com uma pergunta em seus olhos, então ela riu. "Eu prometo que não vou morder."

Até ele teve que rir. Ele esperou até que ambos parassem de rir e o silêncio reinou novamente. "Como você conseguiu um nome como George?"

"Você não gosta do meu nome?"

Ele disse uma maldição para si mesmo. Ele podia sentir que estava ficando vermelho.

Ela deu uma risadinha. "Eu sinto muito. Eu não deveria ter dito isso."

"O nome George é a ideia de seu irmão para se divertir. Meu nome é Georgina, Georgina Bayard."

"Bayard?" Ele pensou sobre o seu sobrenome.

"Como os relógios?"

"Exatamente."

Ele enfiou as mãos nos bolsos. "Eu sinto muito que Eachann tenha feito isso."

"Eu também." Ela olhou para a janela. "Eu sinto mais do que você, tenha certeza." Havia um olhar sombrio e distante em seu rosto.

"Ele não é o mesmo desde que sua esposa morreu."

Ela não disse nada por um longo tempo, parecia estar pensando no que ele tinha dito. Ela olhou para ele novamente. "Quando ela morreu?"

“Cerca de três anos atrás. Ela adorava navegar. Nósnão sabemos exatamente o que aconteceu. Eachann foi quem encontrou o barco em algumas pedras. O corpo dela apareceu na praia dois dias depois."

Ela balançou a cabeça e desviou o olhar. "Que horrível."

“Ela estava sozinha naquele dia. De certa forma, ele teve sorte. Às vezes ela levava as crianças com ela.“

"Crianças? Há mais de uma?"

"Sim. Você conheceu Kirsty."

"Sim." Ela olhou para Amy. "Nós a conhecemos."

"Seu irmão Graham é um ano mais velho."

Ela não disse nada.

Calum tentou encontrar as palavras certas para explicar a essa mulher que seu irmão nem sempre era tão imprudente em suas ações. “Eachann nem sempre pensa nas consequências do que ele escolhe fazer. Ele não é um homem mau. Ele apenas se senteperdido."

Ela ficou estoicamente em silêncio.

Ele podia ver que ela parecia cansada. Ele se perguntou se ela tinha dormido. Ele sabia que ela não tinha comido. "Eu vou ficar com Amy. Vá até a cozinha. David vai lhe dar algo para comer."

"Você não acha que eu vou tentar fugir?"

Seu olhar era claro e direto. "Não."

Georgina deu um pequeno aceno de cabeça e perguntou: "Quem é David?"

"Um primo. Ele faz um pouco de tudo, inclusive cozinhar."

Quantas pessoas vivem na ilha?

"Kirsty e Graham. Alguns primos — Fergus, David e Will, Eachann e eu."

"Só essas pessoas?"

"Somente essas."

"Nenhuma mulher?"

“Além de Kirsty nenhuma, desde que Sibeal morreu."

Georgina levantou-se. Ela respirou profundamente e esfregou a parte inferior das costas. "Eu acho que estou sentada do mesmo jeito por muito tempo."

“Vá em frente. Pegue um pouco de comida. A cozinha fica no andar de baixo na parte de trás da casa."

Ela olhou para Amy novamente. "Ela não se moveu."

Calum assentiu com a cabeça, agora sua atenção já estava em Amy. Em algum lugar no fundo de sua mente, ele ouviu a porta do quarto se fechar. Ele foi cuidadoso ao se sentar. Ele se recostou na cabeceira da cama e descansou um tornozelo no joelho.

Amy continuava deitada completamente inconsciente do que ela estava fazendo com ele. Suas entranhas pareciam torcidas em nós tensos. Ela o perturbava, o confundia, o fazia ciente de sentimentos que ele não sabia que tinha.

Ele tinha a mais profunda sensação de uma desgraça iminente, como se sua vida nunca mais pudesse ser a mesma. Era como se ele estivesse vivendo um pesadelo ou um sonho ou a vida de outra pessoa.

Não havia nada que ele pudesse fazer sobre isso, porque a confusão vinha dela. Ele não podia se afastar disso.

Ele olhou para o rosto pálido dela. Ela tinha pele de marfim e ele lembrou que ela tinha um leve rubor nas bochechas quando não estava doente. Seu cabelo era grosso e encaracolado. Georgina deve tê-lo escovado porque estava espalhado no travesseiro como o sol.

Ele observou as feições dela: o pequeno rosto em forma de coração, um nariz estreito e arrebitado, um queixo forte. Ela tinha sobrancelhas finas e ele podia ver as pequenas veias azuis em suas pálpebras. Suas bochechas eram altas e seu rosto era cheio e saudável, e muito jovem.

Ele estendeu a mão e apenas tocou sua bochecha. Estava quente, não estava fria como parecia. Ele passou as pontas dos dedos por seu rosto, ciente de que ela era suave e real. Ela não era um sonho.

O tempo passou. E ele não tinha ideia de quanto tempo tinha passado e ele não se importava. Ele apenas estava ali, querendo estar ao lado dela, precisando vê-la dormir porque ele estava com medoque ela não acordasse.

Era um pensamento romântico como uma poesia ou como uma peça melodramática que ele já tinha visto e achava idiota. Ele nunca pensou que esse era um pensamentomuito realista porque ele nunca soube o que era ter um romance.

Mas agora ele não conseguia controlar o que estava dentro de sua cabeça. Era quase como se parte dela estivesse fluindo para ele, tomando conta de sua cabeça, de seus pensamentos.

Ele se achava imune às mulheres. Nenhuma delas jamais o tinha tocado tanto. Nenhuma tinha feito seu coração arder. Nenhuma mulher tinha lhe interessado o suficiente para fazê-lo querer aprender algo sobre ela, para entender como ela pensava.

Ele não a via da mesma maneira como viu as outras mulheres. Ele não a via do jeito que ele viu as mulheres imigrantes a quem ele ajudou. Ela era diferente. Quando ele olhava para Amy, ele não a via apenas com os olhos. Ele a via com o seu coração.

Algo que assustava muito.

Seu pulso batia como uma onda distante quando ela o tocava. Ele pegou a mão dela. Seu pulso batia como a ressaca distante quando ele a tocava. Seu coração batia como ondas em seus ouvidos. Por que essa mulher era capaz de fazê-lo se esquecer de que ele não gostava particularmente de mulheres? O que havia nela?

Ele examinou a mão dela, quase como se, ao fazê-lo, achasse que poderia encontrar uma resposta. Mas não tinha nenhuma resposta lá.

Ele virou a mão dela e correu um dedo ao longo de sua palma, seguindo a linha da vida que serpenteava através dela. Ele abriu a própria mão e olhou para a palma da sua mão. Ele a colocou ao lado da dela.

Sua mão era grande e bruta; a dela era pequena e elegante. Suas unhas tinham a forma de meias-luas; as dele eram quadradas, como as velas de um navio. Calos de trabalho duro borbulhavam em suas mãos. A palma dela era macia e pálida e parecia nova em comparação com a dele. Sua pele era muito mais escura que a dela, tão diferente quanto seu humor.

Ele abaixou a mão dela e endireitou as cobertas, apesar delas não precisarem ser endireitadas. Havia uma paz sobre ela, que ele achava irônico.

Quando ele olhou para ela, quando ele estava com ela, ou quando ele pensava nela, não era paz o que ele sentia. Ele experimentava uma tempestade de sentimentos, algo forte que o consumia.

Era algo que ele não queria colocar um nome, apesar de achar que sabia o que era. Algo que ele pensava que estava muito além do queele sentia.

Quando ele olhava para Amy, o que ele sentia era tão antigo quanto o tempo. O que Calum sentia era intenso. Não era amor. Não, não era amor. Era paixão.