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EM MEADOS DE NOVEMBRO, quando Rosy fez sua apresentação sobre o DNA, eu havia aprendido o suficiente sobre o raciocínio cristalográfico para acompanhar boa parte da palestra. Mais importante, sabia em que concentrar minha atenção. Ouvir Francis durante seis semanas me fez perceber que o cerne da questão era se as novas imagens radiográficas de Rosy dariam algum suporte para a existência de uma estrutura helicoidal do DNA. Os detalhes experimentais realmente relevantes eram aqueles que poderiam fornecer pistas para a construção de modelos moleculares. Bastaram poucos minutos ouvindo Rosy, entretanto, para perceber que sua mente determinada tomara um rumo diferente.

Ela falou para um público de aproximadamente quinze ouvintes, em um estilo rápido e nervoso, bem de acordo com a sala de convenções na qual estávamos, antiga e sem decoração. Não havia nenhum traço de calor ou frivolidade em suas palavras. E, ainda assim, não conseguia vê-la como uma mulher totalmente desinteressante. Por um momento, me perguntei como ela ficaria se tirasse os óculos e fizesse um penteado diferente. Minha maior preocupação, no entanto, era sua descrição do padrão de difração dos raios X cristalinos.

Os anos de aprendizado cristalográfico cuidadoso e racional deixaram sua marca. Tivera a vantagem de receber a rígida educação de Cambridge e não podia ser tola a ponto de usá-la incorretamente. Era totalmente óbvio para Rosy que o único caminho para descobrir a estrutura do DNA era por meio de abordagens puramente cristalográficas. Como a construção de modelos não lhe agradava, ela nunca mencionou o triunfo de Pauling com a α-hélice. A ideia de usar modelos semelhantes a brinquedos de montar para desvendar estruturas biológicas era claramente um último recurso. É claro que Rosy sabia do sucesso de Linus, mas não via nenhuma razão óbvia para imitar aquelas idiossincrasias. O tamanho de seus triunfos era motivo suficiente para que agisse de modo diferente; apenas um gênio no seu nível poderia brincar como um garoto de dez anos de idade e ainda assim obter a resposta correta.

Rosy via sua palestra como um relatório preliminar que, em si, não provaria nada fundamental sobre o DNA. A crua realidade só apareceria quando mais dados tivessem sido coletados, permitindo que as análises cristalográficas fossem levadas a um estágio mais refinado. Sua falta de otimismo imediato era compartilhada pelo pequeno grupo do laboratório que comparecera à palestra. Ninguém mais mencionou as vantagens de usar modelos moleculares para ajudar a determinar a estrutura. O próprio Maurice fez apenas algumas perguntas de caráter técnico. A discussão foi interrompida rapidamente quando as expressões nos rostos dos ouvintes indicaram ou que eles não tinham nada a acrescentar ou que, se quisessem dizer alguma coisa, não seria de bom-tom, pois já a haviam dito antes. A relutância em exprimir qualquer coisa romanticamente otimista, ou mesmo em mencionar modelos, talvez se devesse ao receio de receber uma resposta mordaz de Rosy. Ouvir de uma mulher que era melhor conter a ousadia e não opinar sobre um assunto sobre o qual não tinha conhecimento era certamente um modo desagradável de sair para uma pesada e enevoada noite de novembro. Era a certeza de reviver memórias desagradáveis da escola primária.

Depois de uma breve e, como eu observaria mais tarde, caracteristicamente tensa conversa com Rosy, Maurice e eu caminhamos pela Strand até o restaurante Choy, no Soho. O humor de Maurice estava surpreendentemente jovial. De modo lento e preciso, ele detalhou como Rosy, apesar de ter produzido muita análise cristalográfica elaborada, havia obtido pouco progresso real desde sua chegada ao King’s. Embora as fotografias radiográficas dela fossem um pouco mais nítidas do que as dele, ela era incapaz de dizer algo mais categórico do que ele já havia dito. É verdade que Rosy fizera medições mais detalhadas do conteúdo líquido de suas amostras de DNA, mas mesmo nisso Maurice tinha dúvidas a respeito de ela estar medindo o que pretendia de fato.

Para minha surpresa, Maurice parecia encorajado com minha presença. A distância que existia quando nos encontramos pela primeira vez, em Nápoles, desaparecera. O fato de eu, um cientista dedicado a fagos, achar o que ele estava fazendo importante era tranquilizador. Realmente, não ajudava receber incentivo de um colega físico. Mesmo quando encontrava um que achava que sua decisão de migrar para a biologia fazia sentido, ele não podia confiar nesse julgamento. No fim, eles não sabiam nada de biologia, e por isso era melhor levar suas observações para o lado da polidez, até da condescendência, direcionada a alguém que se opunha ao ritmo competitivo da física do pós-guerra.

Para garantir, ele recebera a ajuda ativa e muito necessária de alguns bioquímicos. Caso contrário, nunca poderia ter entrado no jogo. Muitos deles foram essenciais ao lhe fornecerem generosamente amostras de DNA altamente purificado. Já era ruim o bastante aprender cristalografia sem conhecer as técnicas de feitiçaria de um bioquímico. Por outro lado, a maioria não era como os tipos superpoderosos com os quais ele tinha trabalhado no projeto da bomba. Às vezes, eles pareciam até ignorantes quanto à importância do DNA.

Mas, mesmo assim, sabiam mais do que a maioria dos biólogos. Na Inglaterra, se não em todo lugar, a maioria dos botânicos e zoólogos formava um grupo heterogêneo. Nem mesmo suas cadeiras universitárias lhes garantiam fazer ciência limpa; alguns desperdiçaram verdadeiramente seus esforços em polêmicas inúteis sobre a origem da vida ou sobre como sabemos que um fato científico está realmente correto. Pior ainda, era possível se formar em biologia sem aprender nada de genética. Isso para não dizer que os próprios geneticistas não forneciam nenhuma ajuda intelectual. Poderíamos pensar que, com toda a falação sobre genes, eles deveriam se preocupar mais com isso. Ainda assim, quase nenhum deles parecia levar a sério a evidência de que genes eram feitos de DNA. Esse fato era desnecessariamente químico. O que a maioria deles queria da vida era guiar seus alunos para os detalhes não interpretáveis do comportamento dos cromossomos ou fazer especulações confusas e elegantemente construídas sobre tópicos como o papel do geneticista nessa época transicional de valores em transformação.

Assim, saber que o grupo especializado em fagos levou o DNA a sério fez Maurice acreditar que os tempos iriam mudar e que ele não teria de explicar dolorosamente, a cada palestra que desse, por que seu laboratório dava tanta atenção e importância para o DNA. Quando nosso jantar acabou, ele estava claramente inclinado a seguir adiante. Mas, de repente, Rosy voltou a ser o tema da conversa, e a possibilidade de mobilizar de verdade os esforços de seu laboratório lentamente retrocedeu enquanto pagávamos a conta e saíamos para a noite.