Capítulo IX

À Sombra da Idade de Ouro66

O café proporcionou um esplendor econômico e social ao Vale do Paraíba, jamais conhecido anteriormente em terras paulistas. Zaluar, que percorreu várias cidades e fazendas do vale no terceiro quartel do século XIX, faz afirmações deveras informativas a respeito do padrão de vida dos fazendeiros e de suas famílias. “Os grandes proprietários de terrenos, deixando de frequentar os povoados, e reconcentrando­-se em suas fazendas, que são os verdadeiros castelos feudais de nosso tempo, fazem convergir aí toda a vida que reflui das povoações para essas moradas ostentosas onde muitas vezes o luxo e a riqueza disputam primazia à magnificência dos palácios da capital”.67 Esse depoimento seria logo confirmado pelo testemunho de outros viajantes, especialmente os franceses, e ainda hoje encontra uma corroboração indireta. Quem percorra a mesma região em nossos dias e visite as fazendas mais conservadas poderá de fato admirar o conforto e a grandeza das sedes, encontrando aqui e ali um pouco desse antigo fausto na comodidade dos móveis, feito para uma longa duração e para um uso intenso; na extensão da sala de jantar e de estar, própria para o aconchego nas horas de lazer, para o convívio íntimo e para a recriação associativa; e, enfim, na fisionomia dessas rústicas mansões senhoriais, que inspiram segurança em face do mundo exterior, mesmo aos seus visitantes mais afoitos ou apressados. Sobravam, pois, razões a Zaluar, quando escrevia: “Como é diferente a vida da roça da existência monótona de povoações! Ali as distrações abundam. Vive­-se na sala, vive­-se nos passeios, vive­-se na conversação da intimidade”.68

Todo esse esplendor, porém, estava destinado a fenecer, a extinguir­-se, a tornar­-se muito cedo uma grandeza pretérita. O café que o criaria, não o manteria no mesmo lugar indefinidamente. Os mais ambiciosos e tenazes deslocaram­-se com a planta, procurando­-lhe terras novas, o que uma ficção permitia descrever como consequência da avidez dos cafezais por “terrenos virgens”. Outros, menos animosos, ficaram por lá mesmo onde a ruína os achou, reduzindo­-os com seus familiares, conforme circunstâncias variáveis, a uma indissimulável penúria, a uma vida pacata mas apertada, ou a uma existência confortável mas sem ostentações. Atrás da lenta extenuação das terras, vieram outros males para o equilíbrio econômico das fazendas: a crise do café, em 1880; a escassez de braços, produzida pela desagregação do regime servil e pela incapacidade financeira de muitos fazendeiros do Vale de “importar” trabalhadores estrangeiros, por volta de 1887;69 a geada de 1918; a crise econômica de 1929; a broca... As resistências se quebraram. Os que não se arruinaram completamente foram tentar a sorte em outras plagas ou reduziram drasticamente o seu estalão, conformando­-se às novidades do marasmo econômico. Uma transformação dessa ordem não se operaria sem deixar marcas profundas. A contradição entre o passado recente e a realidade seguinte vai situar diversamente os indivíduos no mesmo cenário natural. A sociedade se altera internamente com maior rapidez que o ambiente físico exteriormente. Mas ninguém quer dar pela coisa. O fluxo da vida continua incessante, sem que a confiança no futuro e a convicção de prosperidade possam bafejar a um grande número, como antes.

É dentro desse ethos, no qual com muita simplicidade o orgulho se mistura com o desencanto, que o pesquisador precisa projetar­-se, ao inquirir os descendentes dos antigos senhores rurais, quaisquer que sejam as posições por eles ocupadas atualmente na sociedade. O passado permanece vivo: toda uma herança moral continua a insinuar­-se nos comportamentos cotidianos e nos ideais de vida, criando obrigações variadas e laços invisíveis de solidariedade, ou agitando sentimentos contraditórios, em particular contra os estranhos (ou os intrusos, como seria melhor dizer), canhestramente disfarçados. Na memória dos mais velhos conserva­-se uma imagem nítida da velha ordem social. Ouve­-se, então, que “os fazendeiros de prol” de Taubaté chegavam a possuir três (e não duas, como supunha Zaluar) residências; uma na fazenda, uma na cidade e outra em Tremembé, para assistirem às festas religiosas, especialmente a de Bom Jesus. As evocações reconstroem uma sociedade idealizada, mas que não está longe do modelo original. As obrigações, os direitos, os graus de prestígio e as posições sociais são definidos em torno de um polo constante: a pessoa dos fazendeiros. A julgar por essas evocações, em vez de simbolizarem uma hierarquia social, eles seriam a própria fonte de toda e qualquer classificação social naquela sociedade.

Em primeiro lugar, viriam os que se ocupassem com as chamadas “profissões nobres”. Era a camada dominante, constituída pelas “pessoas de prol”. Todavia, em seu seio, os fazendeiros representavam a “verdadeira aristocracia rural”. A essa camada também pertenceriam o clero e os que exercessem “profissões liberais”, desfrutando de grande proeminência: os juízes e tabeliães. Em segundo lugar, estariam os sitiantes, dos quais nos informam que eram pouco numerosos, mas em geral muito considerados pelos fazendeiros. O sitiante, por sua vez, tanto podia estar ligado a “famílias boas”, explicando­-se sua situação econômica pelas sucessivas partilhas de propriedades antigas, quanto ser um camarada ou agregado, protegido por algum senhor. O primeiro gozava, naturalmente, de maior prestígio e mantinha relações íntimas com os membros da camada dominante. Em terceiro lugar, contar­-se­-iam os “comerciantes”. Todas as pessoas que viviam do comércio, como proprietários e negociando com os próprios recursos, entravam nessa categoria, afirmou­-nos o informante. Os beneficiadores e comissários de café eram igualmente classificados e tratados como “comerciantes”. Contudo, quando o fazendeiro fosse também beneficiador, prevaleceria a qualificação mais elevada. De modo geral, assevera­-se, os “comerciantes” não recebiam o tratamento como “iguais” por parte dos fazendeiros nem eram incluídos em seus círculos de “amigos” ou de relações sociais íntimas. Os fazendeiros chegariam a recusar­-se a lhes vender suas fazendas, mesmo nos casos de grande precisão. Atestou­-nos um descendente de antigos fazendeiros que, “nos bons tempos”, as fazendas só seriam vendidas a pessoas conhecidas. Por fim, viria a quarta camada, composta por indivíduos de “profissões mecânicas”. Os dados contidos nas evocações permitem distinguir diversos estratos: 1º) os “caixeiros”, vendedores de balcão, que mereciam maior consideração, por saberem ler e escrever; 2º) os “agregados e boleeiros”, que contavam com a simpatia dos fazendeiros e recebiam deles favores diretos (terras para cultivo de mantimentos ou serviços, que os expunham à condição de “pessoas de confiança”, em contato permanente com os familiares do chefe ou com ele próprio); 3º) os “feitores”, que exerciam certa autoridade sobre os camaradas, comunicando suas faltas ao fazendeiro – embora não ganhassem mais, desfrutavam do prestígio inerente à situação que ocupavam em face dos interesses daquele; 4º) os “camaradas, que se incluíam no último patamar da última camada: trabalham para os fazendeiros por dia, por empreitada ou por mês; mas, às vezes, alcançavam parceria em certas produções e dispunham da regalia de usar pequenas áreas da fazenda, para a produção dos mantimentos de subsistência. O agregado recebia maior consideração, talvez por ser menos dependente ou por participar de forma mais direta do convívio com o fazendeiro ou com seus familiares; é certo que alguns descendiam de “famílias boas” arruinadas, recebendo um tratamento mais afetivo por parte dos fazendeiros. Quem não tinha uma posição certa nessa hierarquia era o “administrador da fazenda”. Tanto poderia ocupar uma das posições inferiores, da primeira camada, quanto estar no topo da segunda. De fato, o seu prestígio e classificação dependeriam de sua situação pessoal. Se descendesse de uma “família boa” ou se fosse parente do fazendeiro, seria incorporado socialmente à primeira camada; se tivesse sido anteriormente um antigo camarada, que “subira” graças à devoção aos interesses do fazendeiro e à simpatia conquistada no ânimo deste, classificar­-se­-ia na segunda camada. Por isso, ser administrador da fazenda tanto podia significar perda de prestígio quanto traduzir ascensão social. A primeira alternativa é ilustrada pelo dito: – “É. Fulano já esteve mal uma vez! Chegou a ser administrador de fazenda!”

O que revela notar, nessas evocações – cuja veracidade sociológica, como meios de reconstrução do passado real, não nos interessa aqui – é o realce em que é posta a estabilidade nas relações sociais e as implicações do prestígio no tratamento recíproco. Elas retratam um sistema de posições sociais em que a mobilidade existe, é reconhecida, mas pode ser contida dentro de certos limites, sem transformar­-se, portanto, numa ameaça à ordem social. Um Zé dos Anzóis qualquer nunca passaria de um zero dentro dele; pois a ascensão social dependia de relações pessoais, de conhecimento mútuo e principalmente do reconhecimento pessoal do esforço realizado, dentro de um círculo restrito de critérios de avaliação. Elas descrevem um sistema de relações sociais em que o direito de mandar e o dever de obedecer se regulam pela tradição e em que o parentesco coloria fortemente todas as esferas de ajustamentos sociais, conformando os interesses ou reativando as obrigações mútuas. Um exame superficial sugere, desde logo, que a imagem retida não reproduz mais o regime social imperante no vale no período de fastígio indiscutível do café, no terceiro quartel do século passado.70 Mas o seu modelo atenuado, no qual todas as normas e padrões de comportamento senhoriais, que regulavam o tratamento recíproco do senhor e do escravo,71 foram abolidos. A insistência nos aspectos mais característicos da antiga organização social senhorial demonstra, porém, que se associam, nos meios humanos em que essas lembranças se conservam, atitudes de lealdade e de preferência para com os princípios em que se fundavam as relações humanas no passado. Trata­-se de uma impulsão de conservantismo social que é mais ativa e significativa que a mera “saudade de antanho”. Ela configura toda uma perspectiva social que vincula ao passado os indivíduos que a aceitam, levando­-os a procurar fora do presente uma inspiração para o ajustamento às situações sociais atuais e as medidas de valor para o exame crítico das “novas condições de vida”. Vemos nessas evocações o clima sociocultural que alimenta as reflexões intelectuais, pessimistas mas construtivas a seu modo, de autores como Alberto Torres e Oliveira Viana.

Poderiam alegar que atitudes dessa natureza, polarizadas em torno do passado e da sua significação, são inadequadas aos ajustamentos e controles sociais impostos pelas situações de vidas emergentes. Isso é verdadeiro, principalmente quando as tendências conservantistas se produzem em uma sociedade em mudança e quando elas contrariam as tendências evolutivas de transformação da ordem social. No caso das comunidades localizadas no Vale do Paraíba, é o que parece ocorrer, à primeira vista. Em quase todas as zonas impôs­-se a substituição do cultivo do café pelo de outras plantas ou pela criação de gado. Além disso, várias atividades industriais ou extrativas se introduziram aqui e ali, sendo que a própria “lavoura de café” tende a ser explorada através de técnicas mais modernas. O afluxo de imigrantes, nacionais e estrangeiros, também contribuiu para afetar as antigas condições de existência e para criar novos focos de alteração da ordem social. Deixando de lado essas e outras questões – pois não temos o propósito de fazer uma análise sociológica das transformações sociais que se operam atualmente nas comunidades do Vale72 – seria o caso de se indagar se as atividades apontadas prejudicam, de certa forma, os descendentes dos membros das velhas “famílias boas”, em particular no que concerne à competição com os imigrantes nacionais e estrangeiros que lá se fixaram.

Através de entrevistas que fizemos, com descendentes dessas antigas famílias, alguns dos quais fazendeiros, outros funcionários públicos ou professores, constatamos que essas atitudes se vinculam a uma rede atual de interesses sociais. Para essas pessoas, a conservação de atitudes que as associam ao passado representa uma fonte de prestígio social e lhes confere uma dignidade toda especial, em confronto com os moradores mais recentes, enriquecidos por meio de atividades que gravitam em torno do comércio, da criação de gado ou de certas indústrias, e quase sempre através de penosos esforços considerados pouco conspícuos, em face dos exemplos legados pelos antepassados e defendidos pela tradição. De modo que a vinculação ao passado, além de ser algo emocional e moralmente compreensível, possui fundamentos sociais facilmente assinaláveis. Não constitui, portanto, uma mera ficção, para obter sensação de segurança e o sentimento de continuidade social. É também o ponto de apoio para o funcionamento de certos critérios de preservação do prestígio antigo, abalado pelo empobrecimento relativo ou completo, tanto quanto pela ascensão econômica de famílias adventícias; e o background que assegura, em condições econômicas e sociais relativamente adversas, a obtenção de posições sociais compatíveis com aquele prestígio e com as concepções de dignidade, herdadas do passado. Os imigrantes estrangeiros e os seus descendentes, bem como os mineiros e seus descendentes, que se localizam pela região, apesar de sua crescente hegemonia econômica, não encontravam vantagens em romper com as linhas de acomodação estabelecidas por essa complexa noção de superioridade social. De um lado, já acharam tais pessoas exercendo a autoridade política e administrativa ou a direção das melhores fazendas. Aprenderam a respeitá­-las desde o início, embora introduzindo distinções inevitáveis, que excluem uma avaliação uniforme dos símbolos de prestígio e dos critérios de graduação social, sustentados em nome da tradição. De outro lado, para eles próprios a ascensão social deixa de medir­-se somente pelo sucesso econômico. A aceitação, na qualidade de amigo íntimo ou de parente afim, em grupos domésticos mais ou menos exclusivistas, possui a significação evidente de reconhecimento público de sua integração às camadas socialmente dominantes da sociedade.

Uma esfera em que as referidas atitudes parecem produzir efeitos contraproducentes, tendo­-se em vista os interesses ou as necessidades reais dos seus portadores, é a que diz respeito ao aproveitamento de oportunidades econômicas nascidas do esfacelamento da velha ordem senhorial e do antigo sistema econômico, baseado na exploração exclusiva do café. A maioria dos informantes assevera que os mineiros traziam consigo recursos para adquirir terras e encetar a criação de gado. Todos reconhecem, porém, que os imigrantes estrangeiros, especialmente os italianos, não contavam com tais recursos. Obtiveram seu capital pela poupança. Aceitaram os percalços oriundos da própria ocupação em atividades menosprezadas e da observância de um nível de vida muito inferior ao que seria tolerável de acordo com a tradição. Pelo que pudemos observar, tanto os mineiros quanto os italianos, os sírios e libaneses, os japoneses empregaram em maior ou menor grau as mesmas técnicas de poupança. A diferença entre eles parece estar mais no fato de possuírem os mineiros, que iniciaram a exploração da criação de gado, pecúlios acumulados anteriormente, nas localidades de onde provinham. Aos moradores nativos, entretanto, tais técnicas de acumulação de capital estavam naturalmente vedadas. Não só não seria digno ocuparem­-se em determinadas tarefas ou serviços, como não seria conspícuo sujeitar­-se, mesmo transitoriamente, a um padrão de vida que sacrificasse, direta ou indiretamente, o prestígio da família. Em consequência, os descendentes dos antigos moradores, que possuíam alguns recursos ou mantinham intactas suas propriedades, em particular as fazendas, puderam ajustar­-se sem dificuldades às condições de acomodação com os mineiros e com os imigrantes estrangeiros. Os que nada ou pouco possuíam, porém, ficaram, por assim dizer, imobilizados por sua situação econômica incômoda, presos a empregos que não expunham seu prestígio, mas que também não proporcionavam rendas capazes de contribuir para restaurar a influência anterior de suas famílias. Daí o dilema: ou procurar outros meios de vida fora do Vale – em cidades como São Paulo, por exemplo – ou aceitar as condições insatisfatórias de existência social. É neste setor, entre os que optaram pela permanência nos lugares queridos, em circunstâncias difíceis, que é mais viva a lembrança do passado e em que se patenteiam ressentimentos mais intensos contra os “mineiros” e contra os “estrangeiros”. Sabem que também poderiam ter “enriquecido”, se dispusessem, a tempo, a pagar um preço que lhes parecia tão alto pela prosperidade.

Assim, tende a operar­-se uma indisfarçável diferenciação, com referência aos interesses sociais dos descendentes dos antigos fazendeiros. Todos mantêm certas convicções relativas à importância da agricultura e do café na economia brasileira. Mas os que conseguiram preservar uma situação econômica autônoma se identificam mais com as possibilidades de desenvolvimento rural da região. Os que se viram reduzidos a uma posição de heteronomia econômica, por causa da dependência de empregos na administração pública ou particular, se identificam mais com as possibilidades de desenvolvimento dos núcleos urbanos. Pode­-se verificar esse contraste pelas atitudes em face dos mineiros. Entre os entrevistados, um fazendeiro ancião nos afirmou, referindo­-se ao passado: “Os fazendeiros daquela época entendiam que lavoura era café. O resto, para eles, era quitanda”. Outro, também ancião, disse­-nos: “Para o fazendeiro é uma vergonha comprar alguma coisa que a terra dá. É como papai dizia: o fazendeiro que compra o que pode produzir na fazenda (arroz, feijão, frutas etc.), não é fazendeiro”. Um descendente de fazendeiro de café, mas que atualmente é funcionário público, sustentou por sua vez, no mesmo diapasão, que o café é o único produtor que oferece garantia ao fazendeiro. No seu entender, “os antigos fazendeiros de café eram homens de caráter, de energia, de independência moral e de palavra”, qualidades que supõe existir até hoje nos que se dedicam a essa atividade. Todavia, os fazendeiros que defendem essas ideias procuram transformar suas fazendas, introduzindo nelas a criação de gado. É verdade que criticam os mineiros por não se associarem emocional e praticamente às suas representações sobre o padrão ideal de organização das fazendas, extraído das experiências tradicionais. Acham que eles reduzem as fazendas a meras empresas mercantis, destruindo as antigas benfeitorias ou pomares, reduzindo ao mínimo o pessoal e não cuidando de construir ou manter instalações para residência do fazendeiro e sua família. Mas imitam­-nos, procedendo em maior ou menor escala quase do mesmo modo, talvez premidos pelas circunstâncias ou pela natureza do novo gênero de exploração. Já os que vivem de serviços que dependem da existência e do progresso de núcleos urbanos, veem na substituição do café pela criação um mal irreparável – e dele culpam os mineiros. Amam duas equações, expressas por um informante da seguinte maneira: a) “onde entra o boi, sai o homem”; b) “o mineiro é o maior inimigo da civilização: onde ele cria, desaparecem os seres humanos e a vida civilizada”.

Nesse sentido, é interessante o que nos adiantou um funcionário federal, entrevistado em Jambeiro: “O leite é mais seguro que outros produtos sucedâneos do café. Tem saída garantida e não precisa de braços. Duas pessoas, quando muito, podem lidar com o gado”. “A fazenda do meu [...] tinha 90 famílias. E agora que foi vendido para mineiros, tem umas três famílias. Três famílias dão conta do serviço.” “Isso é ruim para a cidade. Paralisa o comércio. Das fazendas têm saído muita gente. Elas têm poucos colonos agora. Da cidade também tem saído gente.” Como se vê, pondo de lado outros aspectos, atrás de uma relativa uniformidade ideológica, começam a surgir, entre os descendentes das antigas “famílias boas”, certas diferenças, matizadas pela polarização de seus interesses econômicos na nova estrutura social em formação. É que o mundo que os unia indissoluvelmente se está esfacelando com celeridade e os seus destinos só se prendem pelo passado, mal se cruzando no presente, graças a afinidades que não podem possuir uma influência prática determinante.

Outra esfera, em que as atitudes indicadas parecem provocar efeitos negativos: à medida em que se associam a valores legitimados pela tradição, aquelas atitudes tendem a transformar­-se em critérios de avaliação do presente e de exame crítico dos valores nascidos das novas condições de existência social. Daí resultam, se não tensões sociais propriamente ditas, pelo menos uma certa incapacidade de compreensão racional do presente e, em particular, manifestações de intolerância diante de inovações socialmente necessárias ou inevitáveis. Os focos de vida social moderna, que se chocam mais diretamente com tais orientações de avaliação crítica, são os que se referem à quebra e assimetria no tratamento recíproco de indivíduos de posições sociais desiguais (nas relações entre patrão e empregado; entre pessoas de idades diferentes; entre o homem e a mulher em geral; entre o negro e o branco etc.); à inobservância das normas antigas de polidez, de certos comportamentos cerimoniais, a serem postos em prática em visitas, na troca de cumprimentos, ao entrar em uma dependência íntima na casa dos pais etc.; à generalização de comportamentos privativos, antigamente dos fazendeiros ou que eram confinados pela tradição, em termos de posição social dos agentes e de conveniência sociais; e, especialmente, às condições que favorecem a ascensão econômica e social dos “estrangeiros”, da “mulher” e dos que não têm “eira nem beira”, as quais solapam os fundamentos da dominação patrimonialista e da ordem social tradicional. Nos limites deste trabalho, não podemos dispensar a esses temas a atenção que eles merecem. A título de ilustração, gostaríamos de apontar um exemplo. Ouvimos de um informante recriminações sobre o comportamento das esposas “modernas”. Salientou que, no passado, as esposas não se envolviam em aventuras amorosas dos maridos. Mesmo quando desconfiavam das infidelidades ou conheciam, com certeza, as mucamas preferidas, guardavam um digno segredo. Se algum parente tentasse abordar o assunto, desmentiam categoricamente os boatos. Agora, “as mulheres vão discutir fora de casa as aventuras do marido. Assim, elas são as primeiras a estragar a reputação do marido e com isso destroem a reputação e a respeitabilidade da família. Por isso, hoje a família não tem mais a mesma consistência que antigamente, porque os filhos perdem o respeito pelos pais e a mulher pelos filhos e por si mesma. O marido fica também desacreditado diante dos amigos e dos filhos, porque é a própria mulher que toma a iniciativa de acusá­-lo”.

Seria necessário lembrar que tais atitudes produzem, também, efeitos que são socialmente construtivos: a consciência de um passado comum, em um país novo como o Brasil e em plena formação nacional, cria uma comunidade de existência e associa de forma mais profunda os indivíduos. Doutro lado, ela conduz à convicção de que as pessoas, mesmo quando agem individualmente, o fazem como parte de um grupo e devem, portanto, proceder de modo a respeitarem os interesses coletivos e as normas morais de solidariedade social imperante dentro do grupo. Daí a projeção das atividades econômica fora do âmbito exclusivamente personalista: as noções do que é “patriótico” e do que é “impatriótico” na organização econômica das fazendas, vistas isoladamente, como uma empresa, ou como uma unidade de um todo maior, em suas relações com as povoações circunvizinhas. Muitos diriam que os descendentes das antigas “famílias boas” defendem tais ideias porque elas exprimem econômica e socialmente os seus próprios interesses. Isto não é inexato, como já apontamos. Mas existem outros móveis atrás dessas ideias. Senão, por que somente eles combatem, abertamente, nas conversações ou mesmo por escrito, os efeitos do êxodo rural, do despovoamento das fazendas e das comunidades rurais? Além disso, por que, quando fazendeiros, alguns deles se esforçam por continuar a exploração do café ou por constituir fazendas mistas, de café e de criação? Na Fazenda Barreiro ouvimos de seu proprietário que “a lavoura é uma obra patriótica” e que o fazendeiro deve desenvolvê­-la, desde que conte com mão de obra. O desejo de reconstruir a prosperidade do Vale do Paraíba com base na exploração do café tem levado esses fazendeiros a procurar novas técnicas agrícolas e a cogitar da recuperação das terras. Essa inspiração cria incompreensões, especialmente contra a industrialização, que se expande em algumas zonas, contra o melhor aproveitamento das possibilidades abertas pela criação, e contra certas medidas de intervenção do Governo no campo. Porém ela incide sobre algo que é essencial para um país agrícola: a necessidade de pensar com carinho e com inteligência os problemas da lavoura. É verdadeiramente uma pena que semelhantes preocupações surgissem tardiamente, quando a terra está exaurida, a mão de obra indecisa e o próprio cultivo do café comprometido. Certas tentativas, aparentemente coroadas de êxito, demonstraram, no entanto, que a esperança no café não é uma utopia. É antes uma questão de técnica, de organização do trabalho, de nível de preços no mercado internacional. Ainda assim, para muitos, uma esperança dessa ordem representa uma ilusão temerária.

Apêndice

O café na evolução de São Paulo73

Ninguém ignora que o café foi o principal fator de desenvolvimento econômico e da prosperidade de São Paulo. Graças ao café, a vida econômica de São Paulo saiu do marasmo em que se mantinha durante o fim do século XVIII e a primeira metade do século XIX. Ela integrou­-se, rapidamente, no sistema econômico tropical, com profundas transformações no cenário natural e humano da região. O fenômeno ocorreu com tamanha rapidez, que mesmo os observadores mais argutos acabaram representando o café como um “fator” de povoamento, de enriquecimento e de progresso.

O que se poderia pensar, em nossos dias, do papel desempenhado pelo café na evolução de São Paulo? Depois de várias investigações, que puseram em evidência os aspectos negativos e as consequências construtivas de sua exploração e exportação permanente, seria legítimo manter as ilusões que alimentaram o labor dos pioneiros? Ele, de fato, proporcionou segurança e prosperidade às populações rurais que se dedicaram à sua plantação e colheita? Os fazendeiros, que se beneficiaram com a exportação dos produtos de sua lavoura, foram os agentes diretos ou indiretos da expansão econômica das cidades localizadas nas “zonas cafeeiras”? As técnicas modernas asseguram a revitalização de sua exploração econômica? É verdade que o café serviu de fulcro ao nascimento de outras atividades econômicas e continuará a ser o esteio de nosso sistema econômico?

Essas e outras perguntas deveriam ser feitas pelos estudiosos, que pretendessem examinar a importância do café como “fator” histórico­-social. Não nos julgamos credenciados a respondê­-las: por incrível que pareça, os principais aspectos da chamada “civilização do café” continuam ignorados ou mal conhecidos. Por duas vezes, pelo menos, tentou­-se estudar o fenômeno em conjunto, segundo critérios objetivos e sistemáticos. Na primeira, um grupo de especialistas, ligado a um órgão que teve duração efêmera, o Instituto de Pesquisas Sociológicas, propôs um plano exaustivo de investigação da “estrutura e organização social das zonas cafeeiras” (esse projeto de pesquisa foi publicado pela revista Sociologia, vol. I, nº 2, 1939, p. 94­-101). Na segunda, o prof. Fernando de Azevedo elaborou, em setembro de 1947, um plano sobre “A civilização do café em São Paulo: estudo sociológico de suas origens, estrutura e mudanças”, que deveria ser desenvolvido em colaboração pelos professores e assistentes do Departamento de Sociologia e Antropologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Ambos os projetos abortaram, por falta de recursos financeiros, o segundo após a realização de algumas excursões de pesquisas no Vale do Paraíba.

Ainda assim, é possível assinalar alguns traços mais relevantes e gerais da influência do café na evolução de São Paulo. O primeiro deles diz respeito, naturalmente, à inclusão da economia paulista no sistema econômico tropical. O café foi, sem dúvida nenhuma, o produto que permitiu esse processo e deu a São Paulo a posição de principal unidade exportadora do país. Embora se possa sustentar que outros produtos seriam capazes de desempenhar funções análogas, o fato é que as tentativas relacionadas com a exploração do algodão, da cana­-de­-açúcar, do chá etc. foram empreendidas sem sucesso prático apreciável. Graças a circunstâncias que não vem ao caso discutir agora, o café impôs­-se como o produto tropical que integrou a vida econômica de São Paulo à economia produtiva da nação e à economia internacional.

Todos os demais traços da influência histórico­-social do café decorrem dessa situação: como produto básico de nossa economia tropical, ele se projeta como o substrato econômico de todos os processos que marcam a formação e o desenvolvimento de novos estilos de vida em São Paulo. Por isso, é possível associar ao café fenômenos tão diversos como a constituição de uma aristocracia rural semelhante à que existia no norte do país (como ocorreu principalmente no Vale do Paraíba); o florescimento de nova mentalidade econômica, que fez do fazendeiro paulista um legítimo representante do espírito capitalista inerente à exploração econômica de produtos agrícolas tropicais (o que se exemplifica com a expansão do Oeste Paulista); a desagregação do regime servil e a implantação do trabalho agrícola livre; a imigração e a ascensão social dos imigrantes; a mobilidade de populações, com seus reflexos do desbravamento do “sertão” e na fundação de cidades; a diferenciação de nosso sistema comercial e bancário bem como a concentração das riquezas e a reaplicação de capitais fora da lavoura. Mesmo um fenômeno como a transformação de São Paulo em comunidade urbana e em metrópole liga­-se, diretamente, a consequências produzidas pelo surto econômico cafeeiro. Pois, foi a expansão do Oeste Paulista que fez da cidade de São Paulo o centro econômico de vasta região produtiva.

É preciso salientar, porém, que em cada caso ou em cada uma dessas conexões o café não conta como tal. Não foi o café que deu origem a este ou àquele efeito. O fator dinâmico, propriamente dito, está nas condições de sua elaboração em elemento básico de nossa economia tropical. Vendo­-se as coisas deste ângulo, o café se apresenta como uma das peças de engrenagens mais complicadas. Tomemos, como exemplo, a mobilidade horizontal de populações: é ela um efeito puro e simples da “sede” ou da “ânsia” do café por “terras virgens”? Está claro que não. Esse efeito prende­-se a um conjunto maior de determinações, em que se deve ter em conta a disponibilidade de terras virgens, o custo da mão de obra agrícola, o ritmo da procura, os lucros assegurados pela venda do produto etc. Essas determinações é que pesaram, de modo específico, na preservação e na aplicação de técnicas agrícolas rudimentares, que tornaram o café uma planta migrante e fizeram o homem caminhar atrás dela. Mas ele é uma peça constante, que está sempre presente nos processos econômicos ligados à conquista e à ocupação da terra pelo homem. Daí o seu caráter de influência universal, como condição material que se repete inevitavelmente, mesmo através de flutuações na organização da vida econômica.

Desta perspectiva, é fácil perceber que o café não é um episódio do passado, na evolução de São Paulo. A influência do café tem preocupado os geógrafos, os historiadores e os sociólogos mais em termos de “realidade vivida”: o que aconteceu no Vale do Paraíba, no Oeste Paulista, nas zonas pioneiras, graças às riquezas e às oportunidades criadas pela exploração do café? Esse tipo de análise ex eventu dá­-nos a possibilidade de acompanhar todo o ciclo “natural” percorrido pelas famílias, pelas cidades e pelas regiões enriquecidas com o café. A prosperidade traz consigo a importação de um nível de vida que, com frequência, não pode ser mantido após a evasão da planta para outras áreas. Ou, então, ela representa o início de novos empreendimentos: nas zonas rurais, da criação ou da policultura; nas zonas urbanas, do comércio e da industrialização. De um lado, temos a alternativa representada pelas “cidades mortas”; de outro, parte da explicação do crescimento de cidades como São Paulo, Campinas, Marília etc. Também homens de ação veem os processos sociais e econômicos desse ângulo, o que os leva ter pouca confiança no futuro de São Paulo. Parece­-lhes que o café, como fonte de riqueza, está com os dias contados.

Ora, a maior lição que se pode tirar de uma análise evolutiva consiste em que o café revela grande plasticidade de adaptação a diferentes regimes de exploração econômica. Em geral, pensa­-se que ele foi explorado com êxito por causa da combinação do latifúndio à lavoura devastadora, o que permitia a migração do homem e a reconstrução das plantações em outras áreas. O que aconteceu no norte do Paraná veio demonstrar que é possível obter sucesso independentemente de uma dessas condições (o latifúndio); o que está ocorrendo em áreas previamente esgotadas (tanto no Vale do Paraíba quanto no Oeste Paulista) demonstra que aquela combinação constituía o produto de uma tecnologia agrícola deficiente, incapaz de assegurar a restauração do equilíbrio na natureza pelo homem. Definitivamente, ambos os tipos de experiência sugerem que a importância econômica do café não deve ser vista como algo do passado.

Essa conclusão não é destituída de significação. Ela indica que o café continuará a ser produzido em terras paulistas, seja para exportação, seja para o consumo interno. O seu papel como substrato da vida econômica e social, todavia, terá que se alterar substancialmente. Deixando de ser o fulcro das atividades econômicas produtivas, perderá concomitantemente a antiga influência ativa, que o convertia em denominador e foco de crescimento de uma civilização. Processo similar afetou a posição de outros produtos na evolução da economia brasileira. Contudo, como escreve Roger Bastide, “o reino do café ainda não terminou”, já que dele depende o equilíbrio econômico e financeiro do Brasil. Em outras palavras, isso quer dizer que ainda não se encerrou a fase das influências socialmente construtivas do café. Se ele não oferece mais a motivação do comportamento econômico, em troca fornece grande parte dos recursos que alimentam a formação da civilização industrial em São Paulo. Mesmo que esta venha a ser a sua derradeira manifestação como fator histórico­-social, está fora de qualquer dúvida que esta será rica de consequências para o futuro da sociedade brasileira.

66 O presente artigo resulta da interpretação de dados colhidos no decorrer de três excursões, que o autor teve oportunidade de realizar através do Vale do Paraíba. A primeira foi feita a Cunha, em companhia do dr. Emílio Willems; a segunda e a terceira foram feitas a diversas comunidades em companhia do sr. Carlos Borges Schmidt e dos professores Antonio Candido de Mello e Souza, Egon Schaden e Gioconda Mussolini, sendo que da última também participou e deu colaboração inestimável o professor Gentil de Camargo. Sob a direção do dr. Fernando de Azevedo, o Departamento de Sociologia e Antropologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras iniciara uma investigação de larga envergadura sobre a Civilização do Café em São Paulo. Ela precisou ser interrompida, porém, por falta de recursos financeiros. As duas últimas excursões mencionadas faziam parte desse projeto, que devia descansar, essencialmente, em dados obtidos por meio de pesquisas de campo. Foi publicado, originalmente, na Edição Especial Dedicada ao Café dos Diários Associados (15 de julho de 1954). Posteriormente, foi publicado um estudo sobre Vassouras que é uma autêntica obra-prima, à qual remeto do leitor interessado no assunto: Stanley J. Steins, Vassouras. A brazilian coffee county, 1850-1900 (1957), publicado em tradução de L. Ventura sob o título Grandeza e decadência do café no Vale do Paraíba (São Paulo, Brasiliense, 1961).

67 Augusto Emílio Zaluar, Peregrinação pela província de S. Paulo. (1860­-1861). Rio de Janeiro, Livraria de B. L. Garnier, 1862; p. 55.

68 Idem, p. 61.

69 Em outro trabalho, escrito em colaboração com Roger Bastide, referimo­-nos aos aspectos, aqui subentendidos, da competição por mão de obra entre os fazendeiros do Vale e do Oeste. Não seria propício insistir no assunto, tendo em vista a natureza do presente capítulo. Conviria lembrar, porém, que, pelo menos num certo setor, a ideia de substituir o escravo pelo imigrante se implantar bem antes do desfecho da questão servil. Leiam­-se, por exemplo, os seguintes trechos de um artigo de fundo, publicado em 15/5/1887, pela Gazeta de Taubaté assinado por A Lavoura. “Os fazendeiros do norte e da província, especialmente o deste município, ainda dormem o sono da indolência com relação à substituição do trabalho, talvez julgando, que, mesmo dado o caso da extinção imediata, os escravos de hoje continuarão em seus trabalhos; manifesto engano.” “Eles, uma vez livres, serão o pesadelo da sociedade e o terror das famílias; porque eles só cogitam em serem livres, mas não lhes passa pela mente a mais pequena ideia do trabalho para sua alimentação.” “Há dois anos ou mais, falecendo o comendador Castro, deixou livre grande número de escravos, e bem assim uma vasta zona de terras para colocarem­-se; no entanto, não se encontram um só desses novos cidadãos situados no lugar indicado por seu ex­-senhor, e muitos deles jazem aí em completa ociosidade.” Aconselha a introdução de imigrantes no trabalho agrícola, como forma de substituição antecipada e gradativa do trabalhador escravo. Isso era, todavia impossível – pela razão “capital” indicada por Rodrigues Alves. “Variam as condições nos municípios: em alguns a substituição se fez naturalmente; nos outros, custará penosos sacrifícios, ou porque os proprietários não tenham encarado, com o devido interesse, a momentosa questão, ou porque descansem na confiança de que a extinção do elemento servil se fará pela ação normal das leis existentes, ou ainda porque, e é a razão capital, lhes falte crédito para empreenderem a substituição e as suas terras depauperadas não ofereçam remuneração suficiente e proporcional ao trabalho” (cf. Relatório Apresentado à Assembleia Legislativa Provincial de S. Paulo pelo Exmo. Snr. Dr. Francisco de Paula Rodrigues Alves, no dia 10 janeiro de 1888; São Paulo, 1888, p. 22).

70 Analisando sociologicamente, em seus aspectos mais gerais, por Maria Isaura Pereira de Queiroz cf. “A estratificação e a mobilidade social nas comunidades agrárias do Vale do Paraíba, entre 1850 e 1888”, in Revista de História, nº 2, São Paulo, 1950). Um estudo que abrange uma unidade maior de tempo e que merece ser considerado pelo leitor, embora se refira somente a uma das comunidades, é o de Lucília Herrmann (“Evolução da estrutura social de guaratinguetá num período de trezentos anos”, ed. da Revista de Administração, São Paulo, 1948). Vejam­-se, ainda: Stanley J. Stein op. cit.; e Maria Sylvia de Carvalho Franco, Homens livres na ordem escravocrata, São Paulo, Instituto de Estudos Brasileiros, USP; 1969.

71 Sobre a etiqueta de relações sociais entre senhores e escravos na antiga ordem senhorial, cf. Roger Bastide e Florestan Fernandes, Relações entre negros e brancos em São Paulo, cap. II (in Anhembi, ano III – nº 31, vol. XI, São Paulo, 1953).

72 O leitor encontrará, em um ensaio de Carlos Borges Schmidt, algumas descrições relativas a alterações da vida rural em comunidades do Vale do Paraíba (cf. O meio rural. Investigação e estudos de suas relações sociais e econômicas, 2. ed., São Paulo, 1946). Restringindo­-se a uma comunidade, Emílio Willems realizou uma análise sistemática das tendências conservantistas e de mudança social que se manifestam atualmente em quase todas as aglomerações humanas dessa ampla região, mesmos as mais isoladas e menos populosas (cf. Cunha: tradição e transição em uma cultura rural do Brasil, São Paulo, Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo, 1947). Essa análise é completada em obra mais recente: Robert W. Shirley, The end of a tradition. Culture Change and Development in the Município of Cunha, Nova York e Londres, Columbia University Press, 1971.

73 Publicado previamente pelo Jornal do Comércio (“Suplemento do Café”, Rio de Janeiro, 19/1/1958) e transcrito pela Revista de História (São Paulo, jul.-set. de 1959, no 39). A conveniência de reproduzir aqui esse pequeno artigo é óbvia, pois ele permite situar a influência do café como fator histórico-social, inclusive em função da importância que teve para a prosperidade econômica e social do Vale do Paraíba.