Assim que sentiu que o indivíduo que estava atrás dela no ônibus de Surquillo para Cinco Esquinas se encostava com más intenções, a Baixinha pegou a agulha grande que levava presa no cinto. Deixou-a na mão, esperando até passarem pelo próximo buraco, pois era nos buracos que o espertinho aproveitava para aproximar a braguilha do seu traseiro. Quando fez de novo, ela se virou para olhá-lo com seus enormes olhos fixos — era um homenzinho insignificante, já velho, que de imediato desviou os olhos — e, com a agulha na sua cara, avisou:
— Na próxima vez que chegar perto de mim, enfio isto nessa piroquinha imunda que você deve ter aí. Juro que está envenenada.
Ouviram-se umas risadas no ônibus e o homenzinho, confuso, disfarçou, fingindo surpresa:
— Está falando comigo, moça? O que foi?
— Está avisado, seu merda — concluiu ela, secamente, virando-lhe as costas.
O sujeito teve que engolir aquilo e, na certa, constrangido e envergonhado com o olhar de deboche dos outros passageiros, desceu no ponto seguinte. A Baixinha lembrou que essas advertências nem sempre funcionavam, embora ela, em duas ocasiões, tenha cumprido suas ameaças. A primeira, num ônibus dessa mesma linha, na altura do quartel Barbones; o rapaz, que levou uma agulhada no meio da braguilha, deu um berro que assustou a todos os passageiros e fez o chofer frear de repente.
— Assim você aprende a se esfregar na sua mãe, bichona! — gritou a Baixinha e, aproveitando que o ônibus tinha parado, pulou para a rua e saiu correndo em direção ao largo Junín.
A segunda vez que enfiou a agulha na braguilha de um sujeito que estava se roçando nela foi mais complicada. Era um mulato grandalhão, cheio de espinhas na cara, que a sacudiu, frenético, e iria agredi-la se os outros passageiros não interviessem. Mas o caso acabou na delegacia; só a soltaram quando descobriram que tinha carteira de jornalista. Ela sabia que, de modo geral, a polícia tinha mais medo dos jornalistas que dos malfeitores e assaltantes.
Enquanto o ônibus não chegava a Cinco Esquinas, voltou a pensar no que estava pensando antes de perceber aquele sujeito grudado nas suas costas: será que os emolienteros tinham desaparecido? Sempre que via na rua um homem empurrando um carrinho ia espiar e geralmente era um sorveteiro ou vendedor de refrigerantes e chocolates. Raramente, muito raramente, um emolientero. Ou seja, deviam estar acabando, outro sinal dos supostos progressos de Lima. Em breve não sobraria nenhum, e os limenhos do futuro nem saberiam mais o que é um emoliente.
Sua infância era inseparável dessa bebida tradicional, feita com cevada, linhaça, boldo e cavalinha, que viu seu pai e um ajudante, um cara manquinho e meio caolho de apelido Coxinova, preparando ao longo dos anos. Naquela época havia carrinhos de emolienteros espalhados pelo centro da cidade, principalmente na entrada das fábricas, nos arredores da plaza Dos de Mayo e ao longo do largo Argentina. “Meus melhores clientes são os farristas e os operários”, costumava dizer seu genitor. Ela tinha acompanhado mil vezes, quando era menina e adolescente, seus percursos empurrando o carrinho com os grandes potes de emoliente que ele mesmo e Coxinova preparavam na pequena quinta onde moravam na época, em Breña, no final do largo Arica, onde terminava a parte antiga da cidade e começavam os descampados que se estendiam até La Perla, Bellavista e Callao. De fato, a Baixinha lembrava perfeitamente que os clientes mais fiéis do seu pai eram os boêmios que tinham passado horas e horas bebendo nos barzinhos do centro e os trabalhadores que ao alvorecer entravam nas fábricas das avenidas Argentina e Colonial e dos arredores da Ponte do Exército. Ela ajudava entregando aos clientes as xicrinhas de vidro junto com um papelucho recortado que fazia as vezes de guardanapo. Quando seu pai a deixava na escola do bairro e a vida da cidade começava, com o aparecimento dos garis e dos guardas de trânsito, o emolientero já estava trabalhando havia pelo menos quatro horas. Ofício duro; um trabalho cansativo e perigoso. Ele já tinha sido assaltado várias vezes e despojado de toda a féria do dia, e o pior da história era correr tantos riscos para ganhar uma miséria. Então não era de se estranhar, pensando bem, que os emolienteros estivessem desaparecendo das ruas de Lima.
Nunca perguntou ao pai pela sua mãe. Ela o tinha abandonado? Morreu ou ainda estava viva? Seu pai jamais lhe disse uma palavra sobre ela, e Julieta respeitou seu silêncio, sem perguntar pela mãe uma única vez. Era um homem parco, podia passar dias inteiros sem dizer uma palavra, mas, embora não fosse muito efusivo com ela, Julieta se lembrava dele com carinho. Tinha sido bom com sua única filha; pelo menos se preocupou que terminasse o colégio, para que no futuro, dizia, não tivesse uma vida sofrida como ele teve por ser analfabeto. Ficava furioso por não saber ler nem escrever. O dia mais feliz da sua vida foi a tarde em que sua única filha lhe mostrou a carteira de jornalista que Rolando Garro conseguiu para ela depois de contratá-la como repórter da revista.
Já estavam em Cinco Esquinas e a Baixinha desceu do ônibus. Andou os sete quarteirões que separavam o ponto da sua casa, no largo Tenente Arancibia, passando por todos os lugares que conhecia de memória e respondendo com movimentos de cabeça ou com a mão aos cumprimentos dos conhecidos: o espírita piurano que só atendia seus clientes à noite, horário propício para dialogar com as almas; o farmacêutico que morava na casinha onde, diziam, nasceu Felipe Pinglo, o grande compositor de valsas; a Quinta Heeren que, parece, havia sido um reduto com as mansões mais elegantes de Lima no século XIX e agora era uma coleção de ruínas disputadas por urubus, morcegos, drogados e delinquentes; a casa da Limbômana, a aborteira; a igreja del Carmen e o pequeno convento das Irmãs Franciscanas da Imaculada Conceição. Ainda era cedo, mas como os roubos e os assaltos haviam aumentado muito no bairro, todas as lojas já tinham colocado grades e atendiam apenas através de um buraco que só deixava passar pequenos pacotes. Casinhas inacabadas e becos ruinosos com um único cano de água, vagabundos e mendigos nas esquinas que, de noite, ficavam cheias de traficantes e prostitutas de rua com seus cafetões espreitando na escuridão. Sua casa ficava nos fundos de um terreno malcuidado, cujas construções, todas de um andar só, eram pequenas e pareciam encaixadas umas nas outras, menos a dela que, por ser a última, era um pouco separada do resto. A casa tinha um quarto, uma salinha de jantar, uma cozinha pequena e um banheiro; estava mobiliada com o indispensável, mas, isso sim, com pilhas e pilhas de jornais e revistas em todos os aposentos. A Baixinha colecionava desde menina. Já no primário era uma leitora compulsiva de jornais e revistas e começara a guardá-los muito antes de saber que um dia ia ser jornalista e poderia tirar proveito dessa enorme coleção. Embora não fosse muito organizada em suas coisas pessoais, sua montanha de jornais e revistas estava rigorosamente classificada. Uns papeizinhos escritos com sua letra minúscula marcavam os anos e os assuntos que tinha destacado. Dedicava seu tempo livre a organizá-los, tal como outros se dedicam aos esportes, ao xadrez, a tricotar e bordar ou a ver televisão. Ela tinha um aparelho pequeno e velho, que só ligava — quando não estava sem luz — para ver os programas de fofocas e escândalos, ou seja, os temas relacionados com seu ofício.
Chegou em casa e, na minúscula cozinha, preparou uma sopa instantânea e requentou o prato de arroz com dobradinha que tinha deixado no forno. Ela era de comer pouco e não bebia nem fumava. Alimentava-se sobretudo do seu trabalho, que também era a sua vocação: descobrir as vergonhas secretas dos outros. Divulgá-las lhe dava uma satisfação profissional e íntima. Adorava aquilo e intuía, de forma um tanto confusa, que fazendo o que fazia estava se vingando de um mundo que sempre tinha sido muito hostil com ela e com seu pai. Apesar de ser tão jovem, suas conquistas já eram de fazer inveja.
Seu mestre havia sido Rolando Garro e por isso lhe devotava uma lealdade a toda prova. Estaria apaixonada por ele? Na redação da Revelações às vezes pilheriavam a respeito, e ela negava com tanta ênfase que todos os colegas de trabalho tinham certeza que sim.
Até onde se lembrava, a ideia de ser jornalista um dia sempre a havia perseguido; mas sua ideia de jornalismo pouco ou nada tinha a ver com o jornalismo chamado sério, de informações objetivas e análises políticas, culturais ou sociais. Sua ideia de jornalismo vinha fundamentalmente dos pequenos pasquins e revistas de escândalos que eram expostos nas bancas do centro e que as pessoas paravam para ler — ou melhor, olhar, porque não havia quase nada para ler além das grandes e espalhafatosas manchetes — e admirar as mulheres seminuas que exibiam seus peitos e nádegas com uma fantástica vulgaridade e os boxes em letras vermelhas berrantes denunciando as sujeiras, os segredos mais pestilentos e as reais ou supostas canalhices, roubos, perversões e tráficos que destruíam a credibilidade das pessoas aparentemente mais dignas e prestigiosas do país.
A Baixinha — ela recebera esse apelido no colégio, onde as garotas da sua turma às vezes também a chamavam de Tachinha — se lembrava com orgulho do sucesso que fez em seus primeiros passos no jornalismo, quando ainda cursava o secundário no colégio María Parado de Bellido. O diretor sugeriu que as alunas fizessem um jornal mural. Julieta, sem imaginar o efeito disso, começou a mandar artigos manuscritos com sua letra regular e diminuta. Em pouco tempo era a principal colunista do jornal mural. Porque, ao contrário das outras colaboradoras, que falavam da pátria, dos heróis nacionais como Grau e Bolognesi, de religião, do Papa ou do problema da terra no Peru, ela se limitava a contar as fofocas e boatos mais escabrosos que corriam sobre as alunas e professores, disfarçando seus nomes quando se tratava de coisas realmente pesadas, como questionar a virilidade de um homem ou a feminilidade de uma mulher. Junto com o sucesso lhe veio uma punição. Foi chamada à direção, advertida — já havia sido antes, por falar palavrão — e ameaçada de expulsão se continuasse naquele caminho.
Continuou, mas já fora do colégio. Com uma audácia tão grande quanto e inversamente proporcional ao seu tamanho, começou a inquirir, fazendo-se passar por repórter do Última Hora, La Crónica, Caretas, Expreso e até El Comércio, nos teatros, rádios, boates, estações de televisão, gravadoras ou nas casas particulares de figuras do espetáculo, conseguindo assim, com sua vozinha de menina ingênua e seus olhaços imóveis, muita informação, naturalmente marcada pela suspicácia hipócrita e a intuição infalível para o mórbido, o pecaminoso e o escuso que lhe eram congênitas. Assim chegou à Revelações, assim conheceu Rolando Garro e assim se transformou na principal repórter do semanário e discípula dileta do jornalista mais famoso do país em matéria de inconfidência e escândalo.
“Como vai acabar essa bendita história das fotos?”, perguntou a si mesma, antes de dormir. “Bem ou mal?” Desde o início, quer dizer, desde que Ceferino lhe confessou que as tinha, ela desconfiou que o caso podia trazer mais prejuízos que benefícios para eles, principalmente quando Rolando Garro foi mostrá-las a Enrique Cárdenas, aquele minerador das altas rodas. Mas o que seu chefe dizia e fazia ela acatava sem questionar.