VENCENDO AS DESCULPAS

Acho que eu tinha uns 9 ou 10 anos de idade quando abri os olhos e, ao pé da cama, havia um violão. Era o dia do meu aniversário. Aquela foi, de longe, uma das melhores surpresas da minha vida. Eu tinha esse sonho, sabe? Um violão para ser meu companheiro. Lembro bem da cor de caramelo que ele tinha, do som rouco das cordas desafinadas que jurava para todo mundo que estavam perfeitamente alinhadas.

Nunca fui do tipo que insiste ou persiste muito nas coisas que me oferecem qualquer tipo de dificuldade. Sou apressado, quero tudo na minha hora, no meu momento. Crio as oportunidades às vezes até na minha própria cabeça. Arranjo logo uma desculpa esfarrapada de que senti que era para ser naquele momento, só com a fútil expectativa de que o universo conspire a favor.

A verdade é que tentei de todas as maneiras aprender a tocar violão. Com professor particular, vídeos na internet, revistas para iniciantes. Meus dedos chegaram a ferir de tanto esforço. As marcas que as cordas deixavam nas pontas custavam a sarar. Até depois que não existiam traços aparentes, o menor toque fazia a dor voltar.

Acredito que nunca fui um bom aluno. Com certeza, não era o mais dedicado, apesar de fazer os dedos sofrerem nas vezes em que tentava me concentrar naquilo. É que meu corpo sempre rejeitou qualquer sinal de dor. Aprendi a soar um alerta dentro de mim para quando algo não fosse sair como eu planejei. Era uma forma de evacuar o barco antes do inevitável fim, entende?

Até hoje, o violão fica ao pé da cama, com uma capa linda que comprei para não guardar poeira. Mas o contato visual é o máximo que eu e ele mantemos. Não ousamos nos tocar. É como se tivéssemos a convicção de que não fomos feitos para ser um par. De que não ia rolar. De que o santo não bateu. De que não rolou a famosa e maldita química.

Amar parece muito com aprender a tocar violão. No começo, parece complicado, dói os dedos, deixa algumas marcas, mas depois caleja. Se a gente não desistir antes, ainda consegue criar acordes e melodias sem lembrar que fere. Que machuca. Que maltrata. Que é aquela famosa máxima de que sem dor não existem vitórias. Talvez fique mais fácil entender se você substituir toda a história do violão por um coração.

Nascemos para viver grandes histórias, mas, para conseguirmos, finalmente, dedilhar músicas apaixonadas, precisamos antes passar por alguns aprendizados. Só quero lhe pedir uma coisa, meu amigo: não faça como eu. Não se dê por vencido. Não desista de tentar. É que eu nunca fui um bom aluno. Talvez por falta de força de vontade. Vai ver, seu final deva ser mais feliz que o meu. O violão pode, quem sabe, te amar.