Sobre Ditadura: o que resta da transição
Marcelo Ridenti
Um aspecto fundamental distingue este livro, organizado por Milton Pinheiro: seus autores tomam como central o caráter de classe da ditadura civil-militar instaurada em 1964, por vezes secundarizado ou até esquecido em outras pesquisas. Não é pouco reafirmar que se tratava de uma “ditadura de classe, que buscava impedir a eventual realização de uma revolução democrática pelas forças populares”, nos termos de Marcos Del Roio.
Disso não decorre que se deva ignorar a complexidade de cada conjuntura, nem minimizar as diferenças no interior do regime. Ao contrário, envolve sensibilidade para desvendar as conexões entre política e economia, como atesta por exemplo Adriano Codato, que analisa as disputas entre os círculos dirigentes civis pelo comando da economia nos anos 1970 e a constituição de “intelectuais de Estado”. Ou ainda as reflexões teóricas de Décio Saes sobre frações da classe dominante e de João Quartim acerca da natureza de classe do Estado brasileiro. Por sua vez, Nilson Souza realizou um balanço da economia dos anos 1960 aos 1980.
Mais de quatro décadas de lutas dos trabalhadores rurais são inventariadas por Leonilde Medeiros, enquanto Marco Santana faz uma síntese das lutas operárias. Aspectos do período final do regime e da transição para a democracia são abordados. Anita Prestes retoma a presença do legendário Luiz Carlos Prestes naquele contexto. David Maciel analisa a Aliança Democrática, Vanderlei Nery o movimento das Diretas Já. Lincoln Secco faz um balanço da atuação dos principais partidos desde os anos 1980. Anderson Deo reflete sobre a longa transição e Milton Pinheiro sobre a formulação política dos comunistas do golpe ao fim do regime.
Todos, a seu modo, ajudam a compreender o tempo da ditadura e seu legado.