O procedimento consiste no conjunto de atos sequenciados (de modo lógico e cronológico) que permite o correto desenvolvimento do processo. Já o processo consiste na relação jurídica formalizada em um procedimento que se destina à realização da prestação jurisdicional. O processo é o instrumento pelo qual o poder jurisdicional do Estado atua. Consequentemente, o procedimento é a exteriorização do processo.1
Tanto no processo civil quanto no processo penal, não há um único procedimento. O legislador, em nome da instrumentalidade do processo, adotou procedimentos distintos para atender necessidades diferentes de cada tipo de lide penal.
No processo penal, o legislador optou por diferenciar os procedimentos de acordo com a gravidade do pretenso delito cometido, com uma atenção especial aos crimes de competência do Tribunal do Júri (que possui procedimento próprio). Em geral, a maior gravidade do crime imputado gera um procedimento mais longo e complexo.
O art. 394 determina que o processo penal brasileiro é dividido entre procedimento comum e o especial. O procedimento comum – pela própria denominação – deve ser a regra geral, só podendo ser excepcionado de modo expresso (aplicando-se, a regra especial). Foi dividido da seguinte maneira, de acordo com a gravidade do crime imputado:
Art. 394, § 1.º, CPP (...) I – ordinário, quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada for igual ou superior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade;
II – sumário, quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada seja inferior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade;
III – sumaríssimo, para as infrações penais de menor potencial ofensivo.
A pena a ser levada em consideração é a pena em abstrato e ainda deve contemplar o concurso de crimes.
Aplicam-se subsidiariamente aos procedimentos especial, sumário e sumaríssimo as disposições do procedimento ordinário.
O procedimento ordinário (ou procedimento comum de rito ordinário) tem início com o oferecimento da denúncia ou queixa. Para determinada linha doutrinária, o processo penal só tem início com o recebimento da denúncia ou queixa. Ocorre que a relação processual já se estabelece, mesmo sem a presença do réu, somente entre o acusador e o Estado Juiz. Após a citação, a relação fica completa, integrando-se o réu.
Após o protocolo da peça inicial, cabe ao Juiz a análise de hipótese de rejeição liminar, pelos seguintes motivos: (i) manifestamente inepta; (ii) faltar pressuposto processual ou condição da ação; e (iii) faltar justa causa para o exercício da ação penal.
A inépcia da denúncia/queixa deve ser analisada à luz do art. 41, CPP, já estudado. Também já estudamos os pressupostos e condições da ação penal e a justa causa.
Determina o art. 396, CPP, que, caso o juiz não rejeite liminarmente a peça acusatória, deve recebê-la e ordenar a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de dez dias. No caso de citação por edital, o prazo para a defesa começa a fluir somente a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído.
Após o recebimento da denúncia, o acusado tem o direito de ofertar resposta, novidade introduzida em 2008 com clara influência do processo civil (contestação).
Na resposta, o acusado poderá arguir (i) preliminares e (ii) alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário.
Caso apresente exceção (por exemplo, de suspeição), esta será processada em apartado.
Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por dez dias. Com isso, para a doutrina majoritária, a apresentação da resposta é obrigatória (a antiga defesa prévia era facultativa), podendo a defesa, obviamente, planejar sua estratégia e optar por restringir seus argumentos etc.
Na resposta, deve o réu especificar provas e lançar o rol de testemunhas defensivas.
Na análise da reposta, o Juiz pode determinar a absolvição sumária do acusado (novidade da reforma de 2008, introduzida pela Lei 11.719/2008), quando verificar: (i) a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; (ii) a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; (iii) que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou (iv) extinta a punibilidade do agente.
Há severa crítica à hipótese de absolvição sumária por “extinção da punibilidade”, pois é isso seria caso de extinção sem julgamento de mérito.
Na inocorrência de absolvição sumária, o art. 399 determina que, “Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente”. Apesar dessa menção a “recebimento”, entendemos que a peça acusatória foi recebida no momento previsto no art. 396, que expressamente menciona “recebimento” e “citação”. Já o art. 399 prevê expressamente que o acusado será intimado – ou seja, já foi citado.
A fase da audiência é de extrema importância no procedimento comum ordinário. Seu prazo de realização é de 60 dias. Se não houver impedimento justificado do defensor constituído, será nomeado defensor para o ato.
Adotou-se o princípio da oralidade e da concentração dos atos. A prova oral deve ser produzida nessa audiência, podendo contemplar:
(i) oitiva do ofendido (vítima, sujeito passivo material) sempre que possível;
(ii) inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, e, por último, as determinadas pelo juízo (caso este as tenha determinado), nessa ordem;
(iii) esclarecimentos dos peritos;
(iv) acareações;
(v) reconhecimento de pessoas e coisas;
(vi) interrogatório do acusado, que finaliza a instrução criminal. O acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o poder público providenciar sua apresentação (ver o capítulo sobre videoconferência e seu uso).
As provas serão produzidas numa só audiência (princípio da unidade ou unicidade da audiência), podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Os esclarecimentos dos peritos dependerão de prévio requerimento das partes.
O modelo legal na inquirição das testemunhas é o modelo norte-americano da cross-examination: as testemunhas são inquiridas diretamente pelas partes, iniciando a parte que as indicou – acusação ou defesa. O juízo questiona por último, de modo complementar, devendo zelar obviamente pelo teor das perguntas das partes, não admitindo o juiz aquelas que puderem: (i) induzir a resposta; (ii) não tiverem relação com a causa; ou (iii) importarem na repetição de outra já respondida.
Na instrução poderão ser inquiridas até oito testemunhas arroladas pela acusação e oito pela defesa. A interpretação desse limite diz respeito ao número máximo por fato imputado. Nesse número não se compreendem as que não prestem compromisso e as referidas.
A parte poderá desistir da inquirição de qualquer das testemunhas arroladas (ressalvado o disposto no art. 209; CPP – “O juiz, quando julgar necessário, poderá ouvir outras testemunhas, além das indicadas pelas partes”). A acusação apresenta seu rol de testemunhas no oferecimento da denúncia ou queixa e a defesa, na apresentação da resposta escrita. Após, há preclusão, salvo se determinada a oitiva pelo juízo (art. 209, CPP).
A ordem de oitiva das testemunhas (as da acusação primeiro, depois as da defesa e finalmente, as do juízo) pode sofrer impacto pela expedição de carta precatória. Como outro juízo realizará a oitiva, pode ocorrer que a testemunha de defesa seja ouvida em carta precatória antes da audiência. Se houver prejuízo, deve ser determinado que a oitiva seja feita após a audiência, para não ensejar quebra da ordem de oitiva das testemunhas.
Também deve ser lembrada a antecipação de depoimento nos casos de pessoas protegidas no programa especial de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, o que foi visto no capítulo sobre “Provas”.
Produzidas as provas, no final da audiência, o Ministério Público, o querelante e o assistente e, a seguir, o acusado poderão requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução.
Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10 minutos, proferindo o juiz, a seguir, sentença.
Havendo mais de um acusado, o tempo previsto para a defesa de cada um será individual. Ao assistente do Ministério Público, após a manifestação desse, serão concedidos 10 minutos, prorrogando-se por igual período o tempo de manifestação da defesa.
Ordenada diligência considerada imprescindível, de ofício ou a requerimento da parte, a audiência será concluída sem as alegações finais.
Realizada, em seguida, a diligência determinada, as partes apresentarão, no prazo sucessivo de cinco dias, suas alegações finais, por memorial, e, no prazo de dez dias, o juiz proferirá a sentença.
Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos.
Sempre que possível, o registro dos depoimentos será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações.
No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhada às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição.
A previsão de debates finais orais e sentença imediatamente após sempre encontrou resistência entre os próprios envolvidos (juiz, acusação e defesa). A experiência da autora como Procuradora da República criminal por anos mostra isso. Aliás, a tradição de ensino das faculdades no Brasil não é voltada ao treino da sustentação, debate e raciocínio em audiência, mas sim reforça sempre a valorização das peças escritas. Por isso, o CPP prevê que o juiz poderá, considerada a complexidade do caso ou o número de acusados, conceder às partes o prazo de cinco dias sucessivamente para a apresentação de memoriais. Nesse caso, terá o prazo de dez dias para proferir a sentença. Ou seja, o próprio Juiz que dá às partes o prazo adicional para apresentar alegações finais escritas é beneficiado, pois também terá prazo adicional para sentenciar.
O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença, tendo o CPP adotado o princípio da identidade física do juiz. Entretanto, como o art. 399, § 2.º, CPP, que assumiu tal princípio, não o detalhou, há o uso analógico do art. 132, CPC, para os casos de impossibilidade de tal identidade física, a saber: “O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor”.
O procedimento comum sumário é regrado pelos arts. 531 e seguintes do CPP e deveria ser mais célere que o ordinário. É previsto para crimes em que a pena privativa de liberdade máxima cominada em abstrato seja inferior a quatro anos (ver supra).
As diferenças são as seguintes: (i) prazo para realização da audiência: 30 dias (em vez de 60 dias); (ii) rol de testemunhas – máximo de 5 (em vez de 8); (iii) inexistência de previsão expressa de diligências complementares; (iv) inexistência de previsão de debates finais em forma de memoriais escritos; e (v) previsão de prolação da sentença somente na própria audiência.
Nessas duas últimas diferenças, a jurisprudência admite tanto os memoriais escritos quanto a prolação da sentença em momento posterior, mostrando a fraqueza do instituto dos debates orais no Brasil.
Para zelar pela celeridade, o art. 535 prevê que nenhum ato será adiado, salvo quando imprescindível a prova faltante, determinando o juiz a condução coercitiva de quem deva comparecer. Além disso, a testemunha que comparecer será inquirida, independentemente da suspensão da audiência, observada em qualquer caso a ordem já exposta no procedimento comum ordinário (primeiro as de acusação, depois as da defesa).
Finalmente, nas infrações penais de menor potencial ofensivo, quando o juizado especial criminal encaminhar ao juízo comum as peças existentes para a adoção de outro procedimento (art. 66 da Lei 9.099/1995), será adotado o procedimento sumário.
O procedimento sumaríssimo é o previsto para as infrações penais de menor potencial ofensivo (art. 394, CPP), o que faz que sua adoção se dê nos Juizados Especiais Criminais.
De acordo com a Lei 9.099/1995, as infrações penais de menor potencial ofensivo são as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 anos, cumulada ou não com multa.
O Procedimento Sumaríssimo é regrado pelos arts. 77 e seguintes da Lei 9.099.
Inicialmente, a Lei 9.099 prevê uma apuração pré-processual célere dessas infrações, por meio da lavratura do termo circunstanciado, que será enviado imediatamente ao Juizado Especial Criminal, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.
Comparecendo o autor do fato e a vítima no Juizado, e não sendo possível a realização imediata de audiência preliminar, será designada data próxima, da qual ambos sairão cientes. Na falta do comparecimento de qualquer dos envolvidos, a secretaria providenciará sua intimação.
Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.
A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.
Não obtida a composição dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a oportunidade de exercer o direito de representação verbal, que será reduzida a termo. O não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica decadência do direito, que poderá ser exercido no prazo previsto em lei.
Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta.
Na recusa injustificada da proposta pelo Parquet, pode o juízo discordante aplicar, por analogia, o art. 28 do CPP e enviar os autos à 2.ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF (aplicação da Súmula 696, STF, que trata da suspensão do processo, mas cuja lógica é aplicável à transação). Nesse sentido, decidiu o STF: “Transação penal homologada em audiência realizada sem a presença do Ministério Público. Nulidade. Violação do art. 129, I, da CF. É da jurisprudência do STF – que a fundamentação do leading case da Súmula 696 evidencia: HC 75.343, 12.11.1997, Pertence, RTJ 177/1293 – que a imprescindibilidade do assentimento do Ministério Público, quer à suspensão condicional do processo, quer à transação penal, está conectada estreitamente à titularidade da ação penal pública, que a Constituição lhe confiou privativamente (CF, art. 129, I). Daí que a transação penal – bem como a suspensão condicional do processo – pressupõe o acordo entre as partes, cuja iniciativa da proposta, na ação penal pública, é do Ministério Público” (RE 468.161, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 14.03.2006, Primeira Turma, DJ 31.03.2006, grifos da autora).
Na ação penal privada, na ausência de proposta pelo querelante, parte da doutrina inclina-se pela possibilidade de oferta pelo MP (que atua como custos legis). E, se o órgão do MP também não oferecer, o juízo discordante poderia usar analogicamente o art. 28, CPP. No entanto, decidiu o STJ que “a transação penal, nos termos da Lei 9.099/1995, não é direito subjetivo do réu e sua aplicação à ação penal privada, embora admitida, não impede o prosseguimento da persecução, em caso de inércia do querelante” (STJ, HC 147.251, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJ 17.09.2012).
Não se admite a proposta de transação penal, porém, em alguns casos: (i) ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva; (ii) ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo; (iii) não indicarem os antecedentes a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.
Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz. Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. A imposição da tal pena não constará de certidão de antecedentes criminais e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.
No caso de não cumprimento da transação pelo autor da infração de menor potencial ofensivo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal determina a “submissão do processo ao seu estado anterior, oportunizando-se ao Ministério Público a propositura da ação penal e ao Juízo o recebimento da peça acusatória. Não há cogitar, portanto, da propositura de nova ação criminal, desta feita por ofensa ao art. 330 do CP. Ordem concedida para determinar o trancamento da ação penal pelo crime de desobediência” (HC 84976/SP – São Paulo, Rel. Min. Carlos Britto, j. 20.09.2005, Primeira Turma).
Finalmente, com repercussão geral, decidiu o STF que “a Corte já decidiu que não fere os preceitos constitucionais indicados a possibilidade de propositura de ação penal em decorrência do não cumprimento das condições estabelecidas em transação penal (art. 76 da Lei 9.099/1995). E isso porque a homologação da transação penal não faz coisa julgada material e, descumpridas suas cláusulas, retorna-se ao status quo ante, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal (situação diversa daquela em que se pretende a conversão automática deste descumprimento em pena privativa de liberdade)” (RE 602.072-QO-RG, voto do Rel. Min. Cezar Peluso, j. 19.11.2009, Plenário, DJE 26.02.2010, com repercussão geral).
Nos casos em que não couber transação (solução típica prevista pelo art. 76 da Lei para os crimes de menor potencial ofensivo), o Ministério Público deve oferecer ao Juiz, de imediato, denúncia (inclusive oral, para o caso de recusa da transação em audiência) se não houver necessidade de diligências imprescindíveis.
O oferecimento da denúncia pode estar embasado no termo circunstanciado (já estudado supra), com dispensa do inquérito policial, sendo dispensável o exame do corpo de delito quando a materialidade do crime estiver aferida por boletim médico ou prova equivalente.
Caso a complexidade ou circunstâncias do caso não permitirem a formulação da denúncia, o Ministério Público poderá requerer ao Juiz o encaminhamento das peças existentes ao Juízo comum (adoção do procedimento sumário, conforme visto).
Na ação penal de iniciativa do ofendido poderá ser oferecida queixa oral, cabendo ao Juiz verificar se a complexidade e as circunstâncias do caso determinam o envio ao juízo comum.
No caso de oferecimento da denúncia ou queixa na própria audiência preliminar de transação penal, será esta reduzida a termo, entregando-se cópia ao acusado, que com ela ficará citado e imediatamente cientificado da designação de dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, da qual também tomarão ciência o Ministério Público, o ofendido, o responsável civil e seus advogados.
Se o acusado não estiver presente, será citado e cientificado da data da audiência de instrução e julgamento, devendo a ela trazer suas testemunhas ou apresentar requerimento para intimação, no mínimo cinco dias antes de sua realização. Não estando presentes o ofendido e o responsável civil, serão intimados para comparecer à audiência de instrução e julgamento. Nenhum ato será adiado, determinando o Juiz, quando imprescindível, a condução coercitiva de quem deva comparecer.
Na preliminar da audiência de instrução e julgamento, será renovada possibilidade de tentativa de conciliação e de oferecimento de proposta pelo Ministério Público.
No insucesso dessa tentativa adicional de transação (só viável se o insucesso anterior for fruto da ausência do suspeito na audiência anterior), será aberta a audiência, dando-se a palavra ao defensor para responder à acusação.
Após, o Juiz receberá, ou não, a denúncia ou queixa; havendo recebimento, serão ouvidas a vítima e as testemunhas de acusação e defesa, interrogando-se a seguir o acusado, se presente, passando-se imediatamente aos debates orais e à prolação da sentença.
Todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, podendo o Juiz limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias.
De todo o ocorrido na audiência será lavrado termo, assinado pelo Juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, e a sentença. A sentença, dispensado o relatório, mencionará os elementos de convicção do Juiz.
Da decisão de rejeição da denúncia ou queixa e da sentença caberá apelação, que poderá ser julgada por turma composta de três Juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado.
A apelação será interposta no prazo de dez dias, contados da ciência da sentença pelo Ministério Público, pelo réu e seu defensor, por petição escrita, da qual constarão as razões e o pedido do recorrente.
O recorrido será intimado para oferecer resposta escrita no prazo de dez dias.
As partes serão intimadas da data da sessão de julgamento pela imprensa. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão. Caberão embargos de declaração quando, em sentença ou acórdão, houver obscuridade, contradição, omissão ou dúvida. Os embargos de declaração serão opostos por escrito ou oralmente, no prazo de cinco dias, contados da ciência da decisão. Quando opostos contra sentença, os embargos de declaração suspenderão o prazo para o recurso.
A Lei 9.099/1995 trouxe outra importante inovação na busca da aplicação com humanidade e maior eficiência da lei penal como um todo (e não referente somente aos crimes de menor potencial ofensivo): a suspensão condicional do processo. Dispõe seu art. 89 que, nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (previstos no art. 77, CP).
A suspensão condicional do processo oferece mais uma alternativa para a solução do conflito na lide penal, podendo ser aplicada no procedimento comum ordinário, sumário ou no sumaríssimo.
Caso o acusado cumpra todas as condições durante o período de prova, terá sua punibilidade extinta. O fato imputado não constará de seus antecedentes criminais, obviamente, pois sequer houve uma sentença condenatória.
Não há, tal qual na transação penal, uma admissão de culpa. Assim, caso o acusado não cumpra os requisitos, a suspensão do processo (e da prescrição) termina, devendo o processo continuar seu rumo, e a aceitação da suspensão não pode ser considerada “confissão”.
Sua natureza jurídica é de acordo (bilateralidade exigida) e não de direito público subjetivo do acusado. A solução para a recusa arbitrária do MP em oferecer a suspensão foi dada pelo STF: o uso analógico do art. 28, CPP (Súmula 696 – “Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal”).
Admite-se também que seja aplicada à queixa. Caso o querelante não faça a proposta de suspensão, seria possível também que o MP oferecesse – tal qual na transação (ver supra o precedente do STJ desfavorável a tal tese).
Seus requisitos são os seguintes:
(i) Pena mínima não superior a um ano. Nesse sentido, a Súmula 723 do STF determina que “Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano”. Assim, integram esse cálculo também as causas de aumento e de diminuição de pena, bem como o concurso material ou formal de crimes e a continuidade delitiva (nesse sentido, HC 83.163, Rel. p/ o ac. Min. Joaquim Barbosa, j. 16.04.2009, Plenário, DJE 19.06.2009);
(ii) Inexistência de outro processo criminal em curso;
(iii) Inexistência de condenação anterior por outro crime;
(iv) Requisitos do art. 77, CP: 1. Não reincidência em crime doloso; 2. circunstâncias subjetivas favoráveis (ser suficiente e adequada no caso concreto, tendo em vista a personalidade do acusado e características do crime).
A suspensão do processo tem como premissa o recebimento da denúncia. Nesse sentido, decidiu o STF que, “Diante da apresentação da acusação pelo Parquet, a interpretação legal que melhor se coaduna com o princípio da presunção de inocência e a garantia da ampla defesa é a que permite ao denunciado decidir se aceita a proposta após o eventual decreto de recebimento da denúncia e do consequente reconhecimento, pelo Poder Judiciário, da aptidão da peça acusatória e da existência de justa causa para a ação penal” (Pet. 3.898, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 27.08.2009, Plenário, DJE 18.12.2009).
Por sua vez, a proposta deve ser aceita pelo acusado e seu defensor em audiência, na presença do Juiz. Se houver divergência de vontades entre o acusado e seu defensor, prevalece a vontade do acusado. Se o acusado não aceitar a proposta, o processo prosseguirá normalmente.
Caso aceita a proposta de suspensão, o juiz fixa ao acusado o período de prova, sob as seguintes condições: I – reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; II – proibição de frequentar determinados lugares; III – proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz; e IV – comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.
O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.
A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano. A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta.
Esses dispositivos foram duramente confrontados pela doutrina diante da presunção de inocência, mas a jurisprudência optou por sua constitucionalidade. Nesse sentido, decidiu o STJ que “O fato de o recorrido estar respondendo a outro feito criminal, no curso da prova da suspensão condicional do processo, impõe-lhe a revogação do benefício, segundo dispõe o § 3.º do art. 89 da Lei 9.099/1995. Inexiste a ofensa ao princípio constitucional de inocência” (Recurso Especial 328398/MG, 5.ª Turma, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 18.02.2003, DJU 24.03.2003, p. 262).
Expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade. Entretanto, o STF decidiu que “o benefício da suspensão condicional do processo pode ser revogado após o período de prova, desde que os fatos que ensejaram a revogação tenham ocorrido antes do término deste período (...). Tendo ocorrido o descumprimento das condições impostas, durante o período de suspensão, deve ser revogado o benefício, mesmo após o término do prazo fixado pelo juiz” (HC 97.527, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 16.06.2009, Segunda Turma, DJE 1o.07.2009).
Obviamente, também será suspensa a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.
O denominado tribunal do júri consiste no colegiado de cidadãos que têm a incumbência de julgamento de determinada causa. Conforme ensina Carvalho Ramos, esse instituto tem raízes na Carta Magna de 1215, que previa o direito de uma pessoa ser julgada por seus pares.2
Dispõe o art. 5.º, XXXVIII, da CF/1988 que “é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; e d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
Assim, a instituição do júri está inserida no conjunto dos direitos individuais com as seguintes características: 1) organização regida pela lei; 2) competência mínima a ser observada (podendo ser ampliada pela lei, mas nunca reduzida): julgamento dos crimes dolosos contra a vida; e 3) informado pelos princípios da plenitude de defesa, sigilo das votações e soberania dos veredictos.
Eventual supressão da configuração mínima constitucional do Júri seria inconstitucional, pois violaria cláusula pétrea (art. 60, § 4.º, IV – “direitos e garantias individuais”).
Na atualidade, o Tribunal do Júri brasileiro possui competência legal para os crimes dolosos contra a vida (arts. 121, §§ 1.o e 2.o, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados) e também os crimes conexos, tendo a Lei 11.689/2008 alterado as regras do CPP (arts. 408 e ss.) para dotar o júri de um novo procedimento mais célere. Nenhum projeto de lei, nesses mais de 25 anos de CF/1988, que ampliava a competência do Júri avançou no Congresso Nacional (a competência constitucional para crimes dolosos contra a vida é mínima, nada impede que a lei a amplie).
Tradicionalmente, a doutrina entende o procedimento do tribunal do júri como sendo um procedimento bifásico ou escalonado.
Há duas fases: A primeira é designada de juízo de admissibilidade (judicium accusationis) ou juízo do sumário de culpa perante o juiz togado singular, que se inicia com o recebimento da denúncia por juiz togado (ou queixa, na hipótese de ação penal privada subsidiária da pública) e termina com a sentença de pronúncia, impronúncia ou absolvição sumária. O juiz pode ainda desclassificar o crime para outro além da competência do júri e, caso não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja.
A segunda fase, caso exista a pronúncia, é denominada fase do judicium causae, que consiste no julgamento da causa em plenário no qual os jurados decidem sobre a matéria de fato e o juiz presidente decidirá sobre o quantum da sentença, caso os jurados decidam pela existência de crime.3
Na esfera federal, serão da competência do tribunal do júri da Justiça Federal:
(i) os crimes dolosos contra a vida praticados por servidor público federal em serviço;4
(ii) contra servidor público federal em função do serviço, bem como os crimes conexos (Súmula 147 do STJ);
(iii) crimes dolosos contra a vida no âmbito de “disputas indígenas” (ver item próprio supra). Nesse sentido, compete ao Tribunal do Júri da Justiça Federal julgar os delitos de genocídio e de homicídio ou homicídios dolosos que constituíram modalidade de sua execução (RE 351.487, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 03.08.2006, Plenário, DJ 10.11.2006);
(iv) em caso de provimento de incidente de deslocamento de competência, desloca-se o julgamento de crime doloso contra vida do Tribunal do Júri estadual para o Tribunal do Júri da Justiça Federal.
O novo procedimento do júri estabelecido pela reforma do CPP de 2008 (Lei 11.689/2008) é regulado pelos arts. 406 e seguintes do CPP.
O procedimento inicia-se pelo recebimento da denúncia pelo juízo, que ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de dez dias. Nesse momento, a acusação deverá arrolar testemunhas, até o máximo de oito.
O prazo será contado a partir do efetivo cumprimento do mandado ou do comparecimento, em juízo, do acusado ou de defensor constituído, no caso de citação inválida ou por edital.
Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo que interesse a sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito), qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. Como já visto, as exceções serão processadas em apartado, nos termos dos arts. 95 a 112 do CPP.
Tal como ocorre no procedimento comum, não apresentada a resposta no prazo legal, o juiz nomeará defensor para oferecê-la em até dez dias, concedendo-lhe vista dos autos. Apresentada a defesa, o juiz ouvirá o Ministério Público ou o querelante (na ação penal privada subsidiária da pública) sobre preliminares e documentos, em cinco dias. O juiz determinará a inquirição das testemunhas e a realização das diligências requeridas pelas partes, no prazo máximo de dez dias.
Na audiência de instrução, será realizada a tomada de declarações do ofendido, se possível, a inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, bem como os esclarecimentos dos peritos, as acareações e o reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se o debate.
Os esclarecimentos dos peritos dependerão de prévio requerimento e de deferimento pelo juiz. Tal qual no procedimento comum, as provas serão produzidas em uma só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Encerrada a instrução probatória, é cabível a mutatio libelli, seguindo o disposto no art. 384, CPP (já estudado no item próprio).
As alegações serão orais, concedendo-se a palavra, respectivamente, à acusação e à defesa, pelo prazo de 20 minutos, prorrogáveis por mais 10 minutos. Havendo mais de um acusado, o tempo previsto para a acusação e a defesa de cada um deles será individual. O assistente do Ministério Público, após a manifestação deste, terá dez minutos, prorrogando-se por igual período o tempo de manifestação da defesa.
Nenhum ato será adiado, salvo quando imprescindível à prova faltante, determinando o juiz a condução coercitiva de quem deva comparecer. Tal qual no procedimento sumário, a testemunha que comparecer será inquirida, independentemente da suspensão da audiência, observada em qualquer caso a ordem estabelecida no caput desse artigo.
Zelando pela oralidade, o CPP determina que, encerrados os debates, o juiz proferirá a sua decisão, ou o fará em dez dias, ordenando que os autos para isso lhe sejam conclusos. O procedimento será concluído no prazo máximo de 90 dias.
Essa etapa, denominada pela lei “instrução preliminar”, é caracterizada pela realização de um juízo de admissibilidade (judicium accusationis) ou juízo do sumário de culpa perante o juiz togado singular, que se inicia com o recebimento da denúncia (ou queixa, na hipótese de ação penal privada subsidiária da pública) e termina com a sentença de pronúncia (art. 413, CPP), impronúncia (art. 414, CPP), desclassificação (art. 419, CPP) ou absolvição sumária (art. 415).
Veremos, a seguir, o estudo da absolvição sumária.
A sentença de absolvição sumária no procedimento do Tribunal do Júri consiste em etapa pela qual o juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, caso ocorra uma das quatro seguintes hipóteses: (i) inexistência do fato; (ii) não ser ele autor ou partícipe do fato; (iii) o fato não constituir infração penal; e (iv) demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime.
Consiste em uma forma de julgamento antecipado da lide, que exclui a necessidade de formação da etapa seguinte, o de julgamento pelos pares. A reforma de 2008 ampliou a competência do juiz togado, incluindo duas novas hipóteses (inexistência do fato e não ser o réu o autor do crime) que antes eram tidas como de competência do corpo de jurados. Assim, a reforma excluiu do corpo de jurados matérias que antes eram tidas como do mérito da causa. Pacelli entende que essas novas hipóteses são inconstitucionais, por violar a competência constitucional do Tribunal do Júri.5
No caso de inimputabilidade (art. 26, CP), só caberá a absolvição sumária quando for a única tese defensiva. Isso porque o acusado pode ter teses alternativas, por exemplo, ter agido em legítima defesa, o que impediria a aplicação de medida de segurança.
O recurso cabível é agora o da apelação.
O STF reconhece, contudo, que o princípio do juiz natural (no caso, o Tribunal do Júri) não pode ser indevidamente tolhido pelo juiz nessa fase do procedimento, em especial nos casos de dolo eventual. Para o STF, a absolvição sumária deve ocorrer “não havendo qualquer dúvida acerca da atipicidade material ou formal da conduta, ou a respeito da ausência de justa causa para deflagração da ação penal. Não é a hipótese, competindo ao juiz natural que é o Tribunal do Júri a avaliação da existência de elementos suficientes para o reconhecimento da prática delitiva pelo paciente na modalidade de homicídio sob a modalidade do dolo eventual” (HC 92.304, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 05.08.2008, Segunda Turma, DJE 22.08.2008).
A competência constitucional do Tribunal do Júri foi vista supra, sendo possível que a lei a amplie. Até o momento, o CPP repetiu o modelo constitucional mínimo (art. 74, § 2.º, CPP) que trata de crimes dolosos contra a vida, consumados ou tentados, e crimes conexos.
Assim, na fase do juízo de admissibilidade (judicium accusationis) ou juízo do sumário de culpa perante o juiz togado singular, é possível que o juiz se convença, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos crimes dolosos contra a vida (consumados ou tentados – ver lista dos tipos penais, supra). Caso não seja competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja. Remetidos os autos do processo a outro juiz, à disposição deste ficará o acusado preso.
A sentença de impronúncia revela a convicção do juízo da inexistência de indícios suficientes de autoria ou de participação do acusado. Caso essa decisão seja feita em grau de recurso em sentido estrito da defesa contra a sentença de pronúncia, utiliza-se o termo despronúncia (equivale à reforma da decisão de pronúncia).
Enquanto não ocorrer a extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia ou queixa se houver prova nova.
A decisão de pronúncia consiste é aquela que revela a convicção do juízo monocrático, ainda na fase do juízo de admissibilidade (judicium accusationis), da prova da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação do acusado.
Utilizaram-se aqui os mesmos elementos do recebimento da denúncia: prova da materialidade e indícios suficientes de autoria ou participação, com o adicional de que não existiram as hipóteses de absolvição sumária ou desclassificação. A defesa pode interpor recurso em sentido estrito.
Para evitar eventual convencimento prematuro do corpo de jurados, a fundamentação da pronúncia deve limitar-se à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.
A sentença de pronúncia deve estar embasada em dados constantes do processo, não se podendo utilizar, na fundamentação, excesso de linguagem. (HC 86.414, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 09.12.2008, Primeira Turma, DJE 06.02.2009).
Revela, assim, um juízo de probabilidade e não de certeza, não vinculando o Júri (que pode até mesmo optar pela desclassificação). No entanto, é etapa preliminar ao julgamento pelo corpo de jurados, que sofre os efeitos da preclusão, salvo fato novo. O fato novo tradicionalmente lembrado como apto a ensejar alteração da decisão de pronúncia é a morte da vítima fruto dos ferimentos causados pelo réu, passando a pronúncia de homicídio tentado para homicídio consumado. Assim, ainda que preclusa a decisão de pronúncia, havendo circunstância superveniente (fato novo) que altere a classificação do crime, o juiz ordenará a remessa dos autos ao Ministério Público. Em seguida, os autos serão conclusos ao juiz para decisão.
Por sua vez, a decisão de pronúncia fixa: (i) o marco interruptivo da prescrição (art. 117, II, CP); e (ii) os limites subjetivos e objetivos do judicium causae. Assim, os jurados apreciarão o fato trazido na pronúncia, com as qualificadoras e causas de aumento de pena.
Se o crime for afiançável, o juiz arbitrará o valor da fiança para a concessão ou manutenção da liberdade provisória. O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas cautelares estudadas anteriormente.
Se houver indícios de autoria ou de participação de outras pessoas não incluídas na acusação, o juiz, ao pronunciar ou impronunciar o acusado, determinará o retorno dos autos ao Ministério Público, por 15 dias, sendo possível a separação facultativa dos processos. Não se trata de mutatio libelli, pois não são fatos não descritos na denúncia contra o acusado, mas sim de novos possíveis acusados. O Ministério Público Federal oficiante pode não concordar com a posição do juízo, devendo ser aplicado analogicamente o art. 62, IV, da LC 75/1993 (que alterou o art. 28 do CPP no âmbito federal) e encaminhados os autos à 2.ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF.
O art. 418 do CPP traz hipótese de emendatio libelli à decisão de pronúncia: o juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da constante da acusação, embora o acusado fique sujeito a pena mais grave. Remetemos o leitor ao estudo do item específico deste livro, uma vez que entendemos aplicável ao procedimento do júri o teor do art. 383 (emendatio libelli) e seus parágrafos.
A intimação da decisão de pronúncia será feita pessoalmente ao acusado, ao defensor nomeado (inclusive o dativo e o Defensor Público) e ao Ministério Público.
Já a intimação ao defensor constituído, ao querelante e ao assistente do Ministério Público será feito pela publicação no órgão oficial, que deve conter o nome do acusado, sob pena de nulidade (art. 370, § 1.º, CPP).
Se o réu estiver solto e não for encontrado, será intimado por edital, omitindo a lei o prazo para intimação por edital. Para Pacelli e Fischer, o prazo para intimação por edital é de 15 dias.6 Por fim, preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri.
Para o STF, o defeito de fundamentação na sentença de pronúncia “gera nulidade absoluta, passível de anulação, sob pena de afronta ao princípio da soberania dos veredictos” (HC 103.037, Rel. Min. Carmen Lucia, j. 22.03.2011, Primeira Turma, DJE 31.05.2011).
A segunda etapa do procedimento do júri (o judicium causae) é caracterizada pelo julgamento da causa pelo corpo de jurados. Não há mais o “libelo acusatório”, que deveria ser apresentado pelo MP até cinco dias após o trânsito em julgado da decisão de pronúncia. A pronúncia é a peça que fixa agora os limites da acusação.
Assim, o procedimento do Júri é composto por duas fases distintas e procedimentos específicos, mas que devem possuir uma correlação obrigatória entre pronúncia e julgamento pelo Plenário do Júri. Para o STF, “(...) correlação, essa, que decorre não só da garantia da ampla defesa e do contraditório do réu – que não pode ser surpreendido com nova imputação em plenário –, mas também da necessidade de observância à paridade de armas entre acusação e defesa. Daí a impossibilidade de alteração, na segunda fase do Júri (judicium causae), das teses balizadas pelas partes na primeira fase (judicium accusationis), não dispondo o Conselho de Sentença dos amplos poderes da mutatio libelli conferidos ao juiz togado” (HC 82.980, Rel. Min. Ayres Britto, j. 17.03.2009, Primeira Turma, DJE 23.10.2009).
Ao receber os autos do juiz monocrático, o presidente do Tribunal do Júri determinará a intimação do órgão do Ministério Público ou do querelante, no caso de queixa, e do defensor, para, no prazo de cinco dias, apresentarem rol de testemunhas que irão depor em plenário, até o máximo de cinco por fato, além de juntar documentos e requerer diligência.
Cabe ao Juiz Presidente decidir sobre as provas requeridas e ordenar as diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou esclarecer fato que interesse ao julgamento da causa. As testemunhas intimadas pessoalmente, se não comparecerem, serão conduzidas coercitivamente. A presença do réu no plenário do júri é facultativa, fruto da estratégia de defesa. Pacelli e Fischer denominam essas providências de verdadeiro despacho saneador, no qual se decidem a produção da prova no plenário do júri e a realização das últimas diligências.7
Após, deve fazer relatório sucinto do processo, determinando sua inclusão em pauta da reunião do Tribunal do Júri.
O serviço do júri é obrigatório. O alistamento compreenderá os cidadãos maiores de 18 anos de notória idoneidade. A igualdade de tratamento prevalece: nenhum cidadão poderá ser excluído dos trabalhos do Júri ou deixar de ser alistado em razão de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau de instrução.
Por sua vez, estão isentos do serviço do Júri determinadas autoridades públicas, a saber: (i) o Presidente da República e os Ministros de Estado; (ii) os governadores e seus respectivos secretários estaduais; (iii) os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Distrital e Municipais; (iv) os prefeitos municipais; (v) os Magistrados e membros do Ministério Público e da Defensoria Pública; (vi) os servidores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública; (vii) as autoridades policiais e os servidores da polícia e da segurança pública; (viii) os militares em serviço ativo; (ix) os cidadãos maiores de 70 anos que requeiram sua dispensa; (x) aqueles que o requererem, demonstrando justo impedimento (por exemplo, em virtude do tipo de trabalho ou condição de saúde).
A recusa ao serviço do Júri fundada em convicção religiosa, filosófica ou política importará no dever de prestar serviço alternativo, sob pena de suspensão dos direitos políticos enquanto não prestar o serviço imposto. Entende-se por serviço alternativo o exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, no Poder Judiciário, na Defensoria Pública, no Ministério Público ou em entidade conveniada para esses fins. O juiz fixará o serviço alternativo, atendendo aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Ademais, a lei impõe o pagamento de multa no valor de 1 a 10 salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do indivíduo que se recusar injustificadamente a servir como jurado.
O exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral. Também é direito do jurado a preferência, em igualdade de condições, nas licitações públicas e no provimento, mediante concurso, de cargo ou função pública, bem como nos casos de promoção funcional ou remoção voluntária. Nenhum desconto será feito nos vencimentos ou salário do jurado sorteado que comparecer à sessão do Júri.
Por outro lado, caso o jurado, sem causa legítima, deixe de comparecer no dia marcado para a sessão ou retire-se antes de ser dispensado pelo presidente sofrerá multa de um a dez salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com sua condição econômica.
Por fim, para que haja número suficiente de cidadãos aptos a desempenhar a função de jurado, o CPP determina que anualmente serão alistados pelo presidente do Tribunal do Júri de 800 a 1.500 jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 de habitantes, de 300 a 700 nas comarcas de mais de 100.000 habitantes e de 80 a 400 nas comarcas de menor população.
O Tribunal do Júri é composto por um juiz togado, seu presidente e por 25 jurados que serão sorteados dentre os alistados, sete dos quais constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento.
O sorteio dos 25 jurados será presidido pelo juiz e feito a portas abertas, para a reunião periódica ou extraordinária. Os jurados sorteados serão convocados pelo correio ou por qualquer outro meio hábil para comparecer no dia e hora designados para a reunião, sob as penas da lei.
No dia, comparecendo pelo menos 15 jurados (o que facilita a realização do julgamento), o juiz presidente declarará instalados os trabalhos, anunciando o processo que será submetido a julgamento. Após, o juiz presidente sorteará sete dentre eles para a formação do Conselho de Sentença.
À medida que as cédulas forem sendo retiradas da urna, o juiz presidente as lerá, e a defesa e, depois dela, o Ministério Público poderão recusar os jurados sorteados, até três cada parte, sem motivar a recusa. É a chamada recusa imotivada (pois é de livre alvitre das partes), de conveniência (pois atende à estratégia de cada parte) ou peremptória (porque não pode ser obstada pelo juiz).
São impedidos de servir no mesmo Conselho: I – marido e mulher; II – ascendente e descendente; III – sogro e genro ou nora; IV – irmãos e cunhados, durante o cunhadio; V – tio e sobrinho; VI – padrasto, madrasta ou enteado. O mesmo impedimento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar. Os jurados devem cumprir as regras relativas aos impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados (vistas em capítulo próprio nesta obra).
Os jurados excluídos por impedimento, suspeição ou incompatibilidade serão considerados para a constituição do número legal exigível para a realização da sessão. O mesmo Conselho de Sentença poderá conhecer de mais de um processo, no mesmo dia, se as partes o aceitarem, hipótese em que seus integrantes deverão prestar novo compromisso.
Formado o Conselho de Sentença, há fórmula legal de incitação simbólica ao julgamento justo. O Presidente deve se levantar (junto com todos os presentes e jurados) e exortar em voz alta aos jurados: “Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciência e os ditames da justiça”. Os jurados, um a um chamados pelo presidente, responderão: “Assim o prometo”.
O jurado, em seguida, receberá cópia da pronúncia ou, se for o caso, das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo.
Prestado o compromisso pelos jurados, será iniciada a instrução plenária, quando o juiz presidente, o Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor do acusado tomarão, sucessiva e diretamente, as (i) declarações do ofendido, se possível, e (ii) inquirirão as testemunhas arroladas pela acusação.
Essa regra especial do procedimento do júri destoa da ordem do art. 222 (partes primeiro e juiz por último), pois, curiosamente, o juiz é o primeiro a inquirir o ofendido e as testemunhas de acusação. Os jurados poderão formular perguntas ao ofendido e às testemunhas, por intermédio do juiz presidente.
As perguntas são feitas diretamente, seguindo-se o modelo comum (sem a antiga intermediação do juiz – vide art. 212, CPP, e a cross-examination já estudadas).
Já para a inquirição das testemunhas arroladas pela defesa, a ordem será juiz presidente, jurado (por intermédio do presidente, tal qual ocorre na testemunha de acusação), defensor do acusado, Ministério Público e do assistente. Note-se que a defesa formula perguntas antes do MP e do assistente da acusação.
As partes e os jurados poderão requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e esclarecimento dos peritos, bem como a leitura de peças que se refiram, exclusivamente, às provas colhidas por carta precatória e às provas cautelares, antecipadas ou não repetíveis.
Por fim, o acusado será interrogado, se estiver presente (vide supra, a presença não é obrigatória – é uma faculdade e não um dever). O Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor, nessa ordem, poderão formular, diretamente, perguntas ao acusado.
Não é o acusado obrigado a responder nenhuma pergunta autoincriminadora, diante do direito de não ser obrigado a produzir provas contra si mesmo (nemo tenetur se detegere), previsto no art. 5.º, LXIII, da CF/1988 (“o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado...”) e ainda do art. 8.º.2, “g”, da Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 8. 2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: (...) g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada).
O uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri é, em geral, proibido, salvo se absolutamente necessário (ou seja, o juiz é obrigado a fundamentar sua decisão de impor algemas): à (i) ordem dos trabalhos; (ii) à segurança das testemunhas; ou (iii) à garantia da integridade física dos presentes (em linha com a Súmula Vinculante 11).
O registro dos depoimentos e do interrogatório será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, eletrônica, estenotipia ou técnica similar, destinada a obter maior fidelidade e celeridade na colheita da prova. A transcrição do registro, após feita a degravação, constará dos autos.
Durante o julgamento não serão permitidas a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 dias úteis, dando-se ciência à outra parte (proibida a surpresa e a armadilha no procedimento do Júri). Também são proibidas a leitura de jornais ou qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croqui ou qualquer outro meio assemelhado, não contido nos autos e cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação e julgamento dos jurados.
Para o STF, a previsão de atos instrutórios também em Plenário do Júri (arts. 473 a 475, CPP) torna legítima a manutenção da prisão preventiva, sob a hipótese da conveniência da instrução criminal, uma vez que “(...) não é de se ter por encerrada a fase instrutória simplesmente com a prolação da sentença de pronúncia” (HC 100.480, Rel. Min. Ayres Britto, j. 10.11.2009, Primeira Turma, DJE 04.12.2009).
Encerrada a instrução, as partes iniciam os chamados debates. Após a eliminação do antigo libelo acusatório pelas reformas de 2008, finalmente a acusação tem a oportunidade de mostrar ao Conselho de Sentença sua posição sobre o caso.
Os debates são iniciados pelo Ministério Público, que fará a acusação, nos limites da pronúncia, sustentando, se for o caso, a existência de circunstância agravante.
O assistente falará depois do Ministério Público. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, falará em primeiro lugar o querelante e, em seguida, o Ministério Público, salvo se este houver retomado a titularidade da ação.
Finda a acusação, terá a palavra a defesa.
A acusação poderá replicar e a defesa treplicar, sendo admitida a reinquirição de testemunha já ouvida em plenário.
O tempo destinado à acusação e à defesa será de uma hora e meia para cada, e de uma hora para a réplica e outro tanto para a tréplica.
Havendo mais de um acusador ou mais de um defensor, combinarão entre si a distribuição do tempo, que, na falta de acordo, será dividido pelo juiz presidente, de forma a não exceder o determinado nesse artigo. Havendo mais de um acusado, o tempo para a acusação e a defesa será acrescido de 1 hora e elevado ao dobro o da réplica e da tréplica, observado o disposto no § 1o desse artigo. Pacelli e Fischer sustentam que, em casos excepcionais e complexos com mais de dois acusados, o juiz pode optar por alargar tais prazos, levando em conta o princípio da razoabilidade.8
Durante os debates as partes não poderão, sob pena de nulidade (art. 478, CPP), fazer referências: I – à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado (em que pese os próprios jurados terem acesso, logo após o juramento, à decisão de pronúncia, como vimos antes); II – ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, em seu prejuízo. Busca-se evitar que o jurado, que é julgador leigo, entenda indevidamente que a sentença de pronúncia ou imposição de algemas significam atestados de culpabilidade do acusado. O STF já decidiu: “Leitura no Plenário do Júri. Impossibilidade. Consoante dispõe o inciso I do art. 478 do CPP, presente a redação conferida pela Lei 11.689/2008, a sentença de pronúncia e as decisões posteriores que julgarem admissível a acusação não podem, sob pena de nulidade, ser objeto sequer de referência, o que se dirá de leitura” (HC 86.414, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 09.12.2008, Primeira Turma, DJE 06.02.2009).
Para impedir que os debates possam abarcar dados não contidos nos autos, a acusação a defesa e os jurados poderão, a qualquer momento e por intermédio do juiz presidente, pedir ao orador que indique a folha dos autos onde se encontra a peça por ele lida ou citada (evitando o “vale-tudo mentiroso” nos debates), facultandose ainda aos jurados solicitar, também por intermédio do juiz, o esclarecimento de fato alegado pela parte.
Se a verificação de qualquer fato, reconhecida como essencial para o julgamento da causa, não puder ser realizada imediatamente, o juiz presidente dissolverá o Conselho, ordenando a realização das diligências entendidas necessárias. Se a diligência consistir na produção de prova pericial, o juiz presidente, desde logo, nomeará perito e formulará quesitos, facultando às partes também formulá-los e indicar assistentes técnicos, no prazo de 5 dias.
Concluídos os debates, o presidente indagará dos jurados se estão habilitados a julgar ou se necessitam de outros esclarecimentos. Se houver dúvida sobre questão de fato, o presidente prestará esclarecimentos à vista dos autos.
“Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado” (Súmula Vinculante 11).
O Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o acusado deve ser absolvido.
Os quesitos serão redigidos em proposições afirmativas, simples e distintas, de modo que cada um deles possa ser respondido com suficiente clareza e necessária precisão. Na sua elaboração, o presidente levará em conta os termos da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, do interrogatório e das alegações das partes.
Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: I – a materialidade do fato; II – a autoria ou participação; III – se o acusado deve ser absolvido; IV – se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa; e V – se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.
A resposta negativa, de mais de três jurados, sobre (i) materialidade ou (ii) autoria, encerra a votação e implica a absolvição do acusado. Respondidos afirmativamente por mais de três jurados (ou seja, no mínimo quatro), os dois quesitos iniciais relativos à materialidade e autoria, será formulado quesito objetivo com a formulação imposta pelo CPP: “O jurado absolve o acusado?”
Decidindo os jurados pela condenação, o julgamento prossegue, devendo ser formulados quesitos sobre: I – causa de diminuição de pena alegada pela defesa; e II – circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena, reconhecidas na pronúncia.
Caso a defesa tenha sustentado a desclassificação da infração para outra de competência do juiz singular, deve ser formulado quesito a respeito, para ser respondido após o 2.o (autoria) ou 3.o (absolvição) quesito, conforme o caso.
Por outro lado, caso tenha sido sustentada a tese de ocorrência do crime na sua forma tentada ou havendo divergência sobre a tipificação do delito, sendo este da competência do Tribunal do Júri, o juiz formulará quesito acerca dessas questões, para ser respondido após o segundo quesito (autoria).
Havendo mais de um crime ou mais de um acusado, os quesitos serão formulados em séries distintas.
A leitura dos quesitos deve ser feita no Plenário pelo juiz presidente, que indagará as partes sobre requerimento (por exemplo, correção da redação) ou reclamação a fazer, devendo qualquer deles, bem como a decisão, constar da ata. Ainda em plenário, o juiz presidente explicará aos jurados o significado de cada quesito.
Cabe lembrar que a Súmula 162 do STF dispõe que “É absoluta a nulidade do julgamento pelo Júri quando os quesitos da defesa não precedem aos das circunstâncias agravantes”. E a Súmula 156 STF determina que “É absoluta a nulidade do julgamento, pelo Júri, por falta de quesito obrigatório”.
Não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça devem se dirigir à sala especial (a sala de votação) a fim de ser procedida a votação.
Na falta de sala especial, o juiz presidente determinará que o público se retire, permanecendo somente as pessoas permitidas pelo CPP.
A presença das partes visa evitar qualquer comportamento inadequado dos jurados ou do juiz presidente, não podendo, contudo, gerar intervenção que possa perturbar a livre manifestação do Conselho. O juiz deve retirar da sala quem se portar inconvenientemente.
A votação de cada quesito é feita por cédulas, feitas de papel opaco e facilmente dobráveis, contendo sete delas a palavra sim, e sete a palavra não.
Para assegurar o sigilo do voto, o oficial de justiça recolherá em urnas separadas as cédulas correspondentes aos votos e as não utilizadas.
As decisões do Tribunal do Júri serão tomadas por maioria de votos. Se a resposta a qualquer dos quesitos estiver em contradição com outra ou outras já dadas, o presidente, explicando aos jurados em que consiste a contradição, submeterá novamente à votação os quesitos a que se referirem tais respostas.
Se, pela resposta dada a um dos quesitos, o presidente verificar que ficam prejudicados os seguintes, é dada por finda a votação.
Após a resposta, verificados os votos e as cédulas não utilizadas, o presidente determinará que o escrivão registre no termo a votação de cada quesito, bem como o resultado do julgamento. Do termo também constará a conferência das cédulas não utilizadas. Encerrada a votação, será o termo assinado pelo presidente, pelos jurados e pelas partes.
Encerrada a votação pelo Conselho de Sentença, o juiz presidente proferirá sentença, nos limites impostos pelo Conselho de Sentença, como veremos a seguir.
No caso de condenação, a sentença fixará a pena-base, bem como considerará as circunstâncias agravantes ou atenuantes alegadas nos debates, impondo os aumentos ou diminuições da pena, em atenção às causas admitidas pelo júri e observando as demais disposições do art. 387, CPP (ver o item de sentença desta obra). Além disso, mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva, bem como estabelecerá os efeitos genéricos e específicos da condenação (incluído pela Lei 11.689, de 2008).
Caso o acusado tenha sido absolvido pelo Conselho de Sentença, a sentença deve ordenar a liberdade do acusado, se por outro motivo não estiver preso, revogando as medidas restritivas provisoriamente decretadas, podendo impor, se for o caso, a medida de segurança cabível.
Caso o Conselho de Sentença tenha determinado a desclassificação da infração para outra, de competência do juiz singular, ao presidente do Tribunal do Júri caberá proferir sentença em seguida, aplicando ainda os institutos da Lei 9.099/1995. Em caso de desclassificação, o crime conexo eventualmente existente também será julgado pelo juiz presidente do Tribunal do Júri.
A doutrina distingue duas espécies de desclassificação realizada pelo Conselho de Sentença: a desclassificação própria e a desclassificação imprópria. Na desclassificação própria, os jurados consideram que o crime não é da competência do Tribunal do Júri, sem especificar o tipo penal adequado. Na desclassificação imprópria, os jurados, além de reconhecer a incompetência do tribunal do júri, assinalam o crime que teria sido praticado. Entretanto, o juiz pode determinar outra classificação jurídica aplicada à espécie.
A sentença será lida em plenário pelo presidente antes de encerrada a sessão de instrução e julgamento.
São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri: I – regular a polícia das sessões (lembrar que o crime de desobediência é crime de menor potencial ofensivo); II – requisitar o auxílio da força policial, que ficará sob sua exclusiva autoridade; III – dirigir os debates, intervindo em caso de abuso, excesso de linguagem ou mediante requerimento de uma das partes; IV – resolver as questões incidentes que não dependam de pronunciamento do júri; V – nomear defensor ao acusado, quando considerá-lo indefeso, podendo, nesse caso, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor; VI – mandar retirar da sala o acusado que dificultar a realização do julgamento, que prosseguirá sem a sua presença; VII – suspender a sessão pelo tempo indispensável à realização das diligências requeridas ou entendidas necessárias, mantida a incomunicabilidade dos jurados; VIII – interromper a sessão por tempo razoável, para proferir sentença e para repouso ou refeição dos jurados; IX – decidir, de ofício, ouvidos o Ministério Público e a defesa, ou a requerimento de qualquer destes, a arguição de extinção de punibilidade; X – resolver as questões de direito suscitadas no curso do julgamento; XI – determinar, de ofício ou a requerimento das partes ou de qualquer jurado, as diligências destinadas a sanar nulidade ou a suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade; e XII – regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 3 (três) minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última.
O desaforamento consiste na transferência do julgamento do júri para outra comarca da mesma região, nas hipóteses legais (art. 427, CPP) de: (i) interesse da ordem pública; (ii) dúvida sobre a imparcialidade do júri; ou (iii) a segurança pessoal do acusado. Para o STF, “Não é necessária, ao desaforamento, a afirmação da certeza da imparcialidade dos jurados, bastando o fundado receio de que reste comprometida” (HC 96.785, Rel. Min. Eros Grau, j. 25.11.2008, Segunda Turma, DJE 22.05.2009).
A legitimidade para o pedido de desaforamento é do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado, bem como pode ser proposto por representação do juiz competente.
O pedido é dirigido ao Tribunal ad quem (na área federal, ao Tribunal Regional Federal respectivo), que deve apreciar o pedido com preferência de julgamento. Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri. Além da parte adversa, será ouvido o juiz presidente, quando a medida não tiver sido por ele solicitada.
Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo, nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de julgamento anulado.
O desaforamento também poderá ser determinado em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de seis meses contados do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. Para a contagem do prazo referido nesse artigo, não se computará o tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa.
Não havendo excesso de serviço ou existência de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri, nas reuniões periódicas previstas para o exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal que determine a imediata realização do julgamento.
Além dos precedentes e súmulas supracitadas, Carvalho Ramos ensina que devem ser ressaltados os seguintes precedentes sobre o Júri:9
(i) A competência constitucional do foro por prerrogativa de função prevalece sobre a competência do tribunal do júri. Assim, crime doloso contra a vida cometido por juiz de direito será julgado pelo seu Tribunal de Justiça;
(ii) A competência do Tribunal do Júri prevista na CF/1988 é mínima, podendo a lei ampliá-la, o que torna legítimo o julgamento pelo júri dos crimes conexos, tal qual preconiza o CPP;
(iii) A competência do Tribunal do Júri, por ser prevista na CF/1988, prevalece sobre a competência prevista somente na Constituição Estadual (Súmula 721 do STF);
(iv) Corréu que não tem foro por prerrogativa de função deve ser julgado pelo Tribunal do Júri, desmembrando-se o processo penal;
(v) Para o STF, “a competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz singular e não do Tribunal do Júri” (Súmula 603);
(vi) Para o STF, é constitucional o julgamento dos crimes dolosos contra a vida de militar em serviço pela justiça castrense, sem a submissão destes crimes ao Tribunal do Júri, nos termos do art. 9.º, III, “d”, do COM (HC 91.003, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 22.05.2007, Primeira Turma, DJ 03.08.2007);
(vii) A soberania dos veredictos do Tribunal do Júri não é absoluta, sendo constitucionais os dispositivos que preveem a anulação da decisão do júri sob o fundamento de que ela se deu de modo contrário à prova dos autos. Evita-se o arbítrio, que é incompatível com o Estado de Direito (HC 88.707, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 09.09.2008, Segunda Turma, DJE 17.10.2008);
(viii) O desaforamento (previsto no art. 427 do CPP) do tribunal do júri não viola o princípio do juiz natural, sendo compatível com CF/1988, pois assegura o respeito ao devido processo legal e imparcialidade do juízo (STF, HC 67.851, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 24.04.1990, Plenário, DJ 18.05.1990);
(ix) Algemas e tratamento degradante no Tribunal do Júri. Réu sem passado de violência. Impossibilidade do uso de algemas. Se não há segurança suficiente, deve ser adiada a sessão do júri. “(...) Diante disso, indaga-se: surge harmônico com a Constituição mantê-lo, no recinto, com algemas? A resposta mostra-se iniludivelmente negativa. (...) Da leitura do rol das garantias constitucionais – art. 5.º –, depreende-se a preocupação em resguardar a figura do preso. A ele é assegurado o respeito à integridade física e moral – inciso XLIX. (...) Ora, esses preceitos – a configurarem garantias dos brasileiros e dos estrangeiros residentes no País – repousam no inafastável tratamento humanitário do cidadão, na necessidade de lhe ser preservada a dignidade. Manter o acusado em audiência com algema sem que demonstrada, ante práticas anteriores, a periculosidade significa colocar a defesa antecipadamente em patamar inferior, não bastasse a situação de todo degradante (...). Quanto ao fato de apenas dois policiais civis fazerem a segurança no momento, a deficiência da estrutura do Estado não autorizava o desrespeito à dignidade do envolvido. Incumbia, sim, inexistente o necessário aparato de segurança, o adiamento da sessão, preservandose o valor maior, porque inerente ao cidadão” (STF, HC 91.952, voto do Rel. Min. Marco Aurélio, j. 07.08.2008, Plenário, DJE 19.12.2008).
Originalmente, o CPP tratou dos “procedimentos especiais” no Título II do Livro II (“Dos Processos em Espécie”), enumerando os seguintes: a) processo dos crimes de falência (revogado pela Lei 11.101/2005, a que remetemos o leitor); b) crimes de responsabilidade de funcionários públicos; c) crimes contra a honra; e d) crimes contra a propriedade imaterial, dos quais já tratamos na parte de exame de corpo de delito (no caso de haver o crime deixado vestígio, a queixa ou a denúncia não será recebida se não for instruída com o exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito).
Além destes, o Título III do Livro II do CPP tratava dos “processos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais de apelação”, hoje tratados pelas Leis 8.038/1990 e 8.658/1993.
Quanto aos procedimentos estabelecidos em leis especiais (caso da Lei 11.343/2006 – Lei Antidrogas) ou no Código Eleitoral, o CPP é usado de forma subsidiária.
A temática geral do processo penal na competência originária criminal dos Tribunais já foi analisada nesta obra nos itens sobre competência no foro por prerrogativa de função.
Alerto o leitor que a Lei 8.038/1990 instituiu normas procedimentais para os processos penais originários perante o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal; e a Lei 8.658/1993, por sua vez, determinou a aplicação da Lei 8.038/1990 aos processos penais originários de competência dos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais.
O CPP regula o procedimento especial dos crimes de calúnia, difamação e injúria. Contudo, o art. 61 da Lei 9.099/1995, já estudado, dispõe que são infrações penais de menor potencial ofensivo: (i) as contravenções penais; e os (ii) crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, cumulada ou não com multa. Ou seja, em geral, os crimes contra a honra estão sujeitos ao procedimento sumaríssimo e ao Juizado Especial Criminal.
Somente o art. 140, § 3.º, do Código Penal10 contempla a injúria qualificada por preconceito (injúria preconceituosa), cuja pena estabelecida é de um a três anos, permitindo a utilização do procedimento especial do CPP, regrado pelos arts. 519 e seguintes.
O rito é uma variante do procedimento comum, adaptado a interesses particulares, inclusive regidos pela ação penal privada (o MP atua como custos legis). Antes de receber a queixa, o juiz oferecerá às partes oportunidade para se reconciliarem, fazendo-as comparecer em juízo e ouvindo-as, separadamente, sem a presença dos seus advogados, não se lavrando termo.
Se, depois de ouvir o querelante e o querelado, o juiz achar provável a reconciliação, promoverá entendimento entre eles, na sua presença.
No caso de reconciliação, depois de assinado pelo querelante o termo da desistência, a queixa será arquivada.
Quando for oferecida a exceção da verdade ou da notoriedade do fato imputado, o querelante poderá contestar a exceção no prazo de dois dias, podendo ser inquiridas as testemunhas arroladas na queixa, ou outras indicadas naquele prazo, em substituição às primeiras, ou para completar o máximo legal.
Os chamados crimes de responsabilidade dos funcionários públicos abarcam os crimes funcionais, ou seja, os crimes cometidos pelos funcionários públicos em virtude de seu cargo, emprego ou função. Dispõe o art. 327, CP, que “Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 1.º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. (...)”. Assim, não se trata do crime de responsabilidade tido como infração político-administrativa, e não será julgado pelo Poder Judiciário, mas sim por órgão do Poder Legislativo.
Inicialmente, a queixa ou a denúncia será instruída com documentos ou justificação que façam presumir a existência do delito ou com declaração fundamentada da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas.
O art. 514 estabelecia uma diferenciação entre crimes afiançáveis e não afiançáveis, mas desde a Lei 12.403/2011 (já estudada) não há mais delitos inafiançáveis cometidos por funcionários públicos. Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por escrito, dentro do prazo de quinze dias.
A resposta poderá ser instruída com documentos e justificações. Após, o juiz poderá: (i) rejeitar a denúncia ou queixa, em despacho fundamentado, se convencido, pela resposta do acusado ou do seu defensor, da inexistência do crime ou da improcedência da ação. Admite-se, obviamente, que rejeite a denúncia pela falta de condições da ação, pressupostos processuais ou justa causa (art. 395 do CPP).
Por outro lado, recebida a denúncia ou a queixa, será o acusado citado, seguindo-se o processo comum.
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1 Por todos, ver DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada P.; ARAUJO CINTRA, Antonio Carlos. Teoria geral do processo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. No âmbito processual penal, ver TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal. São Paulo: RT, 2003.
2 CARVALHO RAMOS, André de. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014.
3 CARVALHO RAMOS, André de. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014.
4 Súmula 254 do antigo Tribunal Federal de Recursos: “Compete à Justiça Federal processar e julgar os delitos praticados por funcionário público federal, no exercício de suas funções e com estas relacionadas”.
5 PACELLI, Eugênio; FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 858.
6 PACELLI, Eugênio; FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 867.
7 PACELLI, Eugênio; FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 870.
8 PACELLI, Eugênio; FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Civil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 916.
9 CARVALHO RAMOS, André de. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014.
10 Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: (...) § 3.º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena – reclusão de um a três anos e multa.