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PAULA NUNCA MAIS RESPONDERA ÀS SUAS MENSAGENS E ISSO INQUIETAVA-O. Nessa derradeira noite em Angola, antes de adormecer (as janelas entreabertas para que entrasse aquele fresco do planalto, o vento que atravessava o mar e chegava até ali), ela dissera-lhe que voltaria para Portugal em breve. Podiam encontrar-se lá? Ela ficava em Lisboa, claro que podiam. Miguel apanhava o voo de quarta-feira para São Tomé, e de São Tomé iria para Lisboa na semana seguinte.

«O que vais fazer a São Tomé?»

«Amostras. Duas empresas francesas estão a trabalhar ao largo do Príncipe e recolheram amostras de profundidade.

«Ah, empresas francesas.»

«Sondas móveis, a partir de navios. O fundo do mar. E São Tomé, onde nos conhecemos. E tenho um relatório para entregar.»

«Nunca te conheci», ela riu. «Eu não estive lá, era outra em vez de mim, uma irmã gémea. Não era eu.»

«Eu reconheço esse sinal no queixo, minha senhora.»

«Sou a tua senhora quando tu não és um traidor que trabalha para os franceses de São Tomé.»

«Trabalho para o inimigo, sempre, como tu trabalhas para o inimigo dos franceses.»

Um braço sobre o peito, Paula cantarolando como costumava fazer quando estavam deitados, antes de ele adormecer profundamente. Nessas alturas, mesmo antes de adormecer, prometia amá-la para sempre, mas Paula ria:

«Como fizeste antes.»

«Eu não vivi antes de te conhecer. Amei-te desde que nasci. E agora?»

«Agora dorme.»

«Como sabes o que eu fiz antes?»

«Todos os homens fizeram isso antes.»

«Isso, o quê?»

«Prometer amor para sempre.»

«As mulheres também.»

«Ah. Mas ninguém pode confiar nas mulheres.»

Quando acordara, muito cedo, Paula já tinha partido. Pela janela viu o lugar vazio do carro no parque de estacionamento do hotel. Dois chineses jogavam à bola perto da estrada. Um homem solitário arrancava ramos aos arbustos que se esforçavam por resistir à seca. Paula nunca mais respondeu às suas mensagens. Apenas a promessa de se encontrarem em Portugal uma semana depois, duas semanas depois. E tinha medo, também, porque nunca lhe falara daquele fim de ano no Algarve, quando lhe mostraram a fotografia de ambos, dançando na Praça de Maio, em São Tomé, como uma espécie de chantagem antecipada.

«Porquê?», perguntou-lhe mais tarde Jaime Ramos.

«Porque eu não queria terminar aquela história. Era a única que eu tinha.»