AS BORDAS
DAS PALAVRAS

Estou em casa.

Sento-me aqui, na escada dos fundos da minha mente, enquanto a cidade se levanta em direção ao horizonte, como sempre.

Nasce a luz do dia, o inverno vai morrendo, e a fome cresce dentro de mim.

A máquina de escrever aguarda...

Penso agora nas bordas das palavras, na lealdade do sangue, na música das meninas, nas mãos dos irmãos e em cães famintos que uivam pela noite.

Há inúmeros momentos a serem lembrados, e às vezes acho que não somos pessoas, na verdade. Talvez sejamos momentos.

Momentos de fraqueza, de força.

Momentos de salvação, de tudo.

Vaguei pela vida real e me escrevi pela escuridão das ruas dentro de mim. Vejo pessoas andando pela cidade e me pergunto onde estiveram, e o que os momentos de suas vidas fizeram com elas. Se são parecidas comigo, seus momentos as sustentaram e as derrubaram.

Às vezes, apenas sobrevivo.

Mas, às vezes, ergo-me no telhado da minha existência, de braços abertos, pedindo mais.

É então que as histórias aparecem em mim.

Elas sempre me encontram.

São feitas de perdedores e lutadores. São feitas de fome e desejo e de tentativas de levar uma vida digna.

O único problema é que não sei qual dessas histórias vem primeiro.

Talvez todas se fundam em uma só.

Veremos, acho.

Eu aviso quando decidir.