TÍTULO VIII
DOS CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA

Conceito de incolumidade: Incolumidade é o estado de preservação ou segurança de pessoas ou de coisas em relação a possíveis eventos lesivos. Ao utilizar a expressão “incolumidade pública”, o legislador incriminou condutas atentatórias à vida, ao patrimônio e à segurança de pessoas indeterminadas ou não individualizadas, ao contrário do que se verifica nos delitos disciplinados nos títulos anteriores da Parte Especial do Código Penal.

Capítulo I
DOS CRIMES DE PERIGO COMUM

Introdução: No Direito Penal, perigo é a probabilidade de dano. Destarte, a consumação dos delitos de perigo não depende da efetiva lesão do bem jurídico, bastando sua exposição a uma situação perigosa, evidenciada pela provável ocorrência de dano. No Capítulo I do Título I da Parte Especial (arts. 130 a 136), no campo dos crimes contra a pessoa, o CP previu os delitos de perigo individual, nos quais uma pessoa, ou então um número determinado de pessoas, tem sua vida ou sua saúde submetida a uma situação perigosa. Em seus arts. 250 a 259, inaugurando o rol dos crimes contra a incolumidade pública, o legislador elencou os delitos de perigo comum, caracterizados pela exposição ao perigo de um número indeterminado de pessoas, ameaçadas não apenas no tocante à vida e à saúde, mas também na esfera patrimonial. É a indeterminação do alvo a nota característica do perigo comum.

Incêndio

Art. 250. Causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:

Pena – reclusão, de três a seis anos, e multa.

Aumento de pena

§ 1º As penas aumentam-se de um terço:

I – se o crime é cometido com intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio;

II – se o incêndio é:

a) em casa habitada ou destinada a habitação;

b) em edifício público ou destinado a uso público ou a obra de assistência social ou de cultura;

c) em embarcação, aeronave, comboio ou veículo de transporte coletivo;

d) em estação ferroviária ou aeródromo;

e) em estaleiro, fábrica ou oficina;

f) em depósito de explosivo, combustível ou inflamável;

g) em poço petrolífico ou galeria de mineração;

h) em lavoura, pastagem, mata ou floresta.

Incêndio culposo

§ 2º Se culposo o incêndio, é pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

Classificação:

Crime comum

Crime material ou causal e de perigo concreto

Crime vago

Crime de forma livre

Crime instantâneo

Crime não transeunte

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime comissivo (regra)

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: substância ou o objeto alvo de incêndio.

Elemento subjetivo: dolo (elemento subjetivo específico – § 1.º, I). Só admite modalidade culposa na hipótese do § 2.º.

Crime não transeunte: perícia imprescindível.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É a substância ou o objeto alvo de incêndio, a exemplo da casa ou do automóvel incendiados.

Núcleo do tipo: O núcleo do tipo é causar, no sentido de dar origem, provocar ou produzir. Realiza a conduta criminosa o agente que originar o incêndio, de modo a expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de pessoas em geral. Há nítida relação de causa (incêndio) e efeito (exposição a perigo). Incêndio é o fogo com labaredas de grandes proporções, originado pela combustão de qualquer matéria, cujo poder de destruição e o de causar prejuízos se revelam idôneos no caso concreto. Não é necessário que o perigo seja resultado do fogo em si, bastando que da ocorrência do próprio fato (incêndio) haja a efetiva comprovação do perigo à vida, à integridade física ou ao patrimônio de terceiros.

Sujeito ativo: Qualquer pessoa (crime comum ou geral). O proprietário do bem incendiado também pode ser sujeito ativo, desde que da conduta resulte perigo comum, pois não há crime na conduta de danificar o próprio patrimônio.

Sujeito passivo: É a sociedade (crime vago), bem como as pessoas diretamente atingidas pelo incêndio, as quais tiveram seus bens jurídicos ameaçados ou até mesmo ofendidos, embora muitas vezes não seja possível identificá-las.

Elemento subjetivo: Na conduta descrita no caput, é o dolo de perigo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se exige tenha o agente a intenção de prejudicar terceiros, sendo suficiente a consciência da possibilidade de causar dano. A modalidade culposa é admitida na figura descrita no § 2º do dispositivo em comento.

Incêndio e intenção de matar ou ferir pessoa determinada: Se o incêndio for praticado com o propósito de matar ou ferir alguém, ao agente devem ser imputados os crimes de homicídio qualificado pelo emprego de fogo (art. 121, § 2º, III, do CP) ou lesão corporal (art. 129 de CP) e de incêndio, em concurso formal impróprio ou imperfeito, em razão da presença de desígnios autônomos para ofensa a bens jurídicos distintos.

Incêndio provocado por motivação política: Se o agente causar o incêndio impelido por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas, estará caracterizado o crime definido no art. 20 da Lei 7.170/1983 – Lei de Segurança Nacional, em obediência ao princípio da especialidade.

Consumação: Trata-se de crime material ou causal: consuma-se no momento em que o incêndio provocado pelo agente expõe a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de pessoas indeterminadas. Cuida-se de crime de perigo concreto, pois é indispensável a prova da efetiva ocorrência da situação perigosa. A simples provocação de incêndio não enseja, por si só, a incidência do tipo penal em apreço, se da conduta não resultar a efetiva exposição da coletividade a perigo concreto, sendo possível reconhecer o crime de dano qualificado pelo emprego de substância inflamável ou explosiva (art. 163, parágrafo único, II, do CP).

Incêndio e prova da materialidade do fato criminoso: O exame pericial é necessário para comprovação de crime que deixa vestígios de ordem material (crimes não transeuntes), não podendo supri-lo a confissão do acusado (CPP, art. 158). Diante do disposto pelo art. 173 do Código de Processo Penal, fica nítida a imprescindibilidade da perícia como meio de prova do crime de incêndio.

Tentativa: É cabível, em face do caráter plurissubsistente do delito.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: O incêndio, em sua modalidade dolosa (CP, art. 250, caput), é crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios previstos na Lei 9.099/1995. Na modalidade culposa (CP, art. 250, § 2º), constitui-se em infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal, sujeitando-se à transação penal e ao rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995.

Causas de aumento da pena (art. 250, § 1º): As causas de aumento da pena são aplicáveis ao incêndio doloso e incidem na terceira etapa da dosimetria da pena privativa de liberdade, majorando-a de um terço.

Inciso I – Intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio: Pressupõe a presença de um especial fim de agir (elemento subjetivo específico), consistente no propósito do sujeito ativo de obter vantagem pecuniária, em proveito próprio ou alheio, pouco importando se o lucro indevido venha ou não a ser efetivamente alcançado. Se esta vantagem consistir em indenização ou valor de seguro, que venha a ser efetivamente recebida, há quem entenda configurado o delito em análise, restando absorvido o crime de estelionato (CP, art. 171, § 2º, V).1 Outro entendimento é no sentido de estar configurado o delito de incêndio simples (CP, art. 250, caput) e fraude para recebimento ou valor de seguro (CP, art. 171, § 2º, V) em concurso formal impróprio ou imperfeito, em face da presença de desígnios autônomos. Mas, para afastar o bis in idem, há de reconhecer o incêndio em sua forma simples, pois a intenção de obter vantagem pecuniária não pode ser duplamente valorada. É a posição que adotamos.

Inciso II – Circunstâncias que justificam tratamento mais rigoroso: (a) Pela possibilidade de o incêndio envolver um maior número de pessoas no local, aumentando o perigo de dano (alíneas “a”, “b”, “c”, “d” e “e”): A majorante da alínea “a” terá incidência mesmo que a casa (local destinado à moradia de alguém) não esteja habitada no momento do incêndio. Portanto, se alguém incendiar uma residência vazia cujos proprietários se encontram em viagem, o aumento da pena será obrigatório. De acordo com a alínea “b”, o aumento será cabível quando o incêndio for praticado em edifício público (prédio de propriedade do Poder Público – União, Estados, Distrito Federal e Municípios), ou destinado ao uso público, embora de domínio particular, e também a obra de assistência social ou de cultura, que igualmente representa uma utilidade pública. A alínea “c” prevê aumento de pena se o incêndio ocorrer em embarcação, aeronave, comboio ou veículo de transporte coletivo. Embarcação é a construção reservada para navegar sobre a água. Aeronave, nos termos no art. 106 do Código Brasileiro de Aeronáutica, é “todo aparelho manobrável em voo, que possa se sustentar e circular no espaço aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a transportar pessoas ou coisas, comboio ou veículo de transporte coletivo”. Comboio é o agrupamento de veículos que se dirigem a um destino comum, a exemplo dos trens e metrôs. Veículo de transporte coletivo é o meio utilizado para levar diversas pessoas de um lugar para outro, tais como as vans e ônibus. A alínea “d” dispõe que a pena será majorada se o incêndio ocorrer em estação ferroviária ou aeródromo. Estação ferroviária é o local destinado ao embarque e desembarque de pessoas ou cargas de trens. Aeródromo é o aeroporto, ou seja, espaço físico reservado ao pouso e à decolagem de aviões. Alínea “e” – Incêndio em estaleiro, em fábrica ou oficina. Estaleiro é o lugar em que se constroem ou se consertam embarcações. Fábrica é o estabelecimento industrial. Oficina é o local em que se operam consertos em geral, notadamente de veículos automotores.

Inciso II – Pelo fato de o risco da propagação do incêndio ser mais elevado (alíneas “f”, “g” e “h”): Alínea “f” – Incêndio em depósito de explosivo, combustível ou inflamável. Depósito é o local reservado para guarda ou armazenamento de alguma coisa. Explosivo é a substância apta a produzir estrondo. Combustível é o produto dotado da propriedade de produzir energia e de se consumir em chamas. Inflamável, por sua vez, é o objeto idôneo a se converter em chamas. Alínea “g” – Incêndio em poço petrolífero ou galeria de mineração. Poço petrolífero é a abertura produzida no solo para alcançar fonte natural de combustível líquido; galeria de mineração, por seu turno, é a passagem subterrânea destinada à extração de minérios. Alínea “h” – Incêndio em lavoura, pastagem, mata ou floresta. Lavoura é a plantação ou terreno cultivado pelo homem; pastagem é o terreno revestido de vegetais para alimentação do gado; mata é o terreno em que se encontram árvores silvestres; floresta é o local em que há grande quantidade de árvores. Essa causa de aumento da pena é perfeitamente compatível com o crime previsto no art. 41 da Lei 9.605/1998 – Crimes Ambientais. A configuração do crime de incêndio agravado depende da provocação de perigo comum. No crime ambiental, por seu turno, basta a causação de incêndio em mata ou floresta. Conclui-se, portanto, que se da ação incendiária à mata ou floresta resultar perigo comum, incidirá o crime tipificado no art. 250, § 1,º, II, h, do Código Penal. Se ausente o perigo comum, estará caracterizado o delito ambiental.

Incêndio culposo (art. 250, § 2º): Verifica-se o incêndio culposo quando alguém, agindo com imprudência, negligência ou imperícia, viola o dever objetivo de cuidado a todos imposto, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outras pessoas, mediante a provocação de incêndio que, embora objetivamente previsível, não tenha sido previsto no caso concreto. A pena é sensivelmente inferior, em face do menor desvalor da conduta, embora inexista diferença no tocante ao desvalor do resultado, pois o incêndio é igualmente produzido.

A questão relativa ao ato de soltar balões: O ato de soltar balões constitui crime ambiental, definido no art. 42 da Lei 9.605/1998. Se da soltura do balão resultar incêndio com perigo comum, entendemos caracterizado o crime de incêndio doloso, na forma simples (CP, art. 250, caput) ou agravada (CP, art. 250, § 1º, II). Há, no caso, dolo eventual, pois as numerosas campanhas educativas destinadas a revelar os danos produzidos pelos balões evidenciam a assunção pelo agente dos diversos resultados que podem ser produzidos por essa conduta ilícita, especialmente o incêndio em casas, florestas e matas. O delito ambiental resta absorvido, em respeito ao princípio da consunção, pois funciona como meio para a concretização do resultado final (incêndio).

Formas qualificadas (art. 258 do CP): Se do incêndio, provocado dolosamente pelo agente, resultar lesão corporal de natureza grave, aí se incluindo a lesão corporal gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; caso resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. O resultado agravador, que importa na configuração de crime preterdoloso, constitui-se em causa de aumento da pena, aplicável na terceira fase de aplicação da pena privativa de liberdade. Por outro lado, se do incêndio culposo resultar lesão corporal, qualquer que seja sua natureza, aumentar-se-á a pena pela metade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. Nesse caso, visualiza-se um crime culposo qualificado por resultado de igual natureza.

Incêndio e Estatuto do Desarmamento: O delito previsto no art. 16, parágrafo único, III, da Lei 10.826/2003 – Estatuto do Desarmamento, de perigo abstrato ou presumido, não se confunde com o incêndio, delito de perigo comum e concreto. Aquele se contenta com a simples utilização de artefato incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, enquanto o incêndio exige a efetiva exposição de pessoas indeterminadas ao risco de dano, no tocante à vida, à saúde ou ao patrimônio.

Jurisprudência selecionada:

Classificação doutrinária e prova da materialidade: “Na taxionomia generalizada, existem, no que se liga a resultado, duas abordagens. Em relação ao resultado jurídico (ofensa ao bem jurídico), os delitos poderiam ser de perigo (concreto ou, então, presumido) e de dano. Em relação ao resultado material (resultado material ou evento natural resultante inseparável), os crimes podem ser, segundo grande parte dos doutrinadores pátrios, materiais, formais e de mera conduta. Assim, de início, nesta linha, todo delito tem seu resultado jurídico (dano ou perigo a bem jurídico), mas nem todo crime apresenta um resultado natural ou material (só para os materiais ele se apresenta imprescindível). Nesta dupla abordagem, que não apresenta qualquer relação direta ou biunívoca, é de se notar que existem crimes de perigo e que são, simultaneamente, materiais. É o que ocorre com o delito de incêndio. Ele é material (sem o fogo ele não poderia existir) e de perigo concreto (e comum). Na hipótese dos autos, flagrante a inépcia da denúncia, bem como a ausência de justa causa para a ação penal. Com efeito, a exordial acusatória narra, apenas, que os denunciados teriam derramado líquido inflamável no interior de um veículo e ateado fogo que foi rapidamente debelado em razão da atuação do Corpo de Bombeiros. Nota-se, assim, que, não há a descrição da ocorrência de perigo efetivo, concreto, para pessoa ou coisas indeterminadas (o tipo penal em destaque fala em ‘perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio’). Além disso, por se tratar de infração que deixa vestígios, imprescindível a comprovação da materialidade por meio de exame de corpo de delito. No entanto, a despeito de o laudo pericial ter sido realizado (quase onze meses depois!) suas conclusões limitaram-se a constatar que o veículo mencionado na proemial foi alvo de ação depredatória e que nele se verificou princípio de combustão extinta sobre a parte central superior do painel, com evidência de ter sido iniciada de cima para baixo e não por curto-circuito (dito em outras palavras, a simples existência de fogo provocado externamente!), sem, contudo, destacar a existência de perigo efetivo e concreto” (STJ: HC 104.371/SE, rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, j. 18.11.2008).

Prova pericial: “Relativamente às infrações que deixam vestígios, a realização de exame pericial se mostra indispensável, podendo ser suprida pela prova testemunhal apenas se os vestígios do crime tiverem desaparecido. Na hipótese, tratando-se de delito de incêndio, inserido entre os que deixam vestígios, apenas poderia ter sido comprovada a materialidade do crime por meio de exame pericial, já que os vestígios não haviam desaparecido. ‘No caso de incêndio, os peritos verificarão a causa e o lugar em que houver começado, o perigo que dele tiver resultado para a vida ou para o patrimônio alheio, a extensão do dano e o seu valor e as demais circunstâncias que interessarem à elucidação do fato’ (art. 173 do CPP)” (STJ: HC 65.667/RS, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, j. 07.08.2008).

Explosão

Art. 251. Expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem, mediante explosão, arremesso ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substância de efeitos análogos:

Pena – reclusão, de três a seis anos, e multa.

§ 1º Se a substância utilizada não é dinamite ou explosivo de efeitos análogos:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Aumento de pena

§ 2º As penas aumentam-se de um terço, se ocorre qualquer das hipóteses previstas no

§ 1º, I, do artigo anterior, ou é visada ou atingida qualquer das coisas enumeradas no nº

II do mesmo parágrafo.

Modalidade culposa

§ 3º No caso de culpa, se a explosão é de dinamite ou substância de efeitos análogos, a pena é de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos; nos demais casos, é de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

Classificação:

Crime comum

Crime material ou causal

Crime de perigo comum e concreto

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime comissivo (regra)

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: engenho de dinamite ou de substâncias de efeitos análogos.

Prescindível a efetiva detonação do explosivo.

Crime não transeunte: perícia imprescindível (crime de perigo concreto).

Elemento subjetivo: dolo. Só admite modalidade culposa na hipótese do § 3.º.

Tentativa: admite (diverg.).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É o engenho de dinamite ou de substâncias de efeitos análogos. Tanto pode existir explosão com o engenho de dinamite como com o engenho de substâncias de efeitos análogos, isto é, diversas da dinamite, mas aptas a produzirem efeitos semelhantes no caso concreto.

Núcleo do tipo: O núcleo do tipo é expor, no sentido de colocar em perigo a vida, a integridade física ou patrimônio de pessoas indeterminadas, mediante explosão, arremes-so ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substância de efeitos análogos. Explosão é a perturbação ou abalo de alguma substância, contida normalmente em um recipiente, seguida de elevado ruído e detonação, a qual produz o desenvolvimento súbito de uma força ou a expansão inesperada de um gás. Arremesso é o ato ou efeito de realizar o lançamento de algum objeto a distância, mediante o emprego de força. No caso, refere-se ao lançamento do engenho de dinamite ou de substância de efeitos análogos. Além da explosão e do arremesso, o tipo penal também incrimina a simples colocação de engenho de dinamite ou de substâncias de efeitos análogos. É prescindível a efetiva detonação do explosivo para caracterização do crime em estudo, mas fundamental a exposição de bens jurídicos de pessoas indeterminadas à situação de risco.

Sujeito ativo: Qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago), e também os titulares dos bens jurídicos colocados em perigo ou mesmo lesados pela conduta criminosa.

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa encontra-se prevista no art. 250, § 3º, do CP.

Explosão e intenção de matar: Se a explosão for provocada com o intuito de matar alguém, estará configurado o crime de homicídio qualificado pelo emprego de explosivo (CP, art. 121, § 2º, III), de natureza hedionda (art. 1º, I, da Lei 8.072/1990). Se da conduta resultar, além da morte de alguém, perigo à vida, à integridade física ou patrimônio de pessoas indeterminadas, serão imputados ao agente, em concurso formal impróprio ou imperfeito, o delito de homicídio qualificado pelo emprego de explosivo (CP, art. 121, § 2º, III) e o de explosão (CP, art. 251, caput). Não há falar em bis in idem, pois foram ofendidos dois bens jurídicos (vida humana e incolumidade pública), pertencentes a titulares diversos.

Explosão provocada por motivação política: Se o agente causar explosão impelido por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas, praticará o delito tipificado pelo art. 20 da Lei 7.170/1983 – Lei de Segurança Nacional, em respeito ao princípio da especialidade.

Explosão e crime ambiental: Se o emprego de explosivos tiver como finalidade a pesca, estará delineado o crime previsto no art. 35, inc. I, da Lei 9.605/1998 – Lei dos Crimes Ambientais.

Consumação: A explosão é crime material ou causal, e de perigo concreto: consuma-se com a explosão, arremesso ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substâncias de efeitos análogos, desde que da conduta resulte perigo à vida, à saúde ou ao patrimônio de pessoas indeterminadas, o qual não se presume, devendo ser demonstrado na situação concreta. Se não restar provado o perigo comum, poderá restar caracterizado o crime de dano qualificado pelo emprego de substância explosiva (art. 163, parágrafo único, II, do CP).

Crime de explosão e prova da materialidade: A prova da materialidade do fato delituoso reclama a elaboração de exame de corpo de delito, o qual somente pode ser substituído pela prova testemunhal na hipótese de desaparecimento dos vestígios (CPP, arts. 158 e 167). Em face do disposto no art. 175 do CPP, a realização do exame pericial se torna imprescindível, pois é sua tarefa determinar se a explosão foi idônea a expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de pessoas indeterminadas. Na hipótese de arremesso ou simples colocação do artefato explosivo em determinado local, competirá à perícia a constatação da potencialidade do risco. Ademais, caberá aos peritos constatar se a substância utilizada na empreitada criminosa possui efeitos análogos ao de engenho de dinamite. Em caso de resposta afirmativa, será atribuído ao autor o crime definido no caput; se negativa, a ele será imputado o crime tipificado no § 1º.

Tentativa: É possível. Na prática, contudo, o conatus é de rara ocorrência, pois a lei pune, de forma autônoma, meros atos preparatórios da explosão.

Ação penal: É pública incondicionada, em todas as modalidades do delito.

Lei 9.099/1995: Em sua modalidade fundamental (CP, art. 251, caput), é crime de elevado potencial ofensivo, não sendo possível a aplicação dos benefícios contidos na Lei 9.099/1995. A explosão privilegiada (art. 251, § 1º) é crime de médio potencial ofensivo, sendo cabível a suspensão condicional do processo, desde que presentes os demais requisitos do art. 89 da lei acima citada. A explosão culposa, em qualquer dos casos, é infração penal de menor potencial ofensivo, compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo, nos moldes da citada lei.

Explosão privilegiada (art. 251, § 1º): Todos os produtos não enquadrados nos conceitos de dinamite e substâncias de efeitos análogos, mas idôneos a provocar explosão, ingressam na modalidade privilegiada. O reconhecimento da forma privilegiada do delito pressupõe a existência de exame pericial, comprovando tratar-se de produto apto a causar explosão, mas diverso da dinamite ou substâncias de efeitos análogos.

Causa de aumento da pena (art. 251, § 2º): Ver comentários às causas de aumento de pena do art. 250, § 1º.

Explosão culposa (art. 251, § 3º): A explosão culposa tem como causa a imprudência, imperícia ou negligência do sujeito ativo, vindo a produzir resultado naturalístico involuntário, mas objetivamente previsível. A pena varia conforme a natureza do objeto material, em face do maior ou menor desvalor do resultado. Não há crime quando o resultado vem a ser provocado por caso fortuito ou força maior, sob pena de configuração da responsabilidade penal objetiva.

Formas qualificadas (art. 258 do CP): Se da explosão, arremesso ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substâncias de efeitos análogos, provocados dolosamente pelo agente, resultar lesão corporal de natureza grave, aí se incluindo a gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. São crimes preterdolosos: dolo na explosão e culpa no resultado agravador. De outro lado, se da explosão, arremesso ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substâncias de efeitos análogos, provocados por culpa do agente, resultar lesão corporal, aumentar-se-á a pena pela metade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. São crimes culposos agravados por resultados de igual natureza.

Explosão e Estatuto do Desarmamento: O crime do art. 16, parágrafo único, III, da Lei 10.826/2003 – Estatuto do Desarmamento é crime de perigo abstrato ou presumido, não se confundindo com a explosão, delito de perigo comum e concreto. O primeiro se contenta com a simples utilização de artefato explosivo, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. A explosão reclama a efetiva exposição de pessoas indeterminadas ao risco de dano, no tocante à vida, à integridade física ou ao patrimônio, como na hipótese da pessoa que detona um engenho de dinamite em praça pública.

Jurisprudência selecionada:

Crime de perigo comum: “Estando o tipo do art. 251 do CP, crime de explosão, entre aqueles denominados de perigo comum, é de se exigir, como circunstância elementar, a comprovação de que a conduta explosiva causou efetiva afronta à vida e à integridade física das pessoas ou concreto dano ao patrimônio de outrem, sob pena de faltar à acusação a devida demonstração da tipicidade. Por isso, ação de arremessar fogos e artifícios em local ocasionalmente despovoado, cuja consequência danosa ao ambiente foi nenhuma, não pode ser tido pela vertente do crime de explosão, podendo, no máximo se referir à contravenção do art. 28 do Decreto-Lei 3688/41, a qual se encontra abrangida pela prescrição” (STJ: HC 104.952/SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, j. 10.02.2009).

Local desabitado – crime de perigo concreto: “Estando o tipo do art. 251 do CP, crime de explosão, entre aqueles denominados de perigo comum, é de se exigir, como circunstância elementar, a comprovação de que a conduta explosiva causou efetiva afronta à vida e à integridade física das pessoas ou concreto dano ao patrimônio de outrem, sob pena de faltar à acusação a devida demonstração da tipicidade. Por isso, ação de arremessar fogos e artifícios em local ocasionalmente despovoado, cuja consequência danosa ao ambiente foi nenhuma, não pode ser tido pela vertente do crime de explosão, podendo, no máximo se referir à contravenção do art. 28 do Decreto-Lei 3.688/1941, a qual se encontra abrangida pela prescrição” (STJ: HC 104.952/SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, j. 02.03.2009).

Uso de gás tóxico ou asfixiante

Art. 252. Expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem, usando de gás tóxico ou asfixiante:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Modalidade culposa

Parágrafo único. Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

Classificação:

Crime comum

Crime material ou causal

Crime de perigo concreto

Crime vago

Crime de forma vinculada

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: gás tóxico ou asfixiante.

Elemento subjetivo: dolo. Só admite modalidade culposa na hipótese do parágrafo único.

Gás tóxico ou asfixiante: exigência de perícia para comprovação da efetiva idoneidade.

Gás lacrimogêneo e polícia: legítima defesa ou estrito cumprimento de dever legal.

Tentativa: admite.

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É o gás tóxico ou asfixiante.

Núcleo do tipo: O núcleo do tipo é expor, no sentido de colocar em perigo um número indeterminado de pessoas, pois trata-se de crime de perigo comum. O meio de execução consiste na utilização de gás tóxico ou asfixiante – cuida-se de crime de forma vinculada, pois a lei penal aponta expressamente os meios de execução a serem utilizados na prática do delito.

Sujeito ativo: Qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago) e, mediatamente, as pessoas que tiveram seus bens jurídicos colocados em perigo ou lesados pela conduta ilícita.

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa encontra previsão no art. 252, parágrafo único, do CP.

Uso de gás tóxico ou asfixiante e intenção homicida: Se o gás tóxico ou asfixiante for utilizado contra pessoa determinada, com o dolo de matá-la, estará caracterizado o crime de homicídio qualificado, de natureza hedionda (art. 121, § 2º, III, do CP). Nada impede o concurso de crimes entre o homicídio e o crime em estudo, desde que, além da morte de uma pessoa determinada, seja também causado perigo à coletividade. Não há bis in idem, pois são atingidos bens jurídicos diversos (vida humana e incolumidade pública), pertencentes a titulares distintos.

Consumação: O crime é material ou causal: consuma-se no momento em que o agente, mediante a utilização de gás tóxico ou asfixiante, expõe efetivamente a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de terceiros. É também crime de perigo concreto, razão pela qual o uso de gás tóxico ou asfixiante depende da comprovação da existência de perigo a um montante indeterminado de indivíduos.

A prova da materialidade do fato delituoso: A prova da materialidade do fato exige a elaboração de perícia, com a finalidade de demonstrar a efetiva idoneidade do gás tóxico ou asfixiante para colocar em risco a vida, a saúde ou o patrimônio de pessoas indeterminadas (art. 175 do CPP).

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: O uso de gás tóxico ou asfixiante, em sua modalidade fundamental (CP, art. 252, caput), é crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo, se presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 da Lei 9.099/1995. Na modalidade culposa (art. 252, parágrafo único) é infração penal de menor potencial ofensivo, admitindo a transação penal e o rito sumaríssimo, nos termos da Lei 9.099/1995.

Modalidade culposa (art. 252, parágrafo único): Nesse crime, o sujeito, agindo com imprudência, negligência ou imperícia, viola o dever objetivo de cuidado a todos imposto, dando causa a resultado naturalístico objetivamente previsível – a exposição a perigo da vida, da integridade física ou do patrimônio de pessoas não individualizadas, mediante o uso de gás tóxico ou asfixiante.

Poluição culposa e Lei dos Crimes Ambientais: Se alguém, desatendendo o dever objetivo de cuidado, causar poluição de qualquer natureza – inclusive mediante o emprego de gás tóxico ou asfixiante – em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, estará caracterizado o delito do art. 54, § 1º, da Lei 9.605/1998 – Lei dos Crimes Ambientais.

Formas qualificadas (art. 258 do CP): Se do uso de gás tóxico ou asfixiante, provocado dolosamente pelo agente, resultar lesão corporal de natureza grave, aí se incluindo a de natureza gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. São figuras nitidamente preterdolosas. Se do crime, provocado por culpa do agente, resultar lesão corporal, aumentar-se-á a pena pela metade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. São crimes culposos qualificados por resultados de igual natureza.

A questão do uso de gás lacrimogêneo pela polícia: O uso moderado do gás lacrimogêneo, de índole asfixiante, por policial ou qualquer pessoa autorizada a portá-lo, para repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem, ainda que caracterize fato típico, encontra-se acobertado pela legítima defesa (art. 25 do CP). Uma das funções precípuas das Polícias Militares é a preservação da ordem pública (CF, art. 144, § 5º). Logo, em momentos de conturbação social é dever não apenas legal, mas notadamente constitucional do agente de segurança, restabelecer a ordem em prol da segurança pública. Portanto, desde que não exista excesso ou abuso de poder na utilização do gás lacrimogêneo, incidirá o estrito cumprimento de dever legal (CP, art. 23, III).

Uso de gás tóxico ou asfixiante e contravenção penal de emissão de fumaça, gás ou vapor – distinção: A distinção entre o crime de uso de gás tóxico ou asfixiante e a contravenção penal de emissão de fumaça (art. 38 do Decreto-lei 3.688/1941 – Lei das Contravenções Penais) repousa na gravidade da conduta, a ser indicada em exame pericial realizado com esta finalidade. No crime o fato expõe a perigo concreto a vida, a integridade física ou o patrimônio de pessoas indeterminadas, provocado pelo uso de gás tóxico ou asfixiante. Na contravenção penal a poluição é menos prejudicial, pois se limita a ofender ou molestar alguém, sem colocar em risco a vida, a saúde ou o patrimônio de um elevado número de pessoas.

Fabrico, fornecimento, aquisição posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico, ou asfixiante

Art. 253. Fabricar, fornecer, adquirir, possuir ou transportar, sem licença da autoridade, substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante, ou material destinado à sua fabricação:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Informações rápidas:

Objeto material: substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante, ou material destinado à sua fabricação.

Elemento normativo do tipo: “sem licença da autoridade” (lei penal em branco heterogênea).

Elemento subjetivo: dolo (não admite modalidade culposa).

Tentativa: não admite.

Ação penal: pública incondicionada.

Competência: Justiça Estadual (sempre).

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É a substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante (acerca desses conceitos, ver comentários aos arts. 251 e 252), ou material destinado à sua fabricação. É fundamental a elaboração de exame pericial para demonstrar a natureza explosiva, tóxica ou asfixiante da substância fabricada, fornecida, transportada ou possuída pelo sujeito ativo, sem licença da autoridade competente.

Núcleos do tipo: O tipo possui contém cinco núcleos. Fabricar é produzir, preparar ou construir. Fornecer equivale a dar ou entregar. Adquirir significa obter a propriedade. Possuir é entrar na posse de um bem, usufruindo-o. Transportar, finalmente, é levar algo de um lugar a outro. Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: a lei contempla diversos núcleos, e a realização de mais de um deles, no tocante ao mesmo objeto material, caracteriza um único crime.

Elemento normativo do tipo: É representado pela expressão sem licença da autoridade. É preciso observar se o agente tinha ou não licença da autoridade pública para desempenhar as atividades indicadas no tipo penal. Se dotado da licença, o fato não se revestirá de tipicidade penal. Trata-se de lei penal em branco heterogênea – a conduta criminosa reclama complementação por ato da Administração Pública, ente legitimado a conceder ou não licença para fabricar, fornecer, adquirir, possuir ou transportar substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante, ou material destinado à sua fabricação.

Sujeito ativo: Qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: O crime é formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se no momento em que o sujeito fabrica, fornece, adquire, possui ou transporta, sem licença da autoridade, substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante, ou material destinado à sua fabricação, não se exigindo a causação de dano a alguém. É também crime de perigo abstrato ou presumido, pois a lei presume a situação de risco ao bem jurídico como corolário da prática da conduta.

Tentativa: Não é possível, pois a lei incriminou de forma autônoma atos que representam fases de preparação de outros delitos.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal, autorizando-se a incidência da transação penal e do rito sumaríssimo, em consonância com as disposições da Lei 9.099/1995.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 258 do CP): Se de qualquer das condutas descritas no tipo penal resultar lesão corporal de natureza grave, aí se incluindo a gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. São crimes preterdolosos.

Competência: O crime é de competência da Justiça Estadual, mesmo nas hipóteses em que a fiscalização das substâncias seja reservada a órgão federal.

Lei de Segurança Nacional: Caso o engenho explosivo seja de uso privativo das forças armadas, será imputado ao agente, em respeito ao princípio da especialidade, o crime previsto no art. 12, parágrafo único, da Lei 7.170/1983.

Estatuto da Criança e do Adolescente: A venda, o fornecimento, ainda que gratuito, ou a entrega, de qualquer forma, a criança ou adolescente, de arma, munição ou explosivo, caracteriza o delito tipificado no art. 242 da Lei 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.

Estatuto do Desarmamento: O art. 16, parágrafo único, III, da Lei 10.826/2003 – Estatuto do Desarmamento comina a pena de reclusão, de três a seis anos, e multa, a quem “possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. O inciso VI do citado dispositivo legal reserva igual pena àquele que “produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo”.

Atividades nucleares: O art. 22 da Lei 6.453/1977 – Responsabilidade civil por danos nucleares e responsabilidade criminal por atos relacionados com atividades nucleares, incrimina a conduta de quem possui, adquire, transfere, transporta, guarda ou traz consigo material nuclear, sem a necessária autorização. O art. 26 do mesmo diploma legal pune aquele que deixar de observar as normas de segurança ou de proteção relativas à instalação nuclear ou ao uso, transporte, posse e guarda de material nuclear, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem.

Jurisprudência selecionada:

Competência: “Explosivos (posse). Justiça Comum. Código Penal, art. 253. A fiscalização da produção e comércio de substâncias e engenhos explosivos atribuída, em regulamento, ao Exército, não tem o efeito de fazer recair a contravenção prevista no art. 18 da Lei das Contravenções Penais, tanto quanto o crime capitulado no art. 253 do Código Penal, na competência da Justiça Federal” (STF: RE 92.424/MG, rel. Min. Rafael Mayer, 1ª Turma, j. 18.12.1980).

Inundação

Art. 254. Causar inundação, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:

Pena – reclusão, de três a seis anos, e multa, no caso de dolo, ou detenção, de seis meses a dois anos, no caso de culpa.

Classificação:

Crime comum

Crime material ou causal e de perigo

comum e concreto

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente

Informações rápidas:

Objeto material: grande quantidade de água liberada.

Elemento subjetivo: dolo. Admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É a grande quantidade de água liberada.

Núcleo do tipo: O núcleo do tipo é causar, ou seja, dar origem, produzir ou originar algo. Inundação é “a invasão de determinado lugar por águas que nele não deveriam estar, porque não é o lugar destinado à sua contenção, ao seu depósito ou curso natural”.2 Destarte, causar inundação é provocá-la mediante a intervenção humana sobre a força natural das águas, represadas ou em curso, de tal forma que elas tomem proporções incontroláveis, colocando em risco um número indeterminado de pessoas. Assim, pratica o delito aquele que dá origem à inundação, expondo efetivamente a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio da coletividade. A conduta é normalmente comissiva, mas nada impede a prática do crime via omissão imprópria (crime omissivo impróprio, espúrio ou comissivo por omissão), desde que o sujeito ativo ostente o dever jurídico de agir (art. 13, § 2º, do CP). Se o alagamento for de pequena gravidade, não há falar em crime de inundação, embora subsista a possibilidade de configuração do delito de dano (CP, art. 163).

Inundação e usurpação de águas – distinção: Na hipótese em que uma pessoa desvia ou represa águas alheias, em proveito próprio ou de outrem, sem provocação de perigo comum, estará configurado o delito de usurpação (art. 161, I, do CP).

Sujeito ativo: Qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Admite-se a modalidade culposa.

Inundação e ânimo homicida: Se a inundação for realizada com a intenção de matar alguém, serão imputados ao agente dois crimes: inundação (CP, art. 254) e homicídio qualificado (CP, art. 121, § 2º, III), de natureza hedionda, em concurso formal impróprio ou imperfeito. Não há bis in idem, pois são violados dois bens jurídicos, pertencentes a pessoas diversas.

Consumação: A inundação é crime material ou causal e de perigo comum e concreto: consuma-se no momento em que o agente, depois de praticar a conduta legalmente descrita, expõe a perigo efetivo e comprovado a vida, a integridade física ou o patrimônio de pessoas não individualizadas.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Em sua modalidade dolosa, constitui-se em crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios elencados pela Lei 9.099/1995. Na modalidade culposa será infração penal de menor potencial ofensivo, compatível com a transação penal e o rito sumaríssimo.

Formas qualificadas (art. 258 do CP): Se da inundação, provocada dolosamente pelo agente, resultar lesão corporal de natureza grave, aí se inserindo também a gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte a pena será aplicada em dobro. São figuras estritamente preterdolosas. Se o mesmo fato, provocado por culpa do agente, resultar em lesão corporal, aumentar-se-á a pena pela metade; e, se resultar morte, aplicar-se-á a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. São crimes culposos agravados por resultados de igual natureza.

Perigo de inundação

Art. 255. Remover, destruir ou inutilizar, em prédio próprio ou alheio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem, obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação:

Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.

Informações rápidas:

Objeto material: obstáculo natural ou qualquer obra destinada a impedir inundação.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Crime de perigo concreto: imprescindível perícia para demonstrar a efetiva exposição a perigo de terceiros. Tentativa: não admite (crime obstáculo).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É o obstáculo natural, compreendido como a barreira criada pela própria natureza, ou qualquer obra destinada a impedir inundação, ou seja, a construção humana cuja finalidade é obstar a inundação, barrando a força das águas.

Núcleos do tipo: No delito em comento há três núcleos: remover (mudar de um lugar para outro, transferir, afastar); destruir (desfazer, demolir, arruinar, fazer desaparecer); e inutilizar (invalidar, tornar imprestável para a sua função). Responde pelo crime em apreço aquele que realizar ao menos uma destas condutas em relação ao obstáculo natural ou obra destinada a impedir a inundação, em prédio próprio ou alheio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de pessoas indeterminadas. A ação de criar obstáculo idôneo a causar inundação não constitui o crime ora analisado. Nada impede, entretanto, a configuração do crime de perigo para a vida ou saúde de outrem (CP, art. 132). Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: a prática de mais de um núcleo do tipo, no tocante ao mesmo objeto material e no mesmo contexto fático, caracteriza um único delito. Prédio é o edifício ou casa, construção de madeira ou alvenaria, instalada em determinado terreno e delimitada por paredes e teto, destinada a servir de moradia, comércio ou indústria. A conduta criminosa pode ser praticada em prédio próprio ou alheio.

Sujeito ativo: Qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: O perigo de inundação é crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado e de perigo comum e concreto: consuma-se no momento em que restar demonstrada a situação de perigo à coletividade, provocada pela remoção, destruição ou inutilização de obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação, independentemente da efetiva invasão das águas em determinado local. Na hipótese em que o dolo do agente limita-se à produção do perigo de inundação, mas esta, que era objetivamente previsível, vem a se concretizar, estarão caracterizados dois crimes, em concurso formal próprio ou perfeito: perigo de inundação e inundação culposa.

Tentativa: Não é cabível, pois o perigo de inundação constitui-se em ato preparatório da inundação (CP, art. 254), que o legislador decidiu tipificar como crime autônomo. Classifica-se, portanto, como crime obstáculo.

A prova da materialidade do fato delituoso: O perigo de inundação é crime de perigo concreto, sendo imprescindível a elaboração de perícia para demonstrar a efetiva exposição a perigo de terceiros em face da remoção, destruição ou inutilização, em prédio próprio ou alheio, de obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação. Este argumento é reforçado pelo fato de tratar-se de crime que deixa vestígios de ordem material (CPP, art. 158).

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Trata-se de crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo, se presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 da Lei 9.099/1995.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 258, 1ª parte, do CP): Se do crime resultar lesão corporal de natureza grave, a pena privativa de liberdade é aumentada de metade; se resulta morte, é aplicada em dobro. Destarte, se do perigo de inundação gerado pelo agente resultar lesão corporal de natureza grave, aí também se incluindo a gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. São casos típicos de crimes preterdolosos. A parte final do art. 258 do Código Penal é inaplicável ao crime de perigo de inundação, pois não se admite sua modalidade culposa.

Desabamento ou desmoronamento

Art. 256. Causar desabamento ou desmoronamento, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Modalidade culposa

Parágrafo único. Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de seis meses a um ano.

Classificação:

Crimes comuns

Crimes materiais ou causais e de perigo concreto

Crimes de forma livre

Crimes vagos

Crimes instantâneos

Crimes comissivos (regra)

Crimes unissubjetivos, unilaterais ou de concurso eventual

Crimes plurissubsistentes (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: espaço físico em que se verifica o desabamento.

Elemento subjetivo: dolo. Só admite modalidade culposa na hipótese do parágrafo único.

Crime de perigo concreto: exigência de perícia para comprovação da efetiva probabilidade de dano.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente). Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É o espaço físico em que se verifica o desabamento ou o desmoronamento. Desabamento é a derrubada de obras produzidas pela ação humana. Desmoronamento, por sua vez, é fazer vir abaixo as partes do solo.

Núcleo do tipo: É “causar”, no sentido de provocar ou originar algo. A conduta criminosa consiste em dar origem ao desabamento ou desmoronamento, ainda que parciais, expondo a perigo concreto a vida, a integridade física ou o patrimônio de pessoas indeterminadas.

Sujeito ativo: O desabamento e o desmoronamento podem ser cometidos por qualquer pessoa (crimes comuns ou gerais).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago) e, mediatamente, a pessoa física ou jurídica prejudicada pelo desabamento ou desmoronamento.

Elemento subjetivo: Na figura do caput, é o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa é admitida pelo parágrafo único.

Desabamento ou desmoronamento e intenção de lesar o patrimônio alheio: Se o agente provocar desabamento ou desmoronamento com o intuito de destruir, deteriorar ou inutilizar coisa alheia, e desde que da conduta não resulte perigo comum, a ele será imputado o crime de dano, simples (CP, art. 163, caput) ou qualificado (CP, art. 163, parágrafo único, inc. IV), se praticado por motivo egoístico.

Consumação: O desabamento e o desmoronamento consumam-se com a exposição a perigo da vida, da integridade física ou do patrimônio de pessoas indeterminadas. São crimes materiais (ou causais) e de perigo concreto, não se presumindo a probabilidade de dano, a qual deve ser demonstrada na situação prática.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: O desabamento e o desmoronamento dolosos são crimes de médio potencial ofensivo, compatíveis com a suspensão condicional do processo. As modalidades culposas, em face do máximo da pena privativa de liberdade cominada (detenção de um ano), constituem-se em infrações penais de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e sujeitas à transação penal e ao rito sumaríssimo.

Modalidades culposas (art. 256, parágrafo único): Admite-se o desabamento e o desmoronamento culposos, ou seja, provocados por imprudência, negligência ou imperícia.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 258 do Código Penal): Se do desabamento ou desmoronamento dolosamente causado pelo agente resultar lesão corporal de natureza grave, aí também se incluindo a gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. De outro lado, se do fato, provocado por culpa, resultar lesão corporal, aumentar-se-á a pena pela metade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

Distinção entre o art. 256 do Código Penal e o art. 29 da Lei das Contravenções Penais: O fato de provocar desabamento de construção ou, por erro no projeto ou na execução, dar-lhe causa, sem expor a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de um número indeterminado de pessoas, configura a contravenção penal. Por sua vez, será imperioso o reconhecimento do crime definido no art. 256 do Código Penal quando restar demonstrada a situação de perigo comum.

Subtração, ocultação ou inutilização de material de salvamento

Art. 257. Subtrair, ocultar ou inutilizar, por ocasião de incêndio, inundação, naufrágio, ou outro desastre ou calamidade, aparelho, material ou qualquer meio destinado a serviço de combate ao perigo, de socorro ou salvamento; ou impedir ou dificultar serviço de tal natureza:

Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: qualquer meio destinado a serviço de combate ao perigo, de socorro ou salvamento.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública.

Objeto material: É o aparelho, material ou meio destinado a serviço de combate ao perigo, de socorro (v.g., ambulância, maca, medicamentos) ou salvamento (v.g., salvavidas, escadas, cordas, redes de salvamento, barcos)”.

Núcleos do tipo: O tipo penal contém cinco núcleos: Subtrair é inverter a posse, ou seja, apoderar-se de algo; ocultar é esconder; inutilizar equivale a invalidar, danificar, tornar alguma coisa imprestável; impedir tem o sentido de embaraçar, servir de obstáculo; e, finalmente, dificultar é colocar empecilhos, embaraçar, tornando algo mais custoso para ser realizado. Vale destacar que essas duas últimas modalidades do delito (“impedir” e “dificultar”) não foram contempladas pela rubrica marginal do art. 257 do Código Penal, deixando de constar do nomen iuris do delito.

Sujeito ativo: Pode ser cometido por qualquer pessoa, inclusive pelo proprietário do aparelho, material ou qualquer meio destinado a serviço de combate ao perigo, de socorro ou salvamento.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não há espaço para a modalidade culposa.

Consumação: Consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, capaz de, por si só, acarretar uma situação perigosa, prescindindo-se da lesão à vida, à saúde ou ao patrimônio de terceiros, bem como da comprovação da efetiva exposição a risco de dano a pessoas indeterminadas.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A subtração, ocultação ou inutilização de material de salvamento é crime de elevado potencial ofensivo, não se aplicando os benefícios contidos na mencionada lei.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 258, 1ª parte, CP): Se da conduta resultar lesão corporal de natureza grave, aí também se inserindo a gravíssima (CP, art. 129, §§ 1º e 2º), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. A parte final do art. 258 do Código Penal é inaplicável a este crime, pois não se admite sua modalidade culposa.

Concurso de crimes: Se o agente que pratica qualquer das condutas descritas no art. 257 do Código Penal também provocar o incêndio ou a inundação, a ele serão imputados ambos os crimes, em concurso material (CP, art. 69). Igual raciocínio se aplica na hipótese em que o sujeito furta ou danifica o aparelho, material ou qualquer outro meio destinado a serviço de combate ao perigo, de socorro ou salvamento.

Formas qualificadas de crime de perigo comum

Art. 258. Se do crime doloso de perigo comum resulta lesão corporal de natureza grave, a pena privativa de liberdade é aumentada de metade; se resulta morte, é aplicada em dobro. No caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

Formas qualificadas de crime de perigo comum: Os crimes de perigo comum são crimes complexos, agravados pelo resultado. Na 1ª parte do art. 258, estão previstos crimes preterdolosos, com dolo na conduta antecedente e culpa no resultado agravador. Na 2ª parte do artigo, há a previsão de crimes culposos agravados por resultados de igual natureza. Tanto nos crimes doloso como nos culposos, aplica-se apenas um aumento, ainda que haja pluralidade de resultados e de vítimas.

Nomenclatura: Embora o dispositivo legal utilize a expressão “forma qualificada”, em seu bojo encontram-se causas de aumento da pena, e sua análise permite as seguintes conclusões: a) se ao fato doloso sobrevier lesão corporal de natureza grave em alguém, a pena privativa de liberdade será aumentada de metade; b) se ao fato doloso sobrevier a morte de alguém, a pena privativa de liberdade será aplicada em dobro; c) se da conduta culposa resultar lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e d) se da conduta culposa resultar a morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

Difusão de doença ou praga

Art. 259. Difundir doença ou praga que possa causar dano a floresta, plantação ou animais de utilidade econômica:

Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

Modalidade culposa

Parágrafo único. No caso de culpa, a pena é de detenção, de um a seis meses, ou multa.

Revogação tácita do art. 259 do Código Penal pelo art. 61 da Lei 9.605/1998: Este artigo foi revogado tacitamente pelo art. 61 da Lei 9.605/1998 – Lei dos Crimes Ambientais, cuja redação é a seguinte: “Disseminar doença ou praga ou espécies que possam causar dano à agricultura, à pecuária, à fauna, à flora ou aos ecossistemas: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”. Nota-se que o tipo penal contido na Lei dos Crimes Ambientais, além de ser mais recente, é também especial. Quanto ao tipo doloso, ocorreu novatio legis in mellius, pois a pena estabelecida pela nova lei é inferior à que estabelecia o Código Penal. Observa-se ainda, que a modalidade culposa do delito de difusão de doença ou praga, originariamente disciplinada no parágrafo único do art. 259 do Código Penal, deixou de existir. Atualmente, esse fato é atípico, uma vez que não foi contemplado pela Lei 9.605/1998. Operou-se, em verdade, a abolitio criminis da forma culposa da difusão de doença ou praga, pois, além da revogação tácita do art. 259 do Código Penal, o fato perdeu seu caráter criminoso perante o ordenamento jurídico em geral.

Capítulo II
DOS CRIMES CONTRA A SEGURANÇA DOS MEIOS DE
COMUNICAÇÃO, TRANSPORTE E OUTROS SERVIÇOS PÚBLICOS

Perigo de desastre ferroviário

Art. 260. Impedir ou perturbar serviço de estrada de ferro:

I – destruindo, danificando ou desarranjando, total ou parcialmente, linha férrea, material rodante ou de tração, obra de arte ou instalação;

II – colocando obstáculo na linha;

III – transmitindo falso aviso acerca do movimento dos veículos ou interrompendo ou embaraçando o funcionamento de telégrafo, telefone ou radiotelegrafia;

IV – praticando outro ato de que possa resultar desastre:

Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

Desastre ferroviário

§ 1º Se do fato resulta desastre:

Pena – reclusão, de quatro a doze anos e multa.

§ 2º No caso de culpa, ocorrendo desastre:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

§ 3º Para os efeitos deste artigo, entende-se por estrada de ferro qualquer via de comunicação em que circulem veículos de tração mecânica, em trilhos ou por meio de cabo aéreo.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e concreto

Crime de forma vinculada

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: linha férrea, o material rodante ou de tração, a obra de arte ou instalação, o telégrafo, o telefone e a radiotelegrafia.

Elemento subjetivo: dolo. Admite modalidade culposa somente no § 2.º. Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada. Competência: Justiça Estadual.

Objeto jurídico: Tutela-se a incolumidade pública, relativamente à segurança do transporte ferroviário.

Objetos materiais: São objetos materiais a linha férrea, o material rodante ou de tração, a obra de arte ou instalação, o telégrafo, o telefone e a radiotelegrafia. Linha férrea: É a estrada composta por trilhos e dormentes, reservada à circulação de material rodante. Material rodante: Consiste nos veículos ferroviários, assim compreendidos como os de tração (exemplo: locomotivas) e os rebocados (exemplos: carros de passageiros e vagões de carga). Material de tração: É veículo ferroviário usado especificamente para tracionar os demais (exemplo: locomotiva ou automotriz). Obra de arte: Nesta expressão incluem-se as pontes, os túneis e os viadutos. Instalação: É o objeto dotado de utilidade à estrada de ferro (exemplos: sinais da linha férrea, placas, cabos, cancelas, cabines de bloqueio, chaves de desvio etc.). Telégrafo: É o sistema de transmissão de mensagens entre dois ou mais pontos distantes entre si, mediante sinais. Telefone: É o aparelho destinado a transmitir a distância a palavra falada. Radiotelegrafia: É a telegrafia sem fio por meio de ondas eletromagnéticas.

Núcleos do tipo: São “impedir” e “perturbar”. Impedir é obstruir, vedar, impossibilitar a normal circulação de veículos ferroviários; perturbar, por sua vez, tem o sentido de dificultar, atrapalhar, causar embaraço. Os verbos relacionam-se com o serviço de estrada de ferro. Além da redação do caput, o tipo penal é composto por condutas complementares, arroladas nos incisos I a IV, analisadas abaixo. O art. 260 do Código Penal constitui-se em tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: a prática de mais de uma conduta, no tocante ao mesmo objeto material e no mesmo contexto fático, caracteriza um único delito de perigo de desastre ferroviário.

Inciso I: Destruir é arruinar, extinguir, fazer desaparecer. Danificar significa deteriorar, estragar, prejudicar. Por sua vez, desarranjar equivale a tirar da ordem, desordenar, prejudicar o bom funcionamento.

Inciso II: Colocar é pôr algo em determinado lugar. O sujeito insere obstáculo, ou seja, barreira, empecilho ou impedimento na linha, impedindo ou perturbando serviço de estrada de ferro.

Inciso III: Transmitir significa expedir, enviar, mandar algo de um lugar para outro, ou de uma pessoa para outra. Por seu turno, interromper é suspender a continuidade, fazer cessar. Finalmente, embaraçar é dificultar, estorvar.

Inciso IV: O legislador valeu-se da interpretação analógica ou intra legem, que se verifica quando a lei contém em seu bojo uma fórmula casuística seguida de uma fórmula genérica. Destarte, se o agente realizar qualquer outra conduta de que possa resultar desastre ferroviário, desde que semelhante a algum dos comportamentos versados nos incisos I a III, a ele será imputado o delito em apreço.

Sujeito ativo: Pode ser cometido por qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não confundir com a simulação de perigo, pois nesse caso inexiste risco ao bem jurídico penalmente tutelado. A figura culposa é admitida unicamente no tocante ao desastre ferroviário (CP, art. 260, § 2º).

Consumação: Dá-se no momento em que restar comprovada a situação de perigo a pessoas indeterminadas, independentemente da efetiva ocorrência do desastre.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: O perigo de desastre ferroviário é crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios contidos na Lei 9.099/1995.

Desastre ferroviário – figura qualificada (art. 260, § 1º): Desastre é o acontecimento calamitoso, o acidente provocado pelo impedimento ou perturbação do serviço de estrada de ferro. Sua caracterização reclama a criação de uma situação de dano grave, extenso e complexo a pessoas (exemplo: passageiros ou funcionários do trem) ou coisas (exemplo: cargas).

Modalidade culposa de desastre ferroviário (art. 260, § 2º): A leitura do texto da lei permite a conclusão no sentido de que somente se admite a modalidade culposa do crime de desastre ferroviário, pois o legislador empregou a expressão “ocorrendo desastre”. Em outras palavras, não há lugar para a culpa no âmbito do delito de perigo de desastre ferroviário.

Formas qualificadas (art. 263 do CP): Embora o dispositivo legal utilize a expressão “forma qualificada”, em seu bojo encontram-se causas de aumento da pena, e sua análise permite as seguintes conclusões: a) se do fato doloso resultar desastre (CP, art. 260, § 1º), e sobrevier lesão corporal de natureza grave em alguém, a pena privativa de liberdade será aumentada de metade; b) se do fato doloso resultar desastre (CP, art. 260, § 1º), daí resultando a morte de alguém, a pena privativa de liberdade será aplicada em dobro; c) se da conduta culposa, ocorrendo desastre, resultar lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e d) se da conduta culposa, ocorrendo desastre, resultar a morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

Sabotagem com fins políticos: Se o agente, impelido por motivação política, praticar sabotagem contra meios e vias de transporte, impedindo ou perturbando serviço de estrada de ferro, a ele será imputado o crime definido no art. 15 da Lei 7.170/1983 – Lei de Segurança Nacional.

Competência: É da Justiça Estadual.

Jurisprudência selecionada:

Competência: “Crime. Perigo. Desastre ferroviário. Na hipótese, não há como entender-se que a prática do crime de perigo de desastre ferroviário (art. 260 do CP) possa reclamar a competência da Justiça Federal, visto que o bem tutelado em questão é a incolumidade pública, a segurança dos transportes, o que não se revela como interesse próprio da União. Note-se que a empresa ferroviária em questão caracteriza-se como sociedade de economia mista” (CC 45.652/SP, rel. Min. Nilson Naves, 3ª Seção, j. 22.09.2004).

Atentado contra a segurança de transporte marítimo, fluvial ou aéreo

Art. 261. Expor a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea:

Pena – reclusão, de dois a cinco anos.

Sinistro em transportes marítimo, fluvial ou aéreo

§ 1º Se do fato resulta naufrágio, submersão ou encalhe de embarcação ou a queda ou destruição de aeronave:

Pena – reclusão, de quatro a doze anos.

Prática do crime com o fim de lucro

§ 2º Aplica-se, também, a pena de multa, se o agente pratica o crime com intuito de obter vantagem econômica, para si ou para outrem.

Modalidade culposa

§ 3º No caso de culpa, se ocorre o sinistro:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e concreto

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime comissivo (regra)

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: embarcação ou aeronave, obrigatoriamente destinadas ao transporte coletivo (embarcações lacustres não estão abrangidas).

Elemento subjetivo: dolo (especial fim de agir implica na incidência cumulativa da sanção pecuniária). Admite modalidade culposa somente no § 3.º.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada. Competência: Justiça Federal.

Objeto jurídico: Tutela-se a incolumidade pública, especificamente no que concerne à segurança dos meios de transporte.

Objeto material: É a embarcação ou aeronave, obrigatoriamente destinadas ao transporte coletivo, ou seja, de pessoas indeterminadas. Embarcação é a construção, de qualquer porte, destinada a navegar sobre a água. Aeronave é “todo aparelho manobrável em voo, que possa sustentar-se e circular no espaço aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a transportar pessoas ou coisas” (art. 106, caput, da Lei 7.565/1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica).

Núcleos do tipo: Expor é colocar em perigo, proporcionar risco; praticar equivale a cometer, executar; impedir é servir de obstáculo, vedar a prática de algo; e, finalmente, dificultar é tornar algo custoso de ser efetuado, criando empecilhos. Destarte, comete o crime em apreço aquele que expõe a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou pratica qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea. Navegação é a atividade de conduzir uma embarcação ou aeronave de um ponto a outro. Trata-se de crime de forma livre.

Sujeito ativo: Pode ser cometido por qualquer pessoa, inclusive pelo proprietário da embarcação ou aeronave (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa é admitida unicamente nas hipóteses em que se verifica o sinistro (CP, art. 261, § 3º). O especial fim de agir consistente na obtenção de vantagem econômica implica a incidência cumulativa da sanção pecuniária (CP, art. 261, § 2º).

Consumação: Consuma-se com a prática da conduta criminosa, a qual acarreta o efetivo perigo a um número indeterminado de pessoas, independentemente do efetivo prejuízo à navegação marítima, fluvial ou aérea.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Trata-se de crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios elencados pela Lei 9.099/1995. No caso da figura culposa, cuida-se de infração penal de menor potencial ofensivo, compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995.

Sinistro em transporte marítimo, fluvial ou aéreo (art. 261, § 1º): Esta figura qualificada constitui-se em crime preterdoloso, isto é, o sinistro há de ser produzido unicamente a título de culpa. Sinistro é o desastre, o acidente de grandes proporções envolvendo pessoas ou coisas, no âmbito do transporte marítimo, fluvial ou aéreo. Naufrágio é a perda total ou parcial de uma embarcação por motivo de encalhe, colisão em outro transporte marítimo ou em iceberg, ou acidente diverso. Submersão é o afundamento total ou parcial da embarcação. Encalhe é ficar em lugar seco, impedindo-se a flutuação, mas sem submersão, a exemplo do que se verifica quando a quilha da embarcação se prende a um banco de areia ou outro obstáculo. Queda da aeronave é o ato ou efeito de cair, projetando-se contra a terra ou sobre águas. Destruição é a demolição ou aniquilação, total ou parcial, da embarcação ou da aeronave.

Modalidade culposa de sinistro (art. 261, § 3º): Somente se admite a modalidade culposa do crime de sinistro em transporte marítimo, fluvial ou aéreo. Com efeito, não há espaço para a culpa no âmbito do delito de atentado contra a segurança de transporte marítimo, fluvial ou aéreo.

Formas qualificadas (art. 263 do Código Penal): Embora o dispositivo legal utilize a expressão “forma qualificada”, em seu bojo encontram-se causas de aumento da pena, e sua análise permite as seguintes conclusões: a) se do fato doloso resultar sinistro (CP, art. 261, § 1º), e sobrevier lesão corporal de natureza grave em alguém, a pena privativa de liberdade será aumentada de metade; b) se do fato doloso resultar sinistro (CP, art. 261, § 1º), daí resultando a morte de alguém, a pena privativa de liberdade será aplicada em dobro; c) se da conduta culposa, ocorrendo desastre, resultar lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; d) se da conduta culposa, ocorrendo desastre, resultar a morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

Competência: A competência para processar e julgar os crimes cometidos a bordo de navios e aeronaves é da Justiça Federal, nos termos do art. 109, inc. IX, da Constituição Federal.3 Veja-se que o texto constitucional fala em “navios”, compreendidos como embarcações de grande porte. Logo, os crimes praticados a bordo de embarcações de pequeno e médio porte são, em regra, de competência da Justiça Estadual.

Atentado contra segurança no transporte aéreo e abuso na prática da aviação – distinção: O art. 35 do Decreto-lei 3.688/1941 – Lei das Contravenções Penais comina a pena de prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, a quem “entregar-se na prática da aviação, a acrobacias ou a voos baixos, fora da zona em que a lei o permite, ou fazer descer a aeronave fora dos lugares destinados a esse fim”. Nesse caso, o sujeito realiza acrobacias ou voos baixos, ou faz descer a aeronave fora dos lugares destinados a esse fim, com domínio da situação, de modo a eliminar ou diminuir o risco de dano à vida, à integridade física ou à saúde de pessoas indeterminadas. Entretanto, se o agente pratica tais comportamentos sem possuir conhecimento e técnica para tanto, ensejando o surgimento do perigo à incolumidade pública, estará configurado o crime tipificado no art. 261 do Código Penal.

Jurisprudência selecionada:

Competência: “Não ofende o princípio do ne bis in idem o fato de os controladores de voo estarem respondendo a processo na Justiça Militar e na Justiça comum pelo mesmo fato da vida, qual seja, o acidente aéreo que ocasionou a queda do Boeing 737/800 da Gol Linhas Aéreas no Município de Peixoto de Azevedo, no Estado do Mato Grosso, com a morte de todos os seus ocupantes, uma vez que as imputações são distintas. Solução que se encontra, mutatis mutandis, no enunciado da Súmula 90/STJ: ‘Compete à Justiça Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar, e à Comum pela prática do crime comum simultâneo àquele’” (STJ: CC 91.016/MT, rel. Min. Paulo Gallotti, 3ª Seção, j. 25.03.2008).

Atentado contra a segurança de outro meio de transporte

Art. 262. Expor a perigo outro meio de transporte público, impedir-lhe ou dificultar-lhe o funcionamento:

Pena – detenção, de um a dois anos.

§ 1º Se do fato resulta desastre, a pena é de reclusão, de dois a cinco anos.

§ 2º No caso de culpa, se ocorre desastre:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e concreto

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime comissivo (regra)

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: qualquer outro meio de transporte público (caráter residual ou subsidiário).

Elemento subjetivo: dolo. Admite modalidade culposa somente no § 2.º.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a incolumidade pública, relativamente à segurança dos meios de transporte público.

Objeto material: É qualquer outro meio de transporte público, desde que não abrangido pelos arts. 260 e 261 do Código Penal. A expressão “meio de transporte público” engloba o serviço prestado diretamente pelo Poder Público ou mediante concessão, bem como toda e qualquer atividade desta natureza efetuada em prol da coletividade, ainda que realizada por particulares. Trata-se de delito de caráter residual ou subsidiário. Vale destacar que a pena cominada às condutas descritas neste artigo é inferior às sanções penais aplicáveis aos crimes definidos nos dois artigos anteriores. Entendeu o legislador que, nesse caso, o risco à incolumidade pública é menor, em face da exposição a perigo de um número menos abrangente de pessoas.

Núcleos do tipo: Os verbos relacionam-se com a segurança do meio de transporte público ou com o seu funcionamento. “Expor”, no sentido de colocar em perigo; “impedir”, que significa embaraçar ou servir de obstáculo; e “dificultar”, ou seja, tornar mais custosa a realização de algo.

Sujeito ativo: Cuida-se de crime comum ou geral: pode ser cometido por qualquer pessoa, inclusive pelo proprietário do meio de transporte público.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago). Em caso de desastre, também são vítimas as pessoas lesadas pela conduta criminosa.

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica.

A presença do ânimo homicida: Se, além de expor a perigo o meio de transporte público, impedir-lhe ou dificultar-lhe o funcionamento, o agente também revelar a intenção de matar alguém, a ele serão imputados os crimes de atentado contra a segurança de outro meio de transporte e de homicídio, em concurso formal impróprio ou imperfeito (CP, art. 70, caput, 2ª parte), em face da presença de desígnios autônomos. Não há falar em bis in idem, pois tais crimes ofendem bens jurídicos diversos e são direcionados a vítimas diferentes.

Consumação: O crime é formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a prática da conduta criminosa, independentemente do desastre. É também delito de perigo comum e concreto, pois exige a comprovação da exposição de pessoas indeterminadas à probabilidade de dano.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: O atentado contra a segurança de outro meio de transporte, em sua modalidade fundamental e na modalidade culposa (CP, art. 262, caput e § 2º), é infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal, admitindo-se a transação penal e o rito sumaríssimo. Na figura qualificada, contida no § 1º, em face da pena mínima em abstrato, é vedada a incidência das disposições contidas na Lei 9.099/1995 (crime de elevado potencial ofensivo).

Modalidade qualificada (art. 262, § 1º): Desastre é o acidente grave, complexo e idôneo a colocar em perigo um número indeterminado de pessoas ou coisas. Cuida-se de crime preterdoloso, ou seja, o desastre há de ser produzido a título de culpa.

Figura culposa (art. 262, § 2º): A conduta culposa somente será punida se sobrevier o desastre. Destarte, se o sujeito, atuando com imprudência, negligência ou imperícia, expuser a perigo outro meio de transporte público, impedir-lhe ou dificultar-lhe o funcionamento, mas sem a produção do desastre, o fato será atípico.

Formas qualificadas (art. 263 do Código Penal): Nada obstante a lei utilize a expressão “forma qualificada”, em seu interior encontram-se causas de aumento da pena, e sua análise permite as seguintes conclusões: a) se do fato doloso resultar desastre (CP, art. 262, § 1º), e sobrevier lesão corporal de natureza grave em alguém, a pena privativa de liberdade será aumentada de metade; b) se do fato doloso resultar sinistro (CP, art. 262, § 1º), daí resultando a morte de alguém, a pena privativa de liberdade será aplicada em dobro; c) se da conduta culposa, ocorrendo desastre, resultar lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; d) se da conduta culposa, ocorrendo desastre, resultar a morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

Forma qualificada

Art. 263. Se de qualquer dos crimes previstos nos arts. 260 a 262, no caso de desastre ou sinistro, resulta lesão corporal ou morte, aplica-se o disposto no art. 258.

Formas qualificadas nos crimes contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços públicos: Na 1ª parte do art. 258, estão previstos crimes preterdolosos, com dolo na conduta antecedente e culpa no resultado agravador. Na 2ª parte do artigo, há a previsão de crimes culposos agravados por resultados de igual natureza. Tanto nos crimes doloso como nos culposos, aplica-se apenas um aumento, ainda que haja pluralidade de resultados e de vítimas.

Nomenclatura: Embora o dispositivo legal utilize a expressão “forma qualificada”, em seu bojo encontram-se causas de aumento da pena, e sua análise permite as seguintes conclusões: a) se ao fato doloso sobrevier lesão corporal de natureza grave em alguém, a pena privativa de liberdade será aumentada de metade; b) se ao fato doloso sobrevier a morte de alguém, a pena privativa de liberdade será aplicada em dobro; c) se da conduta culposa resultar lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e d) se da conduta culposa resultar a morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

Arremesso de projétil

Art. 264. Arremessar projétil contra veículo, em movimento, destinado ao transporte público por terra, por água ou pelo ar:

Pena – detenção, de um a seis meses.

Parágrafo único. Se do fato resulta lesão corporal, a pena é de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos; se resulta morte, a pena é a do art. 121, § 3º, aumentada de um terço.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime doloso

Crime de forma livre

Crime plurissubsistente (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime instantâneo

Crime de perigo comum e abstrato

Informações rápidas:

Objeto material: veículo em movimento, destinado ao transporte público por terra, por água ou pelo ar.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa. Se presente a intenção de matar estará caracterizado o crime de homicídio

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a incolumidade pública, especificamente no que diz respeito à segurança dos meios de transporte.

Objeto material: É o veículo em movimento, destinado ao transporte público por terra, por água ou pelo ar. A expressão “veículo destinado ao transporte público” relaciona-se com qualquer meio de transporte coletivo de pessoas ou coisas (cargas em geral) de um lugar para outro.

Núcleo do tipo:Arremessar”, no sentido de atirar, lançar projétil contra veículo, em movimento, destinado ao transporte público por terra, por água ou pelo ar. Projétil é o objeto idôneo a provocar dano. O projétil, embora normalmente constitua-se em objeto sólido, também pode ser representado por meios líquidos, desde que dotados de eficácia lesiva.

Arma de fogo e o Estatuto do Desarmamento: Se o projétil consistir em munição de arma de fogo, e for lançado em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, estará caracterizado o crime de disparo de arma de fogo, previsto no art. 15 da Lei 10.826/2003 – Estatuto do Desarmamento.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral, podendo ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Arremesso de projétil e intenção de matar: Se o arremesso de projétil visar à morte de pessoa determinada, ou seja, se presente a intenção de matar (animus necandi ou animus occidendi), estará caracterizado o crime de homicídio. Nesse caso, não há crime contra a incolumidade pública, e sim crime doloso contra a vida, pois o arremesso contra veículo em movimento destinava-se, na verdade, a eliminar a vida de alguém. Igual raciocínio é aplicável ao crime de lesão corporal dolosa, em suas variadas formas.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado, e de perigo abstrato: consuma-se com o arremesso do projétil contra um veículo, em movimento, destinado ao transporte público por terra, pela água ou pelo ar, prescindindo-se da comprovação da situação de perigo, a qual é presumida de forma absoluta pela lei (presunção iuris et de iure).4

Tentativa: É possível.

Ação penal: É penal pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Em sua modalidade fundamental, o arremesso de projétil é infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e o rito sumaríssimo.

Figuras qualificadas pelo resultado (art. 264, parágrafo único): A pena é sensivelmente maior nos casos em que o arremesso de projétil resultar em lesão corporal ou morte. No primeiro caso, a pena é de detenção, de seis meses a dois anos, constituindo-se em infração penal de menor potencial ofensivo; no segundo, a pena é a do art. 121, § 3º, relativa ao homicídio culposo (detenção de um a três anos), aumentada de um terço. São hipóteses de crimes preterdolosos.

Atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública

Art. 265. Atentar contra a segurança ou o funcionamento de serviço de água, luz, força ou calor, ou qualquer outro de utilidade pública:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa.

Parágrafo único. Aumentar-se-á a pena de 1/3 (um terço) até a metade, se o dano ocorrer em virtude de subtração de material essencial ao funcionamento dos serviços.

Informações rápidas:

Objeto material: serviços de utilidade pública.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Competência: Justiça Estadual (exceção: serviço de utilidade pública de interesse da União – Justiça Federal).

Objeto jurídico: É a incolumidade pública, no tocante à segurança de serviço de utilidade pública.

Objeto material: É o serviço de água, luz, força, calor ou qualquer outro de utilidade pública.

Núcleo do tipo: É “atentar”, no sentido de ofender, atrapalhar, importunar ou colocar em risco a segurança ou o funcionamento do serviço de água, luz, força, calor ou qualquer outro de utilidade pública.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral. Pode ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado, e de perigo abstrato: consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, que acarreta a presunção absoluta de exposição a perigo de um número indeterminado de pessoas, em face da relevância à sociedade dos serviços de utilidade pública.

Tentativa: É cabível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Trata-se de crime de médio potencial ofensivo. A pena mínima cominada (um ano) autoriza a suspensão condicional do processo, desde que presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 desta lei.

Causa de aumento da pena (art. 265, parágrafo único): É imprescindível, para incidência da majorante, tenha ocorrido dano efetivo como corolário da subtração de material essencial ao funcionamento dos serviços. Há necessidade, portanto, de que a subtração tenha sido efetuada com o intuito de colocar em risco a segurança ou o funcionamento dos serviços.

Competência: O crime de atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública, em regra, é de competência da Justiça Estadual. Entretanto, será competente a Justiça Federal quando o atentado for praticado contra a segurança ou o funcionamento de serviço de utilidade pública de interesse da União. É o que se verifica, exemplificativamente, com o serviço de energia elétrica (CF, art. 21, inc. XII, b).

Lei de Segurança Nacional: Se o móvel do agente apresentar conotação política, estará caracterizado o crime definido no art. 15, § 1º, b, da Lei 7.170/1983.

Código Penal Militar: O art. 287 do Decreto-lei 1.001/1969 – Código Penal Militar define o crime de atentado contra serviço de utilidade militar: “Art. 287. Atentar contra a segurança ou o funcionamento de serviço de água, luz, fôrça ou acesso, ou qualquer outro de utilidade, em edifício ou outro lugar sujeito à administração militar: Pena – reclusão, até cinco anos. Parágrafo único. Aumentar-se-á a pena de um têrço até metade, se o dano ocorrer em virtude de subtração de material essencial ao fun-cionamento do serviço”.

Atentado contra instalação nuclear: Se o atentado for praticado contra instalação nuclear, estará caracterizado o crime definido no art. 27 da Lei 6.453/1977.

Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico ou telefônico

Art. 266. Interromper ou perturbar serviço telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico, impedir ou dificultar-lhe o restabelecimento:

Pena – detenção, de um a três anos, e multa.

§ 1º Incorre na mesma pena quem interrompe serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede ou dificulta-lhe o restabelecimento.

§ 2º Aplicam-se as penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de calamidade pública.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: serviço telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: É a incolumidade pública, no que diz respeito à segurança do serviço telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico.

Objeto material: É o serviço telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico. Serviço telegráfico é o relacionado ao desempenho de atividades inerentes ao sistema de transmissão de mensagens entre dois ou mais pontos distantes entre si, mediante sinais convencionais. Compreende o telégrafo elétrico – terrestre ou submarino – e o semafórico. Por sua vez, serviço radiotelegráfico é a atividade concernente à telegrafia sem fio, por meio de ondas eletromagnéticas, da qual é exemplo o rádio Nextel. Finalmente, o serviço telefônico consiste na atividade referente à transmissão a distância de palavra falada ou outro som, mediante fios (telefonia comum) ou sinais (telefonia celular).

Núcleos do tipo: Interromper é fazer cessar ou romper a continuidade. Perturbar equivale a dificultar ou atrapalhar. Impedir significa obstruir ou embaraçar. Dificultar, por sua vez, é colocar empecilhos, tornando mais custosa a realização de alguma atividade. Os verbos ligam-se aos serviços telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico. Cuida-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado. A lei contempla mais de um núcleo e a realização de dois ou mais deles, no mesmo contexto fático e contra o mesmo objeto material, caracteriza um único delito.

Distinção com o crime de violação de comunicação telegráfica, radioelétrica ou telefônica: O delito em estudo está previsto entre os crimes contra a incolumidade pública. Exige, portanto, a exposição a perigo de pessoas indeterminadas, ofendendo toda a coletividade. Destarte, se a conduta limitar-se a impedir a comunicação ou a conversação de pessoas determinadas, estará configurado o crime de violação de comunicação telegráfica, radioelétrica ou telefônica, disciplinado no art. 151, § 1º, inc. III, do Código Penal.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral, podendo ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado, e de perigo comum e abstrato: consuma-se com a prática da conduta criminosa, independentemente da causação de dano aos serviços telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico. Igualmente, a comprovação do efetivo perigo a um número indeterminado de pessoas é prescindível, pois a lei o presume de forma absoluta (presunção iuris et de iure).

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena mínima cominada ao delito é de detenção, de 1 (um) ano. Constitui-se, portanto, em crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo, se presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 da Lei 9.099/1995.

Figuras equiparadas (art. 266, § 1º): O dispositivo foi criado pela Lei 12.737/2012,5 conhecida como Lei Carolina Dieckmann, com a finalidade de tutelar meios modernos de comunicação, não se limitando aos serviços telefônico e radiotelegráfico, e ao esquecido serviço telegráfico.

Serviço telemático: é a transmissão de dados mediante a união entre recursos das telecomunicações (telefonia, cabo, fibras óticas etc.) e da informática (computadores, softwares, sistemas de redes etc.), e tem como principal exemplo a rede mundial de computadores, também conhecida como internet. Sua grande vantagem é proporcionar o processamento, o armazenamento e a comunicação de elevada quantidade de dados, em formatos de textos, imagens e sons, em pequeno intervalo temporal, entre usuários localizados em qualquer ponto do planeta. Ao utilizar a expressão “serviço de informação de utilidade pública”, o legislador socorreu-se da interpretação analógica (ou intra legem), com a finalidade de proteger qualquer outro meio diverso dos serviços telegráfico, radiotelegráfico, telefônico ou telemático, a exemplo dos jornais e revistas impressos. Portanto, também comete o delito previsto no art. 266 do Código Penal aquele que interromper (romper a continuidade ou fazer cessar) serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede (obstrui) ou dificulta-lhe (onera ou torna mais árdua) o restabelecimento. É o que se dá, a título ilustrativo, quando alguém dolosamente “derruba” o serviço de internet em determinada cidade, privando as pessoas desse meio de comunicação e de acesso ao conhecimento e informações em geral.

Causa de aumento da pena (art. 266, § 2º): O tratamento mais rigoroso se fundamenta na maior reprovabilidade da conduta, praticada no período em que a sociedade se encontra diante de desgraça pública, em geral surgida repentinamente e apta a causar graves prejuízos de todas as ordens.

Instalação clandestina de aparelhos de telecomunicação: A instalação ou utilização de aparelhos clandestinos de telecomunicações configura, em tese, o crime tipificado pelo art. 70 da Lei 4.117/1962 – Código Brasileiro de Telecomunicações.

Capítulo III
DOS CRIMES CONTRA A SAÚDE PÚBLICA

Introdução: A nota marcante dos crimes previstos neste capítulo é o dano ou perigo de dano à saúde de um número indeterminado de pessoas. Não há ataque à integridade corporal de uma única pessoa; o bem jurídico penalmente tutelado é a saúde pública, compreendida como a preservação das condições saudáveis de subsistência e desenvolvimento da coletividade como um todo. Todas as pessoas têm direito ao ar puro, aos alimentos íntegros, à água potável e aos medicamentos eficazes. Se alguém ofende individualmente algum desses direitos, estará caracterizado um crime contra a pessoa. Mas, se tais direitos são coletivamente atacados, abre-se espaço para a incidência dos crimes contra a saúde pública.

Epidemia

Art. 267. Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos:

Pena – reclusão, de dez a quinze anos.

§ 1º Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.

§ 2º No caso de culpa, a pena é de detenção, de um a dois anos, ou, se resulta morte, de dois a quatro anos.

Classificação:

Crime comum

Crime material ou causal

Crime de perigo comum e concreto

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: germe patogênico.

Elemento subjetivo: dolo. Admite modalidade culposa somente no § 2.º.

A moléstia deve ser grave e de fácil propagação (perigo real à coletividade).

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É o germe patogênico, compreendido como o micro-organismo capaz de produzir moléstia infectocontagiosa, nociva à saúde humana.

Núcleo do tipo: É “causar”, no sentido de produzir ou dar origem. A conduta, portanto, consiste em dar origem à epidemia, mediante a propagação de tais micro-organismos. A propagação, ou seja, a proliferação ou disseminação, pode ser efetuada direta ou indiretamente. Epidemia é a doença contagiosa que surge rapidamente em um local e atinge simultaneamente um grande número de pessoas. Endemia é a doença infecciosa que, em face das características do ambiente, manifesta-se em determinada região. É o caso da dengue, frequente nas regiões tropicais. Pandemia é a epidemia que se alastra de forma desproporcional e simultaneamente em várias regiões, difundindo-se por diversos países ou até mesmo por vários continentes, provocando inúmeros óbitos, a exemplo da tuberculose, da peste e da gripe espanhola.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral. Pode ser cometido por qualquer pessoa, inclusive por quem esteja contaminado pela moléstia infecciosa.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa encontra-se descrita no § 2º do art. 267 do Código Penal.

Transmissão de doenças a pessoa determinada e dolo de dano: Se o propósito do agente consistir na transmissão a alguém da doença grave de que está contaminado, será forçoso reconhecer o delito de perigo de contágio de moléstia grave, nos termos do art. 131 do CP. Além disso, se o sujeito possuir o dolo de matar ou de ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem, a ele será imputado o crime de homicídio qualificado pelo meio de que possa resultar perigo comum (CP, art. 121, § 2º, inc. III) ou de lesão corporal (CP, art. 129), consumado ou tentado, conforme o caso.

Consumação: Cuida-se de crime material ou causal, e de perigo comum e concreto: consuma-se com a produção do resultado naturalístico, ou seja, com a superveniência da epidemia. Exige-se a comprovação do risco efetivo à saúde de pessoas indeterminadas, sendo imprescindível, portanto, seja a moléstia grave e de fácil propagação, pois caso contrário não existiria perigo real à coletividade. Vale destacar que, depois da consumação do delito, é possível a coexistência do dano (pessoas infectadas) com a situação de perigo (pessoas expostas aos germes patogênicos).

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Em face da pena cominada – reclusão, de dez a quinze anos –, a epidemia constitui-se em crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios contidos nesta lei.

Causa de aumento da pena (art. 267, § 1º): Se da causação da epidemia resultar a morte de alguém, a pena será aplicada em dobro. Cuida-se de crime preterdoloso: a conduta inicial (epidemia) é dolosa, ao passo que o resultado agravador (morte) sobrevém a título de culpa. A epidemia agravada pela morte é crime hediondo, a teor do art. 1º, inc. VII, da Lei 8.072/1990. Cuidado: a epidemia somente é crime hediondo quando resulta a morte. Em sua modalidade fundamental (CP, art. 267, caput), o delito não suporta os efeitos da Lei 8.072/1990.

Epidemia culposa (art. 267, § 2º): Na primeira hipótese deste parágrafo (sem morte), a epidemia culposa é infração penal de menor potencial ofensivo, compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995; na segunda modalidade (com morte), constitui-se em crime de elevado potencial ofensivo, insuscetível da incidência dos benefícios contidos na Lei 9.099/1995. A propagação dos germes patogênicos surge em razão da imprudência, negligência ou imperícia do sujeito ativo, que assim viola o dever objetivo de cuidado a todos imposto.

Infração de medida sanitária preventiva

Art. 268. Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:

Pena – detenção, de um mês a um ano, e multa.

Parágrafo único. A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: determinação do poder público (lei penal em branco, homogênea ou heterogênea). A lei só se preocupa com as doenças contagiosas que atingem os seres humanos.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a determinação do poder público. O “poder público” que baixa a determinação pode ser qualquer autoridade (federal, estadual, distrital ou municipal) competente para o ato, a qual deve constar do rol de suas atribuições legais.6 Cuida-se, portanto, de lei penal em branco, pois seu preceito primário depende de complementação, a qual pode ser veiculada por outra lei (lei penal em branco homogênea ou lato sensu) ou por algum ato administrativo (lei penal em branco heterogênea ou stricto sensu).

Núcleo do tipo: É “infringir”, no sentido de violar, transgredir, desrespeitar determinação do poder público, destinada a impedir a introdução (ingresso ou entrada) ou propagação (disseminação ou difusão) da doença contagiosa, compreendida como toda moléstia capaz de ser transmitida de uma pessoa a outra mediante contato direto ou indireto.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral. Pode ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a violação da determinação do poder público, pouco importando venha a doença contagiosa a ser efetivamente introduzida ou propagada. É também crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume de forma absoluta o risco causado à saúde pública com a prática da conduta criminosa.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena máxima cominada ao delito é de um ano. Trata-se, portanto, de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo.

Causa de aumento da pena (art. 268, parágrafo único): O delito de infração de medida sanitária preventiva, quando praticado por funcionário da saúde pública, médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro, terá a pena aumentada de um terço. Tais pessoas, em razão do cargo público ocupado ou da função exercida, têm o dever de evitar a introdução ou propagação de doença contagiosa. Se não bastasse, são dotadas de conhecimentos técnicos para avaliar a gravidade de seus comportamentos.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): O art. 285 do Código Penal determina a incidência das regras contidas no art. 258 ao crime de infração de medida sanitária preventiva. Destarte, se da conduta resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. São causas de aumento da pena, nada obstante o legislador tenha utilizado a expressão “formas qualificadas pelo resultado”.

Omissão de notificação de doença

Art. 269. Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Classificação:

Crime próprio

Crime de mera conduta ou de simples atividade

Crime de perigo comum e abstrato Crime de forma vinculada

Crime vago

Crime instantâneo

Crime omissivo próprio ou puro

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime unissubsistente

Informações rápidas:

Objeto material: notificação compulsória.

Crime omissivo próprio ou puro. Lei penal em branco homogênea (ex. CC)

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: não admite (crime unissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a notificação compulsória, ou seja, a comunicação de cunho obrigatório.

Núcleo do tipo: É “deixar” de denunciar, no sentido de não comunicar, permitindo que determinada situação denunciável permaneça desconhecida. A omissão diz respeito ao dever do médico de comunicar à autoridade pública doença cuja notificação seja compulsória. Constitui-se, portanto, em crime omissivo próprio ou puro, uma vez que a omissão está descrita expressamente no tipo penal.

Doenças de notificação compulsória: Este artigo constitui-se em lei penal em branco, pois seu preceito primário é incompleto, dependendo de complementação emanada de outras leis e de atos da Administração Pública.

Autoridade pública: Relaciona-se com as autoridades sanitárias, a exemplo do Ministério da Saúde, no âmbito da União, e da Vigilância Sanitária, no campo dos municípios.

Sujeito ativo: Somente pode ser cometido pelo médico (crime próprio ou especial). É cabível o concurso de pessoas que concorrem para o ato do profissional de medicina, como o farmacêutico e a enfermeira.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Consuma-se com a omissão do médico em denunciar à autoridade pública doença de notificação compulsória (crime de mera conduta ou de simples atividade). Além disso, a lei presume o risco à saúde de um número indeterminado de pessoas (crime de perigo comum e abstrato).

Tentativa: Não é cabível, pois a conduta se exterioriza em um único ato, necessário e suficiente para a consumação (crime unissubsistente), como decorrência da natureza do delito como omissivo próprio ou puro.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal. A pena máxima cominada, de dois anos, autoriza a transação penal e o rito sumaríssimo, em sintonia com as disposições desta lei.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): O art. 285 do Código Penal determina a incidência das regras contidas em seu art. 258 ao crime de omissão de notificação de doença. Logo, se da conduta resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Ver comentários ao art. 285.

Confronto entre omissão de notificação de doença e violação do segredo profissional: O crime de violação do segredo profissional está previsto no art. 154 do CP. O médico que comunica a notificação de doença, atendendo ao comando normativo do art. 269 do Código Penal, não comete o delito de violação do segredo profissional, sob pena de incoerência do sistema jurídico-penal. Na verdade, os arts. 154 e 269 do Código Penal se complementam. Com efeito, somente se verifica o crime de violação do segredo profissional quando a revelação é efetuada sem justa causa (elemento normativo do tipo). E na comunicação de doença de notificação compulsória o médico atua no estrito cumprimento do dever legal que lhe é imposto, afastando-se a tipicidade do delito contido no art. 154 do Código Penal, pois presente a justa causa.

Envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal

Art. 270. Envenenar água potável, de uso comum ou particular, ou substância alimentícia ou medicinal destinada a consumo:

Pena – reclusão, de dez a quinze anos.

§ 1º Está sujeito à mesma pena quem entrega a consumo ou tem em depósito, para o fim de ser distribuída, a água ou a substância envenenada.

Modalidade culposa

§ 2º Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: água potável ou a substância alimentícia ou medicinal destinada a consumo.

Elemento subjetivo: dolo. Só admite modalidade culposa na hipótese do § 2.º.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Introdução: A pena cominada ao delito de envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal – reclusão, de dez a quinze anos – foi atribuída pela Lei 8.072/1990 – Lei dos Crimes Hediondos. Aliás, na redação original desta lei o delito em apreço estava previsto entre os crimes de natureza hedionda. No entanto, com a edição da Lei 8.930/1994, responsável por diversas modificações na Lei 8.072/1990, o delito tipificado neste artigo foi retirado do rol taxativo dos crimes hediondos, situação mantida nos dias atuais. O crime de envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal é compatível com a prisão temporária, como se infere da leitura do art. 1º, inc. III, j, da Lei 7.960/1989.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a água potável ou a substância alimentícia ou medicinal destinada a consumo. Água potável é aquela que não apresenta risco à saúde humana, razão pela qual é utilizável como bebida ou no preparo de alimentos. Não precisa ser quimicamente pura. Pode ser de uso comum ou particular, não exigindo o Código seja destinada ao consumo. Substância alimentícia é a matéria líquida ou sólida destinada à alimentação dos seres vivos. Substância medicinal é a matéria líquida ou sólida que serve de remédio visando a cura ou a prevenção de algum mal que acomete os seres vivos.

Núcleo do tipo: É “envenenar”, ou seja, ministrar veneno, intoxicar.

Sujeito ativo: Pode ser cometido por qualquer pessoa (crime comum ou geral), inclusive pelo proprietário da água potável de uso particular, ou da substância alimentícia ou medicinal destinada ao consumo.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa é admitida no § 2º.

Envenenamento dirigido a pessoa determinada e ânimo homicida: No crime de envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal, o dolo do agente limita-se a colocar em perigo a saúde pública. Destarte, se o sujeito, exemplificativamente, envenena água potável com a intenção de provocar a morte de pessoa determinada, obtendo êxito em seu intento, a ele será imputado o crime de homicídio qualificado pelo emprego de veneno (CP, art. 121, § 2º, inc. III).

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com o envenenamento da água potável, de uso comum ou particular, ou da substância alimentícia ou medicinal destinada a consumo, prescindindo-se da causação de dano a alguém e até mesmo da ingestão da água ou da substância alimentícia ou medicinal. É também delito de perigo comum e abstrato, pois a lei presume, de forma absoluta, a situação de risco a pessoas indeterminadas como consequência da conduta legalmente descrita.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Em face da pena cominada – reclusão, de dez a quinze anos –, o envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal constitui-se em crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios elencados por esta lei. A modalidade culposa, prevista no § 2º, é infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e o rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995.

Figura equiparada (art. 270, § 1º): Aqui os núcleos do tipo são “entregar a consumo” e “ter em depósito”. Aquele tem o sentido de passar algo à posse de alguém para ser ingerido; este, por sua vez, significa manter alguma coisa acondicionada em determinado local. A figura equiparada é reservada a terceira pessoa, diversa da responsável pelo envenenamento, que pratica fato posterior consistente em entregar a consumo a água ou então a substância alimentícia ou medicinal já envenenadas, ou então as mantém em depósito para distribuição futura (elemento subjetivo específico) a pessoas indeterminadas. A pessoa que efetuou o envenenamento não pode ser responsabilizada pela figura equiparada, mas somente pela modalidade fundamental, prevista no art. 270, caput, do Código Penal, ainda que venha a entregar a consumo ou ter em depósito, para o fim de ser distribuída, a água ou a substância envenenada. Nessa hipótese, a conduta ulterior funciona como mero desdobramento do fato principal, restando por este absorvida. O conflito aparente de leis penais é solucionado pelo princípio da consunção.

Modalidade culposa (§ 2º): Nessa hipótese, o perigo à saúde pública como corolário do envenenamento de água potável, de uso comum ou particular, ou de substância alimentícia ou medicinal, destinada ao consumo, é provocado em razão da imprudência, negligência ou imperícia do agente.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285): Se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. São hipóteses de crimes preterdolosos, pois o resultado agravador (lesão corporal grave ou morte) há de ser produzido a título de culpa. Por sua vez, no caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e, se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. Cuida-se de crime culposo agravado por resultados de igual natureza. Ver comentários ao art. 285.

Jurisprudência selecionada:

Bem jurídico e ação penal: “O objeto jurídico tutelado pelo tipo penal inscrito no art. 270 do Código Penal é a incolumidade pública, não importando o fato de as águas serem de uso comum ou particular, bastando que sejam destinadas ao consumo de indeterminado número de pessoas. No caso dos autos, apesar de se tratar de poço situado em propriedade particular, verifica-se que o consumo da sua água era destinado a todos os que a ele tinham acesso, de modo que eventual envenenamento dessa água configuraria, em tese, o crime do art. 270 do Código Penal, cuja ação penal é pública incondicionada, nos termos do art. 100 do Código Penal” (STJ: HC 55.504/PI, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 11.12.2007).

Corrupção ou poluição de água potável

Art. 271. Corromper ou poluir água potável, de uso comum ou particular, tornando-a imprópria para consumo ou nociva à saúde:

Pena – reclusão, de dois a cinco anos.

Modalidade culposa

Parágrafo único. Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de dois meses a um ano.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: água potável, de uso comum ou particular.

Tipo penal misto cumulativo e alternativo.

Elemento subjetivo: dolo. Só admite modalidade culposa na hipótese do parágrafo único.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Não revogação pelo art. 54, § 2.º, inc. III, da Lei 9.605/1998.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a água potável, de uso comum ou particular.

Núcleos do tipo: “Corromper” e “poluir”. Corromper a água é modificar sua essência ou composição, tornando-a nociva à saúde ou intolerável pelo mau sabor ou odor; poluir a água é sujá-la, transformando-a em líquido impróprio para consumo pelo ser humano. Não basta, portanto, o simples ato de corromper ou poluir água potável. É imprescindível torná-la imprópria para consumo ou nociva à saúde de pessoas indeterminadas. Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: há um único crime na situação em que o agente corrompe e polui a mesma água potável.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral. Pode ser cometido por qualquer pessoa, inclusive pelo proprietário da água potável.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa encontra-se prevista no parágrafo único.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se no instante em que a água potável, de uso comum ou particular, é corrompida ou poluída, de modo a torná-la imprópria para consumo ou nociva à saúde, independentemente de ser consumida por alguém ou da efetiva causação de dano à saúde pública. É também crime de perigo comum e abstrato, uma vez que a lei presume, de forma absoluta, a situação de risco a pessoas indeterminadas.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Em face da pena cominada – reclusão, de dois a cinco anos –, a corrupção ou poluição de água potável constitui-se em crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios elencados por esta lei. Em sua modalidade culposa, trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo, nos termos da Lei 9.099/1995.

Modalidade culposa (art. 271, parágrafo único): O agente dá causa à corrupção ou poluição da água potável em razão da sua imprudência, negligência ou imperícia, violando o dever objetivo de cuidado a todos imposto.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Por sua vez, no caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e, se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. Ver comentários ao art. 285.

Lei dos Crimes Ambientais: Se a poluição hídrica tornar necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade, estará caracterizado o crime tipificado no art. 54, § 2º, inc. III, da Lei 9.605/1998 – Crimes Ambientais, cuja pena é de reclusão, de um a cinco anos. Esse crime não revogou o delito de corrupção ou poluição de água potável, pois sua redação típica contém elementos especializantes: pressupõe a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade. O conflito aparente de leis penais é solucionado pelo princípio da especialidade.

Envenenamento de água potável e corrupção ou poluição de água potável – distinção: Ambos os delitos têm como objeto material a água potável, de uso comum ou particular. Nos dois casos, a água inicialmente potável torna-se imprópria ao consumo ou nociva à saúde. Entretanto, no art. 270, o núcleo do tipo é “envenenar”, ao passo que no art. 271 as condutas típicas são “corromper” e “poluir”. No primeiro delito o perigo à saúde pública é sensivelmente maior, pois o envenenamento de água potável é idôneo a produzir danos mais graves e mais amplos à coletividade do que a corrupção ou poluição. Este é o fundamento da opção legislativa em punir com reclusão, de dez a quinze anos, o envenenamento de água potável, reservando a pena também de reclusão, mas de dois a cinco anos, à corrupção ou poluição.

Jurisprudência selecionada:

Art. 54 da Lei dos Crimes Ambientais – revogação: “O tipo penal, posterior, específico e mais brando, do art. 54 da Lei nº 9.605/1998, engloba completamente a conduta tipificada no art. 271 do Código Penal, provocando a ab-rogação do delito de corrupção ou poluição de água potável. Para a caracterização do tipo citado, mister a ocorrência de efetiva lesão ou perigo de dano, concreto, real e presente, à saúde humana, à flora ou à fauna. Mostra-se inepta a denúncia que carece de comprovação da possibilidade de danos à saúde humana pelo suposto fato de a paciente ter deixado, em data específica, que seu rebanho bebesse em dique que abastece cidade, pela ausência de conclusão técnica sobre a salubridade da água” (STJ: HC 178.423/GO, rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, j. 19.12.2011).

Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios

Art. 272. Corromper, adulterar, falsificar ou alterar substância ou produto alimentício destinado a consumo, tornando-o nociva à saúde ou reduzindo-lhe o valor nutritivo:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

§ 1º-A. Incorre nas penas deste artigo quem fabrica, vende, expõe à venda, importa, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo a substância alimentícia ou o produto falsificado, corrompido ou adulterado.

§ 1º Está sujeito às mesmas penas quem pratica as ações previstas neste artigo em relação a bebidas, com ou sem teor alcoólico.

Modalidade culposa

§ 2º Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e concreto

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: substância ou produto alimentício destinado a consumo (no § 1.º-A é a substância alimentícia ou produto falsificado, corrompido ou adulterado).

É imprescindível acarrete a conduta em nocividade à saúde ou redução do valor nutritivo.

Elemento subjetivo: dolo. Admite modalidade culposa somente no § 2.º.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Introdução: Com o advento da Lei 9.677/1998, várias mudanças foram promovidas na redação original do art. 272 do Código Penal. Os pontos mais interessantes residem na adição da expressão “ou reduzindo-lhe o valor nutritivo”, no caput, bem como na elevação da pena cominada às modalidades dolosas do crime (reclusão, de quatro a oito anos, e multa). Em razão disso, diversas vozes sustentam a inconstitucionalidade da sanção penal, por violação ao princípio da proporcionalidade, em sua face de proibição do excesso, e também do princípio da isonomia, pois situações diversas (como a falsificação do produto alimentício destinado a consumo, tornando-o nocivo à saúde, e a redução de seu valor nutritivo, sendo a primeira conduta muito mais grave) estariam recebendo idêntico tratamento penal.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a substância ou produto alimentício destinado a consumo, ou seja, a matéria líquida (exemplos: bebidas em geral, alcoólicas ou não) ou sólida (exemplos: chocolates, cereais etc.) destinada à alimentação de pessoas indeterminadas.

Núcleos do tipo: No caput, há quatro núcleos: “corromper”, “adulterar”, “falsificar” e “alterar”. Corromper é desnaturar algo, estragando-o; adulterar é deturpar, alterar alguma coisa, piorando-a; falsificar, por seu turno, equivale a alterar a verdade, dar a aparência de verdadeira a alguma coisa de qualidade inferior; e, finalmente, alterar tem o sentido de modificar ou transformar. Todas as condutas são praticadas em relação a substância ou produto alimentício destinado a consumo por um número indeterminado de pessoas. Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: há diversos núcleos, e a prática de mais de um deles no tocante ao mesmo objeto material caracteriza um único delito. Entretanto, não basta a corrupção, adulteração, falsificação ou alteração do objeto material. É imprescindível acarrete a conduta nocividade à saúde (caráter prejudicial ao ser humano em suas funções orgânicas, físicas ou mentais) ou redução do valor nutritivo (qualidade para alimentar as pessoas em geral) da substância ou produto alimentício destinado a consumo, circunstâncias a serem provadas em exame pericial realizado com essa finalidade.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral. Pode ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer modalidade específica. A modalidade culposa encontra-se prevista no § 2º.

Consumação: Em todas as suas modalidades, o delito é formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado, consumando-se com a prática das condutas legalmente descritas, independentemente do efetivo prejuízo à saúde pública. É crime de perigo comum e concreto, pois exige a demonstração da nocividade do produto à saúde de pessoas indeterminadas, ou então a diminuição do seu valor nutritivo. Vale destacar, entretanto, a existência de entendimentos no sentido de constituir-se em crime de perigo abstrato, sob o argumento de que, com a prática da conduta legalmente descrita, presume-se a situação de perigo a um elevado número de pessoas.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Competência: Será competente para processo e julgamento do delito o local em que se concretizar a nocividade do produto ou a redução do seu valor nutritivo, nos termos do art. 70, caput, 1ª parte, CPP.

Lei 9.099/1995: Em face da pena cominada – reclusão, de quatro a oito anos, e multa –, a falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância ou produto alimentícios é crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios contidos nesta lei. Em sua modalidade culposa, trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo, em sintonia com a Lei 9.099/1995.

Figuras equiparadas (art. 272, § 1º-A):

Sujeito ativo: Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo do delito (crime comum ou geral), com exceção do envolvido nas condutas descritas no caput do art. 272 do Código Penal. De fato, aquele que corrompeu, adulterou, falsificou ou alterou o produto ou substância alimentícia, e posteriormente realizou algum dos comportamentos previstos no § 1º-A, deve ser responsabilizado unicamente pelo crime previsto no art. 272, caput, do Código Penal.

Núcleos do tipo: Fabricar é manufaturar, preparar ou construir; vender equivale a alienar ou ceder por determinado preço; expor à venda é exibir com a intenção de alienar mediante determinada contraprestação; importar é fazer ingressar no País produto oriundo do estrangeiro; ter em depósito para vender significa manter acondicionado em algum lugar visando posterior alienação; distribuir é dar, entregar, repartir; e, finalmente, entregar a consumo tem o sentido de passar algo à posse de alguém para ser ingerido.

Objeto material: É a substância alimentícia ou produto falsificado, corrompido ou adulterado.

Elemento subjetivo: É o dolo, sem qualquer finalidade específica, exceto na conduta de “ter em depósito para venda”, na qual o propósito de transmissão onerosa da propriedade representa o especial fim de agir buscado pelo agente. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação e tentativa: No geral, as figuras equiparadas constituem-se em crimes instantâneos, salvo nas variantes “expor à venda” e “ter em depósito para venda”, em que se notam crimes permanentes, pois a consumação se prolonga no tempo, por vontade do agente. A tentativa é possível, em razão do caráter plurissubsistente do delito.

Modalidade culposa (art. 272, parágrafo único): A figura culposa incide sobre a modalidade fundamental (CP, art. 272, caput) e também sobre as modalidades equiparadas (CP, art. 272, § 1º) do delito. O sujeito pratica qualquer das condutas legalmente incriminadas agindo com imprudência, negligência ou imperícia, produzindo resultado involuntário, mas objetivamente previsível.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Por sua vez, no caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e, se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. Cuida-se de crime culposo agravado por resultados de igual natureza. Ver comentários ao art. 285.

Jurisprudência selecionada:

Consumação e competência: “Crimes contra a saúde pública – que se encontram tipificadas no art. 272 do CP na redação anterior à Lei nº 9.677/98, as quais se consumam no momento em que a substância se torna nociva à saúde. Ou seja, já no momento da fabricação e comercialização a competência se encontrava definida” (STJ, CC 34540/ SP, rel. Min. Felix Fischer, 3ª Seção, j. 26.06.2002).

Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais

Art. 273. Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais:

Pena – reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.

§ 1º-A. Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico.

§ 1º-B. Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições:

I – sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente;

II – em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior;

III – sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização;

IV – com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade;

V – de procedência ignorada;

VI – adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente.

Modalidade culposa

§ 2º Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Informações rápidas:

Objeto material: produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Lei penal explicativa: § 1.º-A.

Inclusão dos cosméticos e saneantes: violação ao princípio da proporcionalidade.

Elemento subjetivo: dolo. Admite modalidade culposa somente no § 2.º.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada. Incompatibilidade do crime com o

Princípio da insignificância (saúde pública).

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É o produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, ou seja, a substância líquida ou sólida voltada à atenuação da dor ou à cura dos enfermos, ou ainda a matéria destinada à prevenção dos males que acometem os seres humanos.

Substâncias alcançadas pelo tipo penal (art. 273, § 1º-A): O § 1º-A deste artigo, classificado como lei penal explicativa, ampliou o rol das substâncias alcançadas pelo tipo penal. Medicamentos são os produtos destinados ao tratamento de uma doença ou ao controle dos seus efeitos. Matérias-primas são as substâncias brutas essenciais para o fabrico de produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais. Por sua vez, o art. 4º, inc. III, da Lei 5.991/1973 conceitua o insumo farmacêutico como a “droga ou matéria-prima aditiva ou complementar de qualquer natureza, destinada a emprego em medicamentos, quando for o caso, e seus recipientes”. Cosméticos, de acordo com a definição contida no art. 3º, inc. V, da Lei 6.360/1976, são os “produtos para uso externo, destinados à proteção ou ao embelezamento das diferentes partes do corpo, tais como pós faciais, talcos, cremes de beleza, creme para as mãos e similares, máscaras faciais, loções de beleza, soluções leitosas, cremosas e adstringentes, loções para as mãos, bases de maquilagem e óleos cosméticos, ruges, blushes, batons, lápis labiais, preparados antissolares, bronzeadores e simulatórios, rímeis, sombras, delineadores, tinturas capilares, agentes clareadores de cabelos, preparados para ondular e para alisar cabelos, fixadores de cabelos, laquês, brilhantinas e similares, loções capilares, depilatórios e epilatórios, preparados para unhas e outros”. Por sua vez, saneantes são os produtos voltados à higienização e limpeza de locais, visando assegurar as condições sanitárias necessárias à qualidade de vida das pessoas em geral. Finalmente, produtos de uso em diagnóstico são os utilizados para conhecimento ou determinação de doenças.

Cosméticos e saneantes e princípio da proporcionalidade: Critica-se a opção adotada pela Lei 9.677/1998, responsável pela equiparação dos cosméticos e saneantes aos medicamentos. O legislador, assim agindo, incorreu em grave erro, afrontando o princípio da proporcionalidade, pois colocou em igual patamar produtos incapazes de ofender a saúde pública com a mesma intensidade. A situação se agrava ao recordarmos que o delito previsto no art. 273, § 1º-A, do Código Penal é crime hediondo, a teor da regra contida no art. 1º, inc. VII-B, da Lei 8.072/1990.

Núcleos do tipo: São quatro núcleos: “falsificar”, “corromper”, “adulterar” e “alterar”. Ver comentários aos núcleos do tipo do art. 272.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral, podendo ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A modalidade culposa encontra-se prevista no § 2º.

Consumação: Trata-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a prática de qualquer das condutas legalmente descritas, pouco importando se sobrevém ou não prejuízo a alguém. É também crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume, de forma absoluta, o risco criado a pessoas indeterminadas em razão do comportamento ilícito.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Competência: Em regra, é da Justiça Estadual. Entretanto, será competente a Justiça Federal se caracterizada a procedência internacional do medicamento.

Lei 9.099/1995: Em face da pena cominada, a falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais constitui-se em crime de elevado potencial ofensivo, incompatível com os benefícios previstos nesta lei. O crime culposo é compatível com a suspensão condicional do processo, se presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 da Lei 9.099/1995 (crime de médio potencial ofensivo).

Figura equiparada do art. 273, § 1º: O objeto material é o produto já falsificado, corrompido, adulterado ou alterado. Por sua vez, os núcleos do tipo derivado são idênticos aos contidos no § 1º-A do artigo anterior. Para a análise, ver comentários aos núcleos do tipo das figuras equiparadas do art. 272, § 1º-A.

Figura equiparada do art. 273, § 1º-B: O legislador trouxe para a seara penal condutas de natureza administrativa, em face do elevado risco proporcionado à saúde pública. É de se ressaltar que a incriminação de tais condutas não obsta a responsabilização simultânea do infrator no âmbito administrativo. São elas: I – sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente; II – em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior; III – sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização; IV – com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade; V – de procedência ignorada; VI – adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente.

Modalidade culposa (art. 273, § 2º): Responde pelo delito, em sua forma culposa, a pessoa que de modo negligente, imprudente ou imperito, em inobservância do dever geral de cuidado objetivo, e sendo previsível o resultado, realiza qualquer das condutas previstas no caput, colocando em perigo a saúde pública.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. No caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e, se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. Ver comentários ao art. 285.

Lei dos Crimes Hediondos: A Lei 9.695/1998 incluiu o inc. VII-B no art. 1º da Lei 8.072/1990, para o fim de definir como hediondos os crimes tipificados nos 273, caput, §§ 1º, 1º-A e 1º-B, do Código Penal, com todas as consequências gravosas daí decorrentes. Logo, somente a modalidade culposa do crime de falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, definida no art. 273, § 2º, do Código Penal, não possui a nota da hediondez.

Princípio da insignificância: O crime tipificado no caput, em qualquer das suas modalidades, é incompatível com o princípio da insignificância, mesmo nas hipóteses de pequeno valor da venda do produto terapêutico ou medicinal falsificado, corrompido, adulterado ou alterado, pois o bem jurídico penalmente tutelado é a saúde pública, a qual jamais pode ser considerada ínfima, independentemente da amplitude da lesão patrimonial.

Jurisprudência selecionada:

Competência: “Esta Corte vem decidindo que a competência para processar e julgar o crime previsto no art. 273 do Código Penal é, em regra, da Justiça estadual, somente existindo interesse da União se houver indícios da internacionalidade do delito. Hipótese em que se investiga a apreensão em poder do investigado, para fins de venda em seu estabelecimento comercial, de produto sem registro no órgão de vigilância sanitária, inexistindo indícios de que o produto foi adquirido fora do território nacional. A presunção de que ele tinha conhecimento da procedência estrangeira da mercadoria não serve para alterar a competência” (CC 110.497/SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 3ª Seção, j. 23.03.2011).

Importação de anabolizantes sem registro na ANVISA – Competência: “A Justiça Federal é a competente para conhecer e julgar o crime previsto no art. 273, § 1º-B, I, do CP – importação e posse de medicamento sem registro no órgão competente – desde que caracterizada a internacionalização da conduta. In casu, o paciente foi preso em flagrante, durante uma fiscalização da Receita Federal, quando trazia consigo anabolizantes sem o devido registro da Anvisa, em um ônibus procedente da cidade de Foz do Iguaçu. Segundo confessado pelo paciente, ele seria o responsável pela aquisição dos medicamentos no Paraguai e por seu ingresso no território nacional. Na linha de precedentes desta Corte, a competência para processo e julgamento de crimes contra a saúde pública, em regra, é concorrente aos entes da Federação. Entretanto, se constatada a lesão a bens, interesses e serviços da União, verificada na internacionalidade da conduta criminosa, firma-se a competência da Justiça Federal” (STJ: CC 119.594/ PR, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora convocada do TJ-PE), 3ª Seção, j. 12.09.2012, noticiado no Informativo 304).

Princípio da insignificância: “O princípio da insignificância, como derivação necessária do princípio da intervenção mínima do direito penal, busca afastar desta seara as condutas que, embora típicas, não produzam efetiva lesão ao bem jurídico protegido pela norma penal incriminadora. Trata-se, na espécie, de crime em que o bem jurídico tutelado é a saúde pública. Irrelevante considerar o valor da venda do medicamento para desqualificar a conduta” (RHC 17.942/SP, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, 6ª Turma, j. 08.11.2005).

Punição administrativa e punição penal – possibilidade: “O art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal, tipifica a ação de vender, expor à venda ou ter em depósito para fins de comércio, distribuir ou entregar a consumo produto sem registro, quando este é exigível, no órgão de vigilância sanitária. Não há óbice legal à punição de uma conduta na esfera administrativa e na esfera penal, se houver sua previsão como infração à legislação sanitária federal, assim como sua tipificação no Código Penal ou na legislação penal especial” (RHC 12.264/RS, rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, j. 10.12.2002).

Transnacionalidade do crime e Justiça Federal: “Hipótese que cuida da introdução, em território nacional, de medicamento produzido na Itália e provavelmente adquirido no Paraguai. Configurada que a produção do medicamento deu-se em território estrangeiro e existindo fortes indícios de que igualmente o foi sua aquisição, resta configurada a internacionalidade da conduta a justificar a atração da competência da Justiça Federal.” (CC 116.037/SP, rel. Min. Gilson Dipp, 3ª Seção, j. 09.11.2011).

Emprego de processo proibido ou de substância não permitida

Art. 274. Empregar, no fabrico de produto destinado a consumo, revestimento, gaseificação artificial, matéria corante, substância aromática, antisséptica, conservadora ou qualquer outra não expressamente permitida pela legislação sanitária:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: produto fabricado e destinado a consumo (qualquer tipo de produto).

Lei penal em branco homogênea (legislação sanitária).

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É o produto fabricado e destinado a consumo, compreendido como todo material produzido em razão da intervenção humana, resultante de qualquer processo ou atividade, para ser utilizado ou ingerido por um número indeterminado de pessoas. O fato de a lei referir-se ao “fabrico de produto destinado a consumo” autoriza a conclusão no sentido de que o objeto material não se restringe unicamente às substâncias alimentícias ou medicinais, podendo a conduta típica recair sobre qualquer tipo de produto destinado a consumo, a exemplo dos artigos de perfumaria ou de higiene pessoal, brinquedos, roupas e calçados.

Núcleo do tipo: É “empregar”, ou seja, utilizar ou aplicar alguma coisa. Nas lições de Damásio E. de Jesus: O fato se perfaz com a conduta de utilizar, no fabrico de produto destinado a consumo, revestimento (o invólucro que cobre o produto), gaseificação artificial ( processo utilizado na fabricação de refrigerantes ou de certas bebidas alcoólicas), matéria corante (substância utilizada para dar cor aos alimentos), substância aromática (substância empregada para conferir determinado aroma aos alimentos), substância antisséptica (substância utilizada para evitar a fermentação de alimentos), conservadora (substância que retarda ou impede a deterioração de alimentos) ou qualquer outra não expressamente permitida pela legislação sanitária (substâncias estabilizantes, acidulantes, flavorizantes etc.).”7 Na parte final do art. 274 do Código Penal, o legislador valeu-se da interpretação analógica contida na expressão “ou qualquer outra não expressamente permitida pela legislação sanitária”. Além disso, cuida-se de lei penal em branco homogênea, pois o preceito primário depende de complementação, a ser efetuada por outra lei (legislação sanitária).

Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se no momento em que o sujeito emprega, no fabrico de produto destinado a consumo, revestimento, gaseificação artificial, matéria corante, substância aromática, antisséptica, conservadora, ou qualquer outra não permitida expressamente pela legislação sanitária, pouco importando se sobrevém ou não dano a alguém. Constitui-se também em crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume, de forma absoluta, o perigo à saúde pública, ou seja, a situação de risco à saúde de pessoas indeterminadas.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena mínima cominada ao delito é de um ano. Cuida-se, portanto, de crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade se do fato resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima); se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Ver comentários ao art. 285.

Crime contra a economia popular: Se a conduta consistir na exposição à venda ou venda de mercadoria ou produto alimentício, cujo fabrico haja desatendido a determinações oficiais, quanto ao peso e composição, estará caracterizado o crime tipificado pelo art. 2º, inc. III, da Lei 1.521/1951 – Crimes contra a Economia Popular, punido com detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Invólucro ou recipiente com falsa indicação

Art. 275. Inculcar, em invólucro ou recipiente de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais, a existência de substância que não se encontra em seu conteúdo ou que nele existe em quantidade menor que a mencionada:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: invólucro ou recipiente de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objetivo jurídico: Protege-se a saúde pública.

Objeto material: É o invólucro ou recipiente de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais. Invólucro é tudo o que serve para envolver (exemplos: capas, rótulos, bulas, pacotes e eppendorfs). Recipiente é o receptáculo, ou seja, o objeto capaz de conter líquidos ou sólidos (exemplos: potes, sacos plásticos, latas e frascos). Produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais são as substâncias destinadas à nutrição do organismo (alimentícias), à atenuação da dor ou à cura dos enfermos (terapêuticas), ou ao tratamento de males ou doenças (medicinais). Como o tipo penal faz menção somente ao invólucro e ao recipiente, não são alcançados os boletins, os catálogos, os prospectos, as propagandas, os folhetos e os anúncios, entre outros. Consequentemente, se a conduta recair sobre tais objetos, não se caracterizará o delito em apreço, sem prejuízo da configuração do crime de fraude no comércio, definido no art. 175 do Código Penal.8

Núcleo do tipo: É “inculcar”, no sentido de imprimir, apregoar, demonstrar, dar a entender. É inerente ao tipo penal a declaração de informação falsa, afirmando a presença de alguma substância que, na realidade, não compõe o produto, ou nele exista em quantidade inferior à mencionada. O crime, portanto, é praticado com o emprego da fraude. A conduta deve implicar riscos à saúde de pessoas indeterminadas, pois está inserido entre os crimes contra a saúde pública, e o art. 278 contém o crime denominado “outras substâncias nocivas à saúde pública”, deixando claro que os crimes anteriores apresentam nocividade ao bem jurídico penalmente tutelado. Se assim não fosse, a incriminação seria ilegítima, pois representaria afronta ao princípio da lesividade (ou da ofensividade), um dos pilares do Direito Penal moderno.

Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Trata-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, prescindindo-se da lesão a alguém. É também de crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume, de forma absoluta, a exposição a risco da saúde de pessoas indeterminadas como consequência do comportamento criminoso.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena mínima cominada é de um ano. Constitui-se, portanto, em crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade, se do fato resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima); se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Ver comentários ao art. 285.

Art. 275 do Código Penal e art. 66 da Lei 8.078/1990 – distinção: Embora apresentem redações semelhantes, o crime definido no art. 275 do Código Penal não se confunde com o delito contido no art. 66 da Lei 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor, cuja redação é a seguinte: “Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços: Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa. § 1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta. § 2º Se o crime é culposo; Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.” É fácil perceber que, se a conduta recair sobre produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais, incidirá o art. 275 do Código Penal. Nas demais hipóteses, que inclusive admitem a modalidade culposa, terá lugar o art. 66 da Lei 8.078/1990. Portanto, o conflito aparente de leis penais é solucionado pelo princípio da especialidade.

Produto ou substância nas condições dos dois artigos anteriores

Art. 276. Vender, expor à venda, ter em depósito para vender ou, de qualquer forma, entregar a consumo produto nas condições dos arts. 274 e 275.

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime remetido (a definição típica se reporta aos arts. 274 e 275 do Código Penal);

Crime instantâneo (“vender” e “entregar a consumo”) ou permanente (“expor à venda” e “ter em depósito para vender”)

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: produto cf. arts. 274 e 275 do CP (crime remetido).

Elemento subjetivo: dolo (exceto na conduta “ter em depósito para vender”, em que exige a intenção de guardar o produto para aliená-lo por determinado preço). Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É o produto nas condições indicadas nos arts. 274 e 275.

Núcleos do tipo: O tipo penal contém quatro núcleos: “vender”, “expor à venda”, “ter em depósito para vender” e “entregar a consumo”. Vender é alienar ou ceder algo por preço certo, transferindo a propriedade de um bem em troca do recebimento de determinado valor. Expor à venda equivale a exibir um objeto com a intenção de vendê-lo. Ter em depósito para vender significa manter um bem acondicionado em algum local visando vendê-lo no futuro. Finalmente, entregar a consumo é transferir um bem a outrem para ser utilizado ou ingerido. Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: existem vários núcleos, e a prática de mais de um deles no tocante ao mesmo objeto material configura um único delito.

Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa, e não necessariamente os comerciantes (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica, salvo no tocante à conduta de “ter em depósito para vender”, na qual se exige a intenção de guardar o produto para aliená-lo por determinado preço. Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se no momento em que o sujeito vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, entrega a consumo produto nas condições dos arts. 274 e 275 do Código Penal, pouco importando se sobrevém ou não dano a alguém. É também crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume, de forma absoluta, a situação perigosa à saúde de pessoas indeterminadas como corolário da prática das condutas legalmente descritas. Vale destacar que nas modalidades “vender” e “entregar a consumo”, o art. 276 é crime instantâneo, consumando-se em momento determinado, sem continuidade no tempo; de outro lado, é crime permanente nas modalidades “expor à venda” e “ter em depósito para vender”, pois nesses casos a consumação se prolonga no tempo, por vontade do agente.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena mínima cominada é de um ano. Constitui-se, pois, em crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade se do fato resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima); se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Ver comentários ao art. 285.

Substância destinada à falsificação

Art. 277. Vender, expor à venda, ter em depósito ou ceder substância destinada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

Informações rápidas:

Objeto material: substância destinada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: não admite (incriminação autônoma dos atos preparatórios).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a substância destinada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais, ou seja, a matéria cuja finalidade é desvirtuar ou adulterar tais produtos, conferindo-lhes suposta aparência de autenticidade, de modo a colocar em perigo a saúde pública. Produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais são as substâncias destinadas à nutrição do organismo (alimentícias), à atenuação da dor ou à cura dos enfermos (terapêuticas), ou ao tratamento de males ou doenças (medicinais).

Núcleos do tipo: O tipo penal contém quatro núcleos: “vender”, “expor à venda”, “ter em depósito” e “ceder”. Cuida-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: a lei apresenta diversos núcleos, e a prática de mais de um deles no tocante ao mesmo objeto material caracteriza um único delito. Vender é alienar um bem por determinado preço. Expor à venda significa colocar um produto à mostra com a finalidade de vendê-lo. Ter em depósito equivale a manter algo acondicionado em determinado local. Ceder, finalmente, é transferir ou colocar um bem à disposição de terceira pessoa. Destarte, incide no tipo penal o sujeito que realiza qualquer das condutas típicas em relação à substância destinada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais. Visualiza-se, nesse contexto, a incriminação autônoma de comportamentos representativos de atos preparatórios dos delitos definidos nos arts. 272 e 273 do Código Penal. Trata-se, portanto, de crime obstáculo.

Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Como destaca Heleno Cláudio Fragoso: “É indispensável que o agente conheça a natureza da substância ou a destinação que lhe vai ser dada por quem a recebe ou adquire. Na modalidade de expor à venda ou ter em depósito será impossível afirmar a vontade criminosa nos casos de substâncias que podem ser destinadas a outros fins lícitos. O conhecimento do fim lícito pode ser evidenciado pela qualidade do comprador e pela atividade a que se dedica.”9 Não se admite a modalidade culposa.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a prática de qualquer das condutas criminosas, prescindindo-se da causação de dano a alguém. É também delito de perigo comum e abstrato, pois a lei presume, de forma absoluta, a exposição a perigo de pessoas indeterminadas como corolário do comportamento ilícito. Nos núcleos “vender” e “ceder” o crime é instantâneo, consumando-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo; por sua vez, nas modalidades “expor à venda” e “ter em depósito” o delito é permanente, pois a consumação se protrai no tempo, por vontade do agente.

Tentativa: Não se admite, pois o legislador incriminou de forma autônoma atos preparatórios dos delitos contidos nos arts. 272 e 273 do Código Penal.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena mínima cominada é de um ano. Constitui-se, portanto, em crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo, desde que presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 da Lei 9.099/1995.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade se do fato resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima); se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Ver comentários ao art. 285.

Outras substâncias nocivas à saúde pública

Art. 278. Fabricar, vender, expor à venda, ter em depósito para vender ou, de qualquer forma, entregar a consumo coisa ou substância nociva à saúde, ainda que não destinada à alimentação ou a fim medicinal:

Pena – detenção, de um a três anos, e multa.

Modalidade culposa

Parágrafo único. Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de dois meses a um ano.

Informações rápidas:

Objeto material: coisa ou substância nociva à saúde (exceto a de natureza alimentícia ou medicinal e drogas).

Elemento subjetivo: dolo (elemento subjetivo específico na modalidade “ter em depósito para vender”). Só admite modalidade culposa na hipótese do parágrafo único.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a coisa ou substância nociva à saúde, salvo a de natureza alimentícia ou medicinal, pois ambas são abrangidas pelos crimes definidos nos arts. 272 e 273 do Código Penal.

Drogas e princípio da especialidade: Se o objeto material consistir em droga, assim definida em lei ou em ato administrativo, substância igualmente nociva à saúde públi-ca, estará configurado o crime de tráfico de drogas, contido no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006 – Lei de Drogas. O conflito aparente de leis penais é solucionado pelo princípio da especialidade.

Núcleos do tipo: O tipo penal contém cinco núcleos: “fabricar, “vender”, “expor à venda”, “ter em depósito para vender” e “entregar a consumo”. Fabricar é manufaturar, preparar ou construir. Vender equivale a transferir a propriedade de um bem, alienando-se por determinado valor. Expor à venda tem o sentido de exibir um objeto com a intenção de vendê-lo. Ter em depósito para vender, por sua vez, significa manter um produto acondicionado em algum local, para posteriormente vendê-lo. Entregar a consumo, finalmente, é transmitir um bem à posse de terceiro, para ser ingerido ou utilizado. Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado: há vários núcleos, e a realização de mais de um deles, no tocante ao mesmo objeto material, acarreta a caracterização de um único delito.

Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica, salvo no tocante à modalidade “ter em depósito para vender”, no qual o propósito de venda representa o especial fim de agir buscado pelo agente (elemento subjetivo específico). A figura culposa é admitida pelo parágrafo único.

Consumação: O crime de outras substâncias nocivas à saúde é formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a prática de qualquer das condutas ilícitas, pouco importando se sobrevém a causação de dano a alguém. É também crime de perigo comum e concreto, reclamando a comprovação da nocividade da coisa ou substância à saúde de um número indeterminado de pessoas. Nos núcleos “fabricar”, “vender” e “entregar a consumo” o crime é instantâneo, pois se consuma em um momento determinado, qual seja, o da prática da conduta legalmente descrita; por sua vez, nas modalidades “expor à venda” e “ter em depósito para vender” o delito é permanente, uma vez que a consumação se prolonga no tempo, por vontade do agente.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena mínima cominada ao delito previsto no art. 278 do Código Penal é de um ano. Constitui-se, portanto, em crime de médio potencial ofensivo, afigurando-se cabível a suspensão condicional do processo, se presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 desta Lei. Na modalidade culposa, trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e o rito sumaríssimo, em consonância com as disposições da Lei 9.099/1995.

Modalidade culposa (art. 278, parágrafo único): O sujeito pratica qualquer das condutas legalmente incriminadas agindo com imprudência, negligência ou imperícia, produzindo resultado involuntário, mas objetivamente previsível.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima); se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Por sua vez, no caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e, se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. Cuida-se de crime culposo agravado por resultados de igual natureza. Ver comentários ao art. 285.

Substância avariada

Art. 279. (Revogado).

Revogação: O art. 279 do Código Penal, que continha a definição típica do crime de substância avariada, foi expressamente revogado pelo art. 23 da Lei 8.137/1990. Atualmente, a conduta configura crime contra as relações de consumo, e encontra-se definida no art. 7º, inc. IX, do citado diploma legal, cuja redação é a seguinte: “Art. 7º Constitui crime contra as relações de consumo: (…) IX – vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo. Pena – detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.” O parágrafo único do art. 7º da Lei 8.137/1990 pune inclusive a modalidade culposa, reduzindo a pena de detenção de um terço ou a de multa à quinta parte.

Medicamento em desacordo com receita médica

Art. 280. Fornecer substância medicinal em desacordo com receita médica:

Pena – detenção, de um a três anos, ou multa.

Modalidade culposa

Parágrafo único. Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de dois meses a um ano.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: substância medicinal.

Elemento normativo do tipo: “em desacordo com receita médica” (só médicos).

Elemento subjetivo: dolo (elemento subjetivo específico na modalidade “ter em depósito para vender”). Só admite modalidade culposa na hipótese do parágrafo único.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Medicamentos similares e genéricos: não caracteriza o crime.

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a substância medicinal, ou seja, o produto destinado a servir de medicamento, cuja finalidade é a prevenção ou cura de alguma doença ou mal.

Núcleo do tipo: É “fornecer”, no sentido de entregar ou proporcionar a alguém, a título oneroso ou gratuito, substância medicinal em desacordo com receita médica, no tocante à sua espécie, qualidade ou quantidade. A expressão contida na parte final do dispositivo – “em desacordo com receita médica” – representa elemento normativo do tipo. Destarte, não é todo e qualquer fornecimento de medicamento que configura o crime em análise, mas somente o efetuado em contrariedade com a prescrição do profissional da medicina. Receita médica é a indicação escrita elaborada pelo médico regularmente inscrito nos quadros do Conselho Regional de Medicina. Não há crime no fornecimento de substância medicinal em desacordo com receitas emitidas por outros profissionais da área de saúde, a exemplo dos dentistas e das parteiras, em face da vedação da analogia in malam partem no Direito Penal. Entretanto, embora se reconheça a incompatibilidade com dispositivo em análise, convém ressaltar a existência de hipóteses excepcionais, previstas nos arts. 30 e 37, d, do Decreto 20.931/1932, nas quais é autorizada a prescrição de medicamentos por dentistas e parteiras. Subsiste o delito ainda que o fornecimento da substância medicinal em descompasso com a receita médica seja benéfico ao paciente, pois o bem jurídico protegido é a saúde pública, incompatível com arbitrariedades na entrega de medicamentos. Trata-se de crime de perigo abstrato, no qual a lei presume o risco à saúde pública como corolário da prática da conduta legalmente descrita.

Fornecimento de medicamento similar ou genérico: Nos dias atuais, os medicamentos similares e genéricos têm assumido importante papel no combate das mais variadas doenças. Questiona-se se ocorre o crime em análise na hipótese em que o médico prescreve determinada substância medicinal, conhecida pelo seu nome comercial (exemplo: Novalgina), e o farmacêutico fornece medicamento genérico (exemplo: dipirona sódica produzida por outro laboratório) ou similar (exemplo: Anador). Em sintonia com o art. 3º, XX, da Lei 6.360/1976, medicamento similar é “aquele que contém o mesmo ou os mesmos princípios ativos, apresenta a mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica, e que é equivalente ao medicamento registrado no órgão federal responsável pela vigilância sanitária, podendo diferir somente em características relativas ao tamanho e forma do produto, prazo de validade, embalagem, rotulagem, excipientes e veículos, devendo sempre ser identificado por nome comercial ou marca”. Por sua vez, medicamento genérico, a teor do art. 3º, XXI, é “o medicamento similar a um produto de referência ou inovador, que se pretende ser com este intercambiável, geralmente produzido após a expiração ou renúncia da proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade, comprovada a sua eficácia, segurança e qualidade, e designado pela DCB – Denominação Comum Brasileira, ou, na sua ausência, pela DCI – Denominação Comum Internacional”. Destarte, é fácil concluir que os medicamentos similares e genéricos possuem o mesmo princípio ativo do medicamento “original”. Logo, não há falar na prática do crime ora estudado, até porque seria ilógico e absurdo a legislação permitir a circulação destes medicamentos e, ao mesmo tempo, incriminar seu fornecimento em prejuízo da população que ficaria ainda mais alijada do direito constitucional à saúde.

Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica.

Medicamento em desacordo com receita médica e ânimo homicida: Se o sujeito possuir a intenção de matar (animus necandi ou occidendi) a vítima, fornecendo substância médica diversa da prescrita ou em dose manifestamente excessiva, estará configurado o homicídio qualificado pelo emprego de meio insidioso, a teor do art. 121, § 2º, inc. III, do CP, restando absorvido o delito de medicamento em desacordo com receita médica. O conflito aparente de normas penais é solucionado pelo princípio da consunção.

Consumação: Trata-se de delito formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se no momento do fornecimento da substância medicinal em desacordo com a receita médica. Constitui-se também em crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume, de forma absoluta, a exposição a perigo da saúde de um número indeterminado de pessoas em razão da prática da conduta criminosa.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena mínima cominada ao delito previsto no art. 280 do Código Penal é de um ano. Cuida-se, portanto, de crime de médio potencial ofensivo, compatível com a suspensão condicional do processo, se presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 desta Lei.

Modalidade culposa (art. 280, parágrafo único): Cuida-se de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal, sujeitando-se à transação penal e ao rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade, se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima); se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Por sua vez, no caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e, se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. Ver comentários ao art. 285.

Comércio clandestino ou facilitação de uso de entorpecentes

Art. 281. (Revogado).

Revogação: O art. 281 do Código Penal foi expressamente revogado pela Lei 6.368/1976 – Lei de Tóxicos. Esta última, por sua vez, foi revogada expressamente pela Lei 11.343/2006 – Lei de Drogas, a qual atualmente disciplina os ilícitos penais relativos às drogas em geral.

Exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica

Art. 282. Exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal ou excedendo-lhe os limites:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Parágrafo único. Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se também multa.

Classificação:

Crime comum (“exercer a profissão sem autorização legal”) ou próprio (“exercer a profissão excedendo-lhe os limites”)

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime habitual

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: profissão de médico, dentista ou farmacêutico (rol taxativo).

Exercício ainda que a título gratuito caracteriza o crime. Exige-se ainda habitualidade.

Elemento normativo do tipo: “sem autorização legal”.

Lei penal em branco homogênea (transposição dos limites da profissão – fixação em lei).

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: não admite (habitualidade – doutrina dominante).

Ação penal: pública incondicionada.

Introdução: Como estatui o art. 5º, inc. XIII, da Constituição Federal: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. Trata-se de norma constitucional de eficácia contida. A regra é a liberdade de trabalho, ofício ou profissão, mas o próprio constituinte originário admitiu a imposição de exigências, pelo legislador ordinário, para o desempenho de tais atividades. Nesse contexto, há requisitos legais para o exercício da medicina, da odontologia e da atividade farmacêutica. E, levando em conta a relevância da saúde pública, este artigo acertadamente erigiu à categoria de crime a atuação ilegal relacionada a tais profissões.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a profissão de médico, dentista ou farmacêutico.

A discussão relativa a outras profissões e a taxatividade do art. 282 do CP: O rol do caput do dispositivo ora analisado é taxativo, abarcando somente o exercício ilegal da medicina e da arte dentária ou farmacêutica. De fato, o exercício da profissão de médico veterinário, sem autorização legal, não autoriza a incidência do crime tipificado no art. 282 do CP, pois é vedada a utilização da analogia in malam partem no âmbito criminal, em respeito ao princípio da reserva legal (art. 5º, XXXIX, da CF e art. 1º do CP).10 Com efeito, se o legislador desejasse tutelar a saúde pública também na esfera veterinária, deveria tê-lo feito expressamente. Como se sabe, a elementar “médico” não alcança o sujeito que desempenha atos inerentes à medicina veterinária. Igual raciocínio deve ser aplicado à atuação dos enfermeiros, dos massagistas e especialmente das parteiras, as quais, embora cada vez mais raras, ainda existem nos longínquos rincões brasileiros, em face da dificuldade de encontrar médicos ginecologistas e obstetras.

Núcleo do tipo: É “exercer”, no sentido de praticar, desempenhar ou exercitar, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico. O verbo “exercer” é indicativo da habitualidade do delito. Destarte, não basta a realização de um único ato privativo do médico, dentista ou farmacêutico. Exige-se a reiteração de atos, reveladores do estilo de vida ilícito assumido pelo farsante.

Modos de execução: O crime pode ser praticado de duas formas: (a) quando o sujeito exerce, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal. É a famosa “falta de autorização legal”; ou (b) quando ele a exerce, ainda que a título gratuito, excedendo-lhe os limites. Trata-se da “transposição dos limites da profissão”. Na primeira forma, a expressão “sem autorização legal” representa um elemento normativo do tipo: o sujeito não está autorizado a desempenhar a profissão porque não possui o título que o habilite para tanto (falta de capacidade profissional), como no exemplo daquele que atende doentes em seu consultório, sem nunca ter frequentado a faculdade de medicina, ou então porque seu título, embora exista, não foi registrado perante o órgão competente (falta de capacidade legal), tal como se verifica na situação em que o graduado em ciências médicas não teve seu diploma registrado perante o Conselho Regional de Medicina respectivo. Na transposição dos limites da profissão, o agente possui autorização legal para exercer a medicina, arte dentária ou farmacêutica, mas extrapola os limites que a lei lhe impõe. Em outras palavras, o sujeito concluiu o curso superior de medicina, odontologia ou farmácia, e seu título encontra-se devidamente registrado perante o órgão competente, mas ele extravasa os limites da autorização para o exercício da profissão. É o que se verifica, a título ilustrativo, quando um médico ortopedista se aventura a realizar cirurgias cardíacas. Cuida-se de lei penal em branco homogênea, pois é preciso analisar os limites de atuação conferidos a cada profissional pelas leis atinentes às áreas da medicina, da odontologia e da farmácia.

Sujeito ativo: No tocante à primeira conduta – “exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal” – o art. 282 do CP contempla um crime comum ou geral, uma vez que pode ser cometido por qualquer pessoa. Na prática, contudo, normalmente o agente possui conhecimentos da profissão, ainda que a título precário, pois somente assim reúne condições para ludibriar um número indeterminado de pessoas, proporcionando-lhes tratamento típico daqueles que se fazem com médico, dentista ou farmacêutico. Nesse caso, apresenta-se o exercício profissional sem qualquer título de habilitação ou sem registro deste na repartição competente. Não basta o diploma universitário: exige-se ainda seu registro na repartição competente. Por sua vez, na conduta de “exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, (…) excedendo-lhe os limites, cuida-se de crime próprio ou especial, pois somente pode ser praticado pelo médico, dentista ou farmacêutico devidamente habilitado e registrado que extrapola os quadrantes da sua atuação. O excesso apontado pelo texto legal é somente o funcional, não abrangendo o de natureza territorial (ou espacial). Exemplificativamente, o médico registrado perante o Conselho Regional de Medicina de São Paulo não praticará o delito tipificado no artigo em comento, mas somente um ilícito administrativo, se passar a exercer sua profissão no Estado do Ceará, sem efetuar seu registro no Conselho Regional de Medicina respectivo.

Médico, dentista ou farmacêutico e suspensão das suas atividades: Se o médico, dentista ou farmacêutico realizar atos inerentes às suas profissões, no período em que se encontrava suspenso das suas atividades, duas situações deverão ser diferenciadas: (a) Em caso de suspensão judicial, estará caracterizado o crime de desobediência à decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito (art. 359 do CP); (b) Tratando-se, porém, de suspensão administrativa, incidirá o crime de exercício de atividade com infração de decisão administrativa (art. 205 do CP).

A profissão de dentista exercida pelo protético: Nos termos do art. 4º, I, II e III, da Lei 6.710/1979, aos técnicos em prótese dentária é vedado prestar, sob qualquer forma, assistência direta a clientes; manter, em sua oficina, equipamento e instrumental específico de consultório dentário, bem como fazer propaganda de seus serviços ao público em geral. Consequentemente, se o técnico em prótese dentária exercer de forma habitual a profissão de dentista, a ele será imputado o crime definido no art. 282 do CP. Este efeito, a propósito, consta expressamente do art. 8º da Lei 6.710/1979.

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago) e, mediatamente, as pessoas atendidas pelo falso profissional da medicina, arte dentária ou farmacêutica.

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa.

Exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica e finalidade lucrativa: Se o crime for praticado com fim de lucro, aplica-se também a pena de multa.

Atos praticados em situações emergenciais ou na falta de profissionais habilitados (estado de necessidade) e pequenos auxílios no âmbito familiar (ausência de dolo): Não há crime, em razão da incidência da causa excludente da ilicitude atinente ao estado de necessidade (CP, arts. 23, inc. I, e 24), nas situações em que uma pessoa, sem estar devidamente habilitada para o exercício da profissão, desempenha atividade inerente aos médicos, dentistas ou farmacêuticos, quando ausentes tais profissionais, para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. Também não há crime, agora por ausência de dolo, nos pequenos auxílios prestados a enfermos no âmbito do recinto familiar. É o que ocorre, exemplificativamente, com a mãe de família que habitualmente ministra aos seus filhos xaropes caseiros para cura de resfriados. Nessas situações, indiscutivelmente há crime do ponto de vista objetivo, pois encontram-se presentes as elementares do art. 282, caput, do Código Penal. Contudo, não se nega, sob o prisma subjetivo, a ausência de dolo, indispensável para a concretização da conduta criminosa.

Consumação: O núcleo do tipo – “exercer” – autoriza a conclusão no sentido de que o delito, de natureza habitual, somente se consuma com a prática reiterada e uniforme da conduta legalmente descrita, de modo a revelar o estilo de vida ilícito adotado pelo agente. Cuida-se também de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado, atingindo a consumação com a prática reiterada do comportamento previsto no art. 282 do CP, prescindindo-se da superveniência do resultado naturalístico, ou seja, da provocação de mal a quem quer que seja. Finalmente, é crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume de forma absoluta o risco à saúde de pessoas indeterminadas como desdobramento da conduta ilícita. Destarte, ainda que o atendimento prestado seja de alto nível e proporcione resultado eficaz, o delito estará consumado.

Tentativa: A doutrina amplamente majoritária sustenta a inadmissibilidade do conatus, com um argumento bastante simples: o exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica é crime habitual, e delitos desta estirpe são incompatíveis com a tentativa. Com o devido respeito, acreditamos que esse raciocínio, generalizado e extremamente simplista, deva ser rechaçado. Em nossa opinião, os crimes habituais são, em regra, contrários à figura da tentativa. Todavia, o caso concreto pode, excepcionalmente, revelar o cabimento do conatus.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Em face do máximo da pena privativa de liberdade cominada (dois anos), o exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica constitui-se em infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e o rito sumaríssimo.

Formas qualificadas pelo resultado: O art. 285 do CP determina a incidência das regras contidas em seu art. 258 ao crime de exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica. Nada obstante o legislador tenha empregado a expressão “formas qualificadas pelo resultado”, cuidam-se de causas de aumento da pena. Destarte, se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro.

A questão relativa à falsificação do diploma universitário para o exercício ilegal da profissão: A falsificação de diploma universitário, visando o exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica fica absorvida pela descrição do tipo em estudo, pois funciona como meio de execução para a prática do crime contra a saúde pública.

Jurisprudência selecionada:

Crime habitual e de perigo abstrato: “O tipo penal previsto no art. 282 do Código Penal (exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica) pune a conduta daquele que sem autorização legal, é dizer, sem qualquer título de habilitação ou sem registro deste na repartição competente (Nelson Hungria, Comentários ao Código Penal – Volume IX, Ed. Forense, 2ª edição, 1959, página 145), ou ainda, exorbitando os limites desta, exerce, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico. Trata-se de crime de perigo abstrato, habitual, que procura tutelar a saúde pública do dano que pode resultar do exercício ilegal e abusivo da medicina, bem como da arte dentária ou farmacêutica (Heleno Cláudio Fragoso, Lições de Direito Penal – Parte Especial – Volume II, Ed. Forense, 1ª edição, 1989, p. 275)” (HC 139.667/RJ, rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, j. 17.12.2009).

Curandeirismo e exercício ilegal de arte farmacêutica – concurso de crimes – impossibilidade: “Concurso material. Crimes de exercício ilegal da arte farmacêutica e de curandeirismo. Inadmissibilidade. Incompatibilidade entre os tipos penais previstos nos arts. 282 e 284 do Código Penal. Pacientes não ignorantes nem incultos. Comportamento correspondente, em tese, ao art. 282 do CP” (STF: HC 85.718/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 2ª Turma, j. 18.11.2008).

Curandeirismo e exercício ilegal de arte farmacêutica – concurso de crimes – possibilidade: “Embora o curandeirismo seja prática delituosa típica de pessoa rude, sem qualquer conhecimento técnico-profissional da medicina e que se dedica a prescrever substâncias ou procedimentos com o fim de curar doenças, não se pode descartar a possibilidade de existência do concurso entre tal crime e o de exercício ilegal de arte farmacêutica, se o agente também não tem habilitação profissional específica para exercer tal atividade. Reconhecida a prática de duas condutas distintas e independentes, não há como se proclamar ilegal a condenação por cada uma delas, não se mostrando, in casu, ter havido bis in idem ou indevida atribuição de concurso de crimes, não cabendo, ainda, aplicação da consunção entre os delitos” (HC 36.244/DF, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma, j. 22.02.2005).

Exercício ilegal da medicina e tráfico de drogas – independência: “Não existe a vinculação necessária, que se pretende estabelecer, da prática do crime previsto no art. 282 do Código Penal com o crime de tráfico de drogas. De fato, não se exige para a configuração do crime de exercício ilegal da medicina que o agente prescreva substância tida pela legislação como droga para os fins da Lei nº 11.343/2006. O vulgar exercício da medicina por parte daquele que não possui autorização legal para tanto é suficiente para a delimitação do tipo em destaque. Se o agente ao exercer irregularmente a medicina ainda prescreve droga, resta configurado, em tese, conforme já reconhecido por esta Corte em outra oportunidade (HC 9.126/GO, 6ª Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 13.08.2001) o concurso formal entre o art. 282 do Código Penal e o art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006” (STJ: HC 139.667/RJ, rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, j. 17.12.2009).

Falsificação de documento público – princípio da consunção: “A falsificação de documentos públicos (diploma de conclusão do curso superior de medicina) visando ao exercício ilegal da profissão de médico, consubstanciado no requerimento de exames clínicos, prescrição de medicamentos e realização de plantões médicos em hospital, constitui crime-meio, que deve ser absorvido pelo crime-fim, pois a falsificação em questão se exauriu no exercício ilegal da medicina, sem mais potencialidade lesiva” (STJ: HC 138.221/RS, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 29.09.2009).

Charlatanismo

Art. 283. Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma livre

Crime vago

Crime instantâneo

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: anúncio da cura por meio secreto ou infalível.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública. O anúncio da falsa cura muitas vezes acarreta a decisão de pessoas ingênuas no sentido de ser desnecessário o auxílio médico para proceder ao tratamento convencional da doença, resultando em riscos para a saúde ou mesmo para a vida.

Objeto material: É o anúncio da cura por meio secreto ou infalível. Cura secreta é o tratamento de doença de maneira oculta, mediante a utilização de procedimentos ignorados pelas ciências médicas. Cura infalível, por sua vez, é o tratamento plenamente eficaz, apto a restabelecer, inevitavelmente, a saúde do paciente.

Núcleos do tipo: Os núcleos do tipo são “inculcar” e “anunciar” (tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado). Inculcar é aconselhar, apregoar, sugerir; anunciar é noticiar, divulgar pelos mais variados meios (panfletos, cartazes, rádio, televisão etc.). Pratica o delito em comento aquele que apregoa ou divulga tratamento de doença mediante cura secreta ou infalível. A ilicitude do comportamento reside no segredo e na infalibilidade da cura de determinada doença, pois às ciências médicas não é dado prometê-la por meios secretos, tampouco anunciar procedimento que inevitavelmente irá alcançá-la. É sabido, a propósito, que a medicina, em sua grande parte, é considerada atividade-meio, e não atividade-fim.

Sujeito ativo: O crime é comum ou geral. Pode ser cometido por qualquer pessoa, inclusive pelos profissionais da área da saúde (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, dentistas, farmacêuticos etc.).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. O sujeito deve possuir ciência da falsidade do meio secreto ou infalível por ele inculcado ou anunciado, pois nesse ponto repousa sua fraude. Não se exige a finalidade de obtenção de vantagem econômica, malgrado esta seja normalmente a meta buscada pelo charlatão. Não se admite a modalidade culposa.

Charlatanismo e exercício ilegal da medicina – distinção: Os crimes de charlatanismo e de exercício ilegal da medicina não se confundem. Aquele é de natureza instantânea e pode ser cometido inclusive pelo médico; este é habitual e, via de regra, não pode ter o profissional da medicina como sujeito ativo. Mas não para por aí. O ponto fundamental que os diferencia repousa no elemento subjetivo: no exercício ilegal da medicina, o sujeito acredita na eficácia do tratamento que aconselha ou aplica; de seu turno, no charlatanismo, o agente sabe que nenhum efeito curativo pode ter o tratamento que inculca ou anuncia.

Charlatanismo e estelionato: diferença e concurso de crimes: O charlatanismo, cuja nota característica é a fraude, guarda muita afinidade com o estelionato. Cuida-se de autêntico “estelionato contra a saúde pública”. Como leciona Magalhães Noronha, “A expressão vem do latim ciarlare, que significa falar muito, tagarelar, parlar etc. É o crime do ‘conversa fiada’, do que, com lábia, ilude os incautos, fazendo-os crer em curas maravilhosas, em processos infalíveis etc.”.11 De qualquer modo, o legislador decidiu inserir o charlatanismo de forma autônoma no rol dos crimes contra a saúde pública, e não entre os delitos patrimoniais, por duas razões: (a) embora seja a regra geral, nem sempre o sujeito é movido pela intenção de obter vantagem ilícita em prejuízo alheio; e (b) sua prática implica perigo à saúde pública, pois diversas pessoas deixam de receber tratamento médico adequado pelo fato de acreditarem na “conversa fiada” do charlatão. Entretanto, se o falsário, além de inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível, também obtiver vantagem ilícita em prejuízo alheio, a ele serão imputados os crimes de charlatanismo e estelionato, em concurso material, pois há ofensa a bens jurídicos diversos, quais sejam, a saúde pública e o patrimônio. É o que se verifica, a título ilustrativo, quando um golpista anuncia a cura da AIDS ou do câncer mediante o consumo de um chá especial, que vem a ser vendido aos interessados por elevado preço.

Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com o ato de inculcar ou anunciar a cura por meio secreto ou infalível, pouco importando se a pessoa enferma venha ou não a ser efetivamente “tratada” pelo charlatão. É também crime de perigo comum e abstrato, pois a lei presume de forma absoluta a situação de risco a pessoas indeterminadas como consequência da conduta ilícita. Finalmente, constitui-se em crime instantâneo, e não habitual, razão pela qual é dispensável a reiteração do comportamento para a sua caracterização. Basta um único anúncio fraudulento de cura para o aperfeiçoamento do delito.

Tentativa: É possível.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: Trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo. A pena privativa de liberdade cominada em seu patamar máximo (um ano) autoriza a transação penal e o rito sumaríssimo, incluindo o delito na competência do Juizado Especial Criminal.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Ver comentários ao art. 285.

Jurisprudência selecionada:

Liberdade de culto: “A liberdade de culto é garantia constitucional, com proteção do local e da liturgia” (STJ: HC 1.498/RJ, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, 6ª Turma, j. 16.08.1993).

Curandeirismo

Art. 284. Exercer o curandeirismo:

I – prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente, qualquer substância;

II – usando gestos, palavras ou qualquer outro meio;

III – fazendo diagnósticos:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Parágrafo único. Se o crime é praticado mediante remuneração, o agente fica também sujeito à multa.

Classificação:

Crime comum

Crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado

Crime de perigo comum e abstrato

Crime de forma vinculada

Crime vago

Crime habitual

Crime comissivo (regra)

Crime unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual

Crime plurissubsistente (regra)

Informações rápidas:

Objeto material: substância prescrita, ministrada ou aplicada, o gesto, a palavra ou qualquer outro meio, bem como o diagnóstico efetuado.

Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa.

Tentativa: admite (crime plurissubsistente – divergência doutrinária).

Ação penal: pública incondicionada.

Objeto jurídico: Tutela-se a saúde pública.

Objeto material: É a substância prescrita, ministrada ou aplicada, o gesto, a palavra ou qualquer outro meio, bem como o diagnóstico efetuado.

Núcleo do tipo: O núcleo do tipo é “exercer”, no sentido de desempenhar ou praticar determinado comportamento com habitualidade. Com efeito, o verbo “exercer” é indicativo da reiteração de atos, razão pela qual a realização isolada da conduta legalmente descrita não constitui o delito. Curandeirismo é a prática consistente no ato de restabelecer a saúde alheia por pessoa a quem não é atribuída a função, capacidade ou poder para tal fim. Em regra, é realizada por indivíduo sem qualquer título ou idoneidade técnica ou profissional para alcançar a cura. A atividade do curandeiro não precisa ser completamente inovadora e totalmente falha, de modo a permitir que somente as pessoas menos esclarecidas possam cair no golpe. Cuida-se de crime de forma vinculada, pois o tipo penal arrola expressamente seus meios de execução. Vejamos.

Inciso I – prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente, qualquer substância: Prescrever é receitar ou recomendar; ministrar equivale a entregar para consumir ou inocular; e aplicar tem o sentido de empregar ou utilizar. As ações ligam-se a “qualquer substância”, de origem vegetal, animal ou mineral (exemplos: pomadas, líquidos, tripas de animais, penas de aves etc.), seja ou não nociva à saúde humana pois, nada obstante sua inocuidade, ela impede ou retarda o tratamento correto do enfermo pelo profissional da área de saúde.

Inciso II – usando gestos, palavras ou qualquer outro meio: Gestos consistem no emprego de movimentos corporais, especialmente dos membros superiores e da cabeça, que podem servir para manifestar ideias ou sentimentos. Palavras são os meios utilizados para facilitar a comunicação interpessoal, mediante linguagem escrita ou falada, tais como as rezas, benzeduras, encomendações e esconjuros. A expressão “ou qualquer outro meio” abarca atos análogos aos gestos e às palavras criados pela imaginação humana e impossíveis de serem esgotados no plano abstrato.

Inciso III – fazendo diagnósticos: Nessa hipótese, o comportamento ilícito reduz-se a fazer diagnósticos, ato privativo do médico, mediante a constatação de uma doença ou enfermidade pelos seus sintomas ou sinais característicos. Assim agindo, o curandeiro retarda a cura ou o tratamento de uma doença, comprometendo a saúde e até mesmo a vida do enfermo.

Sujeito ativo: Pode ser qualquer pessoa desprovida de conhecimentos médicos (crime comum ou geral).

Sujeito passivo: É a coletividade (crime vago).

Elemento subjetivo: É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Prescinde-se da cupidez, ou seja, da intenção de alcançar vantagem indevida em consequência da conduta ilícita. Não se admite a modalidade culposa.

Atuação remunerada e aplicação cumulativa da pena de multa (art. 284, parágrafo único): Se o curandeirismo for praticado mediante remuneração, incidirá também a pena de multa.

Consumação: O curandeirismo é crime habitual. Sua consumação reclama a prática reiterada de qualquer dos atos descritos no tipo penal, demonstrando um estilo de vida ilícito por parte do agente. A habitualidade não exige o exercício dos comportamentos legalmente descritos durante longo período, ou mesmo em dias sucessivos. Uma reiteração de atos (exemplos: aplicações de substâncias, passes etc.), em um mesmo dia e para diversas pessoas, é prova inequívoca do exercício efetivo do curandeirismo. Para comprovação da habitualidade, prescinde-se, por parte do sujeito ativo, do desempenho exclusivo do curandeirismo. Pode ele entregar-se a outras atividades, e nem por isso deixará de ser curandeiro, quando realizar reiteradamente as ações delineadas no dispositivo em análise. Trata-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a prática repetida de qualquer dos comportamentos descritos pelo tipo penal, pouco importando se sobrevém dano ou prejuízo a alguém. Cuida-se ainda de crime de perigo abstrato, pois o legislador presume, de forma absoluta, o risco à saúde pública em decorrência da prática das condutas legalmente previstas.

Tentativa: Embora a doutrina majoritária sustente a inadmissibilidade do conatus no âmbito do curandeirismo, em face da sua natureza habitual, ousamos discordar. Em nosso entendimento, o delito é compatível com a figura da tentativa, como corolário do seu caráter plurissubsistente, permitindo o fracionamento do iter criminis.

Ação penal: É pública incondicionada.

Lei 9.099/1995: A pena máxima cominada ao delito de curandeirismo é de dois anos. Trata-se, portanto, de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal e compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo.

Formas qualificadas pelo resultado (art. 285 do Código Penal): Se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. Ver comentários ao art. 285.

Curandeirismo e rituais religiosos: O Brasil é um Estado laico, ou seja, não adota oficialmente nenhuma religião (art. 19, inc. I, da Constituição Federal). Se não bastasse, o art. 5º, inc. VI, da Lei Suprema assegura a liberdade de consciência e de crença, bem como o livre exercício dos cultos religiosos. Portanto, os atos inerentes aos rituais religiosos – a exemplo dos passes efetuados no espiritismo e das benzeduras dos padres católicos – constituem-se em autênticas manifestações da fé, e não se encaixam no tipo penal do curandeirismo, pois são incapazes de oferecer perigo à saúde pública.

A problemática relacionada aos abusos da atividade religiosa: Existem indivíduos que, sob o manto da proteção constitucional da liberdade de consciência e de crença, e do livre exercício dos cultos religiosos, extrapolam os limites consagrados à atividade religiosa, provocando danos à saúde e até mesmo à vida de pessoas simples e incautas que depositam a esperança da cura de suas enfermidades nos poderes a eles supostamente atribuídos pelos deuses. É o que se dá nas “cirurgias” de amputações de membros do corpo humano ou de retirada de órgãos, ou, ainda, nas perfurações efetuadas para operações das mais variadas espécies. Mesmo nesses casos extremos, não se pode reconhecer o crime de curandeirismo, porque está em jogo a crença religiosa da pessoa submetida ao tratamento sobrenatural. Contudo, o Direito Penal não pode se omitir. Sua atuação fica restrita à esfera de disponibilidade do paciente. Destarte, quando a vítima suportar ferimentos graves ou vier a falecer, ou seja, quando for atingida em bens jurídicos indisponíveis, o sujeito deverá ser responsabilizado pela lesão corporal grave (ou gravíssima), ou então pelo crime de homicídio.

Exercício ilegal da medicina, charlatanismo e curandeirismo: No exercício ilegal da medicina (art. 282 do CP), o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa (crime comum ou geral), inclusive aquela dotada de conhecimentos médicos, desde que não esteja devidamente habilitada para o exercício da profissão. De igual modo, o charlatanismo (art. 283 do CP) é crime comum, podendo ser cometido inclusive pelo médico. Entretanto, o charlatão funciona como autêntico estelionatário da medicina, pois anuncia a cura de determinada enfermidade por meio secreto ou infalível, ciente de que seu procedimento não é idôneo para tanto. Finalmente, o curandeirismo também pode ser praticado por qualquer pessoa. Todavia, aqui o sujeito ativo não se passa por médico, dentista ou farmacêutico. Sua conduta consiste em promover habitualmente a cura, por meio de métodos vulgares, sem qualquer base técnico-científica. No entanto, ao contrário do charlatão, o curandeiro acredita ser capaz de curar seu paciente mediante a utilização de fórmulas mágicas ou sobrenaturais.

Curandeirismo e estelionato: O curandeiro é a pessoa que acredita ser capaz de curar doenças e males do corpo humano mediante o emprego de fórmulas mágicas e completamente em descompasso com os postulados da medicina. Por seu turno, o estelionatário é o sujeito de má-fé que se aproveita da simplicidade da vítima para, valendo-se da fraude, induzi-la ou mantê-la em erro, obtendo vantagem ilícita em prejuízo alheio. Nesse contexto, se o agente atuar travestido de curandeiro, prometendo solucionar moléstias de modo sobrenatural, mas com o propósito deliberado de obter vantagem ilícita, de ordem econômica, em prejuízo de alguém, a ele será imputado o crime de estelionato (art. 171, caput, do CP), e não o de curandeirismo. De fato, a simulação da condição de curandeiro funciona efetivamente como fraude, meio de execução do delito contra o patrimônio.

Curandeirismo, violação sexual mediante fraude e estupro de vulnerável: Se o sujeito, a pretexto de curar determinada pessoa de males que acometem seu corpo ou sua mente, com ela mantém conjunção carnal ou outro ato libidinoso, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte sua livre manifestação de vontade, deverá ser responsabilizado pelo crime de violação sexual mediante fraude (art. 215 do CP), restando absorvido o curandeirismo, o qual desponta como meio de execução para a prática do fato principal. Se a vítima for pessoa menor de 14 anos de idade, ou então portadora de doença ou enfermidade mental, e consequentemente não possuir discernimento para a prática do ato sexual, ou finalmente não puder, por qualquer outra causa, oferecer resistência, estará caracterizado o crime de estupro de vulnerável, de natureza hedionda, definido no art. 217-A do CP.

Jurisprudência selecionada:

Crime habitual: “O curandeirismo ficou comprovado com habitualidade com o que o réu ministrava os ‘passes’ e obrigava, adultos e menores, a ingerirem sangue de animais e bebida alcoólica, colocando em perigo a saúde e levando os adolescentes à dependência do álcool” (STJ: REsp 50.426/MG, rel. Min. Jesus Costa Lima, 5ª Turma, j. 10.08.1994).

Liberdade religiosa – distinção: “Condenação criminal fundada em dados inconfundíveis com o mero exercício da liberdade religiosa. Processo penal que não se pode invalidar em habeas corpus. Recurso desprovido” (STF, RHC 62240/SP, rel. Min. Francisco Rezek, 2ª Turma, j. 13.12.1984).

Forma qualificada

Art. 285. Aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267.

Nomenclatura: O art. 285 do Código Penal determina a incidência das regras contidas em seu art. 258 aos crimes contra a incolumidade pública, à exceção do crime de epidemia (art. 267). Nada obstante o legislador tenha utilizado a expressão “formas qualificadas pelo resultado”, cuidam-se de causas de aumento da pena.

Aumento de pena nos crimes dolosos: Se do fato doloso resultar lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), aumentar-se-á pela metade a pena privativa de liberdade; se resultar morte, aplicar-se-á a pena em dobro. São hipóteses de crimes preterdolosos, pois o resultado agravador (lesão corporal grave ou morte) há de ser produzido a título de culpa.

Aumento de pena nos crimes culposos: No caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; e, se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço. São crimes culposos agravados por resultados de igual natureza.

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1Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 3, p. 226.

2Cf. TELES, Ney Moura. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. v. 3, p. 136.

3STJ, RHC 1.386/RJ, rel. Min. Edson Vidigal, 5ª Turma, j. 16.09.1991.

4Rogério Greco entende tratar-se de crime de perigo concreto, sob pena de violação do princípio da lesividade. Cf. Curso de direito penal. 6. ed. Niterói: Impetus, 2010. v. IV.

5De 30 de novembro de 2012, com entrada em vigor 120 dias após a sua publicação.

6Cf. FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. Parte especial. São Paulo: José Bushatsky, 1959. v. 3, p. 683.

7JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 3, p. 358.

8Cf. PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro. 6. ed. São Paulo: RT, 2010. v. 3, p. 149.

9FRAGOSO, Claudio Heleno. Lições de direito penal. Parte especial. São Paulo: José Bushatsky, 1959. v. 3, p. 708-709.

10No mesmo sentido: PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. Parte especial. 2. ed. São Paulo: RT, 2007. v. 2, p. 657.

11NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1983. vol. 4, p. 69.