3. O auxílio-doença

O primeiro grande benefício por incapacidade do Regime Geral da Previdência Social é o auxílio-doença.

Ocorrendo um acidente de qualquer natureza ou um acidente no trabalho (acidente típico, doença ocupacional) ou no trajeto para o trabalho (acidente in itinere), é possível que o segurado necessite de um maior período de afastamento para recuperação adequada do quadro infortunístico.23

Em se tratando de infortúnio de natureza não laboral, tanto os segurados obrigatórios quanto os segurados facultativos farão jus à prestação, já que nenhum cidadão-contribuinte está livre de, por algum evento não previsto, ficar temporariamente impedido de realizar as suas atividades hodiernas. No caso específico dos segurados obrigatórios, em ocorrendo alguma moléstia, o benefício auxílio-doença comum será sempre devido ao empregado doméstico e ao contribuinte individual, já que estes não possuem, por lei, a opção de percepção de benefício provisório de natureza acidentária.24

De fato, no caso específico de acidente de trabalho, nos termos da lei, o empregado celetista é, sem dúvida, o grande segurado obrigatório protegido; sendo que o trabalhador avulso e o segurado especial são os demais únicos segurados obrigatórios do sistema que podem obter a benesse acidentária.25

Tomando por base o celetista, a previsão é de que deverá permanecer afastado de suas atividades habituais por mais de quinze dias – pequeno período esse em que cabe ao empregador o ônus de arcar com a remuneração do obreiro, mesmo que não haja prestação de serviço. A partir do 16° dia de afastamento, cabe ao órgão previdenciário conceder benefício ao empregado lesionado, realizando perícias de rotina para avaliar o desenvolvimento do quadro clínico e as perspectivas de retorno do acidentado ao mercado de trabalho, para a prática da mesma atividade profissional ou para outra compatível com as suas atuais limitações funcionais.

Permanecendo o obreiro por mais de quinze dias afastado do trabalho, será determinada pelo INSS a concessão de um benefício provisório: o auxílio-doença; sendo realmente improvável que se faça a opção imediata pela concessão de um benefício de natureza definitiva – o auxílio-acidente ou até mesmo a aposentadoria por invalidez, a serem mais à frente explicitados.

Em casos mais graves, é de praxe a concessão pelo INSS de certo período para análise das peculiaridades do problema de saúde (quando mantido o segurado em benefício provisório), para um posterior encaminhamento da melhor solução definitiva (quando então cogitada a possibilidade de transformação do benefício provisório em definitivo).

O requerimento de benefício por incapacidade inicial, como aludido, a partir do 16° dia de afastamento, deve ser feito junto à agência do INSS, sendo comum que o empregador tenha estrutura interna capaz de intermediar a relação segurado-órgão previdenciário, auxiliando nesse primeiro contato com a autarquia federal para fins de afastamento do trabalhador por prazo indeterminado do ambiente de trabalho.

Por certo, não é possível qualquer participação do Poder Judiciário em estágio anterior à negativa de benefício na via administrativa, devendo ser oportunizado que perícia, a cargo dos médicos do INSS, avalie primeiramente a condição de saúde do trabalhador. A partir daí, existindo inconformidade do segurado com a decisão administrativa tomada, poder-se-ia admitir o ingresso na via judicial para discussão de lesão a direito (art. 5°, XXXV, CF/88), mesmo sem o exaurimento das instâncias recursais administrativas (Súmula 89 STJ).26

Desde já, devemos apontar tópico por demais relevante no estudo do benefício por incapacidade e seu requerimento administrativo, qual seja, a da “perda da qualidade de segurado”.

Isto porque, muitas vezes, o segurado tem indeferido benefício por incapacidade na agência do INSS, especialmente o auxílio-doença, não por razão propriamente médica/clínica, mas sim supostamente por razão de ordem formal/burocrática, embora esteja visivelmente incapacitado em razão de determinado problema de saúde.

Pode ocorrer de o trabalhador sofrer um acidente e não pleitear junto ao INSS, àquele tempo, o seu legítimo benefício auxílio-doença. Posteriormente, desempregado e sem melhores perspectivas, decide investigar melhor os seus direitos e então recorre ao sistema previdenciário, momento em que é informado que não pode receber qualquer benefício por incapacidade devido ao fato de não manter mais vínculo com o sistema previdenciário.

Mesmo que se admita que no momento do requerimento do benefício previdenciário não há mais o vínculo entre o segurado e o INSS – em razão da descontinuidade de contribuições previdenciárias pelo segurado e do término do período de graça (período provisório em que o obreiro mantém a qualidade de segurado mesmo sem contribuir mensalmente ao sistema) – o que realmente interessa é se havia o aludido vínculo jurídico ao tempo da ocorrência do evento infortunístico.

É nesse momento – qual seja, do “sinistro” – que deve ser feita a investigação a respeito da qualidade ou eventual perda da qualidade de segurado do trabalhador; e não ao tempo do pedido administrativo. Adota-se esta postura para privilegiar legitimamente o hipossuficiente, mesmo porque é comum que, por ignorância, o cidadão acidentado demore a procurar o seu direito, precisando ter uma espécie de tolerância e sensibilidade do sistema previdenciário.

Nesse sentido leciona Hertz J. Costa ao narrar que:

“A massa trabalhadora é composta, normalmente, de pessoas extremamente humildes, de culturas rudimentares, desinformadas e que apenas quando se acham desempregadas, passando privações e portanto incapacidade, saem à busca dos direitos (...). Justificar que a Previdência Social se livre do pagamento das prestações acidentárias, nas circunstâncias apontadas, só porque transposto o período de graça, significaria negar os preceitos inscritos no art. 5°, XXXVI, e 7°, XXVIII, Constituição Federal, ao lado de considerar-se comportamento iníquo, pois deixa ao desamparo o trabalhador comprometido física e psiquicamente”.27

Observe-se, ainda nessa conjectura, a verídica exposição de Irineu e William Pedrotti:

“O nosso povo é humilde, trabalhador e o segurado sempre foi carecedor de uma educação regular da lei de acidentes de trabalho, tanto que em determinados centros os Sindicatos de classe chamam para sim, através dos Departamentos Jurídicos, a responsabilidade da representação do segurado filiado, suprindo-lhe a deficiência técnica”.28

Ademais, vale o registro, há entendimento jurisprudencial de que mantém a qualidade de segurado aquele que deixou de exercer atividade laboral em razão da incapacidade que deu causa ao afastamento, mesmo que momentaneamente não esteja efetivamente em gozo de benefício auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, conforme se trate de invalidez temporária ou definitiva.29 Ou seja, se a cessação das contribuições ao sistema decorre do acometimento de doença ocupacional que retira a capacidade laborativa do trabalhador, pode-se cogitar até de manutenção da qualidade do segurado, porquanto a perda da condição de labor enseja a proteção previdenciária.30

Ultrapassada a questão formal da existência de qualidade de segurado (ao tempo do infortúnio), tem-se que a regulamentação da concessão do auxílio-doença, na via administrativa, prevê a realização de uma primeira perícia, na qual sendo reconhecida a incapacidade para o trabalho, será concedido ao segurado o benefício provisório, já sendo determinada uma data futura em que provavelmente o trabalhador terá condições de retorno ao labor (“alta programada”).

Implantado pelo INSS em 2005, por meio da Orientação Interna 130, o programa da “alta programada”, também conhecido como DCB – Data de Cessação do Benefício, no nosso entender de duvidosa legalidade,31 modificou o procedimento utilizado pelo INSS para a concessão de auxílio-doença aos usuários comprovadamente incapazes para o trabalho.32

No que toca à determinação de altas médicas programadas, é de se dizer que tal foi a forma encontrada pelo sistema previdenciário para gerenciamento da prorrogação de benefícios por incapacidade. Embora haja realmente questionamento judicial quanto à legalidade do procedimento adotado pelo órgão previdenciário,33 certo é que o procedimento vem sendo nacionalmente mantido, ancorado posteriormente na Instrução Normativa INSS/PRES nº 31, de 10 de setembro de 2008.34

Tal sistemática envolve a manutenção de benefício por incapacidade com imediata previsão de data futura para cessação do benefício (fixação do DCB – Data Cessação de Benefício). O segurado faz hoje perícia que reconhece a incapacidade, e já sabe de pronto que teve prorrogado seu benefício por mais um número exato de meses, sendo que se ainda estiver incapacitado naquela data futura, deve ele (segurado) ter a iniciativa de procurar novamente o INSS para uma nova tentativa de manutenção do benefício.

Essa situação pode colocar o segurado em uma situação de constante pressão e angústia, já que mesmo absolutamente incapacitado não tem o direito de permanecer por prazo indeterminado em benefício, até que recupere adequadamente a sua capacidade laborativa. É determinada, então, pelo INSS uma data futura e certa em que o obreiro terá supostamente recuperado sua capacidade de trabalho, cabendo ao trabalhador provar a manutenção do problema de saúde, em perícia que deva agendar previamente, sob pena de suspensão imediata do benefício de caráter alimentar.

O segurado, chegando em período próximo a da alta futura, tendo provas que permanece incapacitado, deve requerer especificamente no período de quinze dias antes do limite temporal fixado para a alta nova perícia para prorrogação do benefício; sendo negado esse pedido, cabe ainda ao segurado requerer uma reconsideração; mantendo a negativa, ainda é prevista a interposição, na via administrativa, pelo segurado de um apelo à Junta de Recursos.

De fato, a sistemática interna do INSS, um tanto quanto complexa, prevê que dentro de quinze dias da data prevista para cessação do benefício por incapacidade o segurado entre em contato com a agência previdenciária para fins de agendamento de nova perícia, em que será analisado seu Pedido de Prorrogação (PP).35

Caso negado esse pedido, o segurado tem direito a novo recurso, agora um Pedido de Reconsideração da decisão tomada pelo perito da autarquia federal (PR), o qual deverá ser interposto em até 30 dias da ciência do resultado negativo do Pedido de Prorrogação. Em caso de nova negativa, há possibilidade de recurso administrativo, também em até 30 dias da última decisão administrativa, para a Junta de Recursos (JRPS) do Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS).

Todo esse procedimento melindroso, levado a cabo pelo INSS, não teria maiores repercussões ao segurado (que efetivamente incapacitado, deve se apresentar junto ao órgão previdenciário para fins de demonstrar a sua incapacidade laboral atual), caso a perícia agendada para análise de PP e PR fosse sempre completa e adequada, sendo apresentados dados objetivos e bem fundamentados das decisões a serem tomadas, para bem ou para mal.

Na prática, embora venham sendo feitos permanentes ajustes nesses procedimentos médicos para a reavaliação das altas médicas programadas, ainda algumas perícias de PP e PR são sumárias, sendo negada a continuidade de benefício sem dados concretos e claros dos resultados dos exames médicos encaminhados pelo segurado à perícia. Todo esse cenário de desgaste na via administrativa acaba repercutindo fatalmente em número maior de demandas judiciais com pedido de antecipação de tutela, cujo objeto é o de restabelecimento liminar do benefício de caráter alimentar, com base na urgência do pleito e nas provas indiciárias de sumariedade da avaliação médica previdenciária, a qual não detectou um problema de saúde que, a toda evidência, se apresentava bem demonstrado documentalmente pelo segurado.

Diga-se, por derradeiro, que em sendo consagrada, no Brasil, a desnecessidade de exaurimento da via administrativa (Súmula 89 STJ), o segurado tem a possibilidade de ingressar com medida judicial, com pedido liminar, inclusive, logo após uma resposta negativa do Pedido de Prorrogação (PP), não sendo crível se exigir do segurado, ao pleitear a urgente manutenção de benefício de caráter alimentar, que aguardasse por prazo indefinido pela resposta da autarquia federal de Pedido de Reconsideração (PR) ou mesmo recurso à Junta de Recursos (JRPS).

Não pode o segurado, no entanto, ir ao Judiciário se o seu benefício está ativo ou se foi determinada data de cessação do benefício, mas ainda não encaminhou o segurado o seu pedido de Pedido de Prorrogação (PP) ou não teve ainda realizada a perícia por profissional do INSS que aponte para a manutenção ou a suspensão do benefício de caráter alimentar.36 Nessas hipóteses, ainda não há uma negativa administrativa (mínima) que justifique uma irresignação que mereça a pronta intervenção do Poder Judiciário.

Pode o segurado, respeitando esses termos, fazer a opção de recorrer administrativamente, em face de um indeferimento de PP ou PR, e, em havendo demora na solução do imbróglio, propor paralelamente uma demanda judicial, com pedido de tutela antecipada. Forçoso reconhecer, pela nossa experiência na prática previdenciária, que muitas vezes a liminar é deferida em casos em que há demora excessiva na resposta administrativa, mesmo que a causa litigiosa indique flagrantemente para o direito do segurado – como naquelas hipóteses, em que é concedida alta médica pelo INSS e o segurado encontra-se tão incapacitado que a própria empresa, no exame médico de retorno, aponta expressamente, e com maiores detalhes, para a inaptidão do trabalhador, determinando o seu retorno a benefício previdenciário.

O benefício provisório a ser requerido junto ao órgão previdenciário vem previsto na Lei de Benefícios (Lei n° 8.213/91) no artigo 59, in verbis:

“O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos”.

Trata-se de benefício concedido por prazo indeterminado, mantido até que seja formada conclusão segura sobre a estabilização do quadro infortunístico. A partir daí, o expert autárquico deve determinar: a) o retorno do trabalhador ao mercado de trabalho, quando estiver 100% apto; b) encaminhá-lo à reabilitação profissional, quando houver dúvidas sobre a real extensão da sua aptidão ou quando entender oportuno que passe por algum procedimento conservador antes de retorno ao mercado de trabalho;37 c) o retorno do trabalhador ao mercado de trabalho, com a contraprestação do auxílio-acidente, quando estiver apto com restrições definitivas às suas tradicionais atividades laborais; d) a transformação do benefício auxílio-doença na aposentadoria por invalidez, quando a convicção é a de que o obreiro não terá mais condições de retorno ao mercado de trabalho para desenvolvimento de atividade laboral que lhe garanta a subsistência.

No entanto, na hipótese de o trabalhador, em gozo de benefício e no aguardo de recuperação clínica, vir a óbito, será transformado o seu benefício auxílio-doença em pensão por morte. A pensão será devida mensalmente aos dependentes do acidentado, a contar da data do óbito, no valor correspondente a 100% do valor da aposentadoria por invalidez que teria direito na data do seu falecimento. Se houver mais de um dependente da mesma classe, a pensão por morte será rateada entre todos em partes iguais.38

O auxílio-doença é benefício que substitui a renda do trabalhador, tendo renda mensal inicial (RMI) de 91% do salário-benefício, razão pela qual se percebem, nesse momento, proventos um pouco abaixo daquela auferida “na ativa”. Por isso, o segurado no período em que estiver em gozo do benefício não pode se furtar à realização de qualquer perícia administrativa, assim que formalmente notificado pelo INSS, sob pena de imediata suspensão do benefício – indicando o art. 77 do Decreto n° 3.048/99 que o segurado só não está obrigado a seguir recomendação de tratamento cirúrgico e a transfusão de sangue, os quais seriam facultativos.39

O benefício tem, por regra, carência de doze meses, sendo que tal carência é excluída no caso de comprovação de acidente de trabalho ou quando as incapacidades forem de natureza não acidentária, mas consideradas de alta gravidade – previstas na Instrução Normativa INSS/PRES n° 45, de 06 de agosto de 2010 (art. 152),40 tais como Tuberculose ativa; Hanseníase; Alienação mental; Neoplasia maligna; Cegueira; Paralisia irreversível e incapacitante; Cardiopatia grave; Doença de Parkinson; Espondiloartrose anquilosante (Doença inflamatória aguda); Hepatopatia grave: (insuficiência crônica do fígado); Nefropatia grave (insuficiência crônica dos rins); Estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante); Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (HIV); e Contaminação por radiação (com base em conclusão da medicina especializada, a desencadear leucemia ou outros tipo de câncer).41

Nos casos então em que não há necessidade de carência, para fins de percepção do benefício previdenciário, basta ao segurado comprovar a sua qualidade de segurado ao tempo do início da lesão incapacitante – demonstrando, assim, que a sua incapacidade é proveniente de infortúnio desencadeado em momento posterior a sua vinculação ao regime do INSS.42 De fato, não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao RGPS já portador da lesão invocada como causa para a saída em benefício provisório, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa lesão.43

Em sendo acidentário, o auxílio-doença leva do sistema o código 91, sendo usualmente conhecido como “B91”; diferenciando-se assim do benefício de natureza não acidentária (rectius: natureza previdenciária), o qual leva do sistema o código 31, sendo usualmente conhecido como “B31”.

Dentre as grandes causas que motivam a concessão do B31 temos hoje no Brasil os acidentes de trânsito e os acidentes domésticos; já dentre os infortúnios que motivam a saída em B91 devemos lembrar as lesões por esforços repetitivos (LER) e as quedas ocorridas no ambiente de trabalho.

O empregado conhecedor dos seus direitos sabe, desde esse momento de requerimento administrativo de benefício, quais são as importantes diferenças entre um “B91” e um “B31”, e que motivam o pedido expresso para que haja a concessão do primeiro, a partir do reconhecimento da natureza acidentária do benefício provisório pleiteado. Ocorre que somente o auxílio-doença acidentário (“B91”) confere um ano de estabilidade ao obreiro após retorno deste ao ambiente de trabalho, bem como somente o auxílio-doença acidentário (“B91”) obriga o empregador a efetuar o depósito do FGTS na conta do empregado pelo período que o mesmo se mantenha vinculado ao órgão previdenciário – sendo as aludidas vantagens previstas, respectivamente, no art. 118 da Lei n° 8.213/91 e no art. 15, § 5°, Lei n° 8.036/90.44

Esses dois grandes resultados autorizam, aliás, que se recorra administrativamente ou se ingresse judicialmente, de imediato, tão somente para conversão do benefício provisório previdenciário em acidentário, já que mesmo que a perícia administrativa acabe por reconhecer a extensão da incapacidade (a “inaptidão”), se não reconhece a natureza acidentária da benesse (o “acidente de trabalho”), passa a trazer prejuízo de alguma ordem significativa ao empregado/segurado, o que pode possibilitar, por si só, o ingresso com demanda judicial.45 Nessa hipótese, de discussão exclusiva da natureza acidentária do benefício concedido, a interposição de recurso na via administrativa é uma mera faculdade, e não uma obrigação imposta ao segurado, que perfeitamente já poderia então acessar o Judiciário – justamente em face do teor da já anunciada Súmula 89 STJ.

Vê-se, pelas informações prestadas a respeito deste importante benefício, que o mesmo tem ampla saída nas agências do INSS, ainda mais o B31, tendo em conta envolver número bem superior de segurados habilitados a sua percepção. Ademais, o benefício assistencial por deficiência (B87), mencionado no início do nosso estudo, com ele não pode ser confundido, já que o LOAS é requerido por quem não é segurado (obrigatório ou facultativo) do sistema, sendo limitado o seu pagamento a um salário mínimo, não autorizando a concessão de pensão por morte e nem pagando a gratificação natalina (denominado de “abono anual” – nos termos do art. 40 da Lei n° 8.213/91). Ademais, o B87 somente é pago quando comprovado o quadro de miserabilidade do beneficiário e constatada a sua incapacidade por período mínimo de dois anos, sendo que o B31 já é pago a partir do 16° dia de incapacidade, frisemos – tudo a apontar que o sistema privilegia sobremaneira o cidadão que pode contribuir para a previdência, integrando as suas fileiras como segurado ativo do INSS.

Notas

23 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 5. ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 215/224.

24 GONÇALES, Odonel Urbano. Manual de direito previdenciário. São Paulo: Atlas, 1993, p. 82.

25 COSTA, Hertz J. Acidentes de trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003, p. 101.

26 STJ Súmula nº 89 – 21/10/1993 – DJ 26.10.1993. Ação Acidentária – Via Administrativa: “A ação acidentária prescinde do exaurimento da via administrativa”. Ainda oportuna a lembrança da Súmula TRF da 2ª Região n° 44: “Para a propositura de ações de natureza previdenciária é desnecessário o exaurimento das vias administrativas” (MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentários às súmulas previdenciárias. São Paulo: LTr, 2011, p. 223).

27 COSTA, Hertz J. Acidentes de trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003. p. 203/205.

28 PEDROTTI, Irineu A.; PEDROTTI, Willian A. Acidentes do trabalho. 4. ed. São Paulo: LEUD, 2003, p. 220.

29 Consultar a respeito: BERNARDO, Leandro Ferreira; FRACALOSSI, William. Direito previdenciário na visão dos tribunais. São Paulo: Método, 2009, p. 188/190.

30 Dentre os paradigmas jurisprudenciais analisados, cabe destaque: TRF4, AC 2007.71.99.006645-8/RS, Rel. Des. Luís Alberto D´Azevedo Aurvalle, Turma Suplementar, j. em 24/10/2007; TRF1, AC 200138000154546, Rel. Juiz Itelmar Raydan Evangelista, Primeira Turma, j. em 10/03/2008.

31 SANTANA ANDRADE, Verônica Chrithiane de. Alta programada de perícia médica criada pelo INSS é ilegal. Extraído do site Conjur: <http://www.conjur.com.br/2008-jun-18/alta_programada_pericia_medica_inss_ilegal>. Acesso em 31.01.2014.

32 SILVA FILHO, Fernando Paulo da. Período de benefício não renovado pela previdência social. Extraído do site Migalhas: <http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI177133,21048-Periodo+ de+beneficio+nao+renovado+pela+previdencia+social+suspensao>. Acesso em 31.01.2014.

33 Segue, parte de decisão judicial, que reconhece a ilegalidade do procedimento administrativo de concessão de alta médica programada: “(...) DO MÉRITO. Nessa seara, não é razoável a fixação de prazo para a fruição do benefício auxílio-doença, sob pena de se pôr em risco a sobrevivência dos beneficiários e a de suas famílias, tanto que os arts. 59 e 60 da Lei nº 8.213/91 assim determina: No mesmo passo, assim determina o art. 78 do Decreto nº 3.048/99, que regulamenta as Leis nos 8.212/91 e 8.213/91:Assim, para que o auxílio-doença seja suspenso ou cesse, deve ser verificado se o beneficiário encontra-se capacitado para o trabalho, através da devida perícia, o que cumpre ao INSS de forma contundente e não por mera presunção. Sob outro ângulo, não prospera o argumento de que o segurado pode solicitar exame médico-pericial se não estiver apto para o trabalho ao término do prazo de duração do auxílio-doença, tendo em vista que é dever da Autarquia Previdenciária convocar o segurado para a submissão ao exame, e não o contrário. Posto isso, concedo a tutela antecipada requerida para determinar ao réu que cesse a prática ilegal denominada de “Data de Cessação de Benefício DCB – ou de “Alta Programada”, prevista no Decreto nº 5.844/06, não suspendendo os benefícios previdenciários do auxílio-doença antes da constatação do efetivo fim da incapacidade laborativa do segurado beneficiário, através do agendamento de nova perícia médica, nos casos existentes nas suas agências e postos situados nos Estados integrantes do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, impondo a multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais reais) caso haja descumprimento ainda que parcial desta decisão. Intime-se o réu para cumprir esta decisão, citando-o, em seguida, para responder a ação, no prazo legal. Aracaju, 5 de fevereiro de 2009. Juiz Edmilson da Silva Pimenta” (Seção Judiciária do Estado de Sergipe. Processo nº 2008.85.00.002633-8. Ação Civil Pública: 2008.85.00.002633-8.Partes: Autor: Defensoria Pública da União. Réus: Instituto Nacional do Seguro Social).

34 O INSS, confirmou por intermédio de Instrução Normativa, o COPES – Cobertura Previdenciária Estimada, conhecida como alta programada, pretendendo reduzir o número de perícias médicas, as filas, e consequentemente, melhorar o atendimento. Inúmeras ações foram ajuizadas contra o novo sistema, dentre as quais 16 ações civis públicas, onde foram concedidas algumas medidas liminares. O Superior Tribunal de Justiça, pelo julgado CC 66732, D.J. 02.10.2006, entretanto, cassou todas e manteve o COPES (VIANNA, João Ernesto. Curso de direito previdenciário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 535).

35 Evidentemente que nos casos de Pedido de Prorrogação (PP), e se o INSS não conseguir marcar a perícia antes da data de cessação prevista inicialmente, o órgão previdenciário deve manter o pagamento de benefício ao segurado até que nova perícia possa ocorrer – a respeito, consultar: KRAVCHYCHYN, Gisele Lemos. Do direito à continuidade de pagamento em casos de pedido de prorrogação do benefício de auxílio-doença in Revista Jurídica da Universidade do Sul de Santa Catarina n° 7 (2013): 203/210.

36 Anota, de maneira geral, Monteiro e Bertagni que a propositura da ação nessas hipóteses só se justifica se a autarquia permanecer por um tempo muito prolongado sem uma definição sobre o término do auxílio-doença (alta médica) ou aposentadoria (MONTEIRO, Antônio Lopes; BERTAGNI, Roberto Fleury de Souza. Acidentes do trabalho e doenças ocupacionais. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 142).

37 PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS NECESSÁRIOS. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício de outras atividades laborais. Assentando o Tribunal a quo estarem demonstrados os requisitos necessários à concessão do benefício previdenciário, a alegação em sentido contrário, em sede de recurso especial, exige o exame do acervo fático-probatório, procedimento vedado a teor da Súmula 7/STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento (STJ, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, AgRg-AREsp 220768/PB j. em 06.11.2012).

38 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 5. ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 230.

39 PAIXÃO, Floriceno; PAIXÃO, Luiz Antônio C. A previdência social em perguntas e respostas. 40. ed. Porto Alegre: Síntese, 2004, p. 128.

40 Informações retiradas do site Dataprev <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/38/inss-pres/2010/45_1.htm>. Acesso em fevereiro/2014.

41 AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. CONCESSÃO. CARÊNCIA. NEOPLASIA MALIGNA. DESNECESSIDADE. ART. 151 DA LEI DE BENEFÍCIOS. 1. Para a concessão da antecipação dos efeitos da tutela, é necessária a presença dos requisitos previstos no art. 273 do CPC, quais sejam: a verossimilhança das alegações e o periculum in mora. 2. A cardiopatia grave isenta da carência contributiva para fins de concessão de auxílio-doença, nos termos do art. 151 da Lei nº 8.213/91. 3. O beneficio alimentar, na proteção da subsistência e da vida, deve prevalecer sobre a genérica alegação de dano ao erário público mesmo ante eventual risco de irreversibilidade – ainda maior ao particular, que precisa de verba para a sua sobrevivência. (TRF4, Agravo De Instrumento nº 0024458-83.2010.404.0000, 6ª Turma, Des. Federal Luís Alberto D Azevedo Aurvalle, por unanimidade, D.E. 19/11/2010).

42 PEDROTTI, Irineu A.; PEDROTTI, Willian A. Acidentes do trabalho. 4. ed. São Paulo: LEUD, 2003, p. 118.

43 PROCESSUAL CIVIL – PREVIDENCIÁRIO – AGRAVO PREVISTO NO ART. 557, § 1º, DO CPC – APOSENTADORIA POR INVALIDEZ – PREEXISTÊNCIA. DESCARACTERIZAÇÃO. I – O laudo pericial aponta que a enfermidade que acomete o autor lhe acarreta limitação para atividades laborativas de natureza total e permanente. II – O afastamento do trabalho deu-se em razão da progressão ou do agravamento de sua doença, fato este que afasta a alegação de doença preexistente e autoriza a concessão do benefício, nos termos do § 2º, do art. 42, da Lei 8.213/91. III – Agravo previsto no art. 557, § 1º, do CPC, interposto pelo INSS, improvido (TRF da 3ª Região, Proc. 0011381-73.2011.4.03.9999-SP, 10ª T., Rel.: Des. Fed. Baptista Pereira, j. em 14/01/2014, e-DJF3 22/01/2014).razão da progressão ou do agravamento de sua doença, fato este que afasta a alegação de doença preexistente e autoriza a concessão do benefício, nos termos do § 2º, do art. 42, da Lei 8.213/91. III – Agravo previsto no art. 557, § 1º, do CPC, interposto pelo INSS, improvido.” (TRF da 3ª Região, Proc. 0011381-73.2011.4.03.9999-SP, 10ª T., Rel.: Des. Fed. Baptista Pereira, j. em 14/01/2014, e-DJF3 22/01/2014).

44 ACIDENTE DE TRABALHO. AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO EM BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. CABIMENTO. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO. SENTENÇA EXTINTIVA DO PROCESSO DESCONSTITUÍDA. O auxílio-doença acidentário possibilita a estabilidade de emprego e o depósito do FGTS, evidenciando o interesse de agir da demandante que postula a conversão da natureza do benefício previdenciário em acidentário. Decreto de carência de ação afastado. Sentença desconstituída. (Apelação Cível nº 70020776845, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Antônio Kretzmann, Julgado em 18/10/2007).

45 APELAÇÃO REEXAME NECESSÁRIO. ACIDENTE DE TRABALHO. INSS. CONVERSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO EM AUXÍLIO DOENÇA ACIDENTÁRIO. POSSIBILIDADE. NEXO CAUSAL COMPROVADO. INTERESSE DE AGIR DO POSTULANTE. 1. Verificando-se que somente os benefícios de natureza acidentária conferem ao segurado a garantia de emprego, conforem disposto no artigo 118, da Lei n. 8213/1991, não há falar em ausência de interesse de agir ao ser pleiteada a conversão do benefício de natureza previdenciária em acidentária. 2. Comprovado o nexo causal entre a atividade funcional desenvolvida pelo autor e a moléstia que gerou o pagamento de benefício pelo INSS, mostra-se adequada à conversão do auxílio doença previdenciário em auxílio doença acidentário (...). PRELIMINAR REJEITADA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO (Apelação e Reexame Necessário nº 70035651082, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mário Crespo Brum, Julgado em 08/07/2010).