Tabânidas do Brasil e de alguns Estados vizinhos*

Segunda memória

O presente estudo faz continuação a um outro publicado nestas Memórias em 1913 (Tomo V, Fasc. II) que tratava das Diachlorinae e Lepidoselaginae. Apareceu depois um artigo “Sobre a sistemática dos tabanídeos, subfamília Tabaninae” que pedimos consultar também. Damos em seguida uma nota adicional à memória sobre as Diachlorinae e continuaremos o estudo dos tabanídeos, seguindo a orientação indicada no segundo artigo.

Nota adicional ao gênero Diachlorus

Recebemos alguns exemplares de Diachlorus distinctus, colecionados pelo Dr. L. Travassos em Japuíba, perto de Angra dos Reis (estado do Rio de Janeiro). Mostravam algumas aberrações, sendo que, muitas vezes, o dorso do primeiro anel é escuro apenas na parte média (que corresponde às faixas laterais unidas anteriormente) e amarelo ou avermelhado nas partes laterais. O mesmo achei constantemente em seis exemplares que colecionei em São Bento, no interior do estado de Santa Catarina. Nestes, porém, o fêmur e a metade apical do par médio, em vez de amarelos, são distintamente pardos. Todos esses exemplares também são menores e as asas são mais amarelas na base e na costa. Podem ser considerados como variedade local e denominados D. distinctus, var. catarinensis.

O exame de numerosos exemplares, colecionados pelo Dr. Pedroso no Noroeste de São Paulo, confirmou observações anteriores; sobre a existência de formas, intermediárias entre os Diachlorus bimaculatus e flavitaenia, mas aproximando-se mais do último. No dorso do abdome, as partes laterais, de regra escuras nesta espécie, aparecem mais claras, deixando reconhecer manchas mais escuras (semelhantes às que aparecem no bimaculatus) sobre fundo claro. Posto que nessa região apareçam as duas formas típicas, determináveis à primeira vista, não considero essas formas como híbridas, supondo antes tratar-se de duas espécies que não acabaram de se separar completamente; conheço fatos análogos em outros gêneros.

1. Tabaninae Schistocerae

Tratarei em primeiro lugar das Tabaninae Schistocerae, começando com o gê-nero Acanthocera, estabelecido por Macquart. Como espécie típica deve ser considerada a longicornis, completamente diferente de todas as espécies do velho mundo. Esta foi colocada por Fabricius entre os Tabanus e por Wiedemann, embora com algumas dúvidas, entre as Haematopota. O grande número de espécies afins, que existe na América do Sul, prova claramente que se trata de um gênero indígena bem caracterizado.

A respeito deste gênero Schiner (L. 5) fez algumas considerações cuja tradução dou em seguida:

O gênero Acanthocera, estabelecido por Macquart nas Suites à Buffon, não foi por ele delimitado bastante bem, para poder distingui-lo seguramente de Dichelacera. Diz que o dente antenal se acha na base do primeiro e segundo artículo, o que é completamente falso, porque se acha (como em todas os tabanídeos, onde existe) na base do terceiro artículo. Que não se trata apenas de um erro de impressão resulta do fato que Macquart, na sua chave de família (Diptères exotiques 1,90), coloca o gênero Acanthocera entre os que são destituídos de processo lateral no terceiro artículo antenal. Macquart não conhecia espécie alguma de Acanthocera quando estabeleceu o gênero, que por esta razão não podia definir corretamente. Aproveitou apenas os dados de Wiedemann e a observação deste, que a Haematopota longicornis não se adaptava bem ao gênero Haematopota, para estabelecer, um pouco precipitadamente, um novo grupo genérico. Isto resulta também claramente de ter descrito uma espécie de Dichelacera, dando-lhe casualmente o nome de Dichelacera longicornis (F. W.). O caráter mais essencial, para distinguir os gêneros Dichelacera e Acanthocera, é a estrutura das antenas. Estas em Acanthocera são muito compridas e porretas, sendo o primeiro artículo quase tão longo quanto o terceiro, e este dividido em anéis aproximadamente iguais. Em Dichelacera o primeiro artículo antenal, de fato, também é um tanto alongado, o que ao lado da forma delgada do corpo é o único caráter seguro para separá-la de Tabanus, mas sempre é consideravelmente mais curto do que o terceiro que pela forma e a anulação parece ao dos Tabanus com dente basal comprido. O gênero Acanthocera pertence à divisão das Tabanidas, sendo mais afim de Dichelacera que de Haematopota.

O caráter principal parece ter escapado a Schiner, a saber a semelhança com himenópteros indígenas, que influiu de tal modo sobre o aspecto, que resultou uma transformação, gradual, mas atingindo um alto grau, tanto nas antenas, como no abdome. Em cinco espécies, em conseqüência disso desapareceu do processo antenal. O estreitamento característico do abdome varia bastante e em duas chegou ao ponto de lembrar as vespas. Também a forma da fronte sofreu modificações.

O gênero Acanthocera, sem dúvida bem justificado, não aumentou em espécies depois dos tempos de Macquart, Walker e Schiner; tenho porém de ajuntar várias espécies novas e, por isso, parece acertado reunir os caracteres que são comuns às espécies por mim observadas:

Tabanídeos quase glabros, de tamanho médio ou pequeno e relativamente estreitos, de aspecto geral bastante original, lembrando mais ou menos as vespas e mostrando matizes pretos ou pardos com pêlos dourados, dispostos no escudo em estrias e no abdome em cintas. A face inferior, no meio, calosa (glabra, convexa e luzidia), escavada em forma de goteira dos lados; a calosidade frontal grande e larga, mas de forma bastante variável, a fronte (nas fêmeas) assaz larga; não há ocelos; olhos com três listras verdes, duas paralelas e diagonais e uma seguindo a margem posterior. Antenas sempre bastante compridas, mas variando na sua forma, com o primeiro segmento mais ou menos alongado, estreito na base, o terceiro comprido, pontudo ou claviforme, porém nunca curvado para cima; o galho lateral pode faltar ou existir, mais ou menos desenvolvido, mas sempre de forma bastante reta. Asas nunca hialinas e raras vezes sem desenho, geralmente com faixas escuras, formando, quando bem desenvolvidas, um triângulo com os lados, mais ou menos paralelos às margens das asas; muitas vezes são reduzidas a uma ou a duas. Tórax quase glabro; o escudo, muitas vezes, com as duas estrias longitudinais e duas faixas transversais muito curtas, nascendo na raiz das asas; e cobertas com pêlos amarelos, como também os há geralmente no escutelo. Abdome subcilíndrico, arredondado no ápice, com achatamento dorsoventral e com estreitamento, mais ou menos forte, na extremidade do segundo anel; quando muito forte, o aspecto geral lembra muito a aparência das vespas. O desenho consiste em faixas transversais cor de ouro ou latão. Pernas de duas cores, mas sem tipo especial, apenas as tíbias anteriores um tanto curvadas. Os machos são geralmente desconhecidos. As fêmeas são observadas durante o dia, quando atacam, de preferência nas pernas, os cavalos de cujo sangue são ávidas; confun-dem-se então com himenópteros que costumam, em dias quentes, lamber o suor desses animais. Raras vezes atacam também pessoas. Que podem também visitar flores fica demonstrado pela tromba de uma fêmea de A. longicornis, mas o fato parece excepcional, sendo completamente desconhecido dos colecionadores de himenópteros. O gênero é exclusivamente americano e representado especialmente nas zonas mais quentes da América do Sul. Desse gênero conheço cinco espécies descritas e seis novas. Entre elas há algumas que divergem bastante do tipo mais comum; todavia as afinidades prevalecem e não permitem dúvidas sobre a sua posição. Com exceção do Tabanus sylveirii (que coloco entre as Haplocerae, em novo gênero correspondente), não conheço mutucas americanas que se possam confundir com espécies de Acanthocera. Se os antigos autores as colocaram no gênero Haematopota, não representado na América, foi apenas por não achar outra colocação.

Passo agora à descrição das espécies:

No seu catálogo Kertész menciona as espécies seguintes: Acanthocera longicornis Fabr., exstincta Wied. e trigonifera Schin.; falta a coarctata Wied., que constitui uma boa espécie. A. marginalis Walk., outra espécie boa, é considerada erroneamente como sinônima de exstincta Wied.; cita também A. triangulares

Wied. como sinônima de longicornis de Fabr., o que já foi indicado pelo próprio Wiedemann.

Temos assim cinco espécies já conhecidas: A. longicornis F. , exstincta e coarctata Wied., marginalis Walker e trigonifera Schiner. Acrescem mais seis espécies novas, a saber: tenuicornis, nigricorpus, anacantha, intermedia, quinquecincta e cristalis.

As espécies podem ser facilmente reconhecidas pelas estampas ou determinadas pela chave seguinte:

Começo com a descrição das espécies já conhecidas, mencionando em primeiro lugar:

1. Acanthocera longicornis(FABR.)

(Sin. Tabanus longicornis – FABR. Ent. Syst. IV,371,38; Syst. Anti. 103, 45. Haemat. triangularis – WIED. Zool. Magaz. III. 44.6)

Tradução da descrição original de Wiedemann: (L. 8, 1, 123):

Delgada, preta, com linhas cor de latão; asas com a costa, uma mancha semilunar e uma estria parda. Comprimento 6 linhas ♀. Do Brasil.

Fabr. Ent. Syst. IV. 317.38 (Texto latim): Tabanus longicornis: oculis maculatis, alis dimidiato fuscis: macula alba, antennis longiribus.

Reliquis minor, antennae elongatae, cylindricae longitudine thoracis, in medio unidentalae fuscae, basi pallescentes. Oculi basi fusci, apice pallidiores arcu maculaque fuscis. Thorax fuscus lineis dorsalibus flavis, quae tamen basin haud altingunt. Scutellum flavescens. Abdomen cylindricum fuscum segmento primo et secundo basi striga flava. Alae ad marginem crassiorem fuscae macula magna, media triangulari, alba.

Raiz das antenas pardo-amarelada, artículo terminal preto, na base com espinho comprido e curvado, face inferior branco-amarelada, com calo preto triangular, cuja ponta é virada para as antenas, e de cada lado com dois pontos pretos luzidios. Palpos pardo-enegrecidos; fronte amarelada, imediatamente por trás das antenas com calo preto quase quadrado, contendo de cada lado um tubérculo arredondado, acima desta e da estria que dele nasce um segundo calo, alongado, estendendo-se até ao occipício, sendo dividido no meio por uma pequena faixa branco-amarelada, interrompida. Escudo preto luzidio, com duas linhas longitudinais, cor de latão; por diante e um pouco acima da base das asas uma mancha de pêlos, cor de latão, que emite uma estria da mesma cor obliquamente para trás, abaixo da base da asa; escutelo com pêlos cor de latão. Abdome preto, brilhante mas pouco carregado, as primeiras três incisões amarelas, tanto no dorso como no ventre; na margem lateral do primeiro segmento uma manchinha transversal. Asas hialinas. Margem anterior pardo-amarelada e, contínua com esta, uma grande mancha semilunar oblíqua, cuja concavidade é virada para o ápice; da base corre uma estria oblíqua, parda, porém amarela na base, até a extremidade interior da mancha semilunar, com a qual conflui na última nervura, de modo que as partes da asa incluem um triângulo hialino. Pernas pardas, base das tíbias brancas, primeiro tarso pardo amarelado. Na minha coleção.

Trata-se de uma espécie aberrante, tendo tantas afinidades com vários gêneros que se poderia ficar na dúvida, onde deve ser colocada. A forma e a estrutura da cabeça aproximam-se mais de Chrysops, mas faltam os ocelos. As antenas diferem de todas as espécies de Tabanus porque o terceiro artículo é fusiforme, achatado com 5 segmentos. Antenas do comprimento do tórax, o primeiro segmento cilíndrico ocupando 1/3 do comprimento total, o segundo pela metade mais curta quase ciatiforme. Nervuras das asas como em Haematopota.

Como já ficou dito nas observações de Schiner, acima reproduzidas, Macquart também descreveu esta espécie, mas não debaixo do nome Acanthocera, por ele criado. A sua descrição de Dichelacera longicornis é acompanhada de uma figura, que não deixa dúvidas sobre a identidade, dispensando-se assim a reprodução da descrição. Macquart salientou as diferenças consideráveis que apresenta com as outras espécies de Dichelacera.

A espécie é citada também por Schiner e por Miss Ricardo, que menciona dois exemplares procedentes do Brasil e guardados no British Museum.

Deixo de entrar na descrição da espécie, referindo o leitor à estampa que vai junto.

A. longicornis não é rara no litoral do Rio de Janeiro, acompanhando a costa até Santa Catarina. Em Minas e Espírito Santo, foi encontrada também, mesmo bastante distante da costa, em lugares mais elevados, como São Paulo do Muriaé (Dr. Braune leg.) e Mar de Espanha (Zikán leg.). Aparece pelo menos de outubro até janeiro. O macho não é conhecido.

2. Achantocera exstincta (WIED.)
(Syn. Haematopota exstincta WIED.)

Tradução da descrição original (L. 8, v.1, 214):

Preta: escudo com linhas douradas, abdome com cintas da mesma cor, asas pardacentas nas costas. – 4 1/2 linhas ♀. – De Montevidéu ao Brasil. Afim da última espécie, porém menos delgada; terceiro artículo antenal um tanto mais curto, apenas com espinho muito diminuto na base. Nas asas apenas a base ínfima, uma tarja larga na costa e a margem da nervura penúltima pardacentas. Pelo resto tudo tal qual a última espécie, sendo todavia todas as incisuras amarelas. – Na minha coleção e no museu de Berlim.

A estampa é tirada de um exemplar proveniente do Rio da Prata; não sei se atualmente existe em território brasileiro. A espécie parece bastante rara.

3. Acanthocera coarctata (WIED.)
(Syn. Haematopota coarctata WIED.)

Tradução da descrição original (L S,1p.578):

Preta, com abdome estreitado na base e mostrando uma cinta castanha com margens brancas e asas pardacentas nas costas. – 5 1/2 linhas ♀. – Do Brasil.

Pertence à categoria que contém a Haem. longicornis e exstincta e me inclino quase a pensar que seja o outro sexo de exstincta, porque também o ápice do abdome se distingue dos dois exemplares de exstincta e de três exemplares de longicornis na minha coleção, por diminuir rapidamente em largura, quando os cinco, todos, têm a extremidade do abdome quase sem estreitamento e tampouco uma parte mais estreita na base.

Antenas compridas, como em longicornis, mas o dente na base do terceiro artículo mais curto e por isso mais parecido com o da exstincta: a cor do artículo basal pardacenta, o seguinte mais enegrecido, o terceiro preto. Face inferior muito luzidia, palpos pardacentos pretos com pouco brilho, fronte pardacenta preta. O escudo, muito pelado, pardacento preto, com os cantos mais ou menos pardo-avermelhados: que houve linhas ou estrias é claro, e dos pelinhos amarelos, que persistem na margem do escutelo, pode-se concluir que foram de cor amarela. O primeiro anel do abdome é um tanto brilhante e de cor pardacenta, com estreita tarja branca na margem posterior e, adiante desta, em largura pouco maior, preta escura; segundo segmento da mesma cor, apenas com a diferença que aqui a faixa branca estreita também passa a face ventral, formando uma espécie de cinta; os cinco segmentos seguintes pardacentos pretos, sem desenho algum, com pêlos muito finos e curtos, esbranquiçados ou amarelados, que só aparecem com uma certa incidência da luz. Abdome total um tanto claviforme. Asas amareladas, largamente castanhas na costa. Halteres pardos com capítulo amarelo. Fêmures pretos: os de diante mais ou menos pardos; tíbias pretas: pés amarelados, ambos com pelinhos brancos, muito curtos, de modo que vistos em certa direção parecem completamente brancos, especialmente os pés; joelhos castanho-amarelos e o extremo ápice dos pés castanho; os quadris de frente alongados. – Na coleção de Westermann.

A descrição de Wiedemann e a estampa bastam para fazer reconhecer a espécie que, durante o verão, não é muito rara nas montanhas do Rio de Janeiro e de São Paulo até uma altura de 1.200 metros, ao menos. A semelhança dessa espécie com certas vespas é muito acusada.

4. Acanthocera marginalis WALKER
(L.6, V, p.268)

Tradução da descrição original:

Fêmea. Pícea. Cabeça na frente com calo triangular e outro, maior e quase redondo, abaixo das antenas. Antenas do comprimento do tórax, testáceas na base; terceiro artículo com chifre bastante comprido; os segmentos distais de comprimento quase igual e mais curtos do que o terceiro. Tórax com duas estrias dorsais paralelas, estreitas, de amarelo dourado e de cada lado com mancha da mesma cor. Escutelo amarelo dourado. Primeiro, segundo e terceiro segmentos abdominais com margem posterior de amarelo dourado. Pernas píceas; tíbias e tarsos brancos em direção à base; as do meio totalmente brancas. Asas hialinas, pardas na margem anterior, e com estria parda entre as nervuras subanal e anal em direção ao ápice; primeiro galho da nervura cubital simples, formando perto da base um ângulo bem acusado, um tanto obtuso; nervura subanal e anal unindo-se perto da margem. Comprimento do corpo 4 linhas; das asas, 8 linhas. a. Pará. Da coleção do Sr. Bates.

Sobre a mesma espécie escreve Miss G. Ricardo (L 3, Ser. 7, v.14, p.363):

Acanthocera marginalis, ♂♀, Walker.

Uma fêmea (tipo) de Pará, Brasil (Col. Bates), 51, 147; um macho do Rio Amazonas Brasil (Bates Col.), 66, 53; uma fêmea da mesma localidade (Saunders Col.), 73, 34; uma fêmea, Ega, Rio Amazonas (Bates Col.), 66, 53.

Espécie castanha, com estrias no tórax e cintas no abdome de amarelo dourado, as asas quase claras e sem faixa escura atravessando o meio da asa. Face castanha, abaixo das antenas castanha brilhante, dos lados preta com tomento esbranquiçado, a fronte castanha, o calo frontal acima das antenas triangular com a ponta virada para o vértice, duas estrias cinzentas, partindo dos lados do triângulo encontra-se no ápice. Antenas mais longas do que o tórax; os dois primeiros artículos amarelos com pubescência preta, o primeiro comprido, o segundo apenas da metade do comprimento daquele, cilíndrico, o terceiro quase três vezes mais longo do que o primeiro, com a base ruiva e depois castanha, de grossura igual, com exceção da base ínfima onde começa o dente, sendo um tanto mais grossa, e do ápice, que se torna mais fino; o dente comprido alcança o segundo anel, sendo os últimos quatro anéis todos de comprimento igual e, no conjunto, mais longos do que o primeiro. Tórax castanho preto, duas estrias amarelas e uma mancha amarela lateral, formada de pubescência amarela; o peito da mesma cor com uma estria amarela, continuada da mancha, com tomento e pêlos cinzentos; escutelo amarelo. Abdome castanho avermelhado, nos outros exemplares enegrecido, com cintas amarelas pubescentes na margem posterior dos dois primeiros segmentos e uma cinta pubescente branca no terceiro; a cinta branca falta em dois exemplares, sendo amarela no terceiro; a pubescência no dorso preta, alguns pêlos brancos nos segmentos anteriores, o lado ventral com duas cintas brancas. Pernas castanhas, a base das tíbias anteriores e posteriores, as do meio inteiras e o primeiro artículo tarsal de todas brancos, em alguns exemplares as tíbias do meio são inteiramente castanhas ou apenas brancas na base. Asas com a margem anterior até o ápice, a base ínfima e o ápice da célula anal pardos.

Comprimento 10mm.

A espécie parece muito espalhada no território do Amazonas, mas antes escassa. Entre o meu material abundante, procedente dessa zona, só existe desta espécie uma fêmea pouco bonita que apanhei em um cavalo em Peixe-boi, entre Belém e Bragança, sendo representada na estampa. Em todo o território não se conhece outra espécie de Acanthocera.

É singular que Miss Ricardo mencione o macho sem descrição de qualquer Acanthocera desse sexo. Verifiquei que apresenta apenas as diferenças habituais, principalmente a confluência dos olhos.

5. Acanthocera trigonifera SCHINER
(L. 5, p.95)

Tradução da descrição original:

Magnífica espécie nova. Castanho-preta; escudo com duas estrias longitudinais, amarelas estreitas e afastadas, e uma mancha da mesma cor adiante da base de cada asa; pleuras com manchas amarelas; escutelo pardo-ferruginoso. Abdome pardo-mate, o primeiro e o segundo anel, cada um com triângulo preto aveludado, tarjado de amarelo dourado, cuja base larga abraça toda a largura do anel, enquanto o ápice, no primeiro anel, alcança a margem anterior, ficando muito aquém no segundo anel; ventre com duas cintas branco-amareladas, a primeira ocupando a margem anterior e posterior dos anéis, a segunda mais estreita na margem posterior do segundo anel. Cabeça preta, a face inferior regularmente abaulada, muito brilhante nas margens oculares e, dos lados, com brilho esbranquiçado; fronte branco-cinzenta, com calo preto brilhante, continuado até o vértice por linha elevada; antenas amarelas na base, depois castanhas, o primeiro artículo quase quatro vezes mais longo do que o segundo; o terceiro assaz mais comprido do que o primeiro, em cima com prolongamento basal muito pontudo, alcançando o meio do artículo; palpos do comprimento da tromba, estreitos e um tanto curvos, ferruginoso-pardacentos; a tromba de comprimento médio. Pernas pardo-amareladas, tíbias anteriores apenas na base extrema, as médias em toda a extensão, as posteriores na metade basal, brancas. Asas pardo-enegrecidas com mancha triangular hialina no meio, ocupando precisamente as células basais e com margem hialina muito estreita, mais estreitada ainda na região da célula anal. Halteres pardo-enegrecidos. 5'.

Três fêmeas da América do Sul.

A espécie é facilmente reconhecida. A estampa mostra um exemplar proveniente da Venezuela, que parece a pátria de quase todas as espécies que Schiner designou como “Da América meridional”.

6. Acanthocera tenuicornis n. sp.

Comprimento 13-14mm. Cor geral parda até preta. Asas, na maior parte, pardacentas.

Probóscide preta; palpos compridos e estreitos, de cor castanha escura, mate; antenas com artículos basais e o dente do último de cor pardo-amarelada, resto de cor castanha; o dente do último artículo é fino, quase reto e não atinge o ápice do segmento basal; os outros quatro segmentos são pouco grossos e diminuem gradualmente; todo o artículo muito curto. A face é formada por uma calosidade brilhante, de cor castanha avermelhada, aos lados da qual há uma depressão bastante profunda; o resto é castanho, mais mate e escuro, com um pouco de pó amarelo nas margens dos olhos e entre as antenas e o calo frontal; este é quadrangular, mais largo do que alto, castanho avermelhado, prolongando-se numa ponta em forma de crista. A fronte, bastante larga entre os olhos, estreita-se um pouco em direção do occipício e mostra pó amarelo sobre fundo preto. Olhos pretos com as três faixas verdes, típicas do gênero. Occipício coberto de pó cinzento, tornando-se amarelo nas margens oculares; barba cor de ouro.

Tórax castanho, em cima com duas estrias longitudinais, submedianas, apagando-se na metade posterior; há nele pêlos dourados escassos e outros, mais abundantes, adiante e embaixo da raiz das asas e na parte anterior da face inferior.

Abdome castanho-avermelhado, enegrecido nos últimos segmentos, estreitando-se no ápice do segundo anel; os três primeiros segmentos com distintas faixas apicais de pêlos curtos, dourados; mais por trás existem também pêlos dourados, curtos, mas bastante afastados entre si, tornando-se todavia um pouco mais abundantes nas margens posteriores dos segmentos; embaixo a margem posterior do segundo e terceiro segmentos e a margem lateral do primeiro com faixas branco-amareladas.

Asas hialinas, com a costa e a margem anterior pardo-amarelada; uma faixa em forma de crescente estende-se do ápice até a ponta da célula anal, sendo quase interrompida quando passa na discoidal; a segunda célula basal hialina; a discoidal e a célula apical, em parte, e a margem côncava da faixa em crescente também são hialinas; a célula anal, amarelada na base, torna-se preta onde conflui com a faixa; a célula axilar é ligeiramente enfuscada; o resto da margem posterior é ocupada por uma mancha parda.

Pernas em geral de cor castanha, ora mais amarelada, ora enegrecida; as tíbias anteriores quase completamente brancas, as últimas pelo menos na metade basal. Escâmulas enegrecidas, com margem quase preta. Balancins com pedúnculo e face terminal do capítulo amarelados, o resto castanho.

A espécie foi encontrada, com bastante freqüência, na serra de Cubatão, durante o verão, ficando porém o macho desconhecido. Existe também na serra da Mantiqueira (Pacau) onde foi encontrada em fevereiro.

7. Acanthocera nigrocorpus n. sp.

Comprimento 15mm. – O corpo inteiro preto, apenas com subpubescência esbranquiçada nas tíbias anteriores e na parte basal do terceiro par.

A calosidade facial e a parietal são castanho-avermelhadas, o procalo e a fronte têm um brilho esbranquiçado, como também duas estrias longitudinais submedianas na parte anterior do escudo; os palpos, as margens do escudo e o segundo segmento abdominal têm um pouco de vermelho misturado com o preto, como também as margens posteriores dos segmentos abdominais são mais claras do que o resto, apresentando, principalmente no lado inferior, um brilho branco, produzido por pêlos finos e brancos, ocupando um fundo mais claro do que o resto.

Asas amareladas, as nervuras subcostal e anal ferrugíneas, as outras de um amarelo mais ou menos enegrecido; uma pequena mancha escura na embocadura do ramo principal da célula forquilhada; escâmulas castanho-escuras com margens quase pretas; balancins castanho-claros.

Pelo resto a espécie segue os caracteres do gênero; há um ligeiro estreitamento entre o segundo e o terceiro anel abdominal.

Descrito de um só exemplar feminino, desenhado em perfeito estado, mas hoje um pouco defeituoso. Acredito que provém de Joinville em Santa Catarina, tendo sido mandado pelo Sr. Schmalz.

8. Acanthocera anacantha LUTZ & NEIVA

Comprimento total cerca de 12mm. Cor geral preta; asas com a margem costal enegrecida.

Antenas de quase 4mm de comprimento, artículo basal fino e bastante comprido, segundo menos da metade do primeiro, porém um pouco mais grosso, terceiro maior e mais grosso do que os dois primeiros juntos, com segmentos, sendo o primeiro mais comprido e os três do meio mais curtos do que o terminal; não há vestígio de dente no último artículo; a cor das antenas é castanha, quase preta no último e quase clara na base do primeiro artículo. Palpos cor de piche escura. Face lisa e brilhante, fronte preto-mate, com calosidade transversal elíptica; olhos escuros com zonas verdes típicas.

Tórax preto-mate; escutelo um pouco lustroso, saliente.

Abdome: O primeiro anel é chanfrado e quase dividido na linha média, formando dos dois lados uma espécie de válvula que cobre a parte ventral, inteiramente preta; o resto do anel tem o bordo posterior e exterior largamente dourado, com uma zona preta premarginal; segundo anel com o bordo posterior com tarja amarela apical e zona preapical preto-escura; abdome preto-mate, mostrando uma constrição no bordo posterior do segundo anel; assim a parte anterior torna-se cônica, sendo a parte posterior apenas subcônica e distintamente achatada no sentido dorsoventral (principalmente na porção apical) e com convexidade superior bastante pronunciada. Base do terceiro anel glabra, preto-escura, o resto do fundo preto-mate com pelinhos amarelos.

Pernas de cor geral preta; os tarsos e os joelhos castanho-claros, as tíbias e as coxas com pubescência prateada e dourada.

Asas transparentes, o bordo anterior distintamente enfuscado, mas com o centro das células mais claro; estigma e pedúnculo da nervura forqueada mais escuros; células basais e anal ligeiramente enfuscadas, tendo a primeira basal os dois terços da mesma cor escura, como o bordo anterior; escâmulas escuras, com bordo claro; balancins com pedúnculo branco-amarelado e capítulo escuro.

Todo o inseto apresenta do modo mais perfeito a semelhança com certos himenópteros, a qual, embora geralmente em grau menor, constitui um caráter de todo esse gênero; assemelha-se bastante com a A. coarctata Wied., da qual se distingue facilmente pela ausência completa do dente antenal.

Descrito de muitos exemplares fêmeos apanhados nas margens do Rio Tietê, desde o salto de Avanhandava até a confluência com o Paraná onde é encontrada também na margem oposta, em território de Mato Grosso. Esta espécie é subcrepuscular e ataca também o homem.

9. Acanthocera intermedia n. sp.

A espécie, figurada na Estampa 1, ocupa um lugar intermediário entre a última e A. coarctata. Escudo, dorso do abdome e extensão da tarja preta da margem anterior correspondem completamente ao que se observa na Acanthocera coarctata, como também a cor do fundo. As antenas não mostram, entretanto, vestígio de dente e combinam completamente com as da Acanthocera anacantha, da qual se aproxima também pelo habitat. Por estes dados a espécie poderá ser reconhecida facilmente.

Duas fêmeas assaz bem conservadas desta espécie foram colecionadas em Goiás pelo Dr. Arthur Neiva. Da Anacantha se distinguem à primeira vista pelas estrias longitudinais douradas do escudo, da coarctata, apenas pela falta do dente antenal. O escutelo é cor de ouro, a menos de ser raspado.

Se quisesse considerar estes exemplares apenas como variedade, só poderiam ser subordinados à espécie coarctata. Mas aqui é preciso notar que essa espécie absolutamente não costuma mostrar variedades no desenvolvimento do dente antenal.

10. Acanthocera quinquecincta n. sp.

Comprimento sem as antenas cerca de 1cm; margem anterior da asa e célula anal pardacentas.

Tromba preta, palpos pardos. Face preta brilhante, calosa, com induto granuloso amarelo nas partes deprimidas.

Antenas porretas, um tanto claviformes; o primeiro artículo bastante comprido, o segundo mais curto, o terminal mais longo do que os dois outros reunidos.

Fronte mais larga adiante, em parte com induto amarelo e com calo transversal elíptico. Os olhos, depois de amolecidos, mostravam o desenho representado na figura.

Tórax pardacento ou preto de piche, o escudo mais preto, com estrias longitudinais indistintas e prescutelo bem aparente. Abdome enegrecido, as bordas posteriores largamente douradas formam nos segmentos 1 e 4-7 cinco cintas; margem posterior dos segmentos 2 e 3 um pouco amareladas, mas sem cintas.

Pernas de cor parda, ora mais clara, ora mais escura; os pés do meio e os posteriores assaz claros, cor de café com leite.

Asas bastante hialinas, bastante enfuscadas na raiz e numa borda larga da margem anterior, menos na célula anal; a célula axilar mui ligeiramente.

Escâmulas pardas com margens mais claras; halteres pardos.

Desta espécie existem duas fêmeas bastante defeituosas, procedentes do noroeste do estado de São Paulo ou da parte vizinha, do estado de Mato Grosso. A semelhança geral com pequenos himenópteros é muito acentuada, mas varia em grau nas diferentes partes do corpo.

11. Acanthocera cristalis n. sp.

Comprimento, sem as antenas, cerca de 11mm; asas com a base, a margem anterior e a célula anal passando do amarelo ao pardo.

Tromba enegrecida, curta; palpos castanhos, artículo basal, na maior parte, preto, terminal com pêlos amarelos, curvado para baixo em forma de foice.

Antenas em forma de clava, com base fina e porção terminal subcônica, obliquamente porretas; artículo basal bastante comprido, segundo com apenas o terço do comprimento, terminal mais comprido que os dois reunidos, sem dente, porém com pequena saliência na base do primeiro segmento. Face preta, luzidia, calosa, com pêlos amarelos muito finos, curtos e espaçados e induto granuloso amarelo entre os calos. Fronte mais larga adiante, com fundo preto, em parte coberta de induto amarelo, o calo em forma de elipse transversal. Olhos com pêlos curtos e desenho aparecendo como se vê na estampa. Occipício enegrecido, tarjado de pelinhos amarelos.

Tórax fuliginoso com pelinhos amarelos espaçados, formando porém alguns feixes dourados nos ombros, por diante e abaixo da raiz das asas. Escudo mais brilhante do que o resto.

Abdome preto de grafite, com ligeiro brilho azulado e muitos pêlos microscópicos e espaçados de cor amarela; estes acumulam-se na margem posterior de alguns segmentos, formando tarjas douradas. No primeiro segmento a tarja é estreita, no segundo larga, mas nos dois acompanhada do lado basal por outra tarja escura; a tarja falta no terceiro, sendo nos segmentos 4-7 pouco larga, mas distinta e de amarelo carregado.

No ventre todos os segmentos com exceção do primeiro têm uma cinta apical dourada, pouco larga. O abdome, achatado, em sentido dorsoventral é horizontal, até o fim do quarto anel, aumentando em largura, mas tornando-se menos grosso; o resto é achatado, curvado para baixo e com a extremidade arredondada.

Pernas castanhas; os fêmures com pêlos curtos e claros, tíbias anteriores ligeiramente curvas, as outras células da margem anterior e a primeira basal de pardo mais ou menos diluído; as nervuras longitudinais parcialmente tarjadas de pardo. Célula anal com tarja amarela na base, tornando-se parda em direção do ápice. Resto da asa cinzento muito diluído, célula discoidal hialina, como também uma parte da anal. Escâmulas pequenas pardas com margem clara. Halteres pardos.

Uma fêmea bem conservada dessa espécie foi apanhada pelo Dr. Pinto Guedes em Santa Catarina. Parece-se muito com as espécies indígenas de Eristalis que imitam himenópteros.

Aditamento

Muito tempo depois de acabar essas descrições, encontrei em uma coleção de mutucas, feita pelo Dr. Pedroso no Noroeste de São Paulo e que já foi mencionada a respeito do gênero Diachlorus, uma fêmea de Acanthocera que lembra outra de Sabauna determinada como coarctata. Em ambas o segundo anel abdominal é translúcido, amarelo-córneo, menos a zona apical muito escura; o primeiro é amarelo acinzentado com margem posterior escura. No exemplar do Noroeste as antenas se parecem com as de anacantha; há, porém, no lugar do dente um tubérculo muito miúdo; no de Sabauna tem um dente, porém muito pequeno. Sendo coarctata espécie das serras costeiras e faltando seguramente no Noroeste, a hipótese de hibridismo pode ser excluída; também seria precipitado fundar nova espécie sobre um ou outro dos exemplares. É mais provável tratar-se nos dois casos de aberrações; também não se pode estranhar a existência de formas intermediárias, considerando o grande número de espécies muito vizinhas.

O gênero Dichelacera foi estabelecido por Macquart, especialmente para as mutucas do grupo T. cervicornis, damicornis e T. nigrum. Posto que a definição do gênero seja defeituosa, a separação está justificada, devendo figurar D. cervicornis como tipo do gênero. Felizmente, esta espécie apresenta bastante bem os caracteres típicos do grupo que consistem no desenho dos olhos e das asas e na forma do artículo terminal das antenas; o alongamento do primeiro artículo, ao qual uns autores ligam tanta importância, me parece bastante insignificante.

Macquart exclui com razão do gênero Dichelacera várias espécies com dente lateral nas antenas, o que mostra habilidade para reconhecer as relações de parentesco. Só mais tarde incluiu a Acanthocera longicornis; era este um erro que acha alguma justificação no fato de se tratar de gêneros afins. Tanto ele, como outros autores posteriores, não souberam classificar as numerosas Schistocerae, por não perceberem nos exemplares secos o critério mais importante (que é o desenho dos olhos) e por isso incluíram-nas, de modo bastante arbitrário, ora em Tabanus, ora em Dichelacera. Assim, das espécies enumeradas no Catálogo de Kertész, só pouco mais de um terço pertence verdadeiramente ao gênero Dichelacera e entre estas há muitos sinônimos.

Schiner parece ter aceitado o gênero Dichelacera no sentido atual, mas não dispunha de bastante material; a grande extensão desse gênero parece ter escapado também a Osten-Sacken. O mesmo se pode dizer de Williston que continuou a obra de Osten-Sacken na Biologia Centrali-Americana, descrevendo uma espécie nova.

Tratando da coleção do British Museum Miss Ricardo fez algumas observações acertadas sobre esse gênero, mas conhecia apenas a menor parte das espécies já descritas; mais tarde, muitas outras, então desconhecidas, resultaram da investigação de novas zonas do Brasil.

Uma determinação exata das espécies desse gênero é muito difícil e, só por meio de estudos extensos, pode ser feita de modo aproximativo. Existe indubitavelmente certa variabilidade, posto que o maior número de espécies possa ser bem delimitado por um estudo exato; assim mesmo se pode, às vezes, estar na dúvida, se dada forma representa nova espécie ou apenas variedade local.

Baseado no meu grande material dou em seguida uma definição do

Gênero Dichelacera

Tabaninas, geralmente bastante estreitas, de comprimento médio ou pequeno. O fundo escuro do olho aparece numa faixa média diagonal, tendo de cada lado uma zona verde, geralmente estreita, porém excepcionalmente alargada de modo a alcançar a margem do olho, quase completamente. Triângulo ocelar distinto. Face muitas vezes calosa. Calo frontal bastante, às vezes muito largo, podendo então a fronte alargar-se na parte anterior. Antenas com artículo terminal curvo e tendo na base um galho lateral, geralmente bastante comprido e curvo, podendo ser excepcionalmente reduzido a um pequeno espinho. Palpos com artículo terminal estreito. Corpo variado por faixas longitudinais e transversais, apresentando muitas vezes no dorso do abdome triângulos em disposições variáveis. Pernas geralmente bicolores, sem particularidades morfológicas. Asas hialinas ou amareladas, com uma ou mais faixas irregulares, às vezes fenestradas ou dissolvidas em manchas menores. Esses desenhos são pardos mais ou menos enegrecidos, os do corpo apresentam tons amarelos e pardos, raras vezes esbranquiçados ou enegrecidos. O gênero contém grande número de espécies, espalhadas pela América Central e Meridional que, não obstante sua grande variabilidade, têm certo tipo característico que não permite dúvidas sobre a sua colocação. A combinação de antenas com galho lateral, olhos com faixas verdes e asas com faixas irregulares e escuras é característica e constante, posto que o último e o primeiro caráter nem sempre sejam bem acusados. Como nas outras Schistocera a primeira célula da margem posterior é aberta, não havendo apêndice, senão excepcionalmente.

As fêmeas de todas as espécies sugam sangue, os machos são encontrados casualmente, principalmente nas janelas. Os primeiros estados não são conhecidos. – Nos machos a metade superior do olho, munida de grande número de facetas, é unicolor, geralmente de cinzento um tanto metálico, e, nesta extensão, como geralmente nas Tabaninae, o desenho da fêmea não aparece.

O desenho das asas é composto de três elementos, podendo faltar em parte. O primeiro é uma faixa costal que não alcança o ápice, o segundo uma faixa preapical oblíqua; há finalmente uma faixa, partindo da célula anal, freqüentemente reduzida em extensão variável. Assim falamos de faixa costal, preapical e anal. A faixa preapical pode ser formada de duas partes com os eixos um tanto deslocados, chamando-se então dividida; quando manda para a margem da asa um prolongamento, sobre o ramo anterior da nervura forqueada ou a margem anterior desta, chamar-se-á “em forma de T”. A parte de cima, geralmente, é um tanto defletida em direção do ápice, podendo alcançá-lo. Se as faixas preapicais ou anais se alargam até a margem, podem ser chamadas marginais.

Das espécies citadas por Wiedemann as seguintes entram indubitavelmente no gênero Dichelacera: cervicornis, alcicornis, damicornis, T. nigrum, varians e januarii. As descrições totalmente insuficientes de Fabricius foram completadas por Wiedemann. Destas espécies alcicornis é característica e de identificação fácil, cervicornis e januarii não são muito distintas, podendo talvez ser consideradas variedades. O habitáculo indicado para damicornis e T. nigrum, ambas caracterizadas por calo facial, é a América do Sul; entre as quatro espécies da minha coleção que têm calo facial, nenhuma corresponde bem a T. nigrum, ficando assim duvidoso se procedem do Brasil. É verdade que Miss Ricardo acredita tê-la reconhecido em dois exemplares procedentes de Santarém e um deles (que tive ensejo de ver) me parecia corresponder bastante à descrição; todavia não me parece impossível tratar-se apenas de espécie vizinha. Quanto a damicornis a descrição combina com um exemplar da Amazônia (Pará) cuja figura acompanha este estudo, concordando com o habitáculo indicado por Miss Ricardo. Pequenas divergências podem resultar do fato de que os originais não tenham provindo da mesma região. Também acredito possuir a varia em exemplares bastante numerosos, procedentes do Ceará.

Das espécies de Macquart a Dichelacera rufa, unifasciata e marginata entram neste gênero. A primeira, segundo o autor, se parece com a januarii, sendo talvez apenas uma variedade, e provavelmente corresponde à rubricosa V. D. Wulp. D. unifasciata parece boa espécie mas falta na minha coleção. O que Macquart descreve como variedade de januarii parece antes pertencer a uma espécie meridional muito variável; marginata é uma espécie do norte da América do Sul. A scapularis Macq. do México parece entrar no gênero.

Entre as espécies descritas por Walker a única nova e boa é a D. bifacies.

Das espécies de Bigot nenhuma pertence a Dichelacera, que faz parte de um grupo, então pouco conhecido, o que explica as suas dúvidas a respeito do seu gênero.

Discutindo as espécies de Dichelacera do British Museum Miss Ricardo descreve uma nova espécie de Honduras. Na Biol. Centr.-Am. está outra descrita do México por Williston.

A essas espécies já descritas acrescem várias novas, procedendo em grande parte de terrenos nunca antes explorados, o que complica ainda mais este grupo, já bastante difícil. Todavia também facilitaram a sistemática pela observação de exemplares frescos e o conhecimento mais exato da distribuição.

Mesmo na limitação exposta, o gênero Dichelacera é bastante grande, não abraçando menos de vinte espécies, distribuídas sobre um terreno muito vasto, que se estende sobre a América Central e a maior parte da América Meridional. No mesmo lugar coexistem somente algumas espécies, mas estas podem aparecer simultaneamente, como observei para D. januarii e rubricosa.

O gênero é essencialmente americano; quanto às espécies de outros continentes, que foram colocadas aqui, trata-se apenas de semelhança superficial em elementos completamente estranhos.

Baseado em material de coleções à minha disposição, fiz a seguinte chave para as espécies brasileiras, incluindo também uma exótica. Não inclui a T. nigrum por falta de material, nem a D. grandis Ricardo de Honduras por não achar distinções seguras com D. cervicornis. Faltam também as espécies incertas de Macquart.

Passo agora à discussão das espécies, principiando pelas de Fabricius e Wiedemann:

1. Dichelacera alcicornis (WIED.)
Tradução da descrição original:

Escudo alvacento com três estrias longitudinais confluentes posteriormente: abdome amarelado com faixas fuscas. Asas com metades de faixas. – 5 3/4 L. ♀. – Do Brasil.

Antenas quase ferrugíneas; segundo artículo e ápice do terceiro pardo-enegrecidos; dente na base do terceiro alongado e curvado como em T. damicornis F.; face inferior esverdeada, barba branca; palpos amarelo-esvaecidos;1 fronte acinzentada verde (cor de mofo), com calo oval pardo-ocráceo e linha saliente lisa. Tórax alvacento; no escudo há três estrias posteriormente confluentes e tão largas que do fundo alvacento só restam duas estrias posteriormente abreviadas; sendo contudo também a margem posterior e os triângulos prealares alvacentos. Primeiro segmento abdominal amarelo muito pálido; 2-4 de amarelo mais carregado com incisuras pálido-amarelas e larga faixa basal fusca; 5 e 6 totalmente fuscas, apenas as margens laterais ferrugíneas; 7 alvacento; ventre amarelado pálido. Asas hialinas, área costal amarelada. Estigma, uma meia faixa, principiando na costa antes do ápice, outra nascendo na margem interior antes do meio e uma mancha mais preta da base na mesma margem, fuscas; halteres amare-lo-claros. Fêmures amarelos, o primeiro e o último com ápice extremo fusco; tíbias de trás inteiramente fuscas, as anteriores apenas no ápice, no resto esbranquiçadas; joelhos verdes; tarsos fuscos. – No Museu de Berlim.

A descrição de Wiedemann garante a identidade, mas convém acrescentar alguns pontos. A espécie tem o sangue verde e, além dos joelhos, também os fêmures e halteres podem ser fracamente verdes e o resto do corpo mostra um tom esverdeado, principalmente nas partes de cor clara e translúcidas. Com a exposição à luz a cor verde desapareceu pouco a pouco. As asas são apenas hialinas, sem nenhum tom amarelo, o que distingue a espécie da maior parte das outras, e o desenho do escutelo é absolutamente característico quando intenso, mas a faixa do meio pode ser apagada até no escutelo. A faixa preapical das asas varia um pouco, aproximando-se da forma de T na fêmea, quando no macho aparece reduzida a duas faixas oblíquas bem separadas, bastante menores e mais fracas. Na fêmea podem ser fenestradas. As partes esbranquiçadas no escudo podem aparecer de cor lilás ou mesmo pardo-avermelhadas em exemplares frescos, de coloração mais intensa. Os olhos do macho têm facetas maiores na parte de cima, incluindo a faixa superior, e toda esta região apresenta tom metálico acinzentado.

A espécie é comum em São Paulo, onde, na capital, ambos os sexos, às vezes, são encontrados nas vidraças das janelas. Estende-se de lá para os estados vizinhos, menos no litoral do que nas serras. Voa durante todo o verão, aparecendo bastante cedo. O homem raras vezes é picado, mas atacam muito os cavalos e bois, preferindo os pés, logo acima do casco.

2. Dichelacera cervicornis (F.)
Descrição original (em latim) de Fabricius (Syst. Antl. 100, 35)

Tabanus cervicornis; T. Thorace albo: fascia nigra, alis maculatis, antenarum dente elongato.

Habitat in America meridionali Dom. Smidt. Mus. Dom. Lund.

Medius. Antenae ferrugineae, apice nigrae: dente médio elongato, incurvo. Caput tomentoso cinereum. Thorax villosus, albus fascia lata scutelloque nigris. Abdomen ferrugineum segmentorum marginibus pallidioribus. Alae fusco alboque variegatae. Pedes pallidi tibiis posticis tarsisque omnibus nigris.

Tradução da descrição de Wiedemann:

Escudo amarelado com faixa fusca, asas com manchas fuscas; dente antenal alongado. – 5 3/4 – 6 linhas ♀. – Da América do Sul.

Antenas ferrugíneas, o artículo terminal com ápice preto e com processo curvo comprido na base; palpos ocráceos; face inferior amarelada; fronte de amarelado mais carregado com calo quadrado e linha elevada simples e lisa. Escudo com larga faixa pardo-enegrecido entre as raízes das asas; escutelo pardo-enegrecido, abdome amarelo, mais de mel que de ferrugem. Asas amareladas, base, costa e três manchas fuscas, formando a maior uma faixa estendendo-se sobre a nervura forqueada e a média correndo da margem interior até acima do meio da asa; a terceira, mais perto da raiz e quase quadrada, estende-se da margem interna até o meio da largura; halteres amarelados com o capítulo quase branco. Pernas cor de mel, tíbias de trás e todos os tarsos pardo-enegrecidos; tíbias de trás e todos os tarsos pardo-enegrecidos; tíbias anteriores brancas, apenas o ápice fusco; as do meio um tanto alvacentas. Na coleção de Fabricius e na minha.

O exemplar aqui figurado procede da Bahia. Distingue-se dos exemplares de Minas e Espírito Santo por ter o dente antenal preto; as duas partes da faixa preapical mais separadas, o ápice da asa mais hialino, o abdome mais alaranjado. As faixas transversais escuras deste só começam no terceiro anel, sendo muito estreitas, quando nos outros já há uma, mais ou menos distinta no segundo anel, e as demais são mais largas. A célula auxiliar aqui é invadida pela cor fusca, quando nos outros está apenas ligeiramente enfumaçada em toda a extensão.

No Brasil, a cervicornis se encontra desde Minas e Espírito Santo até o Norte. Dizem que passando o Amazonas atinge a Panamá. Citarei algumas das procedências, sem garantir que em alguns casos não se trate de outras espécies, apenas semelhantes. Villa Alegre (Esp. Santo) 3. 1. 11. Juiz de Fora (Minas) 12. 1. 07, Bahia, São Paulo (Amazonas) (Bates leg. Ricardo det.), Pará (Ricardo det. – Tipo de D. multifascia Walker). Há no British Museum mais três exemplares colhidos por Bates no Vale do Amazonas. Uma fêmea, colecionada por Champion no Panamá é citada como cervicornis na Biologia Centrali americana por Osten-Sacken. Outros exemplares do México são muito duvidosos como Williston mesmo indica na sua determinação. Do Suriname vi um exemplar muito pequeno, mas no resto bem típico.

A separação da D. januarii não deixa de ter dificuldade; as diferenças indicadas na sua descrição nem sempre são decisivas porque as duas espécies variam um tanto no desenho e ainda mais no tamanho. No litoral do Rio de Janeiro encontra-se uma forma que pelo desenho se assemelha aos exemplares de januarii, apanhados nas montanhas, sendo porém muito maior que estes e pelo menos igual em tamanho aos exemplares ordinários de cervicornis. O diagnóstico diferencial de Schiner não combina com os meus exemplares colhidos no Rio de Janeiro, lugar de precedência dos exemplares originais, a julgar pelo nome. É possível que se trate apenas de duas formas de uma espécie muito espalhada. Nas duas se pode observar na parte anterior do escudo estrias longitudinais, cobertas em exemplares perfeitos pela pilosidade. Há mais uma terceira forma vizinha, muito espalhada mas ocorrendo mais ao sul, que identifiquei com a D. rubricosa V. D. Wulp e que podia também representar a D. rufa de Macquart. É possível que a forma de Schiner entre nesta categoria, mas também aqui a descrição não combina perfeitamente.

3. Dichelacera damicornis (F.)

Descrição original de Wiedemann (traduzida), incluída a de Fabricius:

Pardo enegrecido, escudo com duas faixas de amarelo-dourado; abdome com base mais pálida; asas com desenho pardo. 5 linhas &. Da América do Sul.

Fabr. Syst. Antl. 101, 36 Tab. Damicornis: thorace fulvus: fascia nigra, abdomineque nigro basi glauca.

Statura et summa affinitas T. cervicornis, at alius et distinctus. Antennae nigrae, basi ferrugineae, dente incurvo et minore. Caput cinereum puncto magno frontali elevato, glabro, atro. Thorax tomentoso aureus; fascia la a scutelloque atris. abdomen nigrum, primo segmento toto, secundo margine parum albido. Pedes nigri, tibiis anticis quatuor albidis. Alae albo nigroque variae.

Wiedem. Dipt. exot. 1. 87, 45.

Antenas pretas, ferrugíneas na raiz, o dente curvo da base do terceiro segmento, posto que mais curto que em T. cervicornis, sempre mais longo que na maior parte das outras espécies. Face inferior e frontal amareladas, aquela com tubérculo médio, liso e pardo-ocráceo, esta com crista preta lisa, alargada embaixo com calo arredondado. Primeira faixa do escudo alargada de cada lado e situada antes do centro, segunda, na raiz mesma, ambas e também as pleuras amarelas cobertas de pêlos dourados com brilho de seda; uma estria parda da raiz das asas até os ombros; escutelo pardo; por diante da primeira faixa amarela duas estrias miúdas e de cada lado uma mancha arredondada de pardo mais carregado. Primeiro e segundo segmento abdominal de pardo muito claro e não glauco, com margens posteriores largas quase alvacentas; nos outros as incisuras apenas um pouco esbranquiçadas; nas margens posteriores restos de pelinhos esbranquiçados, o primeiro segmento e a metade posterior do segundo, em exemplares não raspados provavelmente munidos de pilosidade branca. Asas hialinas com faixa larga irregular e oblíqua do ápice à margem interna; na veia transversal anterior uma mancha parda e uma faixa na penúltima veia longitudinal; escâmulas e halteres pardos. Pernas pardo-enegrecidas, tíbias anteriores esbranquiçadas. – Em minha coleção e na de Fabricius.

Nota : Por causa de maior brevidade dei na frase de diagnose a cor geral como preta, porque também o abdome mostra essa cor, porém em analogia com as espécies vizinhas deveria dizer “com escudo amarelo”, como o faz Fabricius que, todavia, errou dizendo que só há uma faixa parda, quando assim há duas muito claras.

Nota de Miss RICARDO (Ann. and Mag. of Nat. Hist., Ser. 8, v.XIV, 1904, p.569:

Dichelacera damicornis, ♀, Fabr.

Two females from Para (Saunders Coll.), 68,4: one female from Villa Nova, Amazons (Bates coll.), 55. 75; one female from Para (Bates Coll.) 66. 53.

This species is distinguished from D. cervicornis by the yellow-brown shining tubercle on the face below the antennae and by the brown legs, with only the middle tarsi whitish. The wings may be more accurately described as having the fore border brown as far as the apex, and extending as a band across the wing through the upper half of the discal cell to the posterior border and anal cell, also prolonged on the third longitudinal vein and for one third of the length of the fifth longitudinal vein.

Não havendo nota neste sentido é pouco provável que o exemplar citado procedesse do Brasil, talvez viesse de um dos países vizinhos e, com efeito, vi um exemplar do Suriname, que combina com a descrição e parece pertencer à mesma espécie que a fêmea da estampa, obtida do Rio Amazonas e que corresponde aos dados de Miss Ricardo.

4. Dichelacera januarii (WIED.)

Tradução da descrição original:

Amarelada, escudo e abdome com faixas pardas; asa largamente enfuscada na costa, com mancha ocrácea, faixa oblíqua fusca e ponto fusco. – 4 1/4 L. ♀. – Do Rio de Janeiro.

Wiedem. Zool. Magaz. III. 43, 4.

Wiedem Dipt. Exot., I. 94, 55.

Parecida com T. cervicornis, porém menor. Antenas pardacento-amarelas, dente do artículo terminal alongado, a ponta enegrecida; face inferior amarelada, palpos grisalhos; fronte pardo-ferrugínea logo por trás das antenas, mais para cima amarelada, calo pardo enegrecido, quase triangular. Escudo ocráceo pardacento com faixa larga entre as bases das asas, anteriormente sinuosa, de cor fusca, e outra apical incluindo o escutelo; entre essas faixas há pêlos dourados; pleuras de amarelo de enxofre muito claro. Abdome amarelado com três faixas fuscas na base dos segmentos 2-4, pelo resto com pêlos dourados. A faixa alar oblíqua passa por cima das nervuras transversais mais aproximadas do ápice; a mancha ocrácea se estende das nervuras transversais médias até o ápice da nervura cubital; a mancha fusca acha-se na margem interna no ângulo entre as duas nervuras penúltimas, sendo esta margem até o ápice da asa de pardacento muito claro; antes do ápice há na célula forqueada uma mancha ou gota quase hialina; halteres amarelos. Pernas cor de mel muito clara, tarsos anteriores pardo-enegrecidos, tíbias e tarsos posteriores também, os do meio pardos, porém menos enegrecidos. – Na minha coleção.

Varia do modo seguinte: faixas fuscas também nos segmentos posteriores do abdome e os dois últimos também fuscos no meio, as tíbias de trás pardo-enegrecidas. Falta o fusco na costa e, em lugar deste e da mancha ocrácea, tudo é amarelo carregado: o ponto entre as nervuras penúltimas varia em tamanho, enchendo, às vezes, todo o ângulo; mas a faixa sempre é sinuosa do lado de fora. – No Museu de Berlim e na minha coleção.

O desenho foi tirado de exemplares da Serra da Cantareira, perto da cidade de São Paulo. Combina com exemplares apanhados na Tijuca e outras serras perto do Rio, mas não com a descrição que Schiner dá dos exemplares que ele considera como típicos.

Dichelacera januarii tem um nome apropriado, por ser a espécie que mais abunda nas montanhas do Rio de Janeiro, mas também é muito espalhada em outras regiões. Temos exemplares dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Minas e Goiás mas, sem dúvida, vai muito além, provavelmente até o Amazonas. De variações individuais apresenta as acima indicadas e outras que dependem da intensidade de pigmentação, de absorção de sangue em período anterior e de outras condições. Assim, os exemplares colhidos por Neiva em Goiás têm a faixa muito estreita mas fortemente pigmentada e podem ser considerados variedade regional. Nos exemplares do Paraguai a chanfradura apical da faixa é quase preta no maior número de exemplares.

Da D. cervicornis, também muito variável e encontrada em grande parte do mesmo território, januarii difere pela estatura menor, o dente antenal mais curto, a cabeça menor, as tíbias posteriores mais claras e as faixas transversais do abdome menos distintas, sendo a coloração em geral mais apagada. Assim mesmo a discriminação das duas espécies em alguns casos se torna duvidosa.

No Rio e em São Paulo a espécie aparece principalmente no começo do verão, geralmente desde outubro.

A descrição seguinte, traduzida do holandês de Van Der Wulp combina bastante bem com alguns exemplares de uma espécie um tanto variável, encontrada por mim nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, junto com D. januarii. Parece ocorrer de modo esporádico ainda mais ao Sul.

5. Dichelacera rubricosa VAN DER WULP.
(Entom. Tijdschrift 23, p.156)

Ochraceus; antennarum apice et callo frontali piceis; alis subhyalinis, costa fasciaque lata oblique fuscis. –long. 19,5mm.

Ocrácea. A fronte bastante larga, embaixo com calo grande arredondado castanho luzidio, ligado para cima com a mancha castanho-claro do vértice por linha longitudinal fina. Olhos glabros. Antenas pardo-avermelhadas, bastante delgadas; o primeiro artículo quase cilíndrico, o segundo curto, ciatiforme, o terceiro alongado terminando em ponta, com dente não muito grande porém bastante conspícuo no primeiro terço; a ponta do artículo bem delimitada, pardo-enegrecida. Os palpos delgados e pontiagudos da mesma cor ocrácea. Barba ocrácea. Dorso do tórax e escutelo apenas um pouco mais escuros do que as pleuras. Abdome quase unicolor. Pernas e halteres ocráceos, tarsos também, porém mais escuros. Asas de cor ligeiramente acinzentada: raiz, margem anterior, e uma faixa transversal, um pouco oblíqua, pardas; nervura postical também com tarja parda; a faixa oblíqua é separada do estigma e tem a maior largura na margem anterior; inclui a raiz da célula forqueada e, embora não alcance completamente o ápice da asa, este também é um tanto enfuscado: para baixo torna-se mais estreita, ocupando cerca de um terço da célula discoidal: aliás atinge a margem posterior. Nervatura como de costume.

Duas fêmeas da República Argentina (Weyenbergh).

O exemplar representado na figura procede de São Paulo (Serra da Cantareira). Tenho outros da Serra da Bocaina (Bonito) e da Serra da Mantiqueira (Pacau), enfim uma série, colecionada em Santa Catarina, no Morro do Cedro, pelo doutor Pinto Guedes. Deixando de lado pequenas variações individuais, combinam bem com essa descrição.

Provavelmente a descrição da D. rufa de Macquart também se refere a forma análoga, mas, não correspondendo muito bem à designação das cores, preferi o outro nome. Não é completamente certo que se trate de espécie independente ou apenas de uma variedade de D. januarii mas, em todo o caso, é uma forma bastante característica.

6. Dichelacera varia (WIED.)
(T. varius WIED.)

Tradução do original alemão:

Tabanus varius.

Escudo quase cinzento de mofo, com faixa e escutelos fuscos; abdome cor de mel com manchas triangulares largas, de cor fusca; asas variegadas de pardo. – 3 2/3 de linhas. ♀. – Do Brasil.

Muito vizinho ao T. januarii, porém menor e diferente. Antenas ferrugíneas, artículo terminal pardo-enegrecido, na base com grande processo em forma de dente ou espinho, igual em comprimento à terça parte do artículo. Face inferior amarelada, tirando um pouco sobre o cinzento do mofo, com dois grandes pontos pardos deprimidos: palpos amarelados escuros; fronte de matiz ocrácea muito clara, quase alvacenta, mais larga do que em januarii com calo transversal preto e linha elevada e lisa subuliforme. Escudo com três estrias lineares e margens laterais branco-amareladas; a faixa fusca é situada entre as raízes das asas; triângulo prealar branco-amarelado; ângulos posteriores e escutelos fuscos; pleuras amarelo-acinzentadas como mofo. Manchas do abdome de forma triangular muito larga, assentadas com a sua base sobre a base dos segmentos; menos largos nos segmentos anteriores e mais carregados nos do meio; os segmentos último e penúltimo totalmente fuscos, o primeiro sem mancha. Escudo e abdome com pêlos cor de ouro. Ventre cor de mel clara, com ápice pardo. Asas com a costa enfuscada até o ápice, além do estigma mais escuro, uma chanfradura larga amarelada, quase hialina; antes do ápice uma faixa fusca, oblíqua, com as margens irregulares que não atingem completamente a margem interior; da margem posterior desta faixa corre um processo para a margem interna do ápice, o espaço entre as duas últimas nervuras desde a margem interior até acima do meio e toda a margem inferior da asa são fuscos sendo nesta a cor muito diluída; também as nervuras transversais do meio com ligeira tarja fusca. Halteres fuscos, o capítulo em cima branco-amarelado. Pernas anteriores cor de mel, com tarsos enfuscados no ápice; pernas de trás pardacentas com os tarsos mais escuros. – Na minha coleção e na do Museu de Berlim.

Por muito tempo não consegui identificar essa espécie, mas afinal recebi vários exemplares do Sr. Rocha, apanhados no estado do Ceará. Mais tarde o Dr. Neiva apanhou alguns exemplares no estado da Bahia, no trem entre a capital e Juazeiro. Está tudo de acordo com a descrição de Wiedemann, incluindo o tamanho diminuto (cerca de 8mm).

7. Dichelacera marginata MACQUART

Tradução da descrição original:

Rufa. Abdome apice fusco. Alis marginibus fuscanis.

Compr. 4. 1. ♀. Tromba preta. Palpos amarelos. Face ocrácea. Fronte amarelo-grisalho; calo castanho, perto da margem anterior, quadrado adiante, pontudo atrás. Antenas; os dois primeiros artículos fulvos, o terceiro falta. Escudo um tanto pardacento; os últimos quatro segmentos abdominais enfuscados, com incisões amarelas. Pés fulvos; tarsos anteriores e posteriores fuscos. Asas com centro claro, um pouco amarelado e os bordos enfuscados; o exterior assaz estreito, o posterior e interior largo.

De Cayenne. M. Bigot.

Tenho dois exemplares do Pará, dos quais um foi figurado, e que correspondem à descrição apresentada. O desenho e o tamanho diminuto não permitem confusão com outra espécie. O que caracteriza também a espécie é o desenho dos olhos, que contribui para distingui-la da submarginata, que tem as asas um tanto parecidas.

8. Dichelacera submarginata n. sp. (?)

Esta forma aproxima-se bastante da cervicornis e parece haver formas intermediárias. A diferença principal nota-se na faixa preapical que aqui se torna marginal; também a anal ganhou em extensão, sendo maior do que no exemplar de cervicornis da Bahia. O abdome em um dos exemplares mostra desde o segundo segmento faixas escuras basais bastante largas, no outro são muito mais estreitas e só começam no terceiro. A cor das antenas e do abdome lembra mais os exemplares de cervicornis do Espírito Santo e de Minas. Posto que os exemplares não sejam de tamanho extraordinário, sempre são muito maiores que os da D. marginata Macq., que é uma das espécies menores. Desta diferem também pela chanfradura triangular da faixa marginal, ainda mais pelas faixas estreitas dos olhos que provam tratar-se de espécie bem diversa.

Dos dois exemplares um procede da Venezuela, o outro é de procedência incerta.

Mais tarde recebi de Townsend quatro exemplares peruanos colhidos no Rio Charape em 13 de setembro de 1912, um dos quais corresponde a nosso tipo. Os três outros mostram na segunda parte da faixa marginal e perto da margem uma janela em forma de vírgula, sendo também o ápice mais claro, de modo que se poderia também falar de uma faixa dividida como na cervicornis e de uma zona marginal enfuscada. No seu tamanho correspondem à forma aqui descrita, sendo menores do que as formas típicas de cervicornis.

9. Dichelacera scutellata WILL.
(Kans. Univ. Quart. Journ., v.III, n.3, 1895)

Tradução do original inglês (p.193):

Dichelacera (Diachlorus?) scutellata, n. sp.

Fêmea. Fronte apenas duas vezes mais longa do que a largura máxima, de cor cinzenta clara opaca, com grande calosidade triangular de lados convexos e estendendo-se até os ocelos. Antenas amareladas, as partes aneladas do terceiro artículo pretas e peludas; o primeiro artículo quatro ou cinco vezes mais longo do que o segundo, que é curto e globoso, o terceiro mais comprido do que os outros reunidos e com pequeno dente dorsal, a porção anelada de comprimento igual ao da basal. Face brilhante, amarelada. Palpos pardo-amarelados, como de Tabanus. Mesonoto castanho brilhante, com duas estrias esbranquiçadas estreitas adiante; na parte posterior com tomento de amarelo brilhante que talvez seja mais estendido em exemplares completamente frescos. Abdome pardo com estria mediana amarelo-claro. Pernas pardas, as últimas enegrecidas. Asas hialinas, tendo, porém, a margem anterior até o ápice, uma faixa de largura média, principiando no fim da primeira nervura e prolongada até por dentro da quinta célula superior, e uma nuvem, na parte exterior da terceira nervura e sobre a nervura transversal basal posterior, pardo-escuras; ângulo anal sub-hialino.

Comprimento 9, 10mm.

Têm a forma alongada e o primeiro artículo antenal alongado, mas falta o processo saliente do terceiro artículo antenal. As tíbias anteriores são mais finas do que nas espécies de Diachlorus que conheço.

A mutuca que figuramos é, sem dúvida, a espécie descrita por Williston, não obstante algumas pequenas diferenças, como no calo frontal, que dependem de variações individuais. Trata-se de uma espécie muito espalhada em regiões distantes da costa; difere bastante nas espécies anteriormente descritas, com exceção de varia Wied., mas com estas e outras forma um grupo do gênero Dichelacera um tanto aberrante, porém sempre ligado por transições aos outros. Não tem absolutamente nada a ver com Diachlorus, como já fica provado pelo desenho dos olhos, que tem fitas verdes alargadas até a margem; além disso o calo frontal enorme, e a fronte anteriormente aberta, o calo facial e a cor geral, bastam para distinguir a espécie. A faixa do abdome é raras vezes muito distinta e formada de triângulos, como na figura; o escudo quase sempre parece pelado. O tamanho é pequeno, quando muito de 9mm; 10, como indica Williston, já é excepcional, mas as espécies das regiões secas variam muito em tamanho.

O nosso exemplar veio de Goiás com muitos outros. Mais tarde, em companhia do Dr. Neiva, encontrei a mesma no Noroeste de São Paulo e na parte vizinha de Mato Grosso, onde é conhecida pelo nome de mutuca mole, em razão da pouca consistência dos seus tecidos. Ataca muito os animais, e às vezes o homem; voa nos meses de verão e talvez também em outros.

Da D. rubricosa aproxima-se uma forma de Santa Cruz, estado do Rio Grande, que descrevo com o nome:

10. Dichelacera lacerifascia n. sp.

Podia ser considerada à primeira vista como rubricosa com faixa preapical fenestrada. Sendo a fenestração ocasionalmente observada em grande número de tabanídeos e tendo apenas o valor de marcar uma variedade, devia ser designada como tal, se não houvesse também na coloração de outras partes do corpo diferenças que aparecem na figura. Não ligo muita importância à coloração mais escura do abdome, mas também a estriação que aparece no tórax epilado é mais pronunciada do que nas outras espécies; na parte média da asa falta uma zona amarela, tão característica para rubricosa e outras espécies vizinhas. Também difere a cor dos palpos e da face. Tudo isso indica com probabilidade a formação de espécie nova, mas a questão só poderá ser decidida pelo exame de mais exemplares.

11 . Dichelacera trigonotaenia n. sp.

No sul do Brasil e no Uruguai encontra-se uma Dichelacera, muito vizinha da D. rubricosa, mas devendo sem dúvida ser considerada espécie à parte. Como Macquart diz de sua espécie unifasciata, ela tem apenas uma faixa escura, paralela à margem posterior, faltando uma faixa anal distinta; tem todavia no dorso do abdome uma série de triângulos escuros, com a ponta para trás, das quais Macquart não fala e que ele não podia ter deixado de perceber. Nos três exemplares que tenho diante de mim, lembrando geralmente os Anapsops, a largura desses triângulos varia muito, sendo mais estreita num do Paraguai, de tamanho médio num outro da vizinhança de Porto Alegre e muito largo num terceiro de Tacuarembó (Uruguai). Nestes exemplares faltam os triângulos marginais escuros, encontrados no exemplar da figura, que também procede da zona de Porto Alegre. Neste, a faixa preapical é contínua, sendo fenestrada nos outros. O escudo, epilado em todos os exemplares, só num deles tem o fundo escuro dividido em faixas longitudinais por linhas ferruginosas. As outras particularidades podem ser percebidas na figura. Não pode ser confundida com outra espécie descrita.

12. Dichelacera multiguttata n. sp.

Um exemplar, colecionado por Sello em Caçapava (Rio Grande do Sul), mostra um desenvolvimento ulterior do tipo da trigonotaenia. Aqui a faixa da asa é reduzida a algumas manchas isoladas e em parte fenestradas, grupadas entre as nervuras em lugares que correspondem àquela faixa. O escudo denudado mostra uma indicação de estrias longitudinais. A nossa figura dispensa uma descrição ulterior.

13. Dichelacera salvadorensis n. sp.

Coloração geral chocolate com desenhos amarelados. Face com calosidade chocolate central e dois pontos fuscos laterais profundamente imprimidos, resto ocráceo claro. Tromba preta, palpos chocolate, antenas pardas com o artículo basal ferruginoso e a parte anelada preta; o dente lateral comprido e curvado; fronte bastante larga, mas sem dilatação anterior, coberta com induto ocráceo muito claro; o calo frontal chocolate, quadrado com prolongamento linear; tubérculo ocelígero chocolate, distinto, mas sem vestígio de ocelos. Olhos com as fitas verdes alargadas até a margem do olho.

Escudo chocolate claro, com indicação de três estrias escuras, um tanto irregulares; dos dois lados da parte anterior e na margem posterior do escudo (adiante do escutelo) o fundo é claro com pêlos dourados, representado talvez os restos de duas faixas transversais, observadas em várias espécies vizinhas. O peito é chocolate; por baixo da raiz das asas há um tufo de pêlos dourados. O escutelo é chocolate.

O primeiro segmento abdominal é ocráceo; de lá para trás o abdome é chocolate, apenas com faixas apicais ocráceas, tanto em cima como embaixo.

A asa, em parte hialina (na segunda célula basal), em parte amarelada ou ligeiramente enfumaçada, tem a base, a costa e quase toda a célula anal enfuscada. A faixa subapical, comparativamente homogênea e ligeiramente côncava, nasce um pouco antes do ápice e alcança a quinta célula da margem posterior.

As pernas são chocolate, apenas com as tíbias anteriores e o metatarso do meio de cor clara.

A espécie aproxima-se de damicornis e de T. nigrum, pelo calo frontal, a forma das antenas, o tamanho e a cor; também já lembra um pouco a Acanthocera longicornis pelo desenho das asas. O desenho dos olhos poderá servir de distinção com outras espécies vizinhas.

A descrição foi feita de um exemplar apanhado por Paessler em Acajutla (São Salvador) em 17. III. Pertence ao Museu de Hamburgo.

14. Dichelacera calosa nova spec.

Cor geral passando de castanho a preto, com cintas claras. Comprimento total (sem antenas) cerca de 13mm.

Face calosa brilhante, cor de mel virando em castanho-claro, com depressão profunda abaixo da margem oblíqua dos olhos. Em redor das antenas e dos olhos o fundo, finamente granuloso, é branco amarelado, no occipício esbranquiçado. Calo frontal largo, castanho-brilhante, o tubérculo ocelar e parte do espaço interocular enegrecido. Olhos com duas estrias verdes pouco largas sobre fundo escuro. Barba escassa, branca. Tromba comprida, preta; palpos em forma de sabre, pardo-ocráceos na base, enegrecidos no ápice. Antenas, ocráceas nos dois primeiros segmentos e na base do terceiro artículo, o resto castanho, ramo lateral deste reduzido a um espinho curto e fino, sem curva, de cor ferruginosa; segundo artículo, em cima, com processo terminal cônico.

Tórax chocolate, dos lados e em baixo com reflexos grisalhos; escudo brilhante tirando sobre o preto, uma estria longitudinal mais estreita e duas laterais mais largas de cinzento claro; escutelo chocolate, bastante avermelhado na margem livre.

Abdome comprido, estreito e achatado no dorso, onde o fundo preto mate é coberto de pêlos muito finos; no primeiro anel e nas margens posteriores dos três seguintes o fundo é mais claro, com pêlos esbranquiçados, formando cintas iguais e bastante largas no terceiro e quarto, no segundo apenas dos lados, tornando-se mais ou menos apagadas no meio; o ventre glabro e polido, chocolate na base, tornando-se preto no ápice.

Pernas chocolate, tornando-se ocráceas nos joelhos, na base das tíbias média e anterior e nos empódios.

Asas quase hialinas, com desenhos pardo-enegrecidos extensos, complicados e um tanto variáveis, podendo apresentar janelas de cor clara. O mais importante é uma faixa em forma de vírgula, com a base no terço apical da margem anterior e a ponta na quinta célula da margem posterior; há mais uma mancha perto do ápice da célula anal, invadindo também a axilar; a célula costal sépia-clara, chocolate no estigma. A margem posterior nem sempre se acha ligeiramente enfuscada por uma tarja com aspecto de nuvem, comunicando com o processo triangular da faixa sobre o ramo posterior da nervura forqueada. Nervuras transversais e principalmente o tronco da anal espessados, castanhos, com tarjas cor de sépia, as outras nervuras castanho-escuras. Escâmulas pequenas, pardacentas; halteres castanhos, esbranquiçados no ápice.

Esta espécie mostra uma convergência evidente para o gênero Acanthocera que falta nas espécies conhecidas do Brasil.

A descrição baseia-se no estudo de muitas fêmeas, colhidas pelo Dr. Neiva nos estados da Bahia (município de Santa Rita) e Goiás (entre Porto Nacional e a capital), nos meses de julho e agosto. Costumavam, no meio do dia, atacar os cavalos em redor dos olhos e nas pernas.

15. Dichelacera micracantha n. sp.

Comprimento geral 9mm. Face calosa, no meio cor de mel, dos lados enfuscada; perto dos olhos e das antenas com fundo granuloso, ocráceo, como existe também no occipício. Tromba curta, quase preta; palpos ocráceos, o segundo artículo estreito. Antenas curtas ferrugíneas; o terceiro artículo ligeiramente curvado, com ápice enfuscado, o dente reduzido a um pequeno tubérculo subcônico. Fronte com fundo pardo ocráceo claro, dilatada na frente, onde há um tubérculo subquadrangular moderadamente largo e pouco alto, prolongado por trás em linha fina.

Escudo com fundo enegrecido mate e margens mais claras, com restos de pêlos cor de ouro. No escutelo o fundo é castanho escuro, nas pleuras e no esterno enfuscado. Abdome: nos quatro primeiros segmentos prevalece um amarelo, um tanto alaranjado, no resto um pardo enegrecido. Nos segmentos 3 e 4 há, de cada lado, uma mancha basal subquadrangular, ocupando mais do que a metade da largura do segmento; no segundo a mesma zona também é um pouco mais escura. Limitam uma faixa média amarelo-alaranjada, composta primeiro por triângulos com ápice anterior e um pouco alargado nos segmentos 4 e 5, terminada depois por um triângulo inverso no segmento 6. Do lado ventral, os segmentos 2 e 3 têm as margens laterais enfuscadas e sinais de uma faixa mediana escura que se confunde com a parte posterior enfuscada do abdome, onde as incisuras, tanto em cima como embaixo, são estreitamente amarelas.

As pernas são geralmente de ocráceo, mais ou menos pardacento.

As asas são bastante hialinas, as nervuras ora ocráceas ora enfuscadas; a faixa costal é bastante larga; a apical estreita, em forma de T., com prolongamento apical e com contornos bastante regulares; da anal há apenas um pequeno triângulo, ocupando o ápice da célula anal. A cor das faixas é chocolate claro.

Como resulta da descrição e da estampa que a acompanha, trata-se de espécie bem caracterizada e que não se confunde com outra. Os olhos têm as faixas verdes alargadas até a margem.

Nosso exemplar foi trazido pelo Dr. Astrogildo Machado das margens do Tocantins. Tenho notas sobre um exemplar do British Museum que, talvez, pertença a esta espécie.

16. Dichelacera bifacies WALKER

Diagnose em latim:

Fusca, capite fulvo, thorace pilis aureis bivittato, pectore cano, abdomine basi fascisque fulvis, pedibus fulvis, alis limpidis fusco fasciatis et vittiatis.

Tradução da descrição inglesa:

Cabeça amarela, em cima com dois tubérculos píceos; olhos verdes e purpúreos; palpos amarelos, lancetas ferrugíneas; haustelo píceo; antenas amarelas, pilosas, mais longas do que a cabeça; segundo artículo menor em comprimento do que a metade do primeiro; terceiro quase duas vezes mais longo do que os dois primeiros reunidos, um tanto curvado, píceo, com exceção da base que emite um espinho, curto, porém mais longo do que o segundo segmento; escudo fusco, ornado com duas faixas de pêlo dourado espesso; peito branco; abdome pardo; primeiro e segundo segmentos amarelos, com exceção de uma mancha subquadrada no disco de cada um deles; há largas faixas amarelas na margem posterior dos segmentos 3 e 4, que mostram também franjas de pêlos dourados; os segmentos posteriores mostram ligeiros traços de faixas iguais; ventre amarelo, com exceção dos lados dos três últimos segmentos que são píceos; pernas mates, amarelas; pés mais escuros; asas hialinas com a margem anterior fusca; uma estria fusca nasce da base da asa e alcança a margem posterior antes do meio, onde é quase atingida por uma faixa fusca que nasce perto do fim da margem anterior e corre obliquamente para trás, emitindo um ramo curto que atinge a margem posterior perto do ápice; nervuras píceas, amarelas em alguns lugares, onde a asa é hialina; halteres amarelos. Comprimento do corpo 3 1/2 linhas; das asas 7 linhas.

a. Pará, dado por Mrs. J. P. O. Smith.

(Nesta descrição Walker usa extensamente a palavra tawny, que traduzimos por amarelo, conforme à expressão yellow, usada por Miss Ricardo, que redescreveu o mesmo exemplar.)

A nossa figura nos dispensa de aumentar muito a descrição de Walker: apenas diremos que a mancha dorsal e mediana, que se observa na base dos anéis 1 e 2, geralmente é triangular. A espécie pertence ao grupo das menores, nas quais o dente antenal é muito curto e tem uma calosidade frontal bem acusada. A faixa subapical, em forma de T, mostra ligeiras variações.

A espécie não é rara no Pará, onde a achei na Ilha de Arapiranga e onde recebi exemplares apanhados pelo Sr. C. Baker. Outras fêmeas provêm de São Pedro do Pindaré (estado do Maranhão) e do Tocantins (Dr. Astr. Machado). Sempre considerei a espécie limitada ao norte do país, mas em fevereiro deste ano recebi dois exemplares perfeitos, apanhados na Serra da Bocaina, perto da barra do Rio Mambucaba.

17. Dichelacera fuscipes LUTZ e NEIVA

Comprimento total 9mm.

Probóscide preta, palpos estreitos, ocráceos com pêlos pretos; antenas ferrugíneas com pêlos pretos, a extremidade do terceiro artículo apenas um pouco mais escura, o dente lateral e reto curto; a face coberta de pó branco, fronte com o mesmo, mais amarelado; calosidade enegrecida, unindo os ângulos anteriores dos olhos; por trás é triangular e prolongada em linha elevada; tubérculo ocelar castanho, ocelos atrofiados; olhos com duas faixas transversais estreitas, verdes sobre fundo escuro.

Tórax, em cima, castanho, com estrias longitudinais mais escuras e pouco distintas; escutelo saliente, da cor do escudo. Peito com fundo pardo, salpicado de branco.

Abdome de cor amarela de couro, enegrecido do quinto anel para trás; da base do segundo até o quinto segmento corre uma faixa escura, no meio da qual há uma mancha escura subtriangular.

Pernas de um pardo oliváceo, mais amarelado nas tíbias anteriores.

Asas sub-hialinas, ligeiramente amareladas na margem anterior, enfuscadas na margem posterior, a costa pardo-amarelada; há três faixas, semelhantes às de D. alcicornis, porém todas mais claras no centro das células.

Balancins com o pedúnculo branco-amarelado e o capítulo amarelo pardacento.

Esta espécie, pouco conspícua, porém bem distinta, foi descrita de uma fêmea capturada em Mato Grosso, na fazenda Pontal, perto das margens do Paraná, em janeiro de 1909.

Há outros exemplares da mesma zona.

A figura representa um macho. O desenho abdominal, nunca muito distinto, aqui é mais apagado do que nas fêmeas.

18. Dichelacera intermedia LUTZ

Convém citar aqui mais uma espécie, da qual tenho dois exemplares colhidos na região onde o Noroeste de São Paulo confina com o Mato Grosso. Posto que não sejam muito bem conservadas, talvez por terem ficado algum tempo em um vidro de cianeto bastante úmido, assim mesmo distingue-se claramente das outras espécies descritas.

No tamanho e no desenho do corpo e das asas parecem-se com a D. alcicornis. No escudo a estria do meio, em um dos exemplares, é fraca, no outro apenas indicada. O galho lateral das antenas é um tanto mais curto. As pernas não são claramente bicolores, mais cor de couro amarelo ou pardas, com os pés algum tanto mais escuros. O abdome é amarelo de couro; mais para trás, onde os segmentos se encontram em grande parte, torna-se pardo. Os outros caracteres aparecem na figura.

19. Dichelacera modesta n. sp.

Comprimento geral 12mm; corpo ocráceo mais ou menos enfuscado.

Fundo da cabeça ocráceo acinzentado. Palpos e artículo basal das antenas ocráceos; o resto das antenas falta. Olhos com duas fitas verdes estreitas sobre fundo preto. Calo frontal quase quadrangular, mas tendo na parte posterior um processo triangular comprido; tubérculo ocelar bastante alongado com a parte anterior saliente. A fronte alarga-se ligeiramente na sua parte anterior. Não há calosidade facial no centro, apenas existe o ponto deprimido dos dois lados.

Tórax pardo-ocráceo, no escudo quatro faixas escuras pouco distintas, duas submedianas e inteiras e duas laterais interrompidas no meio. Escutelo com as margens bastante claras, o resto pardo um tanto escuro.

Abdome ocráceo, pardacento nos dois anéis anteriores e ligeiramente enfuscado nos dois seguintes; o resto fracamente fusco; embaixo os três primeiros segmentos ocráceos, o resto enfuscado. As incisuras são mais claras e do terceiro segmento para trás há no dorso vestígios de triângulos curtos de cor mais clara, assentados sobre a margem posterior.

Pernas de cor ocrácea mais ou menos enfuscada.

Asas: Faixa costal compacta pardo-escura, preapical cor sépia, fenestrada e em forma de T, anal reduzida a ligeira pigmentação, acompanhando a margem anterior da célula anal. A asa é hialina, a célula axilar e, em menor grau, a margem posterior um tanto enfuscadas, os três espaços anteriores entre as nervuras transversais e a faixa preapical são amareladas, as nervuras desta zona, o tronco da quinta e uma pequena zona na base desta têm cor de mel, as outras nervuras são castanhas. O ramo anterior da nervura forqueada tem um apêndice bastante comprido e salientado por uma mancha escura.

O exemplar, que perdeu os pêlos e parte das antenas e pernas, nem por isso é bem caracterizado como espécie nova, distinta de fuscipes da qual mais se aproxima. Esta e a scutellata encontram-se na mesma latitude, porém a última se distingue logo pelo desenho dos olhos e a falta de calo facial. O exemplar, uma fêmea, procede de Corumbá, em Mato Grosso.

20. Dichelacera T. nigrum (F.)

Para completar este trabalho dou em seguida as descrições que Fabricius e Wiedemann deram da D. T. nigrum, sendo a última em tradução:

Fabricius: Syst. Antl. 191, 38:

Tabanus T. nigrum: fulvus ano fusco alis albis: costa strigata postica fuscis.

Statura praecedentium (T. cervicornis, damicornis). Antennae rufae, apice nigrae, dente incurvo. Caput ferrugineo tomentosum: maculi triangulari glabra, atra. Thorax tomentoso ferrugineus. Abdomen ferrugineum ano fusco. Alae albae costa, striga linea ad marginem exserente fuscis. Pedes flavi.

Wiedemann: Aussereurop. Zweifl. Insekten I, p.160, n.76.

Amarelo dourado; escudo e ano pardos, asas amareladas: costa faixa e duas estrias pardas. 5 1/4 L. ♀. Da América do Sul.

Antenas ferrugíneas com dente curvado e ápice do artículo terminal preto; palpos ferrugíneos; face inferior saliente, glabra: fronte com calo triangular pardo. Escudo com pêlos pardos e faixa parda entre as raízes das asas; escutelo ferrugíneo pardo. Abdome com pêlos amarelo-dourados; terceiro segmento com dois pontos pardos, quinto e os que seguem completamente pardos. Asas hialino-amareladas; área costal e estigma de amarelo mais carregado. Uma faixa parda oblíqua nasce perto da raiz da asa da margem interna (que não alcança completamente), corre até a costa e de lá, formando uma curva, até o extremo ápice; essa faixa emite uma estria parda sobre o ramo interno da nervura forqueada até a margem interior do ápice, formando assim a figura de um T; outra estria é situada no ângulo que as duas últimas nervuras formam na margem interior. Pernas amarelo-douradas até pardacento-ocráceos, tíbias anteriores e tarsos pardo-ferrugíneos. Na coleção de Fabricius e na minha.

Tratando dos tabanídeos do British Museum escreve G. Ricardo em Ann. and Mag. of Nat. Hist., Ser. 7, v.XIV, nov. 1904:

Dichelacera T. nigrum, ♀, Fabr.

Uma fêmea de Santarém (Bates Coll.), 53, 72, com rótulo trazendo o nome trifascia, evidentemente um nome de manuscrito de Walker.

Há uma outra fêmea do mato de Santarém (Baixo Amazonas), 3, 95 (Austen Coll.), 96, 229, que corresponde à descrição desta espécie; todavia não tem manchas pardas no terceiro segmento do abdome que é amarelo com ápice pardo, e o tórax tem antes pêlos dourados do que os pardos como Wiedemann indicou.

Para comparação dou afinal em tradução a descrição de uma espécie nova da América Central por Miss Ricardo (Ann., v.XIV, nov. 1904):

Dichelacera grandis, ♀, sp. n.

Três fêmeas de Belize, Orange Walk, British Honduras, Sept. 1809, dadas pelo secretário colonial.

Espécie larga que se distingue de cervicornis pela forma da faixa da asa.

Face amarela com mancha preta escura abaixo das antenas; palpos amarelos, compridos, curvados, com pubescência preta; pêlos embaixo da cabeça (?) escassos e amarelos. Antenas amarelo-avermelhadas, o terceiro segmento preto na parte anelada, comprido e com dente comprido; primeiro segmento duas vezes mais comprido do que o segundo; o terceiro grosso com o dente alcançando os anéis que são de tamanho quase igual. Fronte pálido-amarelada; calo frontal pardo-escuro brilhante, quase quadrado, emitindo uma linha elevada para o vértice, que tem a cor fusca.

Tórax amarelado com pêlos dourados e faixa parda no centro; escutelo pardo. Abdome pardo-avermelhado, o primeiro segmento mais pálido com pêlos dourados, as margens anteriores dos outros segmentos pardas com margens posteriores avermelhadas, cobertas por pêlos fulvos; face ventral amarelada com ápice pardo. Pernas amarelo-avermelhadas, tíbias posteriores e tarsos pardo-escuros. Asas hialinas, margem anterior parda, a faixa começando perto do ápice atravessa a forquilha da veia terceira e depois, estreitando-se, atravessa o ápice da célula discoidal, terminando na quinta célula posterior; o ápice da célula anal e sua margem interna são pardos.

Comprimento 12mm.

A espécie aproxima-se de salvadorensis pelo tamanho e pelo desenho das asas; do outro lado parece distinguir-se pelas calosidades da fronte e da face, a cor das pernas e outros pontos menores. Não se conhece o desenho dos olhos, pelo qual a salvadorensis se distingue facilmente da cervicornis.

Termino aqui a lista das espécies conhecidas de Dichelacera. Posto que seja muito extensa, devem-se esperar ainda adições futuras. Não julgo justificada uma subdivisão do gênero, mas podem-se distinguir pequenos grupos baseados em um ou outro caráter; esses grupos, todavia, são de natureza completamente artificial.

Tratarei agora do

Gênero Stibasoma SCHINER (L. 5)

Como resulta da tradução do texto original:

Cabeça mais larga que o escudo, um tanto achatada, escavada por trás; olhos glabros, nas fêmeas separados pela fronte pouco larga; ocelos faltam; antenas nascendo acima do meio da cabeça, artículos primeiro e segundo curtos, o segundo terminando em espinho dorsal, o terceiro profundamente chanfrado do lado dorsal, com dente comprido, grosso e rombo na ponta, pouco mais curto que o próprio artículo, que tem cinco anéis, o primeiro largo, os outros muito conchegados, pequenos; face inferior abaulada, as genae separadas do resto por depressão profunda. Tromba grossa e curta, os cabelos um tanto alargados, os palpos da fêmea longos e largos na ponta anterior. Escudo pouco abaulado, a largura quase igual por diante e por trás e apenas maior do que o comprimento; escutelo abaulado. Abdome pouco mais comprido que o escudo, muito espesso, grosso e convexo. Pernas fortes, nas anteriores os quadris quase do comprimento dos fêmures, as tíbias largas e grossas, curvadas, os tarsos largos, nas pernas do meio e de trás os quadris curtos, os fêmures fortes, as tíbias de trás largas e ciliadas de modo conspícuo que as faz parecerem mais largas ainda. Tarsos como nas pernas anteriores. Asas com a nervatura igual à do gênero Tabanus, a primeira célula da margem posterior largamente aberta, o ramo superior da forquilha cubital sem apêndice. Espécie típica: Tabanus thiotaenia W.

O novo gênero se distingue, no hábito geral, do gênero Tabanus pelo abdome grosso, muito convexo e relativamente curto, e também pelas tíbias anteriores espessadas e curvas; de Selasoma e Hadrus pela formação das antenas e pela cor que não é metálica. O Tabanus tristis W. também pertence a este grupo.

Como se conclui da continuação do texto, Schiner também inclui em Stibasoma o Tabanus fulvohirtus W., posto que seja bastante diferente das espécies mencionadas.

Kertész dá apenas uma lista pequena de espécies de Stibasoma; a de Ricardo é pouco maior; todavia, o número das espécies registradas é bastante maior, posto que em alguns casos se trate de sinônimos e em outros a posição sistemática não seja completamente certa.

De espécies pertencentes a este gênero acho na literatura as seguintes: Tabanus festivus, fulvohirtus, thiotaenia, e tristis Wied., flaviventris Macq., mallophoroides Walker, Stibasoma bicolor Bigot e willistoni Lutz, cujo macho foi descrito por Williston. Acresce a nova espécie St. semiflavum Lutz.

As seguintes espécies parecem sinônimas: dives Walker e flaviventris Macq., compactus Walker e fulvohirtus Wied.; enfim, chionostigma Osten-Sacken e St. Pachycephalum Bigot talvez sejam idênticas, porém esta forma, alheia a nosso território, talvez tenha de entrar em outro gênero.

T. ferreus Walker é um macho mal conhecido que provavelmente não entra no gênero Stibasoma.

Tenho razões para supor que nas coleções européias haja ainda outras espécies, mas nas circunstâncias atuais não me foi possível comparar os tipos e tenho de adiar isso para tempos mais favoráveis.

Geralmente o material existente em coleções não deixa de ser bem escasso, visto tratar-se de espécies raras e pouco agressivas. Há nele uma proporção extraordinária de machos, que, por sua semelhança com himenópteros, facilmente caem na mão de colecionadores deste grupo.

O caráter fundamental está na imitação de himenópteros que determina a aparência e as diferenças dos vários grupos; estranha-se não vê-lo registrado na literatura. Posto não tenha determinado uma modificação das antenas como no gênero Acanthocera, aparece todavia na coloração, no hábito geral, no revestimento de pêlos e na formação de escovas nas pernas. Os grupos de espécies semelhantes de Stibasoma se explicam pelo mimetismo de himenópteros idênticos ou aliados, dependendo as formas diferentes da imitação de outros modelos. Por isso, pode se dispensar uma divisão anterior deste gênero, ainda imperfeitamente conhecido, posto que haja nos machos diferenças extraordinárias no aspecto dos olhos e em ambos os sexos na aparência das pernas e no hábito geral.

O gênero é principalmente representado na América do Sul; em direção ao norte não passa do México.

Em vez da longa descrição de Schiner bastam os caracteres seguintes para diferenciar as fêmeas de outras tabaninas esquistóceras: grande semelhança com Centris, Bombus, Xylocopa, Euglossa ou outros himenópteros (bem constante nas espécies típicas, estatura compacta, às vezes extraordinariamente curta e grossa, cabeça em forma de calota chata, escavada por trás. Último artículo das antenas com dente comprido e curvo, a principal quase ou completamente angulosa: segundo artículo papal com base larga; olhos glabros, sem desenho. Calo frontal continuado em crista, às vezes com sulco mediano. Asas nunca completamente branco hialinas, sendo amareladas, pardas ou pretas em extensão variável, sem apêndice e com a primeira célula marginal posterior aberta. Todas as tíbias ou, pelo menos, as de trás, às vezes também os fêmures, ciliados em forma de escovas pretas, às vezes com uns tufos brancos; além disso, as tíbias, pelo menos em parte, são espessadas, convexas no dorso e lateralmente achatadas. Nos machos os olhos são mais hemisféricos, com facetas maiores em disposição variada; artículo terminal dos palpos dirigido para diante, abdome terminado em ponta.

Segue agora a descrição das espécies conhecidas:

1. Stibasoma thiotaenia (WIED.)
Tabanus thiotaenia WIED.

Preto; base do abdome cor de enxofre, asas pretas, mais claras no ápice extremo. – 6 linhas ♀. – De Montevidéu ao Brasil.

Preto com pêlos pretos; estatura compacta. Antenas grossas; terceiro segmento mais curto do que de costume, porém com dente muito forte e alongado. Calo frontal oval. Ápice do primeiro e todo o segmento segundo e também o ventre (embora menos densamente) cobertos de pêlos de cor de enxofre; região anal ligeiramente avermelhada. Halteres com capítulo branco. Tíbias com cílios pretos na margem exterior. Tarsos posteriores amarelo-pardacentos. – Em minha coleção.

A identificação da espécie é fácil, apesar da brevidade da descrição. Tratando dela, Schiner (L. 5) escreveu o que segue, em tradução:

Um exemplar sul-americano que tenho diante de mim concorda com a descrição Wiedemann, além de ser garantida a determinação por confronto com exemplares típicos da coleção de Wiedemann. Para completar a descrição acrescento o que segue:

O ápice do terceiro artículo antenal é vermelho-amarelo, o calo frontal oval e um pouco alargado anteriormente e dividido por um sulco no meio; os dois primeiros anéis do abdome são amarelo-claros, quase brancos, os anéis que seguem amarelo-vermelhos, o ventre enegrecido na base (a pilosidade no exemplar presente está raspada), pernas pardo-enegrecidas, tarsos vermelho-amarelos. Todo o resto como foi indicado por Wiedemann.

A descrição de Schiner, longe de representar um progresso, faz desconfiar que seu exemplar estava mal corado ou desbotado, se não se trata de outra espécie. Williston criou outra complicação, designando o macho de outra espécie como pertencente talvez a thiotaenia.

Conheço vários exemplares desta espécie; todos combinam com o da estampa e com a descrição de Wiedemann, parecendo supérfluo dar nova descrição da fêmea. Três machos mostravam sobre os olhos confluentes o desenho que aparece na estampa, onde a cabeça do macho foi tomada de cima; persiste nos exemplares secos e indica as facetas maiores; por fora estas são muito miúdas, apenas apreciáveis a olho nu.

A espécie é escassa, mas bastante espalhada. Conheço-a dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, sendo dois exemplares colhidos no mês de dezembro. Tenho também dois exemplares do Paraguai.

A indicação de Wiedemann parece indicar que vai até o Rio da Prata, o que é um tanto duvidoso. As espécies marcadas no trabalho de Schiner geralmente não são do Brasil, mas, pelo menos em parte, da Venezuela, todavia a sua determinação é bastante incerta.

A semelhança com um himenóptero como Bombus ou Euglossa é muito acusada, não obstante não me constar uma espécie de desenho muito semelhante.

Já expliquei em outro lugar que o nome deve ser escrito thiotaenia, em razão da faixa de cor de enxofre, sendo a grafia theotaenia baseada em erro tipográfico. Mais errada ainda é a grafia theotaeniata adotada por Williston.

2. Stibasoma willistoni LUTZ

Williston deu de um macho de Stibasoma de Mato Grosso (Chapada) a descrição que segue em tradução:

♂ Facetas dos olhos muito alargadas na parte de cima, pequenas na de baixo; olhos glabros. Ocelos faltam. Galho lateral do terceiro artículo antenal muito grande, alcançando o fim da porção não anelada; estilo curto, preto, ligeiramente polvilhado. Palpos pretos, com pilosidade preta.

Tórax preto-escuro, com pêlos pretos. A face dorsal ligeiramente coberta por pólen branco. Todo o abdome preto-escuro e lustroso com todos os pêlos pretos; pernas preto-escuras; tíbias da frente dilatadas; as de trás com cílios pretos do lado externo e interno. Asas pardo-escuras, o ápice cinzento hialino. Comprimento 16mm.

Se este for o ♂ de S. theotaeniata, difere muito na coloração do abdome, que Schiner dá por amarelo-claro nos segmentos basais. Não havendo descrição de ♂ deste gênero, a existência de semelhante diferença sexual não é de todo impossível. Que não se trata de fulvohirtum ou triste é evidenciado pelas asas pretas, e se a espécie não é S. theotaenia deve ser de nova e a fêmea desconhecida.

Trata-se de fato de espécie nova cuja fêmea, inteiramente parecida, conheço muito bem. (Também um dimorfismo sexual de coloração neste gênero não foi observado, nem há probabilidade.) Dou a essa espécie o nome do primeiro observador. Uma fêmea, procedendo da minha coleção, já foi figurada em Surcouf & Gonzalez-Ricones, Essai sur les diptères vulnerants du Venezuela (Part 2, Paris, 1912).

Dou em seguida a descrição de uma fêmea:

Comprimento 18mm; cor geral preta.

Cabeça, tromba, antenas e palpos pretos, as últimas do lado interno com brilho branco e pêlos claros, curtos e espaçados, o dente longo, curvo e rombo; calo frontal claviforme, lustroso, de cor preta, tirando sobre o vermelho; subcalo e vértice pretos com brilho alvacento, devido a pólen e pêlos finos de cor clara. Occipício com pólen claro sobre fundo escuro.

Tórax com pêlos pretos, muito caducos no escudo, que tem o fundo lilás avermelhado, com duas faixas longitudinais, alargadas por diante, de cor mais escura, quase preta.

Abdome nos dois sentidos muito convexo, o fundo preto com pêlos espaçados, bastante finos, margem posteriores dos segmentos mais claros, vermelho-pardacentos ou lilases.

Pernas ocráceas, fêmures e tíbias com escovas de cílios pretos, muito compridos nos de trás, principalmente no lado exterior da tíbia, onde há também alguns pêlos brancos; os tarsos menos pilosos e mais claros, os últimos pardo-claros, por baixo, com brilho dourado.

Asas pardo-sépia com brilho azulado, ápice e às vezes o centro de várias células mais claros, sem serem hialinos; primeiro ramo da nervura forqueada com ângulo arredondado, a primeira célula da margem posterior um tanto estreitada na margem, célula anal fechada antes da margem; escâmula quase preta com margem estreita, de cor mais clara; halteres pardos com a face terminal assaz clara.

A espécie foi encontrada nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. O exemplar da Chapada de Mato Grosso prova que, na mesma latitude, ocorre também muito longe do litoral. Tanto se parece com uma espécie de Bombus que não pode ser distinguida quando voa, de modo que, para obtê-la, é preciso apanhar todos os insetos pretos com aparência de Bombus que voam em redor de pessoas e animais, mesmo quando não procuram pousar. Assim obtive vários exemplares na região de Santos, uma vez três, no mesmo dia. Aparecem pelo menos de dezembro até março.

3. Stibasoma flaviventre (MACQ.)
T. flaviventris MACQ. (?1847)

Tradução da descrição do autor (L. 2):

Com tórax, antenas e pés pretos. Abdome ruivo com incisuras amarelas. (Est. I, Fig. 4).

Compr. 8 1. ♀. – Palpos pretos, na base com ligeira penugem branca; pêlos das Genae ruivos; o resto da fronte preto; um pouco de penugem branca de cada lado, perto da sutura, calosidade alargada e arredondada por diante. Olhos glabros com facetas pequenas. Antenas: terceiro artículo de base parda, o dente alcança três quartos do comprimento do artículo; os dois últimos artículos fulvos. Tórax coberto de espessa penugem preta; uma parte exposta mostra o fundo pardo; escutelo de pardo testáceo. Abdome com fundo fulvo-avermelhado, coberto de espessa penugem alaranjada, amarela nas incisões; ventre preto, todos os segmentos com margem posterior de penugem amarela. Pernas anteriores tumefeitas, arcadas, anteriormente ciliadas; as posteriores ciliadas por diante e por trás, todas com mancha basal e anterior de pêlos brancos; empódios fulvos. Asas amareladas, com base de colorido castanho enegrecido; célula mediastinal fulvo-pardacenta; nervuras normais.

Do Rio Negro. M. Fairmaire.

Descrição e figura mostram claramente tratar-se de Stibasoma. Possuo também um macho da mesma zona, reproduzido na Fig. 22, que combina perfeitamente, como resulta desta descrição breve:

Comprimento: 17mm. Cabeça preta. Olhos com margem preta, mais larga abaixo, formada por facetas pequenas; o resto vermelho-escuro com facetas largas. Tromba e palpos pretos, com pêlos pretos; artículo terminal dos palpos oval, dirigido um pouco para cima. Antenas: os dois primeiros artículos pretos, o terceiro pardo-avermelhado formando ângulo obtuso, o dente pouco arcado, quase paralelo com o ápice do artículo terminal. Margem ocular inferior e parte da face com induto prateado de grânulos finos. Barba preta.

Fundo do tórax chocolate, misturado com vermelho, principalmente dos lados e abaixo; os pêlos conservados são pretos.

Abdome, nos dois primeiros segmentos, ocráceo virando depois em alaranjado, com pêlos finos, amarelos e pretos, formando franjas na margem apical dos anéis, estreitas no dorso e largas no ventre; neste fundo é muito enfuscado, principalmente por diante e no meio.

Pernas chocolate, virando para pardo-avermelhado ou preto, com pêlos espessos e compridos, de cor preta, menos na base das tíbias onde são níveos. Tíbias anteriores em cima convexas e lateralmente compridas, as posteriores com duas fileiras de cílios.

Asas com a base de pardo-avermelhado escuro; célula costal e parte das vizinhas amareladas, as nervuras desta e o estigma ferrugíneos; o resto das asas de cinzento muito diluído, o que não aparece bem na figura. Escâmulas pardo-escuras, capítulos dos halteres pardo-claros.

O macho aqui descrito e figurado foi apanhado no Pará em fevereiro de 1913. Parece-se extraordinariamente com um himenóptero da mesma zona, determinado por Ducke como Euglossa mocsáryi Friese, sendo todavia um pouco menor do que um exemplar dessa abelha, procedente do Rio Madeira.

Como resulta da descrição do autor e das observações de Ricardo, Tabanus dives Walker é sinônimo, tendo o comprimento de 18mm. Das duas fêmeas o cotipo foi colecionado por Bates no Rio Amazonas; o tipo certamente procede da mesma região.

4. Stibasoma fulvohirtum (WIED.)
Tabanus fulvohirtus WIED.

Tradução da descrição original:

Preto, com pêlos amarelo-dourados; antenas com dente muito alongado, pernas do meio totalmente, as outras apenas nos joelhos e tarsos pardo-ferruginosos. – 5 3/4 linhas ♀. – Do Brasil.

Antenas pretas, dente da base do segmento terminal rombo na ponta; face inferior preta, com pêlos dourados; barba amarela de ouro; palpos pardacentos pretos; fronte preta, calo preto em ovalo pontudo, continuando em linha elevada e lisa; parte inferior da fronte amarelada. Tórax amarelo-dourado muito carregado, como também o abdome, munido de incisuras esbranquiçadas; ventre preto, as incisuras com pêlos amarelados. Asas de cor amarelada muito acentuada, no ápice um tanto enfumaçadas, halteres amarelos com capítulo branco. Base dos fêmures preta, na da frente apenas o ápice pardo-ferruginoso, com pilosidade branca; tíbias do meio em certa direção quase inteiramente alvacentas; tarsos anteriores pardacentos, os de trás com cílios pretos. – Na minha coleção e no Museu de Berlim.

Schiner escreve a respeito desta espécie (L. 5):

Duas fêmeas da Colúmbia. A determinação é assegurada por comparação com exemplares típicos da coleção de Wiedemann. As antenas dos exemplares presentes não são pretas, porém castanho-enegrecidas, a face interior coberta de pó e pêlos cinzento-esbranquiçados, também a fronte por diante é alvacenta, não amarelada. O abdome é preto; debaixo das incisuras brancas, formadas por pêlos curtos e muito finos, a cor do fundo é ferruginosa. Os quadris são amarelos, os fêmures, menos os ápices, as tíbias, menos as bases, pretos, o resto ferrugíneo, como também os tarsos; todas as partes claras têm pêlos alvacentos, as escuras pretos; os cílios da face exterior das tíbias de trás muito conspícuos.

Miss Ricardo declara que T. compactus Walker é sinônimo de St. fulvohirtum e que as observações de Schiner e Osten-Sacken se aplicam também ao tipo de Walker. A descrição deste segue aqui:

Fem. Preta. Cabeça por baixo com tomento e pêlos pruinosos; fronte de cada lado com pêlos fulvos. Olhos bronzeados, com facetas muito miúdas. Antenas grossas, os dois primeiros artículos com penugem pruinosa, terceiro com a base vermelha, armado com chifre curvado, comprido e espesso. Tórax ferruginoso nas margens laterais, revestido ligeiramente com pêlos fulvos. Peito com pêlos e tomento pruinosos em todos os segmentos. Pernas fortes, com pêlos pruinosos; trocanteres, fêmures na base, joelhos, tíbias do meio e tarsos de trás fulvos; tíbias da frente ligeiramente dilatadas, com franjas de pêlos pretos e outros brancos em direção à base; tarsos curtos e grossos. Asas ligeiramente amarelas, acinzentadas nas margens posteriores e em direção aos ápices; veias fulvas, pretas em direção às margens; primeiro ramo da veia cubital simples, formando, perto da base, um ângulo muito obtuso e arredondado; veias externo-medianas separadas; veia subanal unida à anal a breve distância da margem. Halteres fulvos, com capítulos brancos. Comprimento do corpo 6, das asas 10 linhas.

Ega, no Amazonas. Da coleção do Sr. Bates.

Além de Ega e da Colúmbia a espécie também foi encontrada no Panamá (Champion). Osten-Sacken (Biol. Centrali-Americana, Diptera T. 1, p.57) diz, a respeito dela:

Tenho um único exemplar do Panamá, que comparei com os tipos em Londres e Viena. Combina em tudo, menos na franja na margem posterior do primeiro segmento abdominal, que difere da dos outros segmentos em ser fulva, em vez de branca. A descrição das pernas devia ser emendada; a cor do fundo é toda avermelhada, mas, mais ou menos escondida por pêlos de comprimento e densidade variados; nos fêmures essa pilosidade é preta, mas a cor avermelhada do fundo aparece na face posterior; nas tíbias os pêlos são brancos na base, pretos apenas na parte distal; nas tíbias da frente o branco ocupa menos da metade, nas do meio muito mais da metade do comprimento total; os pêlos são especialmente longos nas tíbias de trás, o branco na base ocupa cerca de um terço do comprimento. Os tarsos têm pubescência microscópica, prateada no lado de cima e fulvo-avermelhada no de baixo. As asas são distintamente tintas em amarelo, da base até o fim da primeira veia e da costa até a quinta veia; o ápice e uma larga margem posterior são acinzentados. Tenho poucas dúvidas sobre a identidade específica.

Dou em seguida a descrição da fêmea (Fig. 23), apanhada em 1° de dezembro de 1907 a bordo de um vapor fluvial na costa de Marajó, entre Chaves e Breves. Por causa da sua cor mais escura julguei primeiramente tratar-se de espécie nova, todavia parece ligada por transições com o fulvohirtum típico.

♀. Comprimento do corpo (sem os apêndices) cerca de 15mm.

Tromba lustrosa, preta; face, fronte e palpos com pó e pêlos brancos sobre fundo preto; antenas com a forma típica do gênero, primeiro artículo com pequenos pêlos brancos e pretos, segundo com pilosidade branca, último pardacento; calo frontal claviforme, ligado por trás com um triângulo comprido que representa o tubérculo ocelar. Olhos pretos, sem desenho; occipício sobre fundo preto com pó branco e pêlos claros. Barba escassa, branca.

Tórax em cima raspado, com duas estrias longitudinais apagadas, de cor lilás pálido; adiante e por baixo da raiz das asas pequenos tufos de pelinhos níveos; lado ventral preto com pó branco, lateralmente com mancha avermelhada, os pêlos brancos e pretos; escutelo preto, a margem lilás pardacenta.

Abdome preto lustroso, com cintas amarelas na margem posterior dos segmentos, nos três primeiros dorsais alargados no meio; no primeiro segmento há no ventre apenas um tufo mediano de cor amarela.

Pernas, na maior parte, pardo-enegrecido, as tíbias anteriores em cima convexas, lateralmente comprimidas, os dois quintos basais ocráceos com cílios brancos; tíbias do meio normais, a metade basal ocrácea com cílios brancos, as de trás com a base ocrácea, com cílios compridos por fora, sendo as da base brancas e as demais pretas; cílios do lado interno mais curtos e pretos; todos os empódios amarelos.

Asas na costa e na margem de trás não como aparece na figura, mas de pardacento diluído, no resto amarelas, com as nervuras pardo-amarelas; base e célula costal cor de mel, estigma pardacento; escâmulas pardacentas com estreitas bordas mais claras; halteres pardo-claros, capítulos com a face terminal mais clara.

Mais tarde (1911) obtive outro exemplar do Pará, ao qual faltavam as antenas; as pernas são muito mais claras, o preto muitas vezes substituído por ocráceo; as nervuras das asas com estreita tarja parda. Nem por isso se trata da mesma espécie que, sem dúvida, é pouco variável na coloração; por isso, não posso considerá-la diferente da dos exemplares de Wiedemann e de Walker.

5. Stibasoma triste (WIED.)
Tabanus tristis WIED. (L. 8)

Tradução da descrição original:

Preto com a base do abdome amarela e asas amarelas, enfumaçadas no ápice. – 5 1/2 linhas ♀. Do Brasil.

Vizinho de T. tibialis e theotaenia. Antenas pretas, dente do terceiro artículo alongado ou em forma de espinho; cabeça e palpos pretos; fronte lustrosa com calo transversal e linha elevada, glabra. Escudo preto lustroso com margens laterais um tanto pardacentas; escutelo preto lustroso; pleuras pretas. Primeiro e segundo segmento abdominal amarelados, na parte do meio do segundo uma mancha enegrecida larga, convexa adiante; incisuras dos segmentos seguintes amarelas, a mais vizinha um pouco mais larga, as outras muito mais estreitas. As partes amarelas cobertas por pequenos pêlos, mais claros e de amarelo mais bonito, observados ainda no terceiro segmento; no quarto e nos seguintes parecem tornar-se pretos. Ventre preto com largas incisuras amarelas. Velas das asas de amarelo carregado, asas enfumaçadas no terço apical; halteres amarelos com capítulo branco. Pernas pretas, tíbias compridas e espessadas, com cílios pretos na margem exterior convexa, na raiz externa com pêlos brancos. – Na minha coleção.

A espécie seguinte, de Bigot, parece apenas um sinônimo:

6. Stibasoma bicolor BIGOT
(Mém. Soc. Zool. France, v.1892)
Tradução da descrição original:

Stibasoma bicolor, ♀, long. 13 vol. 10mm.

Haustelo preto, apenas igual à cabeça em altitude; olhos glabros; palpos, antenas, face e fronte de preto escuro; dois tubérculos pretos, pouco acentuados; barba pardacenta. Corpo de preto lustroso, base do abdome com duas manchas laterais largas, de cor amarelo-fulva; um tufo de pêlos brancos perto da inserção das asas; escâmulas pardas, halteres alvacentos; asas cinzentas, base e bordo externo largamente tintos de amarelo-fulvo; pés pretos, com cílios pretos, muito curtos.

O tamanho parece variar consideravelmente.

Brasil. – Dois exemplares.

A respeito de duas fêmeas dessa espécie que parecem ser os tipos originais, escreve Ricardo:

Esta é espécie pequena, preta, os dois primeiros segmentos do abdome amarelos dos lados, as asas hialinas (?), tintas de amarelo na base e na margem anterior e com veias amarelas. O dente comprido do terceiro segmento antenal alcança o segundo anel que é pequeno e curto como também os três últimos, sendo o terminal munido de ponta.

(O ponto de interrogação foi colocado por mim, porque Bigot diz: “Ailes grises”, o que corresponde à regra.)

Examinei e mandei figurar, há tempo, uma fêmea, que não tenho mais presente e que se distingue por tamanho maior (15mm), os apêndices mais claros, principalmente as antenas que são pardo-ferruginosas e as manchas laterais que invadem o terceiro segmento abdominal. O calo corresponde à descrição de Bigot, o preto do segundo anel abdominal termina numa linha transversal plana. O exemplar estava muito raspado, mas está bem representado no desenho, apenas a parte apical e posterior da asa devia ser mais acinzentada. O original foi apanhado no limite dos estados do Rio de Janeiro e de Minas.

7. Stibasoma festivum (WIED.)
Tabanus festivus WIEDEMANN (L. 8)

Tradução da descrição original:

Preto intenso; raiz extrema e margens laterais do abdome cor de enxofre; ventre no meio amarelo de ouro; tíbias de traz com cílios níveos; asas pretas. – 7 1/3 linhas ♀. – Do Brasil.

Vizinho do tibialis e muito semelhante ao seguinte (hiotaenia), estatura, antenas e calo frontal da mesma forma, porém a pilosidade cor de enxofre ocupando todo o primeiro segmento abdominal, mas no segundo apenas, de cada lado, um quarto de largura; margens laterais dos segmentos 3-5, como também os lados dos primeiros segmentos ventrais, com espessa pilosidade dourada, virando para o ruivo. Extremo ápice antenal amarelado. O escudo raspado mostra duas estrias lineares branco-avermelhadas, abreviadas por trás; os quatro cantos também são avermelhados; o triângulo antealar todavia é amarelo-pardacento. Extremo ápice da asa e uma mancha longitudinal do campo médio quase hialinos. Pernas pretas; tarsos ruivos: extrema raiz das tíbias da frente e nas de trás, a margem posterior até o ápice, com pêlos níveos. Também adiante da base da asa um tufo de pêlos níveos. – No Museu de Berlim.

Não se conhece bem o habitáculo dessa espécie, rara mas fácil de reconhecer-se em bons exemplares; parece que depois da descrição de Wiedemann foi reencontrada uma vez apenas: Williston registra a observação com estas palavras:

Tabanus festivus Wiedem. Chapada.

As tíbias, densamente ciliadas, na frente de preto e atrás de branco, permitem facilmente reconhecer esta espécie.

Pode-se supor que se trata de uma fêmea e da Chapada, perto de Cuiabá. Estranha-se que Williston não chame a espécie de Stibasoma, visto que já Wiedemann salienta a sua semelhança com thiotaenia.

Não posso dar uma figura, sendo esta aliás dispensável para a determinação.

8. Stibasoma mallophoroides (WALKER)
Tabanus m. WLK (L. 6)

Tradução da descrição original:

Fêmea. – Preta, grossa e curta: cabeça, dos dois lados, branca por cima e na margem dos olhos; dois calos pequenos e lustrosos; antenas com chifre curvado quase tão comprido como o segmento 3 e os seguintes reunidos; tórax de cada lado com ponto branco na base da asa; abdome vermelho, com duas cintas amarelas basais, unidas embaixo, mas largamente interrompidas no meio, havendo uma estria enegrecida acima e no meio: tíbias ciliadas; fêmures ligeiramente ciliados; asas enegrecidas, com reflexos arroxeados; em cada disco uma estria lurida; ápices hialinos, ligeiramente acinzentados; halteres fulvos com extremidade branca.

Comprimento do corpo 6, das asas 12 linhas.

Vizinho de T. festivus Wied.

Região Amazônica.

Essa bonita espécie, que vi em original, não é citada por M. Ricardo com o nome dado por Walker, ao menos no gênero Stibasoma, do qual sem dúvida faz parte.

9. Stibasoma semiflavum n. sp .

Comprimento 14mm, coloração preta com larga faixa abdominal amarela; as asas não são pretas.

Possuo um macho de Santa Catarina, colecionado pelo Sr. J. Schmalz em Joinville que lembra muito o flaviventris de Macquart. Todavia é um tanto menor, o campo basal da asa não é castanho enegrecido; a parte terminal preta do abdome fornece diferença muito evidente. Trata-se sem dúvida de espécie nova. Noto mais as seguintes minúcias:

Fundo da cabeça preto com pó acinzentado. Tromba muito curta, palpos enegrecidos, com pêlos pardos. Antenas preto-avermelhadas, artículo terminal com ângulo muito obtuso, o dente curvo e afilado. Olhos com facetas pequenas apenas no terço inferior, no resto são maiores; a cor, no exemplar seco, castanho-avermelhado até preto. Barba castanha. Tórax chocolate, os pêlos fuliginosos. Os três primeiros anéis abdominais, tanto no dorso como no ventre, ocráceos, com pequenos pêlos amarelos com brilho de seda; o resto castanho enegrecido, apenas a margem posterior dos segmentos mais clara. Pernas castanhas, com ápice preto. Fêmures com pêlos espessos, porém pouco compridos; todas as tíbias um pouco espessadas e convexas no dorso, apenas as últimas com duas fileiras de cílios muito curtos.

Estampa 19

Lista das espécies figuradas

1.Acanthocera longicornis (F)

2.Acanthocera exstincta (WIED.)

3.Acanthocera coarctata (WIED.)

4.Acanthocera marginalis (WALKER)

5.Acanthocera trigonífera SCHINER

6.Acanthocera tennicornis LUTZ

7.Acanthocera nigricorpus LUTZ

8.Acanthocera anacantha LUTZ & NEIVA

9.Acanthocera intermedia LUTZ

10.Acanthocera quinquecincta LUTZ

11.Acanthocera cristalis LUTZ

Os números de ordem correspondem aos do texto.

Estampa 20

Lista das espécies figuradas

1.Dichelacera alcicornis (WIED.) Com cabeça do %

2.Dichelacera cervicornis (F.)

3.Dichelacera damicornis (WIED.)

4.Dichelacera Januarii (WIED.)

5.Dichelacera rubricosa (V. D. WULP)

6.Dichelacera varia (WIED.)

7.Dichelacera marginata MACQ. Com variedade de nervura nas asas.

8.Dichelacera submarginata LUTZ.

9.Dichelacera scutellata WILL

10.Dichelacera incerifascia LUTZ

11.Dichelacera trigonotaenia LUTZ

12.Dichelacera multiguttata LUTZ

Estampa 21

Lista das espécies figuradas

13.Dichelacera salvadorensis LUTZ

14.Dichelacera callosa LUTZ

15.Dichelacera micracantha LUTZ

16.Dichelacera bifacies WALKER

17.Dichelacera fuscipes LUTZ

18.Dichelacera intermedia LUTZ

19.Dichelacera modesta LUTZ

20.Stibasoma thiotaenia (WIED.)

21.Stibasoma willistoni LUTZ

22.Stibasoma euglossa LUTZ

23.Stibasoma dives (WALKER)

24.Stibasoma triste (WIED.)

Todas as figuras representam ♂ ♀; o risco ao lado indica o tamanho natural.

LITERATURA

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