VIII
O SER HUMANO
NASCEU NA ÁFRICA

 

O ser humano nasceu na África,

daí se espalhou para todos os lugares.

E viva o rei Zumbi do Quilombo dos Palmares!!!!

 

“Onde foi que Jesus ensinou sua filosofia?

Foi na Bahia, foi na Bahia!”

Noel Rosa

 

Miriam em aramaico é Maria.

Miriam de Migdal, Maria Madalena.

Aqui é Miriam Maria de Bethânia.

Ela vem do mais profundo início do teatro de Ésquilo onde as falas são cantadas.

Mas é mais atrás, é mais agonal

vem da grande mitologia

da literatura oral de Homero

Hesíodo

dos candomblés

de Dom Sebastião que morreu em Alcácer-Quibir

de cânticos de luz de axé de flores amores que é

Jesus de Nazaré e os tambores do candomblé.

 

O perfeito equilíbrio simultâneo

quando ela canta ela irradia

entre o esplendor de todos os paganismos

e o esplendor de todos os cristianismos

humanismos democracia anarquismo socialismo pacifista

da Amálgama,

com a qual José Bonifácio nos definiu em 1823 dizendo:

“diferente dos outros povos e culturas, nós somos a Amálgama,

esta Amálgama tão difícil de ser feita”.

 

 

Quando ela entra no palco transforma o palco em altar

e ao mesmo tempo-espaço em terreiro.

O altar é de Palas Atena

e o terreiro é de Iansã.

Sua presença é um incêndio de paixão que ressuscita o tempo todo

o seu canto nagô que é banto e é o amor

e que em sua voz tão bela e cheia de bem-querer

é Benguela e Gegê,

pra irradiar a instantaneidade da vibração da vida

com todos os entrelaçamentos das dimensões da graça divina

que começa lá na infância

em sua família

lá em Santo Amaro

desta Bahia onde o Brasil começou

e não é à toa

que foi seu irmão Caetano

quem lhe deu o nome

inspirado na música

cantada por Nelson Gonçalves.

 

Ela é poeta

filósofa

pensadora

ativista social política

pioneira dos feminismos

irradiadora de um conhecimento absorvido

em leituras incessantes

de Fernando Pessoa

dos filósofos

e também não foi à toa

que foi lançada pelo magnífico Vinicius de Moraes

que a trouxe para o Rio de Janeiro.

 

Ela vive perto de Jorge de Lima

da neurociência

e o que é mais impressionante para mim

é um constante mistério

que ela irradia com seu talento

que é ao mesmo tempo antiquíssimo

e reflete todas as emoções e informações dos ancestrais

e ao mesmo tempo, de novo a simultaneidade,

traz sempre a novidade

é o eternamente novo.

Na verdade são cânticos religiosos

incluindo cânticos das religiões ateias

mas todas anunciando a mensagem

do presente

que arrasta o passado

em direção ao futuro

e se eu fosse resumir

em todas as miríades

de interpretações e composições

de Dorival Caymmi a outros tantos

gênios da cultura brasileira e internacional

eu acho que está no Evangelho de São João em que uma voz anuncia:

“Uma criança nasceu entre nós”.

 

Ela tem o expressionismo com um afastamento mediúnico,

ela tem também Villa-Lobos que disse:

“aprendam harmonia e contraponto a fundo e depois esqueçam tudo”

mas o que ela tem é ela mesma e isso se reflete em tudo

em mensagem permanente de ressurreição.

Com Fernando Pessoa

lado a lado com Seu Esteves e a tabacaria

a presença onipresente dos fados imortais.

E aqui eu pergunto:

Nasceram os fados no Brasil?

 

Amália Rodrigues

a grande fadista portuguesa

canta “De São Paulo de Luanda”

de Capiba:

“minha mãe chorava, kalunga,

e eu cantava, kalunga,

maracatu! Maracatu!

Nação do preto nagô”.

Bethânia quando canta

seus cantos também são acalantos

de ninar

de adormecer

a criança que nasceu entre nós

para ela ser feliz

e para morar na felicidade.

 

Dizem que nossa arte é barroca,

ela é mais do que isso,

é maneirista

e o maneirismo já é quântico.

 

Sua majestade tem tamanha plenitude que se apresenta com a mais extrema humildade.

Sua voz ecoa sempre nos batuques em homenagem ao rei Zumbi do Quilombo dos Palmares

ela ecoa em todos os lugares, e este canto

tem sempre aquela cor azul dos primeiros raios da manhã

que o pintor Fra Angelico captava em seus quadros.

Claro que a primeira luz do azul de anil

assim canta e caminha a rainha

porta-estandarte e porta-bandeira da bandeira brasileira.

A voz do candomblé que irradia

o Sermão da Montanha,

Maria Bethânia.

 

Eu a conheço há milênios

e me lembro que assistimos juntos

à entrada em Jerusalém

de Jesus de Nazaré montado em seu burrico.

 

No candomblé existe a árvore Iroko

que é a árvore do tempo

mas no tempo antes do tempo

Orun, o céu e suas estrelas

ou Olorun, seu orixá

habitavam aqui no planeta Terra com nossos ancestrais.

Acontece que de repente

os nossos ancestrais

começaram a tratar Orun e Olorun

com muita falta de respeito.

Alguns usavam a lua como travesseiro

outros chegavam a cuspir e urinar nas estrelas.

Então Orun e Olorun não se queixaram

porque os deuses não se queixam

apenas decidiram

já que a coisa era assim

se afastar do planeta Terra e ir morar lá no alto

onde estão até agora,

no entanto

quando Maria Bethânia canta

Orun, o céu estrelado e

Olorun, seu orixá,

voltam para ficar em nossa presença

e se o espectador prestar bem atenção

perceberá que o sol

a lua

as estrelas

os cometas descem até o chão.

Quando ela para de cantar

Orun e Olorun voltam lá para o alto

para morar no infinito novamente.

 

 

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Vi um nome do ciclone.

Vem do mal vendaval,

tem mania de ventania

o tempo do vento

que monta e que se encontra

no lento contratempo

do tempo e do vento

que vem cem por cento

além do otimismo

e aquém do pessimismo

e que vem no abismo zen,

na luz dos azuis da cruz

de Jesus de Jerusalém

e que tenta e que venta

e que entra e adentra

e precisa voar.

Desliza no ar.

Sereia do mar.

Mas a ressurreição do vento quente é,

na sua antiga versão de azuis,

Marisa, a brisa do mar.

 

Pura e dura

ditadura do não

que perfura o chão

do ser do furacão.

Exu então

no tufão

é parceiro

é por e com pulsão

do sopro que desliza em cima

do mar e sopra no terreiro,

na copa do coqueiro,

no leste da saudade,

no agreste da feliz felicidade

do ser da tempestade

e que só se acalma e se acalmaria

no pé da palma da alma,

no nó do ebó da alma

da calmaria amada

que lembra a Ave Maria sagrada

em sua cavalgada.

 

Exu, irmão que fura o cão

e entra no vão do tufão em vão

e assim as coisas vêm e vão.

 

 

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Feitiço vudu.

Fiz isso

pra Omulu. Exu

chamou para apaziguar

Ararô Ararô Iamogibá.

 

Brilha o brilho dos cristais

no filho e na filha dos casais

de quem trilha o trilho

dos mais altos astrais

que vêm do além

do abismo do budismo zen

como alguém

que feliz diz amém

e ao perdoar

não se humilha,

faz e traz do mar e da ilha

de maravilha

o que faz e traz a paz em Brasília

de leste a oeste,

de norte a sul.

 

De sul a norte,

de norte a sul

chega o canto da fé

voando pelo céu mais azul

o encanto que se irradiou

sem fel, só puro mel

do acalanto, do axé

do amor de Raul,

de Raul de Xangô.

Adonai, evoé, Kolofé,

Oxalá abençoai

saravá oh meu pai.

 

 

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Bebês e babás

Erês e orixás

Vade retro, Satanás