SEGREDOS DO OFÍCIO
Um poema sobre Conde Calúnia

– Aquela gente que fica na fila – diz o Conde – uma semana antes da estreia do filme…

Essa gente é paga pra ficar na fila.

Conde Calúnia no palco, com uma mão erguida, segurando um papel,

o papel branco, tapando o rosto.

O restante dele num terno azul, gravata vermelha. Sapatos marrons lustrados.

No punho da mão erguida, um relógio de ouro no qual está gravado: “Parabéns”.

No palco, em vez de um holofote, em vez de um rosto, está projetado no papel em letra tamanho 72:

JORNALISTA LOCAL VENCE PRÊMIO PULITZER

Atrás da manchete, Conde diz:

– Essa gente passa a vida esperando na fila…

Um sucesso de bilheteria após o outro.

Os estúdios de cinema levam os supostos fãs de

cidade em cidade.

De ficção científica a super-herói.

Toda semana uma cidade nova, um hotel novo, uma nova classificação indicativa de 13 anos que eles fingem idolatrar.

As roupas de papelão e papel-alumínio, com cara de feitas em casa,

é o Departamento de Figurino que faz e manda com antecedência.

Todo esse empenho para fazer a mídia local exibir matéria, para uma divulgação gratuita.

Gerar um burburinho confiável de que todo mundo vai amar o filme.

Todo esse gasto de tempo e de dinheiro se chama “semear audiência”.

No bolso da camiseta pisca a luzinha vermelha do gravador que registra cada palavra.

Quando Conde pergunta:

– Quem é o maior idiota?

O repórter que se recusa a inventar um sentido para a vida?

Ou o leitor que quer esse sentido?

E que se dispõe a aceitar o sentido apresentado pelas palavras de um estranho?

Por trás do jornal, Conde Calúnia diz:

– O jornalista tem o direito…

“… e o dever de destruir

“os bezerros de ouro que ajuda a criar.”