Tout le mal vient de la prédominance que l’on s’obstine à conserver aux métaux précieux dans la circulation et les échanges[b]. (p. 1, 2.)
[O livro de Darimon] inicia com as medidas que o Banco da França tomou, em outubro de 1855, |para remediar a diminuição progressiva de suas reservasf (p. 2). Quer nos fornecer uma tabelaf estatística da situação desse banco durante os cinco últimos meses que precederam as medidas de outubro. Com esse propósito, compara a sua reserva metálicai durante cada um desses meses e as “‘flutuações do portfóliof”, ou seja, a massa de descontosf realizados pelo banco (de títulos comerciais, de letras de câmbio, existentes em seu portfóliof). O número que expressa o valor dos certificadosi em poder do banco “representaf”, de acordo com Darimon, “|a necessidade maior ou menor que experimenta o público de seus serviços, ou, o que vem a ser a mesma coisa, as necessidades da circulaçãof” (p. 2). |O que vem a ser a mesma coisa? De modo algumf. Se a massa das letrasi apresentada para descontoi fosse idêntica às “necessidades da circulação”, o curso do dinheiro em sentido estrito, [ou seja], o curso das notas bancárias deveria ser determinado pela massa das letras descontadas. No entanto, esse movimento, em média, não somente não é paralelo, como é, com frequência, um movimento inverso. A massa de letras descontadas e as flutuações daí resultantes expressam a necessidade de crédito, enquanto a massa de dinheiro circulante é determinada por influências muito distintas. Para chegar de alguma maneira a conclusões sobre a circulação, Darimon deveria ter apresentado, ao lado das colunas da reserva metálicai e das letras de câmbio descontadas, uma coluna sobre o montante das notas bancárias em circulação. Para falar sobre as necessidades da circulação, era de fato evidente verificar, primeiramente, as flutuações na circulação efetiva. A omissão desse elemento necessário da comparação denuncia imediatamente o amadorismo diletante e a confusão intencional das necessidades do crédito com as do curso do dinheiro – uma confusão na qual se baseia de fato todo o segredo da sabedoria proudhoniana. (Uma estatística de mortalidade na qual figurassem, de um lado, as doenças, de outro, as mortes, mas fossem omitidos os nascimentos.)
As duas colunas (p. 3) fornecidas por Darimon, de um lado, a reserva metálica do banco de abril a setembro e, de outro, o movimento de seu portfóliof, expressam nada mais do que o fato tautológico, que não requer o esforço de ilustrações estatísticas, de que, à medida que as letras ingressam no banco para dele retirar metal, o seu portfóliof fica cheio de letras de câmbio e o seu subsolo se esvazia de metal. Nem mesmo essa tautologia, que Darimon quer demonstrar por meio de sua tabela, é expressa claramente. A tabela mostra, ao contrário, que de 12 de abril até 13 de setembro de 1855 a reserva metálica do banco diminuiu em cerca de 144 milhões, enquanto os papéis em seu portfóliof aumentaram em cerca de 101 milhões[2]. A redução da reserva metálica superou, portanto, em 43 milhões o crescimento dos títulos comerciais descontados. A identidade dos dois movimentos naufraga diante do resultado total do movimento desses cinco meses[3]. Uma comparação mais precisa das cifras nos mostra outras incongruências.
Em outras palavras: de 12 de abril até 10 de maio a reserva metálica caiu 11.700.769, enquanto o número de títulosi cresceu[4] 12.159.388; quer dizer, o aumento[5] dos títulosi supera em cerca de meio milhão (458.619 francos) a redução da reserva metálica. O inverso sucede, mas em uma proporção muito mais surpreendente, quando comparamos o mês de maio com o de junho:
De 10 de maio a 14 de junho, por conseguinte, a reserva metálica [do banco] diminuiu em 13.144.215 francos. Os seus títulosi cresceram na mesma proporção? Pelo contrário, diminuíram em 375.486 francos no mesmo período. Não temos mais aqui, portanto, simples desproporção quantitativa entre queda, de um lado, e elevação, de outro. A própria relação inversa entre os dois movimentos desapareceu. Uma enorme queda, de um lado, está acompanhada por queda relativamente fraca, de outro.
A comparação dos meses de junho e julho revela a redução da reserva metálica de 93.140.199 e o aumento dos títulosi de 71.329.717[6], quer dizer, a redução da reserva metálica foi 21.810.482[7] francos maior do que o aumento do portfóliof.
Vemos aumento em ambos os lados, de 24.154.830 na reserva metálica, e o aumento muito mais considerável de 66.990.349[8] francos no portfóliof.
A queda na reserva metálica de 50.139.111 francos vem acompanhada aqui de uma queda nos títulosi de 27.299.043 francos. (Em dezembro de 1855, apesar das medidas restritivas do Banco da Françaf, o seu encaixef havia diminuído em 24 milhões.[9])
O que vale para Pedro tem de valer para João. As verdades que resultam de uma comparação sucessiva dos cinco meses têm o mesmo direito à confiabilidade que as verdades resultantes da comparação dos pontos extremos da série feita pelo sr. Darimon. E o que mostra a comparação? Verdades que se devoram reciprocamente. – Duas vezes o crescimento do portfóliof com a redução da reserva metálica, mas de tal modo que a redução desta última não alcançou o aumento da primeira (meses de abril até maio e junho até julho). Duas vezes a redução da reserva metálica acompanhada da redução do portfóliof, mas de tal modo que a redução da última não cobriu a redução da primeira (mês de maio até junho e mês de agosto até setembro); por fim, uma vez crescimento da reserva metálica e crescimento do portfóliof, mas de tal modo que a primeira não cobriu a segunda. Queda de um lado, aumento do outro; queda de ambos os lados; aumento de ambos os lados; por conseguinte, tudo, mas nenhuma lei uniforme e, sobretudo, nenhuma relação inversa, nem mesmo uma interação, já que a redução no portfóliof não pode ser a causa da queda na reserva metálica, e o crescimento no portfóliof não pode ser a causa do crescimento da reserva metálica. A relação inversa e a interação tampouco são constatadas na comparação isolada, elaborada por Darimon entre o primeiro mês e o último. Se o aumento de 101 milhões no portfóliof não cobre a redução de 144 milhões na reserva metálica, resta a possibilidade de que não haja qualquer nexo causal entre o crescimento, de um lado, e a redução, de outro. A ilustração estatística, em lugar de oferecer uma resposta, suscitou antes uma massa de perguntas entrecruzadas; em lugar de um único enigma, uma legião. Na verdade, tais enigmas desapareceriam tão logo o sr. Darimon apresentasse, junto às colunas de reserva metálica e de portfóliof (os títulos descontados), as colunas de circulação das notas bancárias e dos depósitos. A redução da reserva metálica inferior ao crescimento do portfóliof se explicaria ou pelo simultâneo aumento do depósito de metal; ou porque uma parte das notas bancárias emitidas em razão do desconto não foi convertida em metal, mas permaneceu em circulação; ou, finalmente, porque as notas emitidas, sem aumentar a circulação, retornaram imediatamente [ao banco] sob a forma de depósitos ou de pagamento de títulos vencidos. A diminuição da reserva de metal acompanhada de um menor decréscimo do portfóliof se explicaria pelo saque de depósitos do banco ou pelo ingresso de notas bancárias convertidas em metal, de modo que a sua própria operação de desconto do banco seria afetada pelos proprietários dos depósitos sacados ou das notas bancárias trocadas por metal. Finalmente, o menor decréscimo da reserva metálica acompanhada de uma diminuição do portfóliof se explicaria com base nas mesmas razões. (Desconsideramos completamente as saídas para substituir a moeda de prata no interior do país, uma vez que Darimon as deixa fora de seu exame.) Mas as colunas que assim teriam se explicado reciprocamente, teriam igualmente demonstrado o que não era para ser demonstrado: que a satisfação das crescentes necessidades do comércio por parte do banco não necessariamente implica o aumento da circulação de suas notas bancárias, que a diminuição ou o aumento desta circulação não corresponde à diminuição ou ao aumento de sua reserva metálica, que o banco não controla a massa dos meios de circulação etc. – resultados eloquentes, que perturbam os planos do sr. Darimon. Em seu afã de apresentar de maneira espetacular sua ideia preconcebida, o conflito entre a base metálica do banco, representada por sua reserva metálica, e as necessidades da circulação, em sua opinião representada no portfóliof, Darimon saca duas colunas de seu necessário contexto, colunas que perdem todo sentido nesse isolamento ou, no máximo, depõem contra ele. Nós nos detivemos nesse fatof[10] para esclarecer, em um exemplo, todo o valor das ilustrações estatísticas e positivas dos proudhonianos. Os fatos econômicos, em lugar de fornecer a prova de suas teorias, fornecem a evidência do não domínio dos fatos de modo a poder jogar com eles. A sua maneira de jogar com os fatos mostra, ao contrário, a gênese de sua abstração teórica.
Prossigamos com Darimon.
Quando viu sua reserva bancária reduzir em 144 milhões e seu portfóliof aumentar em 101 milhões, o Banco da França adotou, em 4 e 18 de outubro de 1855, medidas para proteger seus cofres do portfóliof. Elevou a taxa de desconto sucessivamente de 4% para 5% e de 5% para 6%, e reduziu de 90 para 75 dias o prazo de vencimento dos títulos apresentados para desconto. Em outras palavras: agravou as condições sob as quais tornava o seu metal disponível para o comércio. O que isso prova? “Que”, diz Darimon, “um banco organizado segundo princípios atuais, i.e., baseado na predominância do ouro e da prata, subtrai o serviço do público precisamente no momento em que o público dele mais necessita”[11]. Precisava o sr. Darimon de seus números para demonstrar que a oferta encarece seus serviços à medida mesmo que a demanda os requer (e a supera)? E esses senhores que representam o “público” perante o banco não adotam o mesmo “agradável hábito da existência”[12]? Os filantrópicos comerciantes de cereais, que apresentaram suas letras ao banco para receber notas, para trocar as notas por ouro do banco, para converter o ouro do banco em cereal do exterior, para converter o cereal do exterior em dinheiro do público francês, por acaso partiram da ideia de que, como o público agora tinha a máxima necessidade de cereal, seria seu dever ceder o cereal ao público em condições especiais, ou, ao contrário, não correram ao banco para explorar o aumento do preço do cereal, a necessidade do público, a desproporção entre a demanda e a oferta? E o banco deve ser excluído dessa lei econômica geral? |Que ideiaf! Mas pode ser que a presente organização dos bancos signifique que o ouro tem de ser acumulado em quantidades tão grandes para condenar à imobilidade o meio de compra que, em caso de escassez de cereal, poderia ser empregado com máximo proveito da nação, para, enfim, fazer do capital, que deveria percorrer as produtivas metamorfoses da produção, base improdutiva e inerte da circulação? Nesse caso, por conseguinte, tratar-se-ia do fato de que, na presente organização dos bancos, a reserva metálica improdutiva encontra-se acima de seu mínimo necessário porque a economia de ouro e de prata no âmbito da circulação ainda não é reconduzida ao seu limite econômico. Tratar-se-ia de uma quantidade a mais ou a menos, mas sobre o mesmo fundamento. Mas o problema teria desabado das alturas socialistas na superfície prática burguesa, onde o encontramos passeando com grande parte dos adversários burgueses ingleses do Banco da Inglaterra. |Que quedaf! Ou não se trata de uma maior ou menor poupança de metal por meio de notas bancárias e outros dispositivos bancários, mas, ao contrário, de um completo abandono da base metálica? Mas, nesse caso, a fábula estatística de novo não vale, nem sua moral. Se o banco, quaisquer que sejam as circunstâncias, deve enviar metais preciosos ao exterior em caso de necessidade, precisa antes acumulá-los, e se o exterior deve aceitar esses metais em troca de suas mercadorias, os metais precisam assegurar sua predominância.
As causas da fuga de metais preciosos do banco foram, segundo Darimon, a má colheita e, em consequência, a necessidade de importar cereais do exterior. Ele esquece o déficit na colheita de seda e a necessidade de comprá-la em massa da China. Darimon menciona ainda: os grandes e numerosos empreendimentos que coincidiram, nos últimos meses, com a exposição industrial parisiense[13]. Ele esquece de novo as grandes especulações e empreendimentos no exterior realizados pelo Crédit Mobilier e seus rivais com o propósito de mostrar, como disse Isaac Péreire, que o capital francês se distingue dos outros capitais por sua natureza cosmopolita, assim como a língua francesa se distingue das outras línguas[14]. Somam-se a isso os gastos improdutivos provocados pela guerra oriental: empréstimo de 750 milhões. Em resumo, por um lado, um grande e súbito colapso em dois dos mais significativos ramos de produção franceses! Por outro, uma extraordinária utilização do capital francês em mercados estrangeiros, em empreendimentos que de modo algum criaram um equivalente imediato e que, em parte, talvez jamais cubram seus custos de produção! Para compensar, de um lado, a redução da produção doméstica mediante importação e, de outro, o crescimento dos empreendimentos industriais no exterior, eram requeridos não signos de circulação que servem para a troca de equivalentes, mas o próprio equivalente, era requerido não dinheiro, mas capital. A queda na produção doméstica francesa de modo algum era um equivalente para o emprego do capital francês no exterior. Suponha agora que o Banco da França não estivesse constituído sobre uma base metálica, e que o exterior estivesse disposto a aceitar o equivalente ao capital francês sob qualquer forma, não apenas na forma específica de metais preciosos. O banco não estaria igualmente forçado a elevar as condições de seu desconto precisamente no momento em que seu “público” mais reclamasse seus serviços? As notas com as quais o Banco desconta os títulos desse público são agora nada mais do que ordens de pagamento em ouro e prata. Em nossa hipótese, as notas seriam ordens de pagamento sobre o estoque de produtos da nação e de sua força de trabalho imediatamente utilizável: a primeira é limitada, a segunda é expansível apenas dentro de limites muito precisos e em determinados períodos de tempo. A máquina de imprimir, por outro lado, é inesgotável e funciona como em um passe de mágica. De maneira simultânea, enquanto as más colheitas de cereais e seda reduzem enormemente a riqueza da nação diretamente permutável, as ferrovias, as mineradoras etc. no exterior imobilizam a mesma riqueza permutável em uma forma que não cria equivalente imediato e, por conseguinte, momentaneamente a devoram sem reposição! Logo, a riqueza da nação diretamente permutável, capaz de circular e de ser enviada ao exterior, diminui absolutamente! De um lado, aumento ilimitado dos títulos bancários. Consequência imediata: elevação no preço dos produtos, das matérias-primas e do trabalho. De outro lado, redução no preço dos títulos bancários. O Banco não teria aumentado a riqueza da nação em um passe de mágica, mas tão somente desvalorizado seus próprios papéis em uma operação muito banal. Com essa desvalorização, paralisação súbita da produção! De modo algum, grita o proudhoniano. A nossa nova organização bancária não se satisfaria com o mérito negativo de suprimir a base metálica e deixar todo o resto inalterado. Criaria condições de produção e de intercâmbio inteiramente novas, e, portanto, interviria sob pressupostos inteiramente novos. A introdução dos bancos atuais não revolucionou a seu tempo as condições de produção? Sem a concentração de crédito que suscitou, sem as rendas do Estado que criou em antítese à renda da terra e, desse modo, as finanças em antítese à propriedade fundiária, o |interesse do dinheiroi em antítese ao |interesse da terrai, sem este novo instituto da circulação, teria sido possível a grande indústria moderna, as sociedades por ações etc., as mil formas de papéis de circulação que são tanto produtos do comércio e da indústria modernos como suas condições de produção?
Chegamos aqui à questão fundamental, que não se relaciona mais com o ponto de partida. A questão geral seria: as relações de produção existentes e suas correspondentes relações de distribuição podem ser revolucionadas pela mudança no instrumento de circulação – na organização da circulação? Pergunta-se ainda: uma tal transformação da circulação pode ser implementada sem tocar nas relações de produção existentes e nas relações sociais nelas baseadas? Se toda transformação da circulação desse tipo pressupusesse, ela própria, por sua vez, modificações nas outras condições de produção e revoluções sociais, neste caso, naturalmente, colapsaria a priori a doutrina que propõe seus truques de circulação para, de um lado, evitar o caráter violento das transformações e, de outro, fazer dessas próprias transformações não um pressuposto mas, inversamente, um resultado progressivo da transformação de circulação. A falsidade desse pressuposto fundamental seria suficiente para demonstrar o equívoco similar sobre a conexão interna entre as relações de produção, distribuição e circulação. A ilustração histórica sugerida acima não pode, evidentemente, ser decisiva, uma vez que os institutos de crédito modernos foram tanto efeito como causa da concentração do capital, constituindo apenas seu momento, e que a concentração da riqueza é acelerada tanto pela insuficiência na circulação (como na Roma antiga) como pela circulação facilitada. Além disso, haveria de investigar, ou caberia antes à questão geral, se as diferentes formas civilizadas do dinheiro – dinheiro metálico, dinheiro de papel, dinheiro de crédito e dinheiro-trabalho (este último como forma socialista) – podem realizar aquilo que delas é exigido sem abolir a própria relação de produção expressa na categoria dinheiro, e se, nesse caso, por outro lado, não é uma pretensão que se autodissolve desejar, mediante transformações formais de uma relação, passar por cima de suas determinações essenciais? As distintas formas de dinheiro podem corresponder melhor à produção social em diferentes etapas, uma elimina inconvenientes contra os quais a outra não está à altura; mas nenhuma delas, enquanto permanecerem formas do dinheiro e enquanto o dinheiro permanecer uma relação social essencial, pode abolir as contradições inerentes à relação do dinheiro, podendo tão somente representá-las em uma ou outra forma. Nenhuma forma do trabalho assalariado, embora uma possa superar os abusos da outra, pode superar os abusos do próprio trabalho assalariado. Uma alavanca pode superar a resistência da matéria inerte melhor do que outra. Todas elas se baseiam no fato de que a resistência subsiste. Naturalmente, essa questão geral sobre a relação da circulação com as demais relações de produção só pode ser formulada ao final. Mas é desde logo suspeito que Proudhon e consortes não a formulem nem ao menos em sua forma pura, mas só declamem ocasionalmente sobre ela. Toda vez que tal questão for abordada, será preciso examiná-la com rigor.
Com isso, conclui-se imediatamente da introdução de Darimon que curso de dinheiro e crédito são completamente identificados, o que é falso economicamente. (O |crédito gratuitof[15], dito seja de passagem, é apenas uma forma hipócrita, filisteia e amedrontada para: |a propriedade é o roubof[16]. Em lugar de os trabalhadores tomarem o capital dos capitalistas, os capitalistas deveriam ser coagidos a dá-lo aos trabalhadores.) É preciso voltar também a esse ponto.
No próprio tema em consideração, Darimon só se refere ao fato de que os bancos, que negociam com crédito, do mesmo modo que os comerciantes, que negociam com mercadorias, ou que os trabalhadores, que negociam com trabalho, vendem mais caro quando a demanda aumenta em relação à oferta, i.e., dificultam seus serviços ao público no exato momento em que o público deles mais necessita. Vimos que o banco tem de proceder desse modo, emita ele notas convertíveis ou inconvertíveis.
O procedimento do Banco da França em outubro de 1855 deu ensejo a um “|imenso clamorf” (p. 4)[17] e a um “|grande debatef” entre o banco e os porta-vozes do público. Darimon resume ou pretende resumir tal debate. Vamos segui-lo aqui ocasionalmente, uma vez que seu resumof revela a debilidade de ambos adversários em seu constante e desregrado tergiversar. Tateando em causas externas. Cada um dos combatentes abandona a cada momento sua arma para ir em busca de outra. Nenhum dos dois desfere um golpe, não só porque trocam incessantemente as armas com as quais se devem golpear, mas também porque tão logo se enfrentam em um terreno fogem para outro.
(Desde 1806 até 1855, a taxa de desconto na França não superou 6%: durante 50 anos, |praticamente imutável o vencimento de no máximo 90 dias das letras de câmbiof.)
A fraqueza com a qual o Banco se defende nas palavras de Darimon e sua própria falsa concepção emergem, p. ex., da seguinte passagem de seu diálogo fictício:
Diz o adversário do Banco: “|Graças ao vosso monopólio, vós sois o outorgante e o regulador do crédito. Quando vós desejais exibir rigor, os descontadores não só vos imitam, mas exageram vossos rigores… Com vossas medidas, vós causastes uma paralisação nos negóciosf” (p. 5).
Diz o Banco, e o diz “humildementef”: “|O que vós quereis que eu faça? diz humildemente o banco… Para me defender do estrangeiro, tenho de me defender dos nacionais… Sobretudo, devo impedir a saída do numerário, sem o qual não sou nem posso nadaf” (p. 5).
Ao banco é imputada uma tolice. É forçado a evadir-se da questão e a perder-se em generalidades, para que se possa respondê-lo com generalidades. Nesse diálogo, o Banco compartilha da ilusão de Darimon, segundo a qual o Banco pode regular o crédito por meio de seu monopólio. Na verdade, o poder do banco começa somente ali onde termina o poder dos “descontadores de títulosf” privados, em um momento, portanto, no qual seu próprio poder já está extraordinariamente limitado. Caso o Banco, em um momento de fluidezi do |mercado monetárioi no qual qualquer um descontaf a 2½%, permanecesse em 5%, os descontadores de títulosf, em lugar de imitá-lo, descontariam todas as transações do Banco nas suas barbas. Em nenhum outro lugar isso foi mais claramente demonstrado do que na história do |Banco da Inglaterrai, desde a lei de 1844, que o tornou um rival efetivo dos |bancos privadosi no negócio do desconto etc. O |Banco da Inglaterrai, para assegurar uma participação, e uma participação crescente, no negócio do desconto durante os períodos de fluidezi do mercado de dinheiro, foi constantemente forçado a reduzir sua taxa de desconto não somente à taxa dos ‘banqueiros privadosi, mas, com frequência, abaixo dela. A sua “regulação do crédito” deve ser tomada, portanto, cum grano salis, enquanto Darimon converte em ponto de partida as suas superstições sobre controle absoluto do mercado de dinheiro e de crédito por parte do Banco.
Em lugar de investigar criticamente as condições do poder efetivo do Banco sobre o mercado de dinheiro, Darimon agarra-se imediatamente à frase vazia de que, para o Banco, o |dinheiro líquidoi é tudo, e que ele deve evitar o seu efluxoi para o exterior. Um professor do Collège de France (Chevalier) responde: “Ouro e prata são mercadorias como todas as outras… A sua reserva metálica serve apenas para, em momentos de emergência, ser enviada ao exterior para compras”. O Banco responde: “O dinheiro metálico não é uma mercadoria como as outras; é um instrumento de troca e, por força desse título, desfruta do privilégio de prescrever leis para todas as outras mercadorias”. Nesse momento Darimon pula entre os combatentes: “por conseguinte, deve-se atribuir a esse privilégio de ser o único instrumento autêntico da circulação e da troca, desfrutado pelo ouro e pela prata, não apenas a crise atual, mas as crises periódicas do comércio”. Para controlar todos os inconvenientes das crises, “seria suficiente que o ouro e a prata fossem mercadorias como as outras, ou, dizendo exatamente, que todas as mercadorias fossem instrumentos de troca com o mesmo estatuto (au même titre) [em virtude do mesmo título] do ouro e da prata; que os produtos se trocassem verdadeiramente por produtos” (p. 5-7).
Platitude com a qual a disputa é aqui apresentada. Se o Banco emite ordens de pagamento contra dinheiro (notas) e notas promissórias contra capital (depósitos) reembolsáveis em ouro (prata), é evidente que só até certo ponto pode assistir e tolerar a diminuição de suas reservas metálicas sem reagir. Isso nada tem a ver com a teoria do dinheiro metálico. Voltaremos a nos referir à teoria das crises de Darimon.
No capítulo “Petite Histoire des crises de circulation” [Breve história das crises de circulação][18], o sr. Darimon deixa de fora a crise inglesa de 1809 a 1811 e se limita a anotar, sob o título 1810, a nomeação do Bullion Committee, e, sob o título 1811, novamente deixa de fora a crise efetiva (que começou em 1809) e se limita à adoção pela Câmara dos Comuns da resolução de que “a depreciação das notas em relação ao |metal em barrai não resulta de uma depreciação do dinheiro de papel, mas de um encarecimento do |metal em barrai”[19], e ao panfleto de Ricardo[20], que formula a tese oposta, cuja conclusão é necessariamente: “O dinheiro em seu estado mais perfeito é o dinheiro de papel” (p. 22, 23). As crises de 1809 e 1811 foram importantes nesse caso porque o Banco, naquela ocasião, emitiu notas inconvertíveis, de modo que as crises de maneira alguma resultaram da convertibilidade em ouro (metal) das notas e, por isso, também de modo algum podiam ser neutralizadas pela supressão desta convertibilidade. Darimon salta agilmente sobre esses fatos que refutam sua teoria das crises. Agarra-se ao aforismo de Ricardo, que nada tinha a ver com o objeto em questão, nem com o do panfleto – a depreciação das notas bancárias. Darimon ignora que a teoria do dinheiro de Ricardo é totalmente refutada com seus falsos pressupostos, a saber, que o Banco controla a quantidade de notas em circulação, que a quantidade de meios de circulação determina os preços, quando, inversamente, os preços determinam a quantidade de meios de circulação etc. No tempo de Ricardo faltavam ainda investigações detalhadas sobre os fenômenos do curso do dinheiro. Dito de passagem.
Ouro e prata são mercadorias como as outras. Ouro e prata não são mercadorias como as outras: como instrumento de troca universal, são as mercadorias privilegiadas e degradam as outras mercadorias justamente em virtude desse privilégio. Esta é a última análise à qual Darimon reduz o antagonismo. Suprimi o privilégio do ouro e da prata, degradai-os ao status de todas as outras mercadorias, decide-se Darimon em última instância. Nesse caso, não conservareis os males específicos do dinheiro de ouro ou de prata, ou das notas conversíveis em ouro e prata. Tereis suprimido todos os males. Ou, antes, elevai todas as mercadorias ao monopólio até aqui exclusivo desfrutado pelo ouro e pela prata. Deixai existir o papa, mas fazei de cada um um papa. Suprimi o dinheiro, fazendo de cada mercadoria dinheiro e dotando-a das qualidades específicas do dinheiro. A questão que aqui se coloca é justamente se o problema não manifesta sua própria absurdidade e se, por conseguinte, a impossibilidade de solução já não reside nas condições postas para a tarefa. Muitas vezes a resposta só pode consistir da crítica da pergunta, e muitas vezes também só pode ser resolvida à medida que a própria pergunta é negada. A questão efetiva é: o próprio sistema de troca burguês não torna necessário um instrumento de troca específico? Não cria necessariamente um equivalente particular para todos os valores? Uma forma desse instrumento de troca ou desse equivalente pode ser mais prática, mais apropriada, e envolver menos inconvenientes do que outras. Mas os inconvenientes que resultam da existência de um instrumento de troca particular, de um equivalente particular e ainda assim universal, teriam de se reproduzir em qualquer forma, ainda que de modo diferente. Naturalmente, Darimon passa por cima dessa questão com entusiasmo. Suprime o dinheiro e não suprime o dinheiro! Suprime o privilégio que o ouro e a prata detêm em virtude de sua exclusividade como dinheiro, mas faz de todas as mercadorias dinheiro, i.e., confere a todas, em conjunto, uma propriedade que, separada da exclusividade, não existe mais.
Na |evasão de lingotesi manifesta-se de fato uma contradição que Darimon concebe tão superficialmente quanto resolve. Fica patente que ouro e prata não são mercadorias como as demais, e que a Economia moderna, subitamente e com horror, sempre se vê recaindo temporariamente nos preconceitos do sistema mercantilista. Os economistas ingleses procuram resolver a dificuldade por meio de uma distinção. O que é requerido nos momentos de tais crises monetárias, dizem eles, não é ouro e prata como dinheiro, ouro e prata como moeda, mas ouro e prata como capital. Mas se esquecem de adicionar: capital, mas capital sob a forma determinada de ouro e prata. Se o capital é exportável sob qualquer forma, como explicar o efluxo precisamente dessas mercadorias, quando a maioria das outras se deprecia devido à falta de escoamento?
Tomemos exemplos específicos: a drenagemi em razão da má colheita doméstica de um meio de subsistência importante (cereal, por exemplo); a má colheita no exterior e, em consequência, o encarecimento de um produto de consumo importado essencial (por exemplo, chá); a drenagemi em virtude da má colheita de matérias-primas fundamentais para a indústria (algodão, lã, seda, linho); a drenagemi provocada pelo excesso de importação (por especulação, guerra etc.). No caso de uma má colheita doméstica, a compensação de um déficit repentino ou duradouro (de cereais, chá, algodão, linho etc.) priva duplamente a nação. Uma parte de seu capital ou do trabalho investido não é reproduzida – perda efetiva na produção. Uma parte do capital reproduzido deve ser drenada para cobrir essas lacunas, parte que, entretanto, não guarda uma relação aritmética simples com a perda porque o produto em falta aumenta, e tem de aumentar, devido à menor oferta e à maior demanda no mercado mundial. É necessário analisar precisamente como se pareceriam tais crises abstraindo do dinheiro, e qual determinabilidade o dinheiro introduziria no interior das relações dadas. (Má colheita de cereais e excesso de importação [são] os casos principais. A guerra é autoevidente, pois, do ponto de vista econômico, é como se a nação jogasse uma parte do seu capital na água.)
O caso de uma má colheita de cereais: considerada uma nação em relação à outra, é claro que o seu capital (não apenas sua riqueza efetiva) diminui, assim como é claro que um camponês que queima sua massa de pão e tem agora de comprá-la do padeiro se empobrece do montante de sua compra. Com referência à situação doméstica, a elevação do preço do cereal à medida que se considera o valor parece deixar tudo inalterado. Exceto, no entanto, pelo fato de que a quantidade reduzida de cereais × o preço elevado em colheitas realmente más jamais = a quantidade normal × o preço inferior. Suponha que fosse produzido na Inglaterra somente 1 quarter, e esse 1 quarter alcançasse o mesmo preço dos 30 milhões de quarters de trigo anteriores. Nesse caso, abstraindo do fato de que à nação faltariam os meios para a reprodução, seja da vida, seja do trigo, e supondo que a jornada de trabalho para reproduzir 1 quarter = a, a nação trocaria a × 30 milhões de jornadas de trabalho (custos de produção) por 1 × a jornadas de trabalho (produto); a força produtiva de seu capital teria diminuído milhões de vezes e a soma de todos os valores possuídos no país teria diminuído, uma vez que cada jornada de trabalho teria se depreciado 30 milhões de vezes. Cada parte do capital representaria tão somente 1/30.000.000 de seu valor anterior, de seu equivalente em custos de produção, embora nesse caso o capital da nação não teria diminuído em valor nominal (abstraindo da depreciação da terra e do solo), pois o valor reduzido dos demais produtos seria exatamente compensado pelo valor elevado de 1 quarter de trigo. A elevação do preço do trigo de a × 30 milhões de vezes seria a expressão de uma idêntica depreciação de todos os demais produtos. Aliás, essa diferenciação entre interior e exterior é totalmente ilusória. Assim como a nação que experimenta déficit se relaciona com a nação estrangeira da qual compra, cada indivíduo da nação se relaciona com o arrendatário ou o comerciante de cereais. A soma excedente que tem de empregar para a compra de cereais é uma diminuição direta de seu capital, de seus meios disponíveis.
Para não obscurecer a questão com influências irrelevantes, é preciso pressupor uma nação na qual exista |livre-comércioi de cereais. Mesmo que o cereal importado fosse tão barato quanto o produzido domesticamente, ainda assim a nação estaria mais pobre no montante do capital não reproduzido pelos arrendatários. No entanto, sob o pressuposto acima, a nação importaria sempre tanto cereal estrangeiro quanto poderia importar ao preço normal. O crescimento na importação subentende, por conseguinte, aumento de preço.
O aumento do preço do cereal = a queda no preço de todas as outras mercadorias. Os custos de produção acrescidos (representados no preço) com os quais se obtém o quarter de cereal é = a produtividade reduzida do capital existente em todas as outras formas. Ao excedente usado para a compra de cereais deve corresponder uma redução na compra de todos os outros produtos e, por isso, uma queda em seu preço. Com ou sem dinheiro metálico ou de qualquer outra espécie, a nação se encontraria em uma crise que se estenderia não apenas aos cereais, mas a todos os outros ramos de produção, pois não somente sua produtividade diminuiria positivamente e o preço de sua produção seria depreciado em relação ao valor determinado pelos custos de produção normais, como se estenderia igualmente a todos os contratos, obrigações etc. baseados nos preços médios dos produtos. P. ex., é preciso entregar x alqueires de cereais para a dívida pública, mas os custos de produção destes x alqueires aumentaram em uma determinada proporção. Desconsiderando completamente o dinheiro, a nação se encontraria, portanto, em uma crise geral. Prescindindo não apenas do dinheiro, mas também do próprio valor de troca dos produtos, os produtos teriam se depreciado e a produtividade da nação teria diminuído, uma vez que todas as suas relações econômicas estão fundadas sobre uma produtividade média do seu trabalho.
A crise provocada por um déficit de cereais de modo algum é produzida, portanto, pela |evasão de lingotesi, muito embora possa ser agravada pelos obstáculos erigidos com o propósito de impedir a evasãoi.
De todo modo, também não pode ser dito, com Proudhon[21], que a crise resulta do fato de que só os metais preciosos possuem um valor autêntico em contraste com as demais mercadorias, pois a elevação no preço dos cereais só significa que na próxima instância é necessário dar mais ouro e prata em troca de um dado quantum de cereais, i.e., que o preço do ouro e da prata caiu em relação ao preço dos cereais. O ouro e a prata partilham com todas as mercadorias restantes, portanto, da depreciação em relação aos cereais, da qual nenhum privilégio os protege. A depreciação do ouro e da prata com respeito aos cereais é idêntica à elevação do preço dos cereais (não inteiramente correto. O quarter de cereais aumenta de 50 para 100 sh. [shillings], logo 100%, mas as mercadorias de algodão caem 80%. A prata caiu 50% em relação aos cereais, enquanto as mercadorias de algodão caíram 80% (em razão de demanda declinante etc.)[22]. Quer dizer, os preços das outras mercadorias caem mais do que a elevação do preço dos cereais. Mas também acontece o inverso. Nos últimos anos, p. ex., em que os cereais aumentaram temporariamente 100%, não ocorreu de os produtos industriais caírem na mesma proporção com que o ouro tinha caído em relação aos cereais. Essa circunstância não afeta, por ora, a proposição geral). Também não se pode dizer que o ouro possui um privilégio pelo fato de que, como moeda, seu quantum é precisa e autenticamente determinado. Sob quaisquer circunstâncias, um táler (prata) permanece um táler. Da mesma forma, um alqueire de trigo permanece um alqueire, e uma vara de lona, uma vara.
A depreciação da maioria das mercadorias (trabalho incluído) e a consequente crise, no caso de uma significativa má colheita de cereais, não podem ser originariamente imputadas, por conseguinte, à exportação de ouro, uma vez que a depreciação e a crise teriam lugar mesmo se absolutamente nenhum ouro doméstico fosse exportado e nenhum cereal estrangeiro fosse importado. A crise reduz-se simplesmente à lei da demanda e da oferta, que, como se sabe, atua de maneira incomparavelmente mais aguda e enérgica na esfera das primeiras necessidades – considerada em escala nacional – do que em todas as outras esferas. A exportação de ouro não é a causa da crise de cereais, mas a crise de cereais que é a causa da exportação de ouro.
Pode-se afirmar que o ouro e a prata, considerados em si mesmos, interferem na crise e agravam seus sintomas somente em duas direções: 1) se a exportação de ouro é dificultada em virtude das condições da reserva metálica às quais estão ligados os bancos; porquanto as medidas tomadas pelo banco contra essa exportação de ouro repercutem negativamente sobre a circulação doméstica; 2) se a exportação de ouro torna-se necessária porque as nações estrangeiras só querem aceitar capital na forma de ouro e em nenhuma outra forma.
A dificuldade no 2 pode subsistir mesmo quando a dificuldade no 1 é eliminada. O Banco da Inglaterra a experimentou justamente durante o período em que estava legalmente autorizado a emitir notas inconvertíveis. As notas caíram em relação ao ouro em barrai, mas caiu igualmente o |preço do ouro cunhadoi em relação ao seu preço em barrai. O ouro se converteu em um tipo particular de mercadoria em relação à nota. Pode ser dito que a nota ainda permanecia dependente do ouro na medida em que representava nominalmente um determinado quantum de ouro que, |de fatoi, não [era] por ela resgatável. O ouro permanecia seu denominador, muito embora legalmente a nota não fosse mais permutável no Banco por tal quantidade de ouro.
Não há qualquer dúvida (?) (para ser investigado mais tarde, e não faz parte diretamente do |objeto em questãoi) que, enquanto o dinheiro de papel retém sua denominação em ouro (p. ex., que uma nota de 5 libras é a representante em papel de 5 soberanosi[c]), a convertibilidade da nota em ouro continua sendo para ela uma lei econômica, quer esta exista politicamente ou não. De 1799 a 1819, as notas do Banco da Inglaterra também continuavam a declarar que representavam o valor de um determinado quantum de ouro. Como pôr à prova essa afirmação senão pelo fato de que a nota realmente comanda tal e qual quantidade de metali? A partir do momento em que, para uma nota de £ 5, não se podia mais obter valor em metali = 5 soberanosi, a nota era depreciada, muito embora fosse inconvertível. A igualdade do valor da nota com um valor de ouro determinado, expresso em seu título, entrou imediatamente em contradição com a desigualdade factual entre nota e ouro. A disputa entre os ingleses partidários do ouro como denominador da nota centra-se de fato, portanto, não na convertibilidade da nota em ouro – que é apenas a igualdade prática que o título da nota exprime teoricamente –, mas em como garantir essa convertibilidade: essa convertibilidade deve ser garantida por meio de limitações legalmente impostas ao Banco ou abandonada a si mesma? Os últimos afirmam que essa convertibilidade é garantida |em médiai no caso de um banco de emissão que faz adiantamentos em troca de letras de câmbio, banco cujas notas, por conseguinte, têm um refluxo garantido, e cujos adversários jamais propõem algo além dessa garantia média. Este último ponto é um fatoi. A médiai, dito seja de passagem, não deve ser desprezada, e os cálculos de médias podem e têm de constituir o fundamento tanto dos bancos como o de todas as companhias de seguro etc. Nesse particular, são citados como modelo, e com justiça, sobretudo os bancos escoceses. Os bulionistasi puros, por sua vez, dizem que levam a sério a convertibilidade, que a obrigação do banco em converter mantém a nota convertível, que a necessidade dessa convertibilidade está dada pela própria denominação da nota, o que constitui um limite à |sobre-emissãoi, que seus oponentes são pseudopartidários da inconvertibilidade. Entre esses dois lados, diferentes matizes, uma massa de “espéciesf” menores. Finalmente, os defensores da inconvertibilidade, os antibulionistas resolutos, são, sem o saber, tão pseudopartidários da convertibilidade quanto seus adversários o são da inconvertibilidade, porque deixam subsistir a denominação da nota e, por conseguinte, fazem da equiparação prática de nota de determinada denominação e determinado quantum de ouro a medida do valor pleno de suas notas. Na Prússia existe dinheiro de papel de curso forçado. (Para ele está assegurado um refluxo, uma vez que uma parcela dos impostos tem de ser paga em papel.) Esses táleres de papel não são ordens de pagamento em prata, não são legalmente convertíveis em prata em nenhum banco etc. Não são emprestados por nenhum banco comercial em troca de letras de câmbio, mas pagos pelo governo no financiamento de suas despesas. No entanto, sua denominação é a da prata. Um táler de papel declara representar o mesmo valor que um táler de prata. Caso a confiança no governo fosse profundamente abalada, ou caso esse dinheiro de papel fosse emitido em proporção maior do que a exigida pelas necessidades do curso [Umlauf], o táler de papel deixaria de equivaler na prática ao táler de prata e seria depreciado, porque teria caído abaixo do valor que seu título anuncia. O táler de papel se depreciaria mesmo se não ocorresse nenhuma das circunstâncias acima, mas se uma necessidade particular de prata para a exportação, p. ex., conferisse à prata um privilégio em relação a ele. A convertibilidade em ouro ou prata é, portanto, a medida prática do valor de todo dinheiro de papel que tem sua denominação em ouro ou prata, seja o papel legalmente convertível ou não. Um valor nominal corre unicamente como sombra ao lado de seu corpo; se ambos coincidem é algo que a própria convertibilidade (permutabilidade) efetiva deve demonstrar. Depreciação é a queda do valor real abaixo do valor nominal. O curso em paralelo e a troca recíproca efetivos são a convertibilidade. No caso de notas inconvertíveis, a convertibilidade não se revela na caixa do banco, mas na troca cotidiana entre dinheiro de papel e dinheiro de metal, cuja denominação o primeiro carrega. Na verdade, a convertibilidade das notas convertíveis já está comprometida onde tem de ser confirmada não mais pelo intercâmbio cotidiano em todas as partes do país, mas por experimentos de larga escala na caixa do banco. No interior da Escócia, o dinheiro de papel é preferido ao dinheiro de metal. Antes de 1845, quando a lei inglesa de 1844 lhe foi imposta, a Escócia experimentou naturalmente todas as crises sociais inglesas, e diversas crises em grau mais intenso, pois ali o |desmatamento das terrasi se desenvolveu de forma mais brutal. Não obstante, a Escócia não conheceu crise monetária propriamente dita (aqui não vem ao caso o fato de que alguns bancos, excepcionalmente, foram à falência porque concederam crédito de maneira imprudente), nenhuma depreciação das notas, nem queixas e investigações para saber se o quantum de moedai circulante era suficiente ou não etc. A Escócia é importante aqui porque, por um lado, mostra como o sistema monetário pode ser plenamente regulado sobre a base atual – podem ser suprimidos todos os males que Darimon deplora –, sem abandonar a base social atual; enquanto, ao mesmo tempo, suas contradições, seus antagonismos, o antagonismo de classe etc. alcançaram uma intensidade maior do que em qualquer outro país do mundo. É característico que tanto Darimon quanto o patrono que introduz seu livro – Émile de Girardin, que complementa seu embuste prático com utopismo teórico – não encontrem na Escócia o contraste aos bancos monopolistas, como o |Banco da Inglaterrai e o |Banco da Françai, mas procurem nos Estados Unidos, onde o sistema bancário, em virtude da indispensável licençai estatal, é livre apenas nominalmente, onde existe não a livre concorrência entre os bancos, mas um sistema federativo de bancos monopolistas. O sistema bancário e monetário escocês era certamente o recife mais perigoso para as ilusões dos artistas da circulação. Não se diz que o dinheiro de ouro e o dinheiro de prata (onde não existe duplo padrãoi legal da moeda) se depreciam toda vez que muda seu valor relativo às demais mercadorias. Por que não? Porque elas constituem seu próprio denominador; porque seu título não é o de um valor, i.e., não são medidos em uma terceira mercadoria, mas expressam somente partes alíquotas de sua própria matéria. 1 soberanoi = tal quantum de ouro em tal ou qual peso. Nominalmente, portanto, o ouro não é depreciável, não porque expressa com exclusividade um valor autêntico, mas porque, como dinheiro, |não expressa absolutamentei nenhum valori, mas expressa um quantum determinado de sua própria matéria; traz na fronte a sua própria determinabilidade quantitativa. (Analisar com mais detalhe posteriormente se essa marca distintiva do dinheiro de ouro e de prata é em última instância uma propriedade imanente de todo dinheiro.) Confundidos por essa indepreciabilidade nominal do dinheiro de metal, Darimon e consortes veem somente o único aspecto que irrompe nas crises: a apreciação do ouro e da prata em relação a quase todas as outras mercadorias; não veem o outro lado, a depreciação do ouro e da prata ou do dinheiro em relação às demais mercadorias (excluído talvez o trabalho, mas nem sempre) nos períodos da assim chamada prosperidade, em períodos de temporária alta geral dos preços. Como essa depreciação do dinheiro de metal (e de todos os tipos de dinheiro baseados nele) sempre precede sua apreciação, eles deveriam ter formulado o problema de maneira inversa: prevenir a depreciação periódica do dinheiro (em sua linguagem, suprimir os privilégios das mercadorias em relação ao dinheiro). Na última formulação, o problema teria imediatamente se reduzido a: abolir a alta e baixa dos preços. A última teria se reduzido a: abolir os preços. Ou seja: acabar com o valor de troca. Este problema [teria se reduzido a] o que significa: acabar com a troca, tal como corresponde à organização burguesa da sociedade. Este último problema significaria: revolucionar economicamente a sociedade burguesa. Teria então ficado evidente desde o início que o mal da sociedade burguesa não pode ser remediado por meio de “transformações” dos bancos ou da fundação de um “sistema monetário” racional.
A convertibilidade – legal ou não – permanece, por conseguinte, requisito de todo dinheiro cujo título o faz um signo de valor, isto é, o iguala, como quantidade, a uma terceira mercadoria. A igualação já implica a contraposição, a possível desigualdade; a convertibilidade implica seu oposto, a inconvertibilidade; a apreciação inclui dunámei[23], como diria Aristóteles, a depreciação. Suponha, p. ex., que o soberanoi não signifique somente soberanoi, que é o simples título honorífico para a x-ésima parte alíquota de uma onça de ouro (nome de conta), como o é o metro para um determinado comprimento, mas signifique, digamosi, x horas de tempo de trabalho. 1/x onça de ouro nada mais é de fato do que 1/x hora de tempo de trabalho materializado, objetivado. Mas o ouro é tempo de trabalho passado, tempo de trabalho determinado. O seu título faria realmente de um quantum de trabalho determinado sua medida. A libra de ouro teria de ser convertível em x horas de tempo de trabalho, que poderia comprar a qualquer momento: tão logo pudesse comprar mais ou menos horas de trabalho, estaria depreciada ou apreciada; neste último caso, sua convertibilidade teria deixado de existir. O determinante do valor não é o tempo de trabalho incorporado nos produtos, mas o tempo de trabalho necessário num determinado momento. Considere a própria libra de ouro: seja ela o produto de 20 horas de tempo de trabalho. Suponha que, mais adiante, por quaisquer circunstâncias, sejam necessárias 10 horas para produzir uma libra de ouro. A onça de ouro, cujo título indica que é = 20 horas de tempo de trabalho, seria agora somente = 10 horas de tempo de trabalho, dado que 20 horas de tempo de trabalho = 2 onças de ouro. 10 horas de trabalho trocam-se de fato por 1 onça de ouro; logo, 1 onça de ouro não pode mais ser trocada por 20 horas de trabalho. O dinheiro de ouro com título plebeu: x horas de trabalho, estaria sujeito a flutuações maiores do que qualquer outro dinheiro e, particularmente, maiores do que o dinheiro de ouro atual; porque o ouro não pode aumentar ou diminuir em relação ao ouro (é igual a si mesmo), mas o tempo de trabalho passado contido em um determinado quantum de ouro tem de aumentar ou diminuir continuamente em relação ao trabalho vivo atual. Para manter convertível o quantum de ouro, a produtividade da hora de trabalho deveria ser mantida estacionária. De acordo com a lei econômica geral segundo a qual os custos de produção diminuem constantemente, o trabalho vivo devém constantemente mais produtivo e, por conseguinte, o tempo de trabalho objetivado nos produtos se deprecia constantemente, o destino inevitável desse dinheiro-trabalho áureo seria a constante depreciação. Para controlar essa anomalia, poderia ser dito que não seria o ouro que deveria receber o título de horas de trabalho, mas, como propôs Weitling[24] e, antes dele, os ingleses e, depois dele, os franceses, dentre os quais Proudhon et Co., o dinheiro de papel, um simples signo de valor, deveria receber tal título. Nesse caso, o tempo de trabalho que está incorporado no próprio papel viria tão pouco ao caso quanto o valor de papel das notas bancárias. Um seria simples representante das horas de trabalho, assim como as outras o seriam do ouro ou da prata. Se a hora de trabalho se tornasse mais produtiva, o pedaço de papel que a representa aumentaria seu poder de compra e vice-versa, exatamente como hoje uma nota de £ 5 compra mais ou menos à medida que o valor relativo do ouro sobe ou desce em comparação com outras mercadorias. De acordo com a mesma lei, ali onde o dinheiro-trabalho áureo sofresse uma constante depreciação, o dinheiro-trabalho de papel desfrutaria de uma constante apreciação. E é justamente isso que queremos; o trabalhador ficaria mais feliz com a crescente produtividade de seu trabalho, em lugar de criar, como atualmente, riqueza alheia e a própria desvalorização na proporção daquele aumento de produtividade. Eis o que dizem os socialistas. |Mas, infelizmente, surgem algumas pequenas dificuldadesi. |Em primeiro lugarf: se desde logo supomos o dinheiro, mesmo que seja de bônus-horários, devemos pressupor igualmente a acumulação desse dinheiro e os contratos, obrigações, encargos fixos etc. que seriam contraídos sob a forma de tal dinheiro. Os bônus acumulados se valorizariam constantemente tanto quanto os recém emitidos, de modo que, de um lado, a crescente produtividade do trabalho viria em proveito dos não trabalhadores e, de outro, os encargos previamente contratados acompanhariam o mesmo ritmo do aumento do rendimento do trabalho. A queda e a elevação do valor do ouro ou da prata seriam completamente indiferentes se o mundo pudesse ser reiniciado a cada momento, e se os compromissos contraídos para pagar determinado quantum de ouro não sobrevivessem às flutuações do valor do ouro. O mesmo ocorreria aqui com o bônus-horário e a produtividade por hora.
O ponto que precisa ser aqui investigado é a convertibilidade do bônus-horário. O mesmo objetivo é alcançado se tomamos um atalho. Apesar de [o momento ser] ainda prematuro, pode-se fazer algumas observações sobre as ilusõesi que estão na base do bônus-horário e que nos permitem contemplar o mais profundo mistério que liga a teoria da circulação proudhoniana à sua teoria geral – a teoria da determinação do valor. Encontramos a mesma correlação, p. ex., em Bray e Gray. O que pode haver de verdade na base de tal teoria, investigar posteriormente. (Antes, ainda incidentalmentei: consideradas simples ordens de pagamento em ouro, as notas bancárias não deveriam jamais ser emitidas, se depreciarem para além do quantum de dinheiro de ouro que pretendem substituir. Três ordens de pagamento de 15 libras que emito a três credores sobre as mesmas 15 libras em ouro são apenas, de fato, cada qual uma ordem de pagamento de 15/3 libras = 5 libras. Cada uma dessas notas estaria, portanto, imediatamente depreciada em 331/3%.)
O valor (o valor de troca real) de todas as mercadorias (incluído o trabalho) é determinado pelo seu custo de produção, em outras palavras, pelo tempo de trabalho requerido para sua produção. O seu preço é esse seu valor de troca expresso em dinheiro. A substituição do dinheiro metálico (e do dinheiro de papel ou de crédito, que dele recebem sua denominação) pelo dinheiro-trabalho, que recebe sua denominação do próprio tempo de trabalho, igualaria, portanto, o valor real (valor de troca) das mercadorias e seu valor nominal, seu preço, seu valor monetário. Igualação de valor real e valor nominal, de valor e preço. Mas isso só seria alcançado sob o pressuposto de que valor e preço são diferentes apenas nominalmente. Mas de maneira alguma é esse o caso. O valor das mercadorias determinado pelo tempo de trabalho é somente seu valor médio. Uma média que aparece como uma abstração externa, na medida em que a média é calculada como o número médio de uma época, p. ex., 1 libra de café, 1 sh., se a média é calculada, digamos, para o preço do café durante 25 anos; mas que é uma abstração muito real se, ao mesmo tempo, é reconhecida como a força motriz e o princípio de movimento das oscilações por que passam os preços das mercadorias durante uma certa época. Essa realidade não é de importância apenas teórica: constitui a base da especulação comercial, cujo cálculo de probabilidades parte tanto dos preços médios centrais, que valem como centro de suas oscilações, como também das médias mais elevadas e mais baixas das oscilações acima e abaixo desse centro. O valor de mercado da mercadoria é sempre diferente desse seu valor médio, e se encontra sempre abaixo ou acima dele. O valor de mercado iguala-se ao valor real por suas incessantes oscilações, jamais por meio de uma equação com o valor real como terceiro termo, mas por sua contínua inequação consigo mesmo (não, como diria Hegel, por meio de identidade abstrata, mas pela constante negação da negação[25], i.e., de si mesmo como negação do valor real). Em meu panfleto contra Proudhon[26], mostrei que o próprio valor real, por sua vez – independentemente de sua dominação das oscilações dos preços de mercado (abstraindo dele como a lei dessas oscilações) –, nega a si mesmo e põe o valor real das mercadorias em constante contradição com sua própria determinação, deprecia ou aprecia o valor real das mercadorias existentes – e não é preciso entrar aqui em detalhes sobre a questão. O preço diferencia-se também do valor, não apenas como o nominal se diferencia do real; não apenas pela denominação em ouro e prata, mas pelo fato de que o último aparece como lei dos movimentos por que passa o primeiro. Mas são constantemente diferentes e jamais coincidem, ou o fazem apenas de maneira acidental ou excepcional. O preço das mercadorias situa-se continuamente acima ou abaixo do valor das mercadorias, e o próprio valor das mercadorias existe somente na flutuaçãoi dos preços das mercadorias. Demanda e oferta determinam constantemente os preços das mercadorias; elas não coincidem nunca, ou só fortuitamente; mas os custos de produção, por sua vez, determinam as oscilações da demanda e da oferta. O próprio ouro ou prata, no qual é expresso o preço de uma mercadoria, seu valor de mercado, é um determinado quantum de trabalho acumulado, uma determinada quantidade de tempo de trabalho materializado. Sob o pressuposto de que os custos de produção da mercadoria e os custos de produção do ouro e da prata permanecem inalterados, a elevação ou a queda de seu preço de mercado nada mais significa que uma mercadoria, = x tempo de trabalho, comanda constantemente > ou < que x tempo de trabalho no mercado, situa-se acima ou abaixo de seu valor médio determinado pelo tempo de trabalho. A primeira ilusão fundamental dos partidários do bônus-horário consiste em que, ao suprimirem a diferença nominal entre valor real e valor de mercado, entre valor de troca e preço – portanto, em lugar de expressarem o valor em uma objetivação determinada do tempo de trabalho, digamosi, ouro e prata, expressam-no no próprio tempo de trabalho –, eliminam também a diferença e a contradição efetivas entre preço e valor. Daí, é autoevidente como a simples introdução do bônus-horário elimina todas as crises, todas as anomalias da produção burguesa. O preço monetário das mercadorias = seu valor real; a demanda = a oferta; a produção = o consumo; o dinheiro é simultaneamente suprimido e conservado; o tempo de trabalho, do qual a mercadoria é produto, que é materializado na mercadoria, precisa unicamente ser constatado para gerar uma sua correspondente contraimagem em um signo de valor, em dinheiro, em bônus-horário. Cada mercadoria seria assim transformada diretamente em dinheiro, e o ouro e a prata, por seu lado, seriam rebaixados à posição de todas as outras mercadorias.
Dispensa elaboração o fato de que a contradição entre valor de troca e preço – entre o preço médio e os preços dos quais é média –, a diferença entre as magnitudes e suas magnitudes médias, não é suprimida quando se suprime a simples diferença de denominação entre as duas, portanto, em lugar de dizer: 1 libra de pão custa 8 d., dizer 1 libra de pão = 1/x hora de trabalho. Inversamente, se 8 d. = 1/x hora de trabalho, e se o tempo de trabalho materializado em uma libra de pão é maior ou menor do que 1/x hora de trabalho pelo fato de que a medida do valor seria ao mesmo tempo o elemento em que o preço é expresso, a diferença entre valor e preço, que está ocultada no preço-ouro ou no preço-prata, jamais se manifestará de maneira fulgurante. Resultaria daí uma equação interminável. 1/x hora de trabalho (contida em 8 d. ou expressa por meio de um bônus) > < que 1/x hora de trabalho (contida na libra de pão).
O bônus-horário, que representa o tempo de trabalho médio, jamais corresponderia ao tempo de trabalho efetivo e nunca seria nele convertível; i.e., o tempo de trabalho objetivado em uma mercadoria nunca comandaria uma quantidade de dinheiro-trabalho igual a si mesmo e vice-versa, mas uma quantidade maior ou menor, da mesma maneira que atualmente cada oscilação dos valores de mercado se expressa em uma elevação ou queda de seus preços em ouro ou em prata.
A constante depreciação das mercadorias – em períodos mais longos – em relação aos bônus-horários de que falamos acima[27] resultava da lei da crescente produtividade do tempo de trabalho, das perturbações no próprio valor relativo criadas por seu princípio inerente específico, o tempo de trabalho. A inconvertibilidade do bônus-horário, de que agora falamos, nada mais é do que uma outra expressão para a inconvertibilidade entre valor real e valor de mercado, valor de troca e preço. Em contraste com todas as mercadorias, o bônus-horário representaria um tempo de trabalho ideal que se trocaria ora por mais, ora por menos tempo de trabalho efetivo, e que receberia no bônus uma existência própria, isolada, que corresponderia a essa desigualdade efetiva. Por sua vez, o equivalente universal, meio de circulação e medida das mercadorias, as confrontaria individualizadas, operando segundo leis próprias, estranhado [entfremdet], i.e., com todas as qualidades do dinheiro atual, mas sem prestar seus serviços. Com isso, todavia, a confusão alcançaria um nível inteiramente diferente, pois o meio pelo qual são comparadas as mercadorias, esses quanta objetivados de tempo de trabalho, não seria uma terceira mercadoria, mas a sua própria medida do valor, o próprio tempo de trabalho. A mercadoria a, a objetivação de 3 horas de tempo de trabalho, é = 2 bônus-hora de trabalho; a mercadoria b, objetivação também de 3 horas de trabalho, é = 4 bônus-hora de trabalho. Essa contradição é de fato expressa, embora veladamente, nos preços-dinheiro. A diferença entre preço e valor, entre a mercadoria, medida pelo tempo de trabalho do qual é produto, e o produto do tempo de trabalho com o qual se troca – tal diferença requer uma terceira mercadoria como medida na qual se expressa o valor de troca efetivo da mercadoria. Como o preço não é igual ao valor, o elemento determinante do valor – o tempo de trabalho – não pode ser o elemento no qual os preços são expressos porque o tempo de trabalho teria de se expressar simultaneamente como o determinante e o não determinante, como o igual e o desigual a si mesmo. Porque só existe idealmente como medida do valor, o tempo de trabalho não pode servir como material da comparação dos preços. (Ao mesmo tempo, aqui se torna claro como e por que a relação de valor adquire no dinheiro uma existência material e separada. A ser ulteriormente desenvolvido.) A diferença entre preço e valor requer que os valores, como preços, sejam medidos em um padrão diferente de seu próprio. O preço, à diferença do valor, é necessariamente preço em dinheiro. Manifesta-se aqui o fato de que a diferença nominal entre preço e valor é condicionada por sua diferença real.
Mercadoria a = 1 sh. (i.e., = 1/x prata); mercadoria b = 2 sh. (i.e., 2/x prata). Por isso, a mercadoria b = o dobro do valor da mercadoria a. A relação de valor entre a e b é expressa pela proporção na qual ambas são trocadas pelo quantum de uma terceira mercadoria, pela prata; não por uma relação de valor.
Toda mercadoria (produto ou instrumento de produção) = a objetivação de um determinado tempo de trabalho. O seu valor, a relação na qual se troca por outra mercadoria ou na qual outra mercadoria é trocada por ela, = o quantum de tempo de trabalho nela realizado. Se, p. ex., a mercadoria = 1 hora de tempo de trabalho, ela se troca então com todas as outras mercadorias que são produto de 1 hora de tempo de trabalho. (Todo esse raciocínio sob o pressuposto de que o valor de troca = o valor de mercado; o valor real = o preço.) O valor da mercadoria é diferente da própria mercadoria. O valor (valor de troca) é a mercadoria somente na troca (efetiva ou imaginada); o valor não é só a permutabilidade dessa mercadoria em geral, mas sua permutabilidade específica. O valor é ao mesmo tempo o expoente da relação na qual a mercadoria se troca com outras mercadorias e o expoente da relação na qual a mercadoria já se trocou com outras mercadorias na produção (tempo de trabalho materializado); é permutabilidade determinada quantitativamente. As mercadorias, p. ex., uma vara de algodão e uma medida de óleo, consideradas como algodão e óleo, são naturalmente diferentes, possuem qualidades distintas, são medidas por medidas diferentes, são incomensuráveis. Como valores, todas as mercadorias são qualitativamente idênticas e apenas quantitativamente diferentes, portanto, todas se medem reciprocamente e se substituem (se trocam, são mutuamente convertíveis) em relações quantitativas determinadas. O valor é sua relação social, sua qualidade econômica. Um livro de um valor determinado e um pão com o mesmo valor trocam-se mutuamente, são o mesmo valor, só que em materiais diferentes. Como valor, a mercadoria é simultaneamente equivalente para todas as outras mercadorias em uma determinada proporção. Como valor, a mercadoria é equivalente; como equivalente, todas as suas qualidades naturais são nela extintas; não mantém mais qualquer relação qualitativa particular com as outras mercadorias; ao contrário, é tanto a medida universal como a representante universal, como o meio de troca universal de todas as outras mercadorias. Como valor, é dinheiro. No entanto, dado que a mercadoria, ou melhor dizendo, o produto ou o instrumento de produção é diferente de si como valor, como valor, é diferente de si como produto. A sua propriedade como valor não somente pode como deve adquirir simultaneamente uma existência diferente de sua existência natural. Por quê? Porque, como valores, as mercadorias são diferentes entre si apenas quantitativamente, cada mercadoria tem de ser qualitativamente diferente de seu próprio valor. Por isso, o seu valor deve possuir igualmente uma existência qualitativamente dela diferenciável e, na troca efetiva, essa separabilidade tem de devir separação efetiva, porque a diversidade natural das mercadorias tem de entrar em contradição com sua equivalência econômica, e ambas só podem coexistir porque a mercadoria adquire uma dupla existência, ao lado de sua existência natural adquire uma existência puramente econômica, na qual a mercadoria é simples signo, uma letra para uma relação de produção, um simples signo para seu próprio valor. Como valor, toda mercadoria é igualmente divisível; não o é em sua existência natural. Como valor, a mercadoria permanece a mesma, quantas sejam as metamorfoses e formas de existência que percorra; na realidade, as mercadorias só são trocadas porque são heterogêneas e correspondem a diferentes sistemas de necessidades. Como valor, a mercadoria é universal; como mercadoria efetiva, é uma particularidade. Como valor, é sempre permutável; na troca efetiva, o é apenas quando preenche condições particulares. Como valor, a medida de sua permutabilidade é determinada por si mesma; o valor de troca expressa precisamente a relação pela qual ela substitui outras mercadorias; na troca efetiva, a mercadoria só é permutável em quantidades relacionadas às suas propriedades naturais e correspondentes às necessidades daqueles que trocam. (Em resumo, todas as propriedades enumeradas como propriedades particulares do dinheiro são propriedades da mercadoria como valor de troca; propriedades do produto como valor, à diferença do valor como produto.) (O valor de troca da mercadoria, como existência particular ao lado da própria mercadoria, é dinheiro; a forma na qual todas as mercadorias se igualam, se comparam, se medem; [a forma] em que todas as mercadorias se resolvem, aquilo que se resolve em todas as mercadorias; o equivalente universal.) A todo instante, no cálculo, na contabilidade etc., transformamos as mercadorias em signos de valor, as fixamos como simples valores de troca, abstraindo de sua matéria e de todas as suas propriedades naturais. No papel, na cabeça, essa metamorfose procede por simples abstração; mas na troca efetiva é necessária uma mediação efetiva, um meio, para implementar essa abstração. A mercadoria, em suas propriedades naturais, não é nem constantemente permutável nem permutável por qualquer outra mercadoria; não o é em sua natural identidade consigo mesma; mas o é posta como desigual a si mesma, como algo desigual de si, como valor de troca. Temos primeiro que convertê-la em si mesma como valor de troca para, então, comparar e trocar esse valor de troca com outros. No escambo mais rudimentar, quando duas mercadorias são trocadas entre si, cada uma é primeiro equiparada a um signo que exprime seu valor de troca, p. ex., entre certos negros da costa da África Ocidental = x barrasi[28]. Uma mercadoria = 1 barrai; a outra = 2 barrasi. São trocadas nessa relação. As mercadorias são primeiro transformadas em barrasi na cabeça e na linguagem antes de ser trocadas uma pela outra. São avaliadas antes de ser trocadas, e, para ser avaliadas, têm de ser postas em relações numéricas recíprocas determinadas. Para serem postas em tais relações numéricas e tornarem-se comensuráveis, precisam receber a mesma denominação (unidade). (A barrai tem uma existência simplesmente imaginária, dado que só pela abstração uma relação pode receber uma corporificação particular, pode ser ela mesma individualizada.) Na troca, para liquidar o saldo de um valor sobre o outro é exigido o pagamento em dinheiro, tanto no escambo mais rudimentar como no comércio internacional atual.
Os produtos (ou atividades) trocam-se somente como mercadorias; as mercadorias, na própria troca, existem só como valores; somente enquanto tais elas se comparam. Para determinar o peso de pão que posso trocar por uma vara de linho, primeiro faço a vara de linho = seu valor de troca, i.e., = 1/x tempo de trabalho. Da mesma forma, faço a libra de pão = seu valor de troca = 1/x, ou 2/x, etc. tempo de trabalho. Faço cada uma das mercadorias = um terceiro termo; i.e., desiguais de si mesmas. Esse terceiro termo, diferente de ambas, uma vez que expressa uma relação, existe de início na cabeça, na representação, da única maneira, enfim, que relações podem ser pensadas se têm de ser fixadas diferentemente dos termos [Subjekten] em que se relacionam. Quando um produto (atividade) devém valor de troca, é transformado não só em uma relação quantitativa determinada, em uma proporção – a saber, em um número que expressa qual quantidade de outras mercadorias é igual a ele, seu equivalente, ou em qual relação é o equivalente de outras mercadorias –, mas deve ao mesmo tempo ser transformado qualitativamente, ser convertido em um outro elemento, para que ambas as mercadorias devenham magnitudes concretas com a mesma unidade, logo, devenham comensuráveis. A mercadoria tem de ser convertida primeiro em tempo de trabalho, portanto, em algo qualitativamente dela diferente (qualitativamente diferente 1) porque ela não é tempo de trabalho como tempo de trabalho, mas tempo de trabalho materializado; tempo de trabalho não sob a forma de movimento, mas de repouso; não sob a forma de processo, mas de resultado; 2) porque ela não é a objetivação do tempo de trabalho em geral, que existe apenas na representação (que é, ele próprio, apenas trabalho separado de sua qualidade, trabalho só quantitativamente diferente), mas o resultado determinado de um trabalho determinado, naturalmente determinado, qualitativamente diferente de outros trabalhos), para poder então ser comparada, como quantum determinado de tempo de trabalho, magnitude de trabalho determinada, com outros quanta de tempo de trabalho, outras magnitudes de trabalho. Para uma simples comparação – avaliação dos produtos –, para a determinação ideal de seu valor, é suficiente realizar mentalmente tal transformação (uma transformação em que o produto existe simplesmente como expressão de relações de produção quantitativas). Na comparação das mercadorias, essa abstração é suficiente; na troca efetiva, a abstração deve ser, por sua vez, objetivada, simbolizada, realizada por um signo. Essa necessidade se dá [porque]: 1) como já dissemos, as mercadorias em troca são ambas transformadas na cabeça em relações de mesma grandeza, em valores de troca, e são desse modo avaliadas uma em relação à outra. No entanto, caso tenham de ser efetivamente trocadas, as suas propriedades naturais entram em contradição com sua determinação como valores de troca e simples números concretos. Elas não são divisíveis à vontade etc.; 2) na troca efetiva, mercadorias particulares são constantemente trocadas por mercadorias particulares e a permutabilidade de cada mercadoria, bem como a relação em que é permutável, depende de condições locais, temporais etc. Mas a transformação da mercadoria em valor de troca não a equipara a uma outra mercadoria particular, mas a expressa como equivalente, expressa sua relação de permutabilidade com todas as outras mercadorias. Essa comparação, que é efetuada na cabeça de um só golpe, é realizada, na efetividade, somente em um determinado âmbito, determinado pela necessidade, e somente gradualmente. (Por exemplo, troco aos poucos uma renda de 100 táleres, segundo minhas necessidades, por toda uma série de mercadorias cuja soma = o valor de troca de 100 táleres.) Portanto, para realizar a mercadoria de um só golpe em valor de troca e lhe conferir a eficiência universal do valor de troca, não é suficiente a troca por uma mercadoria particular. A mercadoria deve ser trocada por uma terceira coisa que, por sua vez, não seja ela mesma uma mercadoria particular, mas o símbolo da mercadoria como mercadoria, o próprio valor de troca da mercadoria; portanto, que represente, digamos, o tempo de trabalho enquanto tal, digamos, um pedaço de papel ou de couro que represente uma parte alíquota de tempo de trabalho. (Um tal símbolo presume o reconhecimento universal; só pode ser um símbolo social; expressa de fato apenas uma relação social.) Esse símbolo representa as partes alíquotas do tempo de trabalho; representa o valor de troca em partes alíquotas tais que são capazes de expressar, por simples combinação aritmética, todas as relações dos valores de troca entre si; esse símbolo, esse signo material do valor de troca, é um produto da própria troca, e não a implementação de uma ideia concebida a priori. (|De fatoi, só gradualmente a mercadoria que é usada como mediadora da troca é transformada em dinheiro, em um símbolo; tão logo isso acontece, um símbolo dela própria pode substituí-la. Ela devém agora um signo consciente do valor de troca.)
O processo, portanto, é simplesmente o seguinte: o produto devém mercadoria, i.e., simples momento da troca. A mercadoria é transformada em valor de troca. Para se equiparar a si mesma como valor de troca, a mercadoria é trocada por um signo que a representa como valor de troca enquanto tal. Como tal valor de troca simbolizado, a mercadoria pode então ser trocada em proporções determinadas por qualquer outra mercadoria. Pelo fato de que o produto devém mercadoria, e a mercadoria devém valor de troca, o produto adquire, primeiro na cabeça, uma dupla existência. Essa duplicação ideal acontece (e tem de acontecer) de modo que a mercadoria aparece duplicada na troca efetiva: de um lado, como produto natural, de outro, como valor de troca. Em outras palavras, seu valor de troca adquire uma existência material dela separada.
A determinação do produto em valor de troca implica necessariamente, portanto, que o valor de troca adquire uma existência separada e desprendida do produto. O valor de troca desprendido das próprias mercadorias e ele próprio existente junto delas como mercadoria é dinheiro. Todas as propriedades da mercadoria como valor de troca aparecem no dinheiro como um objeto diferente dela, como uma forma de existência social desprendida de sua forma de existência natural. (Provar mais isso na medida em que forem enumeradas as propriedades usuais do dinheiro.) (O material no qual esse símbolo é expresso não é de modo algum indiferente, por mais diferente que apareça historicamente. O desenvolvimento da sociedade elabora, além do símbolo, o material que lhe é mais e mais adequado, e do qual ela tenta em seguida se desvencilhar; um símbolo, se não é arbitrário, requer certas condições do material em que é representado. Assim, p. ex., os signos para palavras têm uma história. Estilo dos caracteres etc.) O valor de troca do produto engendra, por conseguinte, o dinheiro ao lado do produto. Como é impossível suprimir as complicações e contradições derivadas da existência do dinheiro ao lado das mercadorias particulares por meio da modificação da forma do dinheiro (muito embora as dificuldades pertencentes a uma forma inferior possam ser evitadas por uma forma superior), é igualmente impossível suprimir o próprio dinheiro enquanto o valor de troca permaneçer a forma social dos produtos. É preciso compreender isso claramente para não se colocar tarefas impossíveis e para conhecer os limites no interior dos quais as reformas monetárias e as transformações da circulação podem fornecer uma nova configuração para as relações de produção e as relações sociais sobre elas fundadas.
As propriedades do dinheiro como 1) medida de troca de mercadorias; 2) meio de troca; 3) representante das mercadorias (e, por isso, como objeto dos contratos); 4) mercadoria universal junto às mercadorias particulares – todas elas resultam simplesmente de sua determinação como valor de troca objetivado e separado das próprias mercadorias. (A propriedade do dinheiro como mercadoria universal em relação a todas as outras, como corporificação de seu valor de troca, converte-o simultaneamente em forma realizada e sempre realizável do capital; em forma fenomênica sempre válida do capital, uma propriedade que se evidencia na fuga de metais preciososi, que faz com que o capital historicamente apareça primeiro apenas sob a forma de dinheiro, que explica, enfim, o nexo do dinheiro com a taxa de juros e sua influência sobre esta última.)
Quanto mais a produção se desenvolve de tal modo que cada produtor devém dependente do valor de troca de sua mercadoria, i.e., quanto mais o produto efetivamente devém valor de troca e o valor de troca devém o objeto imediato da produção, tanto mais têm de se desenvolver as relações monetárias e as contradições que são imanentes à relação monetária, à relação do produto consigo mesmo como dinheiro. A necessidade da troca e a transformação do produto em puro valor de troca avançam na mesma medida da divisão do trabalho, i.e., com o caráter social da produção. Porém, na mesma medida em que cresce este último, cresce o poder do dinheiro, i.e., a relação de troca se fixa como um poder externo frente aos produtores e deles independente. O que aparecia originariamente como meio para o fomento da produção converte-se em uma relação estranha aos produtores. Na mesma proporção com que os produtores se tornam dependentes da troca, a troca parece tornar-se independente deles e parece crescer o abismo entre o produto como produto e o produto como valor de troca. O dinheiro não gera essas contradições e antíteses; ao contrário, o desenvolvimento dessas contradições e antíteses gera o poder aparentemente transcendental do dinheiro. (Expor a influência da transformação de todas as relações em relações de dinheiro: de imposto em espécie em imposto em dinheiro; de renda em espécie em renda em dinheiro; de serviço militar na guerra em tropa mercenária; enfim, de todos os serviços pessoais em serviços em dinheiro, de trabalho patriarcal, escravo, servil e coorporativo em puro trabalho assalariado.)
O produto devém mercadoria; a mercadoria devém valor de troca; o valor de troca da mercadoria é sua qualidade imanente de dinheiro; essa sua qualidade de dinheiro se desprende dela como dinheiro, adquire uma existência social universal separada de todas as mercadorias particulares e de seu modo de existência natural; a relação do produto consigo mesmo como valor de troca devém sua relação com um dinheiro existente junto dele, ou de todos os produtos com um dinheiro existente fora de todos eles. Assim como a troca efetiva dos produtos gera seu valor de troca, seu valor de troca gera o dinheiro.
A próxima questão que aqui se coloca é a seguinte: a existência do dinheiro ao lado das mercadorias não envolve desde logo contradições que estão dadas nessa própria relação?
Em primeiro lugar: o simples fato de que a mercadoria existe duplamente, uma vez como produto determinado que contém idealmente (contém de modo latente) seu valor de troca em sua forma de existência natural e, depois, como valor de troca manifesto (dinheiro) que removeu por sua vez todo nexo com a forma natural de existência do produto, essa dupla existência distinta tem de continuar até a diferença, a antítese e a contradição. A própria contradição entre a natureza particular da mercadoria como produto e sua natureza universal como valor de troca, que gerou a necessidade de pô-la duplamente, uma vez como essa mercadoria determinada, outra vez como dinheiro, a contradição entre suas propriedades naturais particulares e suas propriedades sociais universais encerra desde o início a possibilidade de que essas duas formas de existência separadas da mercadoria não sejam mutuamente convertíveis. No dinheiro, a permutabilidade da mercadoria existe ao lado dela como uma coisa, como algo dela diferente, não mais imediatamente idêntico. Tão logo o dinheiro seja uma coisa exterior ao lado da mercadoria, a permutabilidade da mercadoria por dinheiro está imediatamente ligada a condições externas que podem se verificar ou não; está sujeita a condições externas. Na troca, a mercadoria é demandada em virtude de suas propriedades naturais, das necessidades das quais é objeto. O dinheiro, ao contrário, é demandado somente em virtude de seu valor de troca, como valor de troca. Em consequência, se a mercadoria é convertível em dinheiro, se pode ser trocada por dinheiro, se o seu valor de troca pode ser posto para ela, depende de circunstâncias que, antes de tudo, nada têm a ver com a mercadoria como valor de troca e são dela independentes. A convertibilidade da mercadoria depende das propriedades naturais do produto; a do dinheiro coincide com sua existência como valor de troca simbolizado. Portanto, torna-se possível que a mercadoria, em sua forma determinada como produto, não possa mais ser trocada por, igualada com, sua forma universal como dinheiro.
A permutabilidade da mercadoria, ao existir fora da mercadoria como dinheiro, deveio algo distinto dela, algo estranho a ela; algo com que a mercadoria deve primeiramente ser equiparada, portanto, algo de que é inicialmentef desigual; enquanto a própria equiparação devém dependente de condições externas e, portanto, contingente.
Em segundo lugar: uma vez que o valor de troca da mercadoria existe duplamente, como a mercadoria determinada e como dinheiro, o ato de troca decompõe-se em dois atos mutuamente independentes: troca das mercadorias por dinheiro, troca de dinheiro por mercadorias; compra e venda. Como esses atos adquiriram agora formas de existência espacial e temporalmente separadas uma da outra, indiferentes entre si, sua identidade imediata deixa de existir. Podem se corresponder ou não se corresponder; podem coincidir ou não; podem entrar em relações recíprocas discrepantes. É verdade que procurarão constantemente se equiparar; porém, no lugar da igualdade imediata anterior, tem lugar agora o constante movimento de equiparação, que pressupõe justamente a constante não equiparação. Possivelmente, a consonância só pode agora ser plenamente atingida percorrendo as mais extremas dissonâncias.
Em terceiro lugar: com a separação de compra e venda, com a cisão da troca em dois atos independentes entre si espacial e temporalmente, fica patente ainda uma outra nova relação.
Como a própria troca cinde-se em dois atos mutuamente independentes, o próprio movimento total da troca separa-se dos trocadores, dos produtores das mercadorias. A troca pela troca separa-se da troca por mercadorias. Um estamento mercantil se interpõe entre os produtores, um estamento que só compra para vender e só vende para novamente comprar, e que nessa operação não tem por finalidade a posse das mercadorias como produtos, mas unicamente a obtenção de valores de troca enquanto tais, de dinheiro. (No simples escambo pode se constituir um estamento mercantil. Mas como só tem à disposição o excedente da produção dos dois lados, a sua influência sobre a própria produção, bem como a sua importância como um todo, permanece completamente secundária.) À autonomização do valor de troca no dinheiro, destacado dos produtos, corresponde a autonomização da troca (do comércio) como função destacada dos trocadores. O valor de troca era a medida da troca de mercadorias; mas sua finalidade era a posse direta da mercadoria trocada, seu consumo (quer esse consumo consistisse no fato de que a mercadoria, como produto, servia diretamente à satisfação de necessidades ou mesmo novamente como instrumento de produção). A finalidade do comércio não é diretamente o consumo, mas o ganhar dinheiro, valor de troca. Com essa duplicação da troca – a troca para o consumo e a troca pela troca – tem origem uma nova desproporção. O negociante, em sua troca, é determinado simplesmente pela diferença entre compra e venda das mercadorias; mas o consumidor precisa repor definitivamente o valor de troca da mercadoria que compra. A circulação, a troca no âmbito do estamento mercantil e no final da circulação, a troca entre o estamento mercantil e os consumidores, por mais que tenham enfim de se condicionar reciprocamente, são determinados por leis e motivos muito diferentes e podem cair na maior das contradições uma com a outra. Nessa separação já reside a possibilidade de crises comerciais. Entretanto, como a produção trabalha imediatamente para o comércio e só mediatamente para o consumo, da mesma forma que tem de ser capturada por essa incongruência entre comércio e troca para consumo, ela tem, por sua vez, de gerá-la. (As relações entre demanda e oferta tornam-se completamente invertidas.) (O negócio de dinheiro separa-se, por sua vez, do comércio propriamente dito.)
Aforismos: (Todas as mercadorias são dinheiro perecível; o dinheiro é a mercadoria imortal[29]. Quanto mais se desenvolve a divisão do trabalho, tanto mais o produto imediato deixa de ser um meio de troca. Surge a necessidade de um meio de troca universal, i.e., de um meio de troca que seja independente da produção específica de cada um. No dinheiro, o valor das coisas está separado de sua substância. O dinheiro é originariamente o representante de todos os valores; na práxis, as coisas se invertem e todos os produtos e trabalhos reais devêm os representantes do dinheiro. Na troca direta cada artigo não pode ser trocado por qualquer outro, e uma atividade determinada só pode ser trocada por produtos determinados. O dinheiro só pode superar as dificuldades inerentes ao escambo na medida em que as generaliza, as torna universais. É absolutamente necessário que elementos separados à força, mas essencialmente ligados, se revelem por erupção violenta como separação de algo essencialmente conectado. A unidade se restaura violentamente. Tão logo a cisão hostil leva a erupções, os economistas salientam a unidade essencial e abstraem do estranhamento. A sua sabedoria apologética consiste em esquecer em todos os momentos decisivos as suas próprias definições. O produto, como meio de troca imediato, está 1) ainda imediatamente ligado à sua qualidade natural e, portanto, de toda maneira por ela limitado; pode, p. ex., se deteriorar etc.; 2) ligado à necessidade imediata que o outro tem ou não precisamente desse produto, ou também que tenho de seu produto. Na medida em que o produto do trabalho e o próprio trabalho estão subordinados à troca, chega um momento em que são separados de seu possuidor. Resulta fortuito se, após tal separação, retornam ao seu possuidor sob outra forma. No momento em que o dinheiro ingressa na troca, sou coagido a trocar meu produto pelo valor de troca universal ou pela permutabilidade universal, de modo que meu produto devém dependente do comércioi universal e é arrancado de seus limites locais, naturais e individuais. Precisamente por isso pode deixar de ser um produto.)
Em quarto lugar: o valor de troca, do mesmo modo que se apresenta no dinheiro como mercadoria universal ao lado de todas as mercadorias particulares, por isso se apresenta simultaneamente no dinheiro como mercadoria particular (dado que possui uma existência particular) ao lado de todas as outras mercadorias. Tem origem uma incongruência não somente pelo fato de que o dinheiro, porque só existe na troca, confronta, como a permutabilidade universal, a permutabilidade particular das mercadorias e a suprime imediatamente, [mas também pelo fato] de que, apesar disso, as duas devem sempre permanecer reciprocamente convertíveis; o dinheiro entra assim em contradição consigo mesmo e com sua determinação, uma vez que o próprio dinheiro é uma mercadoria particular (mesmo quando somente signo) e, em consequência, em sua troca por outras mercadorias está por sua vez submetido a condições de troca particulares que contradizem sua permutabilidade absoluta e universal. (Aqui não se fala ainda, de modo algum, do dinheiro fixado na substância de um determinado produto etc.) Ao lado sua existência na mercadoria, o valor de troca ganhou uma existência própria no dinheiro, foi separado de sua substância justamente porque a determinabilidade natural dessa substância contradizia sua determinação universal como valor de troca. Toda mercadoria é igual (ou comparável) às outras como valor de troca (qualitativamente: cada uma representa apenas um mais ou um menos quantitativo do valor de troca). Por isso, essa sua identidade, essa sua unidade, é distinta de sua diversidade natural; e, por conseguinte, aparece no dinheiro tanto como seu elemento comum quanto como um terceiro elemento que a confronta. No entanto, de um lado, o valor de troca permanece naturalmente uma qualidade inerente às mercadorias, enquanto existe ao mesmo tempo fora delas; de outro, o dinheiro, porquanto não existe mais como propriedade das mercadorias, como um seu universal, mas é individualizado ao lado delas, ele próprio devém uma mercadoria particular ao lado de outras mercadorias (determinável pela oferta e demanda; decompõe-se em tipos particulares de dinheiro etc.). Devém uma mercadoria como as outras mercadorias e, ao mesmo tempo, não é uma mercadoria como as outras mercadorias. A despeito de sua determinação universal, é uma coisa permutável dentre outras coisas permutáveis. É não somente o valor de troca universal, mas, ao mesmo tempo, um valor de troca particular dentre outros valores de troca particulares. Aqui, novas fontes de contradições que se fazem valer na práxis. (A natureza particular do dinheiro evidencia-se de novo na separação do negócio de dinheiro do comércio propriamente dito.)
Vemos, portanto, como é imanente ao dinheiro realizar suas finalidades à medida que simultaneamente as nega; se autonomizar em relação às mercadorias; de meio, devir fim; realizar o valor de troca das mercadorias ao se separar dele; facilitar a troca ao cindi-la; superar as dificuldades da troca imediata de mercadorias ao generalizá-las; autonomizar a troca em relação aos produtores na mesma medida em que os produtores devêm dependentes da troca.
(Será necessário, mais tarde, antes de abandonar essa questão, corrigir o modo idealista da apresentação que produz a aparência de que se trata simplesmente das determinações conceituais e da dialética desses conceitos. Sobretudo, portanto, o clichê: o produto (ou atividade) devém mercadoria; a mercadoria, valor de troca; o valor de troca, dinheiro.)
(Economist, 24 de janeiro de 1857. Com respeito aos bancosi, levar em conta oportunamente a seguinte proposição:
|Na medida em que participam dos lucros dos bancos, como em geral acontece hoje – e pode acontecer ainda em maior extensão pela ampla difusão dos bancos por ações, pela abolição de todos os privilégios corporativos e pela extensão da liberdade total ao negócio bancário –, as classes mercantis têm enriquecido por meio das elevadas taxas do dinheiro. Na verdade, as classes mercantis, dada a extensão de seus depósitos, são virtualmente seus próprios banqueiros; e, na medida em que esse é o caso, a taxa de desconto deve ser de pouca importância para elas. Todas as reservas, bancárias e outras, devem evidentemente ser os resultados de atividade ininterrupta e de poupanças extraídas dos lucros; e, consequentemente, consideradas como um todo, as classes mercantis [e] industriais devem ser seus próprios banqueiros, e basta apenas que os princípios da livre troca sejam estendidos a todos os negócios para igualar ou neutralizar para elas as vantagens e desvantagens de todas as flutuações no mercado de dinheiroi.[30])
Todas as contradições do sistema monetário e da troca de produtos sob o sistema monetário são o desenvolvimento da relação dos produtos como valores de troca, de sua determinação como valor de troca ou valor simplesmente.
(Morning Star, 12 de fevereiro de 1857. “|A pressão do dinheiro durante o ano passado e a elevada taxa de desconto que em consequência foi adotada foram muito benéficas para os lucros do Banco da França. Os seus dividendos continuaram aumentando: 118 francos em 1852, 154 em 1853, 194 em 1854, 200 em 1855, 272 em 1856i.”[31])
Considerar também a seguinte passagem:
|As moedas de prata inglesas [são] emitidas a um preço maior do que o valor da prata que contêm. Uma libra de prata de valor intrínsecoi de 60-62 sh. (|em média, 3 libras esterlinas em ouroi) é |cunhada emi 66 sh. |A Casa da Moeda paga “o preço de mercado do dia, de 5 sh. a 5 sh. 2 d. a onça, e emite à taxa de 5 sh. 6 d. a onça. Há duas razões que impedem que qualquer inconveniente prático resulte desse arranjo: (de moedas simbólicas de prata, e não de valor intrínseco)[32] primeiro, a moeda só pode ser obtida na Casa da Moeda, e naquele preço; como circulação doméstica, portanto, não pode ser depreciada, e não pode ser remetida ao exterior porque circula aqui a um valor maior do que seu valor intrínseco; e, segundo, como é um valor legal apenas até 40 sh., nunca interfere na circulação das moedas de ouro nem afeta seu valori”. Dê também à França o conselho de |emitir moedas simbólicas de prata secundáriasi, não de valor intrínseco, limitando o montante até ao qual deveriam ser moeda de curso legali. Porém, ao mesmo tempo: |ao fixar a qualidade da moeda, o aconselha a adotar uma margem mais ampla entre os valores intrínseco e nominal do que temos na Inglaterra porque o crescente valor da prata em relação ao ouro pode, muito provavelmente, em pouco tempo, se elevar acima do nosso preço atual da Casa da Moeda, ocasião em que seremos forçados a alterá-lo novamente. A nossa moeda de prata está agora pouco mais de 5% abaixo do valor intrínseco: há pouco tempo estava 10%i.[33]
Poder-se-ia pensar então que a emissão de bônus-horários supera todas essas dificuldades. (A existência de bônus-horários naturalmente já pressupõe condições que não estão imediatamente dadas na análise da relação entre valor de troca e dinheiro, [condições] sem as quais ambos podem existir e existem: “crédito público”; banco etc.; no entanto, tudo isso não é para ser abordado aqui em momento ulterior; uma vez que, naturalmente, os homens do bônus-horário o concebem como último produto da “série”[34], que, quando melhor corresponde ao “puro” conceito de dinheiro, “aparece”[35] por último na realidade.) Antes de tudo: quando se consideram realizados os pressupostos sob os quais o preço das mercadorias = seu valor de troca; coincidência de demanda e oferta; de produção e consumo; em última instância, |produção proporcionali[36] (as assim chamadas relações de distribuição são elas próprias relações de produção), a questão do dinheiro devém inteiramente secundária, em especial a questão de quais tíquetesi são emitidos, azuis ou verdes, de papel ou de metal, ou de que outra forma a contabilidade social é conduzida. Nesse caso, é extremamente ridículo manter o pretexto de que deveriam ser feitas investigações sobre as relações monetárias reais.
O banco (|qualquer bancoi) emite os bônus-horários. A mercadoria a = o valor de troca x, i.e., = x horas de trabalho, troca-se por dinheiro, representando x horas de trabalho. O banco deveria igualmente comprar a mercadoria, i.e., trocá-la por seus representantes monetários, como, p. ex., atualmente o Banco da Inglaterra tem de dar notas por ouro. A mercadoria, a existência [Dasein] substancial e, por isso, contingente do valor de troca, é trocada pela existência [Dasein] simbólica do valor de troca como valor de troca. Não há então qualquer dificuldade em convertê-la da forma de mercadoria na forma de dinheiro. O tempo de trabalho nela contido precisa apenas ser autenticamente verificado (o que, dito seja de passagem, não é tão fácil quanto testar a pureza e o peso do ouro e da prata), e gera assim, imediatamente, seu contravalorf, sua existência monetária. Como quer que a viremos ou reviremos, em última instância a questão resume-se ao seguinte: o banco emissor dos bônus-horários compra a mercadoria por seu custo de produção, compra todas as mercadorias, e na verdade a compra não lhe custa nada além da produção de pedaços de papel, e dá ao vendedor, em lugar do valor de troca que este possui em uma forma substancial determinada, o valor de troca simbólico da mercadoria, em outras palavras, uma ordem de pagamento sobre todas as outras mercadorias no montante do mesmo valor de troca. Naturalmente, o valor de troca enquanto tal só pode existir de forma simbólica, se bem que tal símbolo, para ser usado como coisa – não somente como forma de representação –, possui uma existência coisal; não é só uma representação ideal, mas é efetivamente representado de um modo objetivo. (Uma medida pode ser segurada na mão; o valor de troca mede, mas só troca quando a medida passa de uma mão à outra.[37]) Portanto, o banco dá dinheiro pela mercadoria, dinheiro que é exatamente uma ordem de pagamento sobre o valor de troca da mercadoria, i.e., sobre todas as mercadorias de mesmo valor de troca; o banco compra. O banco é o comprador universal, o comprador não desta ou daquela mercadoria, mas de todas as mercadorias. Pois ele deve justamente implementar a conversão de cada mercadoria em sua existência simbólica como valor de troca. Mas se é o comprador universal, tem de ser também o vendedor universal, não só o galpão onde todas as mercadorias são depositadas, não somente o armazém universal, mas o proprietário das mercadorias, no mesmo sentido em que o é qualquer outro comerciante. Troquei a minha mercadoria a pelo bônus-horário b, que representa seu valor de troca; mas só porque com isso posso agora, a qualquer momento, metamorfosear de novo esse b em todas as mercadorias efetivas c, d, e, etc. Esse dinheiro pode então circular fora do banco? Pode circular além da troca entre o possuidor do bônus e o banco? Como é assegurada a convertibilidade desse bônus? Só dois casos são possíveis. Ou todos os possuidores de mercadorias (produtos ou trabalho) desejam em conjunto vender suas mercadorias pelo seu valor de troca, ou alguns desejam e outros não. Caso todos pretendam vendê-las pelo seu valor de troca, não aguardarão pela casualidade de encontrar um comprador, mas irão imediatamente ao banco ceder-lhe as mercadorias e receberão por elas seu signo de valor de troca, dinheiro; readquirem a mercadoria com o próprio dinheiro do banco. Nesse caso, o banco é simultaneamente o comprador e o vendedor universal em uma pessoa. Ou sucede o oposto. Nesse caso, o bônus bancário é um mero papel que apenas afirma ser o símbolo universalmente aceito do valor de troca, mas que não tem qualquer valor. Pois esse símbolo tem a propriedade não apenas de representar o valor de troca, mas de ser o próprio valor de troca na troca efetiva. No último caso, o bônus bancário não seria dinheiro, ou seria apenas dinheiro convencional entre o banco e seus clientes, mas não no mercado universal. Seria o mesmo que uma dúzia de cartões de alimentação que recebo por uma subscrição em um restaurante, ou uma dúzia de bilhetes de teatro, ambos representando dinheiro, mas o primeiro é dinheiro somente nesse determinado restaurante, o segundo, nesse determinado teatro. O bônus bancário teria deixado de corresponder aos requisitos do dinheiro, uma vez que circularia não entre o |público em gerali, mas somente entre o banco e seus clientes. Devemos, portanto, abandonar a última suposição.
O banco seria, portanto, o comprador e vendedor universal. Em lugar das notas, o banco poderia emitir chequesi e, em lugar destes últimos, poderia manter simples |cadernetas de débito e créditoi[d]. Conforme a soma dos valores-mercadorias que depositasse no banco, X teria a seu crédito no banco a mesma soma de valor em outras mercadorias. Um segundo atributo do banco seria necessariamente o de fixar de maneira autêntica o valor de troca de todas as mercadorias, i.e., o tempo de trabalho nelas materializado. Mas suas funções não poderiam terminar aqui. Teria de determinar o tempo de trabalho no qual as mercadorias podem ser produzidas nas condições médias da indústria, o tempo em que têm de ser produzidas. Mas isso também não seria suficiente. Teria não só de determinar o tempo em que um certo quantum de produtos tem de ser produzido e pôr os produtores em condições tais que seu trabalho seja igualmente produtivo (logo, teria também de harmonizar e ordenar a distribuição dos meios de trabalho), mas teria de determinar as quantidades de tempo de trabalho que deveriam ser utilizadas nos diferentes ramos de produção. Este último seria necessário porque, para realizar o valor de troca, para fazer seu dinheiro efetivamente convertível, a produção geral teria de estar assegurada, e em proporções tais que as necessidades dos trocadores fossem satisfeitas. Mas isso ainda não é tudo. A troca mais relevante não é a troca das mercadorias, mas a troca do trabalho por mercadorias. (Mais precisamente em seguida.) Os trabalhadores não venderiam seu trabalho ao banco, mas obteriam o valor de troca pela totalidade do produto de seu trabalho etc. Visto precisamente, então, o banco seria não somente o comprador e vendedor universal, mas também o produtor universal. Na verdade, o banco seria ou o governo despótico da produção e administrador da distribuição, ou seria |na verdadei nada mais do que um conselhoi que cuidaria dos livros e da contabilidade da sociedade trabalhando em comunidade. A posse em comum dos meios de produção está pressuposta etc. etc. Os sansimonianos faziam de seu banco o papado da produção.
A dissolução de todos os produtos e atividades em valores de troca pressupõe a dissolução de todas as relações fixas (históricas) de dependência pessoal na produção, bem como a dependência multilateral dos produtores entre si. A produção de todo indivíduo singular é dependente da produção de todos os outros; bem como a transformação de seu produto em meios de vida para si próprio torna-se dependente do consumo de todos os outros. Os preços são antigos; a troca também; mas a crescente determinação dos primeiros pelos custos de produção, assim como a predominância da última sobre todas as relações de produção, só se desenvolvem completamente, e continuam a desenvolver-se cada vez mais completamente, na sociedade burguesa, a sociedade da livre concorrência. Aquilo que Adam Smith, em autêntico estilo do século XVIII, situa no período pré-histórico, no período que antecede a história, é, ao contrário, um produto da história[38].
Essa dependência recíproca se expressa na permanente necessidade da troca e no valor de troca como mediador geral. Os economistas expressam isso do seguinte modo: cada um persegue seu interesse privado e apenas seu interesse privado; e serve, assim, sem sabê-lo ou desejá-lo, ao interesse privado de todos, ao interesse geral. A piada não consiste em que, à medida que cada um persegue seu interesse privado, a totalidade dos interesses privados, e, portanto, o interesse geral, é alcançado. Dessa frase abstrata poderia ser deduzido, ao contrário, que cada um obstaculiza reciprocamente a afirmação do interesse do outro, e que desta bellum ommium contra omnes[39], em lugar de uma afirmação universal, resulta antes uma negação universal. A moral da história reside, ao contrário, no fato de que o próprio interesse privado já é um interesse socialmente determinado, e que só pode ser alcançado dentro das condições postas pela sociedade e com os meios por ela proporcionados; logo, está vinculado à reprodução de tais condições e meios. É o interesse das pessoas privadas; mas seu conteúdo, assim como a forma e os meios de sua efetivação, está dado por condições sociais independentes de todos.
A dependência recíproca e multilateral dos indivíduos mutuamente indiferentes forma sua conexão social. Essa conexão social é expressa no valor de troca, e somente nele a atividade própria ou o produto de cada indivíduo devêm uma atividade ou produto para si; o indivíduo tem de produzir um produto universal – o valor de troca, ou este último por si isolado, individualizado, dinheiro. De outro lado, o poder que cada indivíduo exerce sobre a atividade dos outros ou sobre as riquezas sociais existe nele como o proprietário de valores de troca, de dinheiro. Seu poder social, assim como seu nexo com a sociedade, [o indivíduo] traz consigo no bolso. A atividade, qualquer que seja sua forma de manifestação individual, e o produto da atividade, qualquer que seja sua qualidade particular, é o valor de troca, i.e., um universal em que toda individualidade, peculiaridade, é negada e apagada. Na verdade, essa é uma situação muito distinta daquela em que o indivíduo, ou o indivíduo natural ou historicamente ampliado na família ou tribo (mais tarde, comunidade), reproduz-se diretamente com base na natureza ou em que sua atividade produtiva e sua participação na produção são dependentes de uma determinada forma do trabalho e do produto, e sua relação com os outros é determinada da mesma forma.
O caráter social da atividade, assim como a forma social do produto e a participação do indivíduo na produção, aparece aqui diante dos indivíduos como algo estranho, como coisa; não como sua conduta recíproca, mas como sua subordinação a relações que existem independentemente deles e que nascem do entrechoque de indivíduos indiferentes entre si. A troca universal de atividades e produtos, que deveio condição vital para todo indivíduo singular, sua conexão recíproca, aparece para eles mesmos como algo estranho, autônomo, como uma coisa. No valor de troca, a conexão social entre as pessoas é transformada em um comportamento social das coisas; o poder [Vermögen] pessoal, em poder coisificado. Quanto menos força social possui o meio de troca, quanto mais está ainda ligado à natureza do produto imediato do trabalho e às necessidades imediatas dos trocadores, maior deve ser a força da comunidade que liga os indivíduos uns aos outros, relação patriarcal, comunidade antiga, feudalismo e sistema corporativo. (Ver meu Caderno de Notas XII, 34b.)[40] Cada indivíduo possui o poder social sob a forma de uma coisa. Retire da coisa esse poder social e terá de dar tal poder a pessoas sobre pessoas. Relações de dependência pessoal (de início, inteiramente espontâneas e naturais) são as primeiras formas sociais nas quais a produtividade humana se desenvolve de maneira limitada e em pontos isolados. Independência pessoal fundada sobre uma dependência coisal é a segunda grande forma na qual se constitui pela primeira vez um sistema de metabolismo social universal, de relações universais, de necessidades múltiplas e de capacidades universais. A livre individualidade fundada sobre o desenvolvimento universal dos indivíduos e a subordinação de sua produtividade coletiva, social, como seu poder social, é o terceiro estágio. O segundo estágio cria as condições do terceiro. Por isso, as condições patriarcais, bem como as antigas (justamente como as feudais), declinam com o desenvolvimento do comércio, do luxo, do dinheiro, do valor de troca na mesma medida em que com eles emerge a sociedade moderna.
Troca e divisão do trabalho condicionam-se reciprocamente. Como cada um trabalha para si e seu produto nada é para ele, tem naturalmente de trocar, não só para participar da capacidade de produção universal, mas para transformar seu próprio produto em um meio de vida para si mesmo. (Vide minhas Observações sobre a economia, p. V (13, 14).)[41] A troca, quando mediada pelo valor de troca e pelo dinheiro, pressupõe certamente a dependência multilateral dos produtores entre si, mas ao mesmo tempo o completo isolamento dos seus interesses privados e uma divisão do trabalho social cuja unidade e mútua complementaridade existem como uma relação natural externa aos indivíduos, independente deles. A pressão da demanda e da oferta universais uma sobre a outra medeia a conexão de [pessoas] reciprocamente indiferentes.
A própria necessidade de primeiro transformar o produto ou a atividade dos indivíduos na forma de valor de troca, no dinheiro, e o fato de que só nessa forma coisal adquirem e comprovam seu poder social, demonstra duas coisas: 1) que os indivíduos produzem tão somente para a sociedade e na sociedade; 2) que sua produção não é imediatamente social, não é |o resultado de associaçãoi que reparte o trabalho entre si. Os indivíduos estão subsumidos à produção social que existe fora deles como uma fatalidade; mas a produção social não está subsumida aos indivíduos que a utilizam como seu poder comum. Logo, não pode haver nada mais falso e insípido do que pressupor, sobre a base do valor de troca, do dinheiro, o controle dos indivíduos reunidos sobre sua produção total, como aconteceu acima com o banco de bônus-horário. A troca privada de todos os produtos do trabalho, das atividades e das capacidades está em contradição tanto com uma distribuição fundada na dominação e subordinação (naturais e espontâneas, ou políticas) dos indivíduos entre si (na qual a verdadeira troca funciona de maneira acessória ou, no geral, apodera-se pouco da vida de comunidades inteiras, pois tem lugar sobretudo entre diferentes comunidades, e de modo algum submete todas as relações de produção e de distribuição) (qualquer que seja o caráter assumido por essa dominação e subordinação: patriarcal, antiga ou feudal), como com a troca livre entre indivíduos que são associados sobre a base da apropriação e do controle coletivos dos meios de produção. (Esta última associação nada tem de arbitrária: ela pressupõe o desenvolvimento de condições materiais e espirituais que tem de ser ulteriormente exposto nesse ponto.) Assim como a divisão do trabalho gera aglomeração, coordenação, cooperação, a antítese dos interesses privados gera interesses de classe, a concorrência gera concentração de capital, monopólios, sociedades anônimas – puras formas antitéticas da unidade que dá origem à própria antítese –, a troca privada gera o comércio mundial, a independência privada gera a total dependência do assim chamado mercado mundial, e os atos de troca fragmentados geram um sistema bancário e de crédito cuja contabilidade ao menos apura os saldos da troca privada. Na taxa de câmbio – por mais que os interesses privados de cada nação a dividam em tantas nações quantos são os seus |indivíduos adultosi e se contraponham os interesses dos |exportadores e importadoresi de uma mesma nação –, o comércio nacional adquire uma aparência de existência etc. etc. Nem por isso alguém acreditará poder suprimir as bases do comércio privado doméstico ou exterior por meio de uma reforma da bolsa. Mas no âmbito da sociedade burguesa, da sociedade baseada no valor de troca, geram-se tanto relações de intercâmbio como de produção que são outras tantas minas para fazê-la explodir. (Uma massa de formas antitéticas da unidade social cujo caráter antitético, todavia, jamais pode ser explodido por meio de metamorfoses silenciosas. Por outro lado, se não encontrássemos veladas na sociedade, tal como ela é, as condições materiais de produção e as correspondentes relações de intercâmbio para uma sociedade sem classes, todas as tentativas para explodi-la seriam quixotadas.)
Vimos que, muito embora o valor de troca seja = o tempo de trabalho relativo materializado nos produtos, o dinheiro, por sua vez, é = o valor de troca das mercadorias destacado de sua substância; nesse valor de troca ou nessa relação monetária estão contidas as contradições entre as mercadorias e seu valor de troca, entre as mercadorias como valores de troca e o dinheiro. Vimos que um banco que produz imediatamente uma réplica da mercadoria em dinheiro-trabalho é uma utopia. Por conseguinte, não obstante o dinheiro [seja] apenas o valor de troca destacado da substância das mercadorias e deva sua origem apenas à tendência desse valor de troca de se pôr de modo puro, a mercadoria não pode ser imediatamente transformada em dinheiro; i.e., o certificado autêntico do quantum de tempo de trabalho nela realizado não pode ser utilizado como seu preço no mundo dos valores de troca. |Como é issoi?
(Em uma forma do dinheiro – como meio de troca (e não medida do valor de troca) – é claro para os economistas que a existência do dinheiro pressupõe a coisificação [Versachlichung] do nexo social; na medida em que, portanto, o dinheiro aparece como penhor que um deve deixar na mão do outro para obter deste uma mercadoria. Os próprios economistas dizem, nesse caso, que os homens depositam na coisa (no dinheiro) a confiança que não depositam em si mesmos como pessoas. Mas por que depositam a confiança na coisa? Evidentemente, só como relação coisificada das pessoas entre si, como valor de troca coisificado, e o valor de troca nada mais é do que uma relação da atividade produtiva das pessoas entre si. Qualquer outro penhor pode servir diretamente ao seu possuidor enquanto tal: o dinheiro serve-lhe somente como “penhor mobiliário da sociedade”[42], mas só é tal penhor em virtude de sua propriedade (simbólica) social; e só pode possuir propriedade social porque os indivíduos se estranharam de sua própria relação social como objeto.)
Nas listas de preços correntes, onde todos os valores são medidos em dinheiro, a independência do caráter social das coisas em relação às pessoas, assim como, simultaneamente, a atividade do comércio sobre essa base da condição estranhada [Fremdartigkeit], na qual as relações globais de produção e intercâmbio aparecem confrontadas ao indivíduo, a todos os indivíduos, parece se subordinar novamente aos indivíduos singulares. Dado que a autonomização do mercado mundial, |se se quiseri, (no qual está incluída a atividade de cada indivíduo singular) cresce com o desenvolvimento das relações monetárias (do valor de troca) e, vice-versa, que a conexão universal e a dependência generalizada na produção e no consumo crescem simultaneamente com a independência e a indiferença recíproca de produtores e consumidores; dado que essa contradição conduz a crises etc., paralelamente ao desenvolvimento do estranhamento tenta-se suprimir a contradição em seu próprio terreno; listas de preços correntes, taxas de câmbio, conexão postal dos comerciantes entre si, telégrafos etc. (os meios de comunicação desenvolvem-se naturalmente ao mesmo tempo), em que cada indivíduo singular obtém informação sobre a atividade de todos os outros e procura em seguida ajustar a sua própria. (I.e., embora a oferta e a demanda de todos com respeito a todos transcorram de forma independente, cada um procura se informar sobre a situação da demanda e da oferta universais; e, em seguida, esse conhecimento retroage praticamente sobre todos eles. Muito embora tudo isso, sob ponto de vista dado, não suprima a condição estranhada [Fremdartigkeit], dá lugar a relações e conexões que contêm em si a possibilidade de abolir o antigo ponto de vista.) (A possibilidade de estatística universal etc.) (Aliás, isso é para ser desenvolvido sob as categorias “Preços, demanda e oferta”. De resto, cabe assinalar aqui apenas que a visão geral sobre o comércio e a produção globais, na medida em que está factualmente presente nas listas de preços correntes, fornece de fato a melhor demonstração de como o seu próprio intercâmbio e sua própria produção confrontam os indivíduos singulares como relação coisal, deles independente. No mercado mundial desenvolveu-se em tal nível o nexo do indivíduo singular com todos, mas ao mesmo tempo também a independência desse nexo em relação aos próprios indivíduos singulares, que sua formação já contém simultaneamente a condição de transição para fora dele mesmo.) A equiparação em lugar da comunalidade e da universalidade efetivas.
(Foi dito e pode ser dito que a beleza e a grandeza residem justamente nessa conexão espontânea e natural, nesse metabolismo material e espiritual independente do saber e da vontade dos indivíduos, e que pressupõe precisamente sua independência e indiferença recíprocas. E essa conexão coisificada é certamente preferível à sua desconexão, ou a uma conexão local baseada unicamente na estreiteza da consanguinidade natural ou nas [relações] de dominação e servidão. É igualmente certo que os indivíduos não podem subordinar suas próprias conexões sociais antes de tê-las criado. Porém, é absurdo conceber tal conexão puramente coisificada como a conexão natural e espontânea, inseparável da natureza da individualidade (em oposição ao saber e ao querer reflexivos) e a ela imanente. A conexão é um produto dos indivíduos. É um produto histórico. Faz parte de uma determinada fase de seu desenvolvimento. A condição estranhada [Fremdartigkeit] e a autonomia com que ainda existe frente aos indivíduos demonstram somente que estes estão ainda no processo de criação das condições de sua vida social, em lugar de terem começado a vida social a partir dessas condições. É a conexão natural e espontânea de indivíduos em meio a relações de produção determinadas, estreitas. Os indivíduos universalmente desenvolvidos, cujas relações sociais, como relações próprias e comunitárias, estão igualmente submetidas ao seu próprio controle comunitário, não são um produto da natureza, mas da história. O grau e a universalidade do desenvolvimento das capacidades em que essa individualidade se torna possível pressupõem justamente a produção sobre a base dos valores de troca, que, com a universalidade do estranhamento do indivíduo de si e dos outros, primeiro produz a universalidade e multilateralidade de suas relações e habilidades. Em estágios anteriores de desenvolvimento, o indivíduo singular aparece mais completo precisamente porque não elaborou ainda a plenitude de suas relações e não as pôs diante de si como poderes e relações sociais independentes dele. É tão ridículo ter nostalgia daquela plenitude original: da mesma forma, é ridícula a crença de que é preciso permanecer naquele completo esvaziamento. O ponto de vista burguês jamais foi além da oposição a tal visão romântica e, por isso, como legítima antítese, a visão romântica o acompanhará até seu bem-aventurado fim.)
(Como ilustração, pode ser tomada aqui a relação do indivíduo singular com a ciência.)
(Comparar o dinheiro com o sangue – a palavra circulação deu ensejo para tanto – é mais ou menos tão verdadeiro quanto a comparação de Menenius Agrippa dos patrícios com o estômago.) (Comparar o dinheiro com a linguagem não é menos falso. As ideias não são transformadas na linguagem de tal maneira que sua especificidade é dissolvida e seu caráter social existe ao lado delas na linguagem, à semelhança dos preços ao lado das mercadorias. As ideias não existem separadas da linguagem. Ideias que primeiro têm de ser traduzidas da língua materna em uma língua estrangeira para circular, para ser permutáveis, oferecem uma analogia melhor; mas a analogia, nesse caso, reside não na língua, mas em seu caráter de língua estrangeira.)
(A permutabilidade de todos os produtos, atividades e relações por um terceiro, por algo que pode ser, por sua vez, trocado indistintamente por tudo – logo, o desenvolvimento dos valores de troca (e das relações monetárias) é idêntico à venalidade e à corrupção universais. A prostituição generalizada aparece como uma fase necessária do caráter social dos talentos, das capacidades, das habilidades e das atividades pessoais. Expresso de forma mais polida: a relação universal de utilidade e de usabilidade. A equiparação do heterogêneo, como Shakespeare bem define o dinheiro[43]. A mania de enriquecimento enquanto tal é impossível sem dinheiro; qualquer outro tipo de acumulação e mania de acumulação aparece natural e espontaneamente limitado, condicionado, por um lado, pelas necessidades e, por outro, pela natureza limitada dos produtos (sacri auri fames[44]).)
(Em seu desenvolvimento, o sistema monetário já supõe, evidentemente, outros desenvolvimentos gerais.)
Caso se considere relações sociais que geram um sistema não desenvolvido de troca, de valores de troca e de dinheiro, ou às quais corresponde um grau pouco desenvolvido destes últimos, é desde logo claro que os indivíduos, embora suas relações apareçam mais pessoais, só entram em relação uns com os outros como indivíduos em uma determinabilidade, como suserano e vassalo, senhor e servo etc., ou como membros de uma casta etc., ou ainda como integrantes de um estamento etc. Na relação monetária, no sistema de trocas desenvolvido (e essa aparência seduz a democracia), são de fato rompidos, dilacerados, os laços de dependência pessoal, as diferenças de sangue, as diferenças de cultura etc. (todos os laços pessoais aparecem ao menos como relações pessoais); e os indivíduos parecem independentes (essa independência que, aliás, não passa de mera ilusão e, mais justamente, significa apatia – no sentido de indiferença), livres para colidirem uns contra os outros e, nessa liberdade, trocar; mas assim parecem apenas para aquele que abstrai das condições, das condições de existência sob as quais esses indivíduos entram em contato (e essas [condições], por sua vez, são independentes dos indivíduos e aparecem, apesar de geradas pela sociedade, como condições naturais, i.e., incontroláveis pelos indivíduos). A determinabilidade que, no primeiro caso, aparece como uma limitação pessoal do indivíduo por parte de um outro, aparece no segundo caso desenvolvida como uma limitação coisal do indivíduo por relações dele independentes e que repousam sobre si mesmas. (Como o indivíduo singular não pode se despojar de sua determinabilidade pessoal, mas pode muito bem superar relações externas e subordiná-las a si, sua liberdade parece maior no caso 2. Entretanto, uma análise mais precisa dessas relações externas, dessas condições, mostra a impossibilidade dos indivíduos de uma classe etc. de superá-las |em massaf sem as abolir. O indivíduo singular pode casualmente ser capaz de fazê-lo; a massa de indivíduos dominados por tais relações não pode, uma vez que sua mera existência expressa a subordinação, a necessária subordinação dos indivíduos a elas.) Essas relações externas tampouco são uma supressão das “relações de dependência”, dado que são apenas a sua resolução em uma forma universal; são, ao contrário, a elaboração do fundamento universal das relações pessoais de dependência. Também aqui os indivíduos só entram em relação entre si como indivíduos determinados. Essas relações de dependência coisal, por oposição às relações de dependência pessoal (a relação de dependência coisal nada mais é do que as relações sociais autônomas contrapostas a indivíduos aparentemente independentes, i.e., suas relações de produção recíprocas deles próprios autonomizadas), aparecem de maneira tal que os indivíduos são agora dominados por abstrações, ao passo que antes dependiam uns dos outros. A abstração ou ideia, no entanto, nada mais é do que a expressão teórica dessas relações materiais que os dominam. As relações só podem naturalmente ser expressas em ideias, e é por isso que os filósofos conceberam como o peculiar da era moderna o fato de ser dominada pelas ideias e identificaram a criação da livre individualidade com a derrubada desse domínio das ideias. Do ponto de vista ideológico, o erro era tão mais fácil de cometer porquanto esse domínio das relações (essa dependência coisal que, aliás, se reverte em relações determinadas de dependência pessoal, mas despidas de toda ilusão) aparece na consciência dos próprios indivíduos como domínio das ideias e a crença na eternidade de tais ideias, i.e., dessas relações coisais de dependência, é consolidada, nutrida, inculcada por todos os meios, |é claroi, pelas classes dominantes.
(A respeito da ilusão das “relações puramente pessoais” dos tempos feudais etc., naturalmente nunca se deve esquecer: 1) que essas próprias relações, em uma fase determinada, assumiram um caráter coisal dentro de sua esfera, como mostra, p. ex., o desenvolvimento das relações de propriedade territorial a partir de relações de subordinação puramente militares; mas 2) que a relação coisal em que tais relações morrem tem caráter limitado, determinado naturalmente, e por isso aparece como pessoal, enquanto no mundo moderno as relações pessoais emergem como simples emanação das relações de produção e de troca.)
O produto devém mercadoria. A mercadoria devém valor de troca. O valor de troca da mercadoria adquire uma existência particular ao lado da mercadoria; i.e., a mercadoria, na forma em que: 1) é permutável por todas as outras mercadorias; 2) por conseguinte, é mercadoria universal e sua particularidade natural é apagada; 3) a medida de sua permutabilidade é posta, a relação determinada pela qual se equipara a todas as outras mercadorias é a mercadoria como dinheiro, na verdade, não como dinheiro em geral, mas como uma determinada soma de dinheiro, pois, para representar o valor de troca em todas as suas diferenças, o dinheiro deve ser contável, deve ser quantitativamente divisível.
O dinheiro, a forma comum na qual se transformam todas as mercadorias como valores de troca, a mercadoria universal, tem ele próprio de existir como mercadoria particular ao lado das outras, uma vez que as mercadorias são medidas não só mentalmente, mas têm de ser trocadas por e convertidas em dinheiro na troca efetiva. Desenvolver em outra parte a contradição daí resultante. O dinheiro não nasce por convenção, como tampouco sucede com o Estado. Nasce da troca e na troca, espontânea e naturalmente, é um produto dela. Originalmente, servirá como dinheiro a mercadoria – i.e., será permutada não como objeto da necessidade e do consumo, mas para ser trocada outra vez por outras mercadorias – que mais é trocada como objeto de necessidade, que mais circula; logo, a mercadoria que com máxima segurança pode ser trocada de novo por outras mercadorias particulares; que, portanto, na organização social dada representa a riqueza katH Êxocan[45], que é objeto da oferta e demanda mais gerais, e que possui um valor de uso particular. Assim, sal, peles, gado, escravos. Na verdade, uma tal mercadoria, em sua configuração particular como mercadoria, corresponde mais a si mesma (pena que em alemão não se pode exprimir adequadamente a diferença entre denrée [gêneros] e marchandise [mercadoria]) como valor de troca do que as outras mercadorias. A utilidade particular da mercadoria, seja como objeto particular de consumo (peles), seja como instrumento imediato de produção (escravo), qualifica-a aqui como dinheiro. No curso do desenvolvimento acontecerá exatamente o inverso, i.e., a mercadoria que menos é objeto imediato de consumo ou instrumento de produção melhor representará o aspecto de que serve à necessidade da troca enquanto tal. No primeiro caso, a mercadoria devém dinheiro em virtude de seu valor de uso particular; no segundo, adquire seu valor de uso particular porque serve como dinheiro. Durabilidade, inalterabilidade, divisibilidade e reconvertibilidade, transporte relativamente fácil por conter elevado valor de troca em pequeno espaço, tudo isso torna os metais preciosos particularmente apropriados para o último estágio. Constituem, ao mesmo tempo, a transição natural a partir da primeira forma do dinheiro. Em uma fase algo mais elevada da produção e da troca, o instrumento de produção tem prioridade sobre os produtos; mas os metais (primeiro pedras) são os primeiros instrumentos de produção e os mais indispensáveis. No cobre, que cumpriu um papel tão importante no dinheiro dos antigos, ainda se encontram reunidos os dois aspectos, o valor de uso particular como instrumento de produção e as outras qualidades, que não derivam do valor de uso da mercadoria, mas correspondem à sua determinação como valor de troca (em que se inclui a de meio de troca). Em seguida, os metais preciosos se separam por sua vez dos outros metais pelo fato de que não são oxidáveis etc., têm qualidade uniforme etc. e, nesse caso, correspondem melhor à fase mais elevada, porquanto a sua utilidade imediata para consumo e produção declinou, mas, em virtude de sua raridade, representam melhor o valor fundado puramente na troca. Desde o início, representam o supérfluo, a forma sob a qual a riqueza originalmente aparece. Além disso, metais são mais trocados por metais do que por outras mercadorias.
A primeira forma do dinheiro corresponde a uma fase pouco desenvolvida da troca e do escambo, onde o dinheiro ainda se distingue mais em sua determinação como medida do que como instrumento de troca efetivo. Nesse estágio, a medida ainda pode ser puramente imaginária (entretanto, a barrai dos negros implica o ferro)[46] (mas conchas etc. correspondem mais à série cujo ponto culminante é o ouro e a prata).
Do fato de que a mercadoria devém valor de troca universal resulta que o valor de troca devém uma mercadoria particular: pode fazê-lo só porque uma mercadoria particular adquire o privilégio, perante todas as demais, de representar, de simbolizar o seu valor de troca, i.e., de devir dinheiro. Que a propriedade de dinheiro de todas as mercadorias se apresenta como uma mercadoria particular na qualidade de sujeito-dinheiro – isso resulta da própria essência do valor de troca. No curso do desenvolvimento, o valor de troca do dinheiro pode adquirir de novo uma existência separada de sua matéria, de sua substância, como ocorre no papel moeda, sem suprimir, entretanto, o privilégio dessa mercadoria particular, porquanto a existência particularizada tem de continuar recebendo sua denominação da mercadoria particular.
Como a mercadoria é valor de troca, ela é permutável por dinheiro, posta = o dinheiro. A relação em que é equiparada ao dinheiro, ou seja, a determinabilidade de seu valor de troca, é pressuposta à sua conversão em dinheiro. A relação em que a mercadoria particular é trocada por dinheiro, i.e., o quantum de dinheiro em que um quantum determinado de mercadoria é convertível, é determinada pelo tempo de trabalho objetivado na mercadoria. Como efetivação de um tempo de trabalho determinado, a mercadoria é valor de troca; no dinheiro, a cota de tempo de trabalho que ela representa está contida, assim como medida, em sua forma permutável universal, adequada ao seu conceito. O dinheiro é o meio coisal no qual os valores de troca, imersos, adquirem uma configuração correspondente à sua determinação universal. Adam Smith diz que o trabalho (tempo de trabalho) é o dinheiro original com o qual todas as mercadorias são compradas[47]. Considerando o ato da produção, tal afirmação continua correta (da mesma maneira que em relação à determinação dos valores relativos). Na produção, toda mercadoria é trocada continuamente por tempo de trabalho. A necessidade de um dinheiro distinto do tempo de trabalho surge precisamente do fato de que a quantidade de tempo de trabalho não deve ser expressa no seu produto imediato e particular, mas em um produto mediado e universal, em seu produto particular como produto igual e convertível em todos os demais produtos de mesmo tempo de trabalho; o tempo de trabalho contido não em uma mercadoria, mas em todas as mercadorias ao mesmo tempo e, por isso, em uma mercadoria particular que representa todas as outras. O próprio tempo de trabalho não pode ser imediatamente o dinheiro (uma exigência que, em outras palavras, equivale a requerer que toda mercadoria seja imediatamente seu próprio dinheiro), justamente porque, na prática, o tempo de trabalho só existe em produtos particulares (como objeto): como objeto universal, o tempo de trabalho só pode existir de forma simbólica e, por sua vez, precisamente em uma mercadoria particular que é posta como dinheiro. O tempo de trabalho não existe como objeto universal da troca, independente e separado (dissociado) das particularidades naturais das mercadorias. Teria de existir deste modo para cumprir imediatamente as condições do dinheiro. A objetivação do caráter universal, social do trabalho (e, por conseguinte, do tempo de trabalho contido no valor de troca) faz justamente de seu produto um valor de troca; confere à mercadoria a propriedade do dinheiro, que, entretanto, implica por sua vez um sujeito-dinheiro autônomo existente fora dela.
O tempo de trabalho determinado é objetivado em uma mercadoria determinada, particular, de qualidades particulares e particulares relações com as necessidades; mas, como valor de troca, o tempo de trabalho deve estar objetivado em uma mercadoria que expressa somente sua quotidade ou quantidade, que é indiferente às suas propriedades naturais e, por isso, pode ser metamorfoseada, i.e., trocada em qualquer outra mercadoria que objetive o mesmo tempo de trabalho. Como objeto, deve possuir esse caráter universal que contradiz sua particularidade natural. Essa contradição só pode ser resolvida na medida em que ela própria é objetivada; i.e., na medida em que a mercadoria é posta duplamente, uma vez em sua forma natural imediata, depois em sua forma mediada, como dinheiro. Essa última operação só é possível porque uma mercadoria particular devém, por assim dizer, a substância universal dos valores de troca, ou porque o valor de troca das mercadorias é identificado a uma substância particular, a uma mercadoria particular distinta de todas as demais. I.e., porque a mercadoria tem de ser trocada primeiro por essa mercadoria universal, pelo produto ou pela objetivação universal simbólica do tempo de trabalho, para ser em seguida, como valor de troca, permutável à vontade e indiferenciadamente por todas as outras mercadorias, para nelas ser metamorfoseável. O dinheiro é o tempo de trabalho como objeto universal, ou a objetivação do tempo de trabalho universal, o tempo de trabalho como mercadoria universal. Se parece muito simples, por essa razão, que o tempo de trabalho, porque regula os valores de troca, é de fato não só sua medida inerente, mas sua própria substância (pois, como valores de troca, as mercadorias não possuem qualquer outra substância, nenhuma qualidade natural), e que pode também servir diretamente como seu dinheiro, i.e., suprir o elemento no qual os valores de troca se realizam enquanto tais, essa aparência de simplicidade ilude. Pelo contrário, a relação dos valores de troca – das mercadorias como objetivações reciprocamente iguais e equiparáveis do tempo de trabalho – inclui contradições que adquirem sua expressão coisal em um dinheiro diferente do tempo de trabalho.
Em Adam Smith, essa contradição ainda aparece como uma justaposição. O trabalhador tem de produzir, ao lado do produto particular do trabalho (do tempo de trabalho como objeto particular), um quantum da mercadoria universal (o tempo de trabalho como objeto universal). As duas determinações do valor de troca aparecem, para ele, uma ao lado da outra, externas[48]. O interior da mercadoria como um todo ainda não aparece capturado e penetrado pela contradição. Isso corresponde ao estágio da produção que tinha diante de si, onde o trabalhador ainda tinha diretamente em seu produto uma parte de sua subsistência; nem sua atividade como um todo nem seu produto como um todo tinham se tornado dependentes da troca; i.e., em grande medida, ainda predominava a agricultura de subsistência (ou algo similar, como Steuart a denomina[49]) e, da mesma maneira, a indústria patriarcal (tecelagem manual, fiação doméstica e associada à agricultura). Só o excedente era trocado em uma grande esfera da nação. Valor de troca e determinação pelo tempo de trabalho ainda não [estavam] plenamente desenvolvidos no plano nacional.
(Incidentali: é menos verdadeiro para o ouro e a prata do que para qualquer outra mercadoria que seu consumo só pode crescer na proporção da diminuição de seus custos de produção. Ao contrário, seu consumo cresce à proporção que cresce a riqueza universal, uma vez que seu uso representa especificamente a riqueza, a abundância, o luxo, porque eles próprios representam a riqueza universal. Prescindindo de seu uso como dinheiro, o ouro e a prata serão mais consumidos em proporção ao crescimento da riqueza universal. Por essa razão, se sua oferta aumenta subitamente, mesmo sem que os custos de produção ou seu valor decresçam proporcionalmente, eles encontram um mercado em rápida expansão que detém sua depreciação. Explica-se, assim, muito daquilo que para os economistas – que, de modo geral, fazem o consumo de ouro e de prata depender exclusivamente da redução de seus custos de produção – é inexplicável no caso australiano-californiano, e no qual se movem em círculos. Isso está exatamente conectado com o fato de que esses metais representam a riqueza, logo, com sua qualidade como dinheiro.)
(A oposição entre o ouro e a prata como a mercadoria eternai e todas as outras mercadorias, que encontramos em Petty[50], já estava presente em Xenofonte, de Vectigal, c.1, referida ao mármore e à prata. o2 mónon dè krateî toîv ÊpH Êniautòn qállousí te kaì gjráskousin, Ãllà laì Ãídia Ãgaqà Ëcei d cJra. péfuke mèn gàr líqov Ên a2to Âfqonov etc. (a saber, o mármore) [...] Ësti dè kaì gc f speiroménj mèn o2 férei karpón, Óruttoménj dè pollaplasíouv tréfei v eÏ aîton Ëfere [51]) (Vale notar que a troca entre diferentes tribos ou povos – e esta é a primeira forma da troca, e não a troca privada – só começa quando o excedente de uma tribo incivilizada é comprado (defraudado), excedente que não é produto de seu trabalho, mas produto natural do solo e da natureza que ela ocupa.)
(Desenvolver as contradições econômicas ordinárias que resultam do fato de que o dinheiro tem de ser simbolizado em uma mercadoria determinada, que ele é, nesse caso, essa própria mercadoria (ouro etc.). Esse é o nº II. Em seguida, determinar a relação entre quantidade de ouro ou prata e os preços das mercadorias, uma vez que todas as mercadorias têm de ser trocadas por dinheiro para ser determinadas como preço, pouco importando se essa troca ocorre de maneira efetiva ou só na cabeça. Esse é o nº III. E claro que, meramente medidas em ouro ou prata, a sua quantidade não exerce qualquer influência sobre o preço das mercadorias; a dificuldade se introduz na troca efetiva, na medida em que o dinheiro serve efetivamente como instrumento de circulação; as relações entre oferta e demanda etc. Mas aquilo que afeta o valor do dinheiro como instrumento de circulação o afeta evidentemente como medida.)
O próprio tempo de trabalho enquanto tal existe apenas subjetivamente, apenas na forma da atividade. Na medida em que é permutável enquanto tal (é ele mesmo mercadoria), é tempo de trabalho determinado e diferente, não só quantitativa, mas também qualitativamente, e de forma alguma universal e idêntico a si mesmo; ao contrário, como sujeito, corresponde tão pouco ao tempo de trabalho universal que determina os valores de troca quanto lhe correspondem, como objeto, as mercadorias e produtos particulares.
A proposição de Adam Smith de que o trabalhador tem de produzir, ao lado de sua mercadoria particular, uma mercadoria universal[52], em outras palavras, que ele tem de dar a forma do dinheiro a uma parte de seus produtos, enfim, à sua mercadoria, dado que ela deve servir não como valor de uso para si mesmo, mas como valor de troca – nada mais significa, subjetivamente expresso, do que afirmar que seu tempo de trabalho particular não pode ser trocado imediatamente por qualquer outro tempo de trabalho particular, mas que essa sua permutabilidade universal deve ser primeiro mediada, que ele deve primeiro assumir uma forma objetiva distinta de si mesmo para obter esta permutabilidade universal.
Considerado no próprio ato da produção, o trabalho do indivíduo singular é o dinheiro com o qual ele compra imediatamente o produto, o objeto de sua atividade particular; mas é um dinheiro particular que só compra exatamente esse produto determinado. Para ser imediatamente o dinheiro universal, teria de ser, desde o início, não um trabalho particular, mas universal, i.e., ser posto desde o início como elemento da produção universal. Sob esse pressuposto, entretanto, a troca não lhe conferiria mais o caráter universal, mas seu caráter coletivo pressuposto determinaria a participação nos produtos. O caráter coletivo da produção faria do produto, desde o início, um produto coletivo, universal. A troca, que originalmente tem lugar na produção – que não seria uma troca de valores de troca, mas de atividades que seriam determinadas pelas necessidades coletivas, por fins coletivos –, incluiria, desde o início, a participação do indivíduo singular no mundo coletivo dos produtos. Sobre a base dos valores de troca, somente por meio da troca o trabalho é posto como trabalho universal. Sobre a base anterior, o trabalho seria posto como trabalho universal antes da troca; i.e., a troca dos produtos não seria de modo algum o meio pelo qual seria mediada a participação dos indivíduos singulares na produção universal. A mediação tem, naturalmente, de ocorrer. No primeiro caso, que parte da produção autônoma dos indivíduos singulares – por mais que essas produções autônomas se determinem e se modifiquem post festum[e] por suas relações recíprocas –, a mediação tem lugar por meio da troca das mercadorias, do valor de troca, do dinheiro, que são todos expressões de uma única e mesma relação. No segundo caso, o próprio pressuposto é mediado; i.e., está pressuposta uma produção coletiva, a coletividade como fundamento da produção. O trabalho do indivíduo singular está posto desde o início como trabalho social. Por conseguinte, qualquer que seja a configuração material do produto que ele cria ou ajuda a criar, o que compra com seu trabalho não é um produto determinado particular, mas uma cota determinada na produção coletiva. Por isso, não tem nenhum produto particular para trocar. Seu produto não é um valor de troca. O produto não tem de ser primeiro convertido em uma forma particular para adquirir um caráter universal para o indivíduo singular. Em lugar de uma divisão do trabalho que é necessariamente gerada na troca de valores de troca, teria lugar uma organização do trabalho que tem por consequência a participação do indivíduo singular no consumo coletivo. No primeiro caso, o caráter social da produção só é posto post festum, pela ascensão dos produtos a valores de troca e pela troca destes valores de troca. No segundo caso, o caráter social da produção está pressuposto e a participação no mundo dos produtos, no consumo, não é mediada pela troca de trabalhos ou de produtos do trabalho independentes uns dos outros. É mediada pelas condições sociais de produção no interior das quais o indivíduo exerce sua atividade. Portanto, querer transformar o trabalho do indivíduo singular imediatamente em dinheiro (i.e., também seu produto), em valor de troca realizado, significa determiná-lo imediatamente como trabalho universal, i.e., significa negar precisamente as condições sob as quais tem de ser transformado em dinheiro e em valores de troca, e nas quais depende da troca privada. Tal pretensão só pode ser satisfeita sob condições em que não pode mais ser posta. Sobre a base dos valores de troca, o trabalho pressupõe justamente que nem o trabalho do indivíduo singular nem seu produto sejam imediatamente universais; que o produto só consiga essa forma por uma mediação objetiva [gegenständlich], por um dinheiro distinto dele.
Pressuposta a produção coletiva, a determinação do tempo permanece naturalmente essencial. Quanto menos tempo a sociedade precisa para produzir trigo, gado etc., tanto mais tempo ganha para outras produções, materiais ou espirituais. Da mesma maneira que para um indivíduo singular, a universalidade de seu desenvolvimento, de seu prazer e de sua atividade depende da economia de tempo. Economia de tempo, a isso se reduz afinal toda economia. Da mesma forma, a sociedade tem de distribuir apropriadamente seu tempo para obter uma produção em conformidade com a totalidade de suas necessidades; do mesmo modo como para o indivíduo singular, tem de distribuir o seu tempo de forma correta para adquirir conhecimentos em proporções apropriadas ou para desempenhar suficientemente as variadas exigências de sua atividade. Economia de tempo, bem como distribuição planificada do tempo de trabalho entre os diferentes ramos de produção, continua sendo também a primeira lei econômica sobre a base da produção coletiva. Permanece lei até mesmo em grau muito mais elevado. Todavia, isto é essencialmente distinto da mensuração dos valores de troca (trabalhos ou produtos de trabalho) pelo tempo de trabalho. Os trabalhos dos indivíduos singulares em um mesmo ramo de trabalho e os diversos tipos de trabalho são diferentes não só quantitativamente, mas também qualitativamente. O que pressupõe a diferença puramente quantitativa das coisas? A uniformidade [Dieselbigkeit] de sua qualidade. Logo, a mensuração quantitativa dos trabalhos pressupõe a igualdade, a uniformidade [Dieselbigkeit] de sua qualidade.
(Estrabão, livro XI. Sobre os albanos do Cáucaso: Kaì oïÂnqrwpoi kállei kaì megéqei diaférontev, äploî dè kaì o2 kapjlikoí. o2dè gàr nomísmati tà pollà crJntai, ondè Ãriqmòn Ìsasi meízw tJn ékatón, Ãllà fortíoiv tàv Ãmoibàv poioûntai. Ainda se lê na mesma passagem: Âpeiroi dè eÏsì kaì métrwn tJn Ãkribèv kaì staqmHn.[53])
O dinheiro aparecendo como medida (por isso, por exemplo, os bois em Homero) mais cedo do que como meio de troca, porque, no escambo, cada mercadoria é ainda seu próprio meio de troca. Mas ela não pode ser sua medida ou seu próprio padrãoi de comparação.
[2) Do que foi desenvolvido até aqui, conclui-se: um produto particular (mercadoria) (material) tem de devir o sujeito do dinheiro, que existe como propriedade de todo valor de troca. O sujeito em que esse símbolo é representado não é indiferente, uma vez que as exigências para representante estão contidas nas condições – determinações conceituais, relações determinadas – do representado. A investigação sobre os metais preciosos como os sujeitos da relação de dinheiro, como suas encarnações, não está fora do âmbito da economia política, como crê Proudhon, da mesma maneira que a natureza física das cores e do mármore não está fora do âmbito da pintura e da escultura. As propriedades que tem a mercadoria como valor de troca, e em relação às quais suas qualidades naturais não são adequadas, expressam as exigências feitas às mercadorias que são o material do dinheiro katH Êxocan[54]. Essas exigências, apenas no nível de que podemos falar até aqui, realizam-se plenamente nos metais preciosos. Os metais em si mesmos, como instrumentos de produção, [têm] preferência sobre as demais mercadorias, e, dentre os metais, o que é primeiro descoberto em sua pureza e perfeição físicas – o ouro; depois o cobre, depois prata e ferro. Como diria Hegel, os metais preciosos, por sua vez, realizam o metal com vantagem em relação aos outros.
|Os metais preciosos [são] uniformes em suas qualidades físicas, de maneira que quantidades iguais deles deveriam ser idênticas, de modo a não oferecer motivo para se preferir uns em lugar de outrosi. O que não vale, por exemplo, |para igual número de gado e quantidades iguais de grãosi[55].
Os metais não preciosos se oxidam com o ar; os preciosos (mercúrio, prata, ouro, platina) são inalteráveis pelo ar.
Aurum[f] (Au). Densidade = 19,5 [g/cm3]; ponto de fusão = 1.200 oC. “Dentre todos os metais o ouro brilhante é o mais magnificente e, por isso, já era chamado pelos antigos de o sol ou o rei dos metais. Consideravelmente difundido, jamais em grandes quantidades, é por isso mais valioso do que os outros metais. Em geral, encontra-se em estado puro, parte em grandes pedaços, parte em pequenos grãos incrustados em outros minerais. Da erosão desses últimos forma-se a areia aurífera carregada por muitos rios, e da qual o ouro pode ser extraído por lavagem devido à sua grande densidade. Extraordinária ductilidade do ouro: um grão[g] pode ser estendido em um fio de até 500 pés e prensado em pequenas folhas com espessura de quase 1/200.000 [polegada]. O ouro não é atacado por nenhum ácido, só pode ser dissolvido por cloro em estado livre (água régia, um composto de ácido nítrico e ácido clorídrico). Dourar”[56].
Argentum[h] (Ag). Densidade = 10 [g/cm3]; ponto de fusão = 1.000 oC. Aparência muito clara; o mais amigável de todos os metais, muito alvo e dúctil; pode ser lindamente trabalhado e estirado em fios muito finos. A prata é encontrada em estado puro; muito frequentemente, em liga com o chumbo em minérios de chumbo argentífero.
Até aqui, as propriedades químicas do ouro e da prata. (A divisibilidade e a possibilidade de recomposição, a uniformidade do ouro e da prata puros etc. são conhecidas.) Mineralógicas:
Ouro. É decerto curioso que os metais, quanto mais preciosos são, tanto mais aparecem isolados e separados dos corpos em que habitualmente ocorrem, naturezas superiores distanciadas das ordinárias. Desse modo, em geral encontramos o ouro em estado puro, cristalino, em diferentes formatos cúbicos ou nas mais variadas formas: fragmentos e pepitas irregulares, areia e pó, nos quais o ouro aparece incrustado em muitas rochas, p. ex., o granito, e por cuja desagregação é encontrado nas areias dos rios e nos depósitos dos solos aluviais. Como a densidade do ouro nesse estado chega a 19,4 [g/cm3], até mesmo as mais finas partículas de ouro podem ser extraídas revolvendo a areia aurífera na água. Com isso, o metal de maior densidade específica deposita-se primeiro e é em seguida lavado, como se diz. Muito frequentemente a prata acompanha o ouro, e se encontram ligas naturais de ambos, que contêm de 0,16% até 38,7% de prata, o que acarreta, naturalmente, diferença em cor e densidade.
Prata. Na considerável variedade de seus minerais, aparece como um dos metais mais abundantes, tanto em estado puro como em liga com outros metais ou combinado ao arsênico e ao enxofre. (Cloreto de prata, brometo de prata, carbonato de prata, liga de prata e bismuto, sternbergita, sternbergita, polibasita etc.)
As principais propriedades químicas são: [de] todos os metais preciosos: inoxidabilidade ao ar; do ouro (e da platina): indissolubilidade pelos ácidos, mas o primeiro só pelo cloro. O fato de serem inoxidáveis ao ar os conserva puros, livres de ferrugem; apresentam-se tal como são. Resistência à dissolução pelo oxigênio – imperecibilidade (altamente louvada pelos antigos entusiastas do ouro e da prata).
Propriedades físicas: peso específico, isto é, muito peso em espaço reduzido; particularmente importante para o instrumento de circulação. Ouro, 19,5 [g/cm3]; prata, 10 [g/cm3]. Brilho colorido. Brilho do ouro, brancura da prata, magnificência, ductibilidade; por isso, tão apropriados no adorno e realce de outros objetos. A cor branca da prata (que reflete todos os raios de luz em sua composição original); o amarelo-rubro do ouro (que absorve todos os raios de luz de um feixe colorido incidente sobre ele e reflete só o vermelho). Difícil fusibilidade.
Propriedades geognósticas: a ocorrência em estado puro (especialmente para o ouro), separado de outros corpos; isolado, individualizado. Ocorrência individual, autônoma em relação ao elementar.
Dos dois outros metais preciosos: 1) Platina, incolor; cinza sobre cinza (fuligem dos metais); muito rara; desconhecida pelos antigos; conhecida só depois da descoberta da América; no século XIX, descoberta também nos Urais; atacada apenas pelo cloro; sempre em estado puro; peso específico = 21 [g/cm3]; infusível nas temperaturas mais elevadas; de valor mais científico. 2) Mercúrio: apresenta-se em estado líquido; volatilizável; vapores tóxicos; pode entrar em combinações líquidas (amálgamas). (Densidade = 13,5 [g/cm3]; ponto de ebulição = 360 oC.) Portanto, nem a platina nem o mercúrio servem como dinheiro.
Uma das propriedades geognósticas comum a todos os metais preciosos: raridade. A raridade é (abstraindo a oferta e a demanda) elemento do valor somente na medida em que o não raro em si e para si, a negação da raridade, o elementar, não tem valor porque não aparece como resultado da produção. Na determinação original do valor, era mais valioso aquilo que era mais independente da produção consciente e voluntária, pressuposta a demanda. Cascalhos não têm nenhum valor, |relativamente falandof, porque são encontrados sem produção (consista esta última tão somente em procurar). Para que algo constitua o objeto da troca, tenha valor de troca, ninguém deve poder tê-lo sem a mediação da troca; é preciso que ele não se apresente em tal forma elementar de bem comum. Nesse sentido, a raridade é elemento do valor de troca e, por essa razão, essa propriedade dos metais preciosos é importante, mesmo abstraindo de uma relação mais precisa da demanda e da oferta.
Quando se considera a vantagem dos metais como instrumentos de produção, pesa em favor do ouro o fato de que, |no fundof, é o primeiro metal a ser descoberto enquanto metal. E isso por uma dupla razão. Primeiro, porque, dentre todos, é o que se apresenta na natureza sob a forma mais metálica, como metal distinto e distinguível; segundo, porque em sua preparação a natureza assumiu o trabalho da arte, e para a sua primeira descoberta só foi necessário |trabalho braçali, nem ciência nem instrumentos de produção desenvolvidos.
“|É certo que o ouro tem de assumir o seu lugar como o primeiro metal conhecido, e no primeiro registro do progresso do homem ele é indicado como uma medida da posição do homemi”[57] (porque, como supérfluo, é forma sob a qual a riqueza primeiro aparece. A primeira forma do valor é o valor de uso, o cotidiano, que exprime a relação do indivíduo com a natureza; a segunda, o valor de troca ao lado[i] do valor de uso, seu comando sobre os valores de uso de outros, sua relação social: mesmo originalmente, valor de dias festivos, de uso que ultrapassa as necessidades básicas imediatas).
|Descoberta muito antiga do ouro pelo homemi:
|O ouro difere consideravelmente dos outros metais, com muito poucas exceções, pelo fato de que é encontrado na natureza em seu estado metálico. Ferro e cobre, estanho, chumbo e prata são normalmente descobertos em combinações com oxigênio, enxofre, arsênico ou carbono; e as poucas ocorrências excepcionais desses metais em um estado não combinado ou, como era denominado anteriormente, em estado virgem, devem ser citadas antes como curiosidades mineralógicas do que como produções comuns. O ouro, entretanto, é sempre descoberto em estado natural ou metálico [...] Em consequência, como uma massa metálica, curiosa por sua cor amarela, atrairia o olhar do homem menos cultivado, enquanto as outras substâncias certamente existentes em seu caminho não ofereceriam qualquer atrativo para seus poderes de observação pouco despertos. O ouro, além disso, devido à circunstância de ter sido formado naquelas rochas que são mais expostas à ação atmosférica, é encontrado nos fragmentosf de rocha das montanhas. Pelas influências desintegradoras da atmosfera, das mudanças de temperatura, da ação da água e, particularmente, dos efeitos do gelo, fragmentos de rocha são continuamente desprendidos. Esses fragmentos são carregados aos vales pelas inundações e são polidos em seixos pela ação constante da água corrente. Entre tais fragmentos, são descobertas pepitas ou partículas de ouro. Os calores estivais, ao secar as águas, transformavam aqueles leitos que tinham constituído os rios e os cursos das tormentas de inverno em rotas para as jornadas do homem migratório; e aqui podemos imaginar a primitiva descoberta do ouroi.[58]
|Na maioria das vezes, o ouro ocorre puro ou de todo modo tão próximo desse estado que sua natureza metálica pode ser prontamente reconhecidai, tanto em rios como em |veios de quartzoi[59].
|O peso específico do quartzo e da maioria de outras rochas pesadas e compactas é de 2 1/2 [g/cm3], enquanto o peso específico do ouro é de 18 [g/cm3] ou 19 [g/cm3]. O ouro, portanto, é cerca de sete vezes mais pesado do que qualquer rocha ou pedra com a qual costuma estar associado. Desse modo, uma corrente de água com força suficiente para carregar areia ou partículas de quartzo ou de qualquer outra rocha pode não ser capaz de mover os fragmentos de ouro com elas associados. A água corrente, por conseguinte, fez no passado com as rochas auríferas exatamente o mesmo que hoje faria o minerador, a saber, quebrá-las em fragmentos, remover as partículas mais leves e deixar ficar o ouro. Os rios são, de fato, grandes bateias naturais, removendo ao mesmo tempo todas as partículas mais leves e finas, enquanto as mais pesadas se acumulam em obstáculos naturais ou são deixadas onde a corrente diminui sua força ou velocidadei. (Vide Gold (Lectures on))[60].
|Com toda probabilidade, segundo a tradição e a pré-história, a descoberta do ouro na areia e no cascalho dos cursos d’água parece ter sido o primeiro passo na identificação dos metais, e em quase todos, talvez em todos os países da Europa, África e Ásia, quantidades maiores ou menores de ouro desde muito cedo foram extraídas por lavagem dos depósitos auríferos com dispositivos muito simples. Ocasionalmente, o sucesso de rios auríferos era grande o suficiente para produzir uma excitação que vibrava por algum tempo em um distrito, mas logo se acalmava. Em 760, as pessoas pobres afluíram em grande número para lavar ouro nas areias fluviais ao sul de Praga, e três homens eram capazes de extrair um marco (½ lb) de ouro por dia; e tão grande foi a consequente corrida às “minas” que, no ano seguinte, o país foi visitado pela fome. Podemos ler sobre a recorrência de eventos similares várias vezes ao longo dos próximos séculos, muito embora aqui, como em toda parte, a atração geral pelas riquezas disseminadas na superfície decresce e se converte em mineração regular e sistemáticai[61].
|Duas espécies de jazimentos nos quais o ouro é descoberto, os filões ou veios, que cortam a rocha sólida em uma direção mais ou menos perpendicular ao horizonte; e os depósitos aluviais ou “correntes” em que o ouro, misturado com cascalho, areia ou argila, foi depositado pela ação mecânica da água sobre a superfície daquelas rochas penetradas pelos filões em profundidades desconhecidas. À primeira espécie corresponde mais especificamente a arte da mineração; à segunda, as simples operações da escavação[62]. Como qualquer outra mineração, a mineração de ouro propriamente dita é uma arte que requer o emprego de capital e uma habilidade só adquirida com anos de experiência. Não há outra arte praticada por homens civilizados que exija, para seu pleno desenvolvimento, a aplicação de tantas ciências e artes conexas. Qualquer uma delas, no entanto, a despeito de serem essenciais para o minerador, são escassamente necessárias ao lavador de ouro ou garimpeiro, que deve contar principalmente com a força de seu braço ou a resistência de sua saúde. O aparato que emprega deve ser necessariamente simples, para que possa ser levado de um lugar para outro, para ser facilmente consertado em caso de defeito e para não exigir qualquer sutileza de manuseio que faria o garimpeiro perder tempo para obter pequenas quantidadesi[63].
Diferença |entre os depósitos aluviais de ouro, melhor exemplificados hoje em dia na Sibéria, na Califórnia e na Austrália; e as areias finas carregadas anualmente por rios, algumas das quais revelam conter ouro em quantidades utilizáveis. Estas últimas, é claro, são encontradas literalmente na superfície, e os primeiros podem ser encontrados sob uma cobertura de 1 a 70 pés de espessura, consistindo de terra, turfa, areia, cascalho etc. Em princípio, o modo de trabalho nos dois casos deve ser idênticoi[64].
|Nas jazidas aluviais, a natureza demoliu as partes mais elevadas, proeminentes e ricas dos filões, e triturou e lavou de tal modo os materiais que o garimpeiro já encontra feita a parte mais pesada do trabalho; enquanto o mineiro, que ataca os filões mais pobres e profundos, embora mais duráveis, deve se munir de todos os recursos das técnicas mais refinadasi[65].
|O ouro foi, com justiça, considerado o mais nobre dos metais por suas várias propriedades físicas e químicas. É inalterável ao ar e não enferrujai[66]. (A inalterabilidade é precisamente a resistência ao oxigênio da atmosfera.) |De cor amarelo-avermelhada brilhante quando em estado de coesão, e muito denso. Altamente maleável. A sua fusão requer uma forte temperatura. Peso específicoi[67].
Por conseguinte, três tipos de produção de ouro: 1) Na areia dos rios. Simples achar na superfície. Lavagem. 2) Nos leitosi aluviais. Escavaçãoi. 3) Mineraçãoi. A sua produção não requer, portanto, nenhum desenvolvimento das forças produtivas. Em sua produção, a natureza faz a maior parte do trabalho.
(Os radicais das palavras para ouro, prata etc. (vide Grimm); é fácil perceber que nada mais há aqui do que noções gerais do brilho, da cor, logo transmitidas às palavras. Prata branca, ouro amarelo… bronze e ouro, bronze e ferro trocam seus nomes. Entre os alemães, o bronze [é] usado mais cedo do que o ferro. Afinidade imediata entre aes e aurum[j].[68])
Cobre (latão, bronze: estanho e cobre) e ouro usados antes da prata e do ferro.
“O ouro é usado muito antes da prata, porque é encontrado em estado puro e em liga com um pouco de prata; obtido por lavagemf simples. A prata existe, em geral, |em filões incrustados nas rochas mais duras dos terrenos primitivos; para sua extração, exige máquinas e trabalhos complicados. |Na América meridionalf, o |ouro em filõesf não é explorado, mas o |ouro disseminado em pó e em grãos nos terrenos aluviaisf. Exatamente igual ao tempo de Heródoto. Os mais antigos monumentos da Grécia, da Ásia, do norte da Europa e do Novo Mundo demonstram que o uso do ouro |em utensílios e joiasf era possível em estado semibárbaro; e o empregof da prataf para o mesmo uso |denota por si mesmo um estado social muito avançadof.”[69] Cf. Dureau de La Malle, Caderno. (2.)[70]
Cobre como principal instrumento da guerra e da paz[71] (como dinheiro na Itália)[72].
Quando se trata de fato de examinar o uso dos metais como corpo do dinheiro, seu uso relativo recíproco, seu aparecimento mais remoto ou mais tardio, [é] preciso examinar simultaneamente as flutuações em seu valor relativo. (Letronne, Böckh, Jacob.)[73] (O quanto essa questão está de fato relacionada com a massa de metais em circulação e sua relação com os preços [deve] ser considerado posteriormente, como apêndice histórico ao capítulo sobre a relação do dinheiro com os preços.)
A |mudança sucessivaf entre ouro, prata e cobre nas diferentes épocas devia depender antes de tudo da |natureza das jazidas desses três metais e do estado mais ou menos puro em que eram encontradosf. Além disso, mudançasf políticas, |tais como a invasão da Ásia e de uma parte da África pelos persas e pelos macedônios, e, mais tarde, a conquista pelos romanos de parte dos três continentesf (orbis Romanus etc.). Logo, depende do estado de pureza relativo em que se encontram e de sua localização[74].
A relação de valor entre os diferentes metais pode ser determinada sem referência aos preços – pela simples relação quantitativa pela qual são trocados uns pelos outros. De modo geral, podemos proceder dessa forma quando comparamos poucas mercadorias com [uma] medida homônima; p. ex., tantos quarters de centeio, de cevada, de aveia por tantos quarters de trigo. Esse método é aplicado no escambo, em que ainda pouca coisa é trocada e ainda são poucas as mercadorias que ingressam no intercâmbio, e, por isso, ainda não é necessário nenhum dinheiro.
De acordo com Estrabão, entre os árabes vizinhos dos sabeus o ouro nativof era tão abundantef que 10 libras de ouro eram trocadas por 1 libra de ferro, e 2 libras por 1 libra de prata[75]. A riqueza em ouro dos |solos da Báctriaf (Bocara etc., em síntese, Turquestão) e de partes da Ásia situadasi entre o Paropamiso (Hindu Kush) e o Imaus (montanhasi de Mustagh), portanto, o Desertum arenosum auro abondans[76] (deserto de Gobii): por essa razão, segundo Dureau de La Malle, é provável que do século XV ao VI antes da era cristã a relaçãof do ouro com a prata = 6:1 ou 8:1, |relação que existiu na China e no Japãof até o começof do século XIX; Heródoto fixa a relação em 13:1 para os persas sob Dario Histaspes. De acordo com o códigof de Mani, escrito entre 1300 e 600 a.C., |ouro em relação à prataf = 1:2½.[77]. |As minas de prata raramente se encontram de fato, senão nos terrenos primitivos, sobretudo nos terrenos estratificados e em alguns filões de terrenos secundários. As gangas de prata, em lugar de serem areias aluviais, consistem ordinariamente de rochas mais compactas e mais duras, tais como o quartzo etc.[78] Esse metal é mais comum nas regiões frias, seja por sua latitude, seja por sua elevação absoluta, do que o ouro, que em geral se encontra em países quentes. Ao contrário do ouro, a prata se encontra muito raramente em estado puro etc.f (em geral combinada ao arsênico ou ao enxofre) (ácido muriático, nitrato de potássio)[79]. No que diz respeito à disseminação quantitativa de ambos os metais (antes do descobrimento da Austrália e da Califórnia): Humboldt, em 1811, estima a relação do ouro com a prata na América = 1:46, na Europa (incluída a Rússia asiática) = 1:40. Na atualidade (1842)[80], os mineralogistas da |Academia de Ciênciasf estimam em 1:52; não obstante, |uma libra de ouro vale somente 15 libras de prataf; portanto, a relação de valor = 15:1[81].
Cobre. Densidade = 8,9 [g/cm3]. Bela cor arrebol; dureza considerável; requer temperaturas muito elevadas para a fusão. Não raramente encontrado em estado puro; muitas vezes combinado ao oxigênio ou ao enxofre. Tem |por jazimentof os |terrenos primários antigosf. No entanto, também é frequentemente encontrado, mais do que os outros minerais, na superfície da terra, |ora em pequenas profundidades, aglomerado em massas puras, ora de considerável pesof. Empregadof antes do ferrof na guerra e na paz[82]. (Ao longo do desenvolvimento histórico, o ouro se comporta com a prata como material de dinheiro, do mesmo modo que o cobre se comporta com o ferro como instrumento de trabalho.) Circula em grande quantidade na Itália dominada pelos romanos, do século I ao V[83]. Pode-se |determinar a priori o grau de civilização de um povo tão somente pelo conhecimento da espécie de metal, ouro, cobre, prata ou ferro, que emprega para suas armas, seus utensílios ou seus ornamentosf[84]. Hesíodo em seu poema sobre a agricultura: CalkV dH eÏrgázovto. mélaz dH o2k Ëske sídjrov[85].
Lucrécio: Et prior aeris erat quam ferri cognitus usus[86]. Jacob menciona minas de cobre antiquíssimas na Núbia e na Sibéria (vide Dureau I, 58)[87]; Heródoto diz que os masságetas só tinham bronze, não o ferrof. O ferro, de acordo com os |Mármores de Oxfordf, era desconhecido antes de 1431 a.C. Em Homero, raro o ferro; por outro lado, |emprego muito comumf do bronzef (cobre, bronze), essa ligaf de cobre, zinco e estanho, |do qual as sociedades grega e romana se serviram por tão longo tempo, até mesmo para a fabricação de machados e facasf[88]. A Itália [era] muito rica em cobre nativo; por isso, a moeda de cobre constituiuf, até 247 a.C., |senão o único numerário, pelo menos a moeda normal, a unidade monetária na Itália centralf[89]. As colônias gregas no sul da Itália receberam diretamente da Grécia e da Ásia, ou através de Tiro e Cartago, a prata da qual fizeram dinheiro desde os séculos V e VI[90]. Os romanos, ao que parece, possuíam dinheiro de prata antes da expulsão dos reis, mas, diz Plínio, interdictum id vetere consulto patrum, Italiae parci (i.e., de suas minas de prata) jubentium[91]. Os romanos temiam as consequências de um meio de circulação fácil – luxo, aumento de escravos, acumulação e concentração da propriedade fundiária[92]. Também entre os etruscos, o cobre [foi] anterior ao ouro para o dinheiro.
É falso, quando Garnier afirma (vide Caderno III, p. 22): “É naturalmente no reino mineral que se procura e escolhe a |matéria destinada à acumulaçãof”[93]. Pelo contrário, a acumulação começou depois que o dinheiro de metal foi descoberto (seja como dinheiro propriamente ou só ainda como meio de troca preferido por peso). Sobre esse ponto, fazer referência em particular ao ouro. Reitemeier está certo (vide Caderno III, p. 34): “Ouro, prata e cobre, a despeito de sua relativa fragilidade, foram primeiro usados pelos povos antigos como instrumentos para cinzelar e partir, antes do ferro e antes de seu uso como dinheiro”[94]. (Aperfeiçoamento dos instrumentos quando se aprendeu a dar ao cobre, mediante a têmpera, uma dureza que apresentava resistência à rocha sólida. De um cobre muito endurecido se faziam os cinzéis e martelos dos quais se serviram para vencer a rocha. Finalmente, descoberto o ferro.[95]) Diz Jacob:
No estado patriarcal” (vide Caderno IV, p. 3), “onde os metais dos quais eram feitas as armas, tais como 1) latãoi e 2) ferroi, eram raros e extremamente caros comparados com os |alimentos comuns e roupas então usadasi, muito embora não fosse conhecido nenhum |dinheiro cunhado de metais preciososi, |ainda assim o ouro e a prata haviam adquirido a faculdadei de ser trocados mais fácil e convenientemente pelos outros metais do que |cereal e gadoi.[96]
|Aliás, para obter ouro puro ou quase puro nos imensos terrenos aluviais situados entre as cadeias do Hindu-Kush e do Himalaia bastava uma simples lavagemf. Naquele tempo, a populaçãof nessas |regiões da Ásiaf era abundantef, e, em consequência, |mão de obra muito barataf. A prata, em virtude da dificuldade (técnica) de sua exploração, [era] relativamente mais cara. |O efeito oposto se produziu na Ásia e na Grécia a partir da morte de Alexandre. As areias auríferas se esgotaram; o preço dos escravos e da mão de obra aumenta; a mecânica e a geometria haviam feito imensos progressos desde Euclides até Arquimedes, de modo que se tornou possível explorar com lucro os ricos filões das minas de prata da Ásia, da Trácia e da Espanha, e, sendo a prata 52 vezes mais abundante do que o ouro, a relação de valor entre os dois metais teve de mudar: a libra de ouro, que nos tempos de Xenofonte, 350 a.C., se permutava por 10 libras de prata, passou a valer 18 libras deste metal no ano 422 d.C.f[97]. Logo, aumentou de 10:1 para 18:1.
Ao fim do século V d.C., massa de dinheiro líquido excepcionalmente reduzida, paralisação da mineração. Na Idade Média, até o final do século XV, parte relativamente significativa do dinheiro em moedas de ouro[98]. (A redução afetou especialmente a prata, que circulava mais no passado.) Relação no século XV = 10:1, no século XVIII = 14:1, no continente; na Inglaterra = 15:1[99]. Na Ásia moderna, a prata [é] usada mais como mercadoria no comércio; em especial na China, onde o dinheiro de cobre (tael, uma composição de cobre, zinco e chumbo) é a moeda nacional; na China, o ouro (e a prata) a peso, como mercadoria para a balança do comércio exterior[100].
Em Roma, grandes flutuações entre valor do cobre e da prata (nas moedas). Até Sérvio, o |metal em lingotesf para a troca: aes rude[101]. A unidade monetária, o ás de cobre = 1 libra de cobre[102]. Ao tempo de Sérvio, relação da prata com o cobre = 279:1[103]; até o começo da Guerra Púnica = 400:1[104]; ao tempo da 1a Guerra Púnica = 140:1[105]; 2ª Guerra Púnica = 112:1[106].
De início, o ouro [era] muito caro em Roma, ao contrário da prata de Cartago (e Espanha); o ouro [era] usado unicamente em lingotesf até 547[107]. Relação do ouro para a prata no comércio = 13,71:1; nas moedasf = 17,4:1[108]; sob César = 12:1[109] (com a eclosão da guerra civil, após a pilhagem do aerarium[k] por César, somente 8,9:1)[110]; sob Honório e Arcádio (397) fixado = 14,4:1; sob Honório e Teodósio, o Jovem (422) = 18:1[111]. Relação da prata para o cobre = 100:1; do ouro para a prata = 18:1[112]. Primeira moeda de prata forjada em Roma em 485 u.c.[113], primeira moeda de ouro: 547 [u.c.][114]. Tão logo o ás, após a 2a Guerra Púnica, reduziu-se a 1 onça, foi tão somente |moeda de troco; o sestérciof (prata), |unidade monetáriaf, e todos os grandes pagamentos feitos em prataf[115]. (No uso cotidiano, o cobre (mais tarde. o ferro) permaneceu o principal metal. Sob os imperadores do Oriente e do Ocidente, o solidus (aureus), ou seja, o ouro, era o dinheiro regulador.[116])
No mundo antigo, portanto, quando se tira uma média:
Primeiro: valor da prata proporcionalmente mais elevado do que o do ouro. Abstraindo de fenômenos isolados (árabes), em que o ouro é mais barato do que a prata e ainda mais barato do que o ferro, na Ásia, do século XV ao VI a.C., a relação do ouro à prata = 6:1 ou 8:1 (a última relaçãof na China e no Japão até o início do século XIX). No próprio códigof de Mani = 2½:1. Essa relação mais baixa resulta das mesmas causas que fizeram o ouro ser descoberto primeiro como metal. Naquela época, o ouro vinha principalmente da Ásia e do Egito. A esse período corresponde, no desenvolvimento italiano, o cobre como dinheiro. Aliás, da mesma maneira que o cobre como instrumento principal da paz e da guerra, ao ouro corresponde o papel de metal precioso predominante. Ainda na época de Xenofonte, a relação do ouro para a prata = 10:1.
Segundo: desde a morte de Alexandre, aumento proporcional do valor do ouro em relação ao da prata com o esgotamento das |areias auríferasf, com o progresso da técnica e da civilização; e, por isso, abertura de minas de prata; daí, influência da maior ocorrência quantitativa da prata em relação ao ouro na Terra. Mas sobretudo os cartagineses, [com] a exploração da Espanha, que tiveram de revolucionar a relação entre ouro e prata, de modo similar à descoberta da prata americana ao fim do século XV. Relação antes do tempo dos Césares = 17:1; mais tarde, 14:1; finalmente, a partir de 422 d.C. = 18:1. (A queda do ouro sob César por razões acidentais.) A queda da prata em relação ao ouro corresponde ao aparecimento do ferro como instrumento principal na guerra e na paz. Se, no primeiro período, o abastecimento de ouro provinha do Oriente, no segundo período, o abastecimento de prata provinha das partes mais frias do Ocidente.
Terceiro, na Idade Média: novamente a relação como na época de Xenofonte; 10:1. (Em vários locais = 12:1?)
Quarto, após a descoberta da América: de novo, |mais ou menosi a relação da época de Honório e Arcádio (397); 14 até 15:1. Apesar do crescimento da produção de ouro desde |cerca dei 1815-1844, o ouro produzia prêmios (p. ex., na França). É provável que o descobrimento da Califórnia e da Austrália,[l]
Quinto, levará novamente a uma relação no nível do Império Romano, 18:1, se não ainda maior. O relativo barateamento da prata com o progresso da produção de metais preciosos, que, tanto na Antiguidade como nos tempos modernos, vai do Leste ao Oeste, até que a Califórnia e a Austrália invertem tal tendência. No detalhe, grandes flutuações; porém, quando são consideradas as diferenças principais, elas se repetem de maneira notável.
Entre os antigos, o cobre [era] três ou quatro vezes mais caro do que [é] hoje[117].
c) É preciso examinar agora as fontes de abastecimento de ouro e prata e sua conexão com o desenvolvimento histórico.
d) O ouro como moeda. Breve histórico das moedas. Depreciação e apreciação etc.
A circulação ou o curso do dinheiro corresponde a uma circulação ou a um curso inverso das mercadorias. A mercadoria de A passa às mãos de B, enquanto o dinheiro de B passa às mãos de A etc. A circulação do dinheiro, assim como a da mercadoria, parte de uma infinidade de pontos distintos e retorna a uma infinidade de pontos distintos. A partida de um único centro para os distintos pontos da periferia e o retorno de todos os pontos da periferia ao centro único não têm lugar no curso do dinheiro no nível em que aqui o consideramos, seu curso imediato, mas somente na circulação mediada pelo sistema bancário. Não obstante, essa primeira circulação, natural e espontânea [naturwüchsig], consiste de uma massa de cursos. No entanto, o curso do dinheiro propriamente só começa ali onde o ouro e a prata deixam de ser mercadorias; nesse sentido, entre os países que exportam metais preciosos e os que importam não tem lugar nenhuma circulação, mas simples troca, porque o ouro e a prata figuram aqui não como dinheiro, mas como mercadorias. Na medida em que medeia a troca das mercadorias, i.e., nesse caso, medeia a sua circulação, logo, é meio de troca, o dinheiro é instrumento da circulação, engrenagem de circulação[118]; porém, na medida em que, nesse processo, ele mesmo é posto a circular, gira, cumpre um movimento próprio, ele próprio tem uma circulação, circulação monetária, curso do dinheiro. Cumpre descobrir até onde essa circulação é determinada por leis particulares. Nessas circunstâncias, é claro desde logo que, se o dinheiro é engrenagem de circulação para a mercadoria, a mercadoria é igualmente engrenagem de circulação para o dinheiro. Se o dinheiro faz circular as mercadorias, as mercadorias fazem circular o dinheiro. Por conseguinte, a circulação das mercadorias e a circulação do dinheiro condicionam-se reciprocamente. Três aspectos têm de ser considerados no curso do dinheiro: 1) a forma do próprio movimento; a linha que descreve (seu conceito); 2) a quantidade de dinheiro circulante; 3) o grau de velocidade com que completa seu movimento, com que circula. Isso só pode ocorrer com referência à circulação de mercadorias. Nessas circunstâncias, é imediatamente claro que a circulação de mercadorias possui momentos que são totalmente independentes da circulação de dinheiro e que, pelo contrário, a determinam diretamente, ou que as mesmas circunstâncias que, p. ex., determinam a velocidade de circulação das mercadorias, determinam também a velocidade de circulação do dinheiro. O caráter global do modo de produção determinará ambas, e mais diretamente a circulação de mercadorias. A massa dos trocadores (população total); sua distribuição em cidade e campo; a quantidade absoluta de mercadorias, de produtos e de agentes de produção; a massa relativa das mercadorias postas em circulação; o desenvolvimento dos meios de comunicação e de transporte, no duplo sentido de que determina tanto o círculo daqueles que trocam entre si, dos que entram em contato, como a velocidade com que a matéria-prima chega aos produtores e o produto, aos consumidores; finalmente, o desenvolvimento da indústria que concentra diferentes ramos de produção, p. ex., fiação, tecelagem, tinturaria etc., e torna, assim, supérflua uma série de atos de troca intermediários. A circulação de mercadorias é o pressuposto original da circulação de dinheiro. Ver até onde esta última determina, por sua vez, a circulação de mercadorias.
Em primeiro lugar, é preciso fixar o conceito geral de circulação ou de curso.
Notar, ainda, que aquilo que o dinheiro faz circular são valores de troca e, por isso, preços. Por conseguinte, na circulação de mercadorias é preciso levar em conta não somente sua massa, mas igualmente seus preços. Uma grande quantidade de mercadorias de baixo valor de troca, preço, requer obviamente menos dinheiro para sua circulação do que uma massa menor a um preço duas vezes maior. Logo, o conceito de preço deve de fato ser desenvolvido antes do conceito de circulação. A circulação é o pôr dos preços, o movimento no qual as mercadorias são transformadas em preço: sua realização enquanto preço. A dupla determinação do dinheiro como 1) medida ou elemento no qual a mercadoria é realizada enquanto valor de troca, e sua determinação como 2) meio de troca, instrumento de circulação, atua em direções totalmente diferentes. O dinheiro faz circular somente as mercadorias já transformadas em dinheiro idealmente, não somente na cabeça do indivíduo singular, mas também na representação da sociedade (imediatamente na representação das partes no processo de compra e venda). Essa transformação ideal em dinheiro e a transformação real não são de modo algum determinadas pelas mesmas leis. É preciso investigar sua relação recíproca.
Uma determinação essencial da circulação é que ela faz circular valores de troca (produtos ou trabalho), na verdade, valores de troca determinados como preços. Portanto, nem todo tipo de troca de mercadorias, p. ex., escamboi, prestações in natura, corveias feudais etc. institui a circulação. Para a circulação são necessárias sobretudo duas coisas: primeira: o pressuposto das mercadorias como preço; segunda: não atos de troca singulares, mas um ambiente de trocas, uma totalidade de trocas em contínuo fluxo e operando mais ou menos em toda a superfície da sociedade; um sistema de atos de troca. A mercadoria é determinada como valor de troca. Como valor de troca, é equivalente, em proporção determinada (proporcionalmente ao tempo de trabalho nela contido), a todos os outros valores (mercadorias); mas a mercadoria não corresponde imediatamente a essa sua determinabilidade. Como valor de troca, é diferente de si mesma em sua existência natural. É preciso uma mediação para pô-la enquanto tal. Por isso, no dinheiro, o valor de troca se lhe contrapõe como algo distinto. Só a mercadoria posta como dinheiro é a mercadoria como puro valor de troca, ou a mercadoria como puro valor de troca é dinheiro. No entanto, ao mesmo tempo, o dinheiro existe agora fora da mercadoria e ao lado dela; seu valor de troca, o valor de troca de todas as mercadorias, adquire uma existência independente dela, existência autonomizada em um material próprio, em uma mercadoria específica. O valor de troca da mercadoria expressa o conjunto das relações quantitativas pelas quais todas as outras mercadorias podem ser trocadas por ela, conjunto determinado pelas quantidades desiguais daquelas mercadorias que podem ser produzidas no mesmo tempo de trabalho. O dinheiro existe então como o valor de troca de todas as mercadorias ao lado e fora delas. Ele é, antes de tudo, a matéria universal na qual as mercadorias têm de ser imersas, douradas e prateadas, para adquirir sua livre existência como valores de troca. Têm de ser traduzidas em dinheiro, expressas nele. O dinheiro devém o denominador universal dos valores de troca, das mercadorias como valores de troca. O valor de troca expresso em dinheiro, i.e., equiparado ao dinheiro, é o preço. Após o dinheiro ter sido posto como coisa autônoma diante dos valores de troca, os valores de troca são postos então na determinabilidade do dinheiro que, enquanto sujeito, os confronta. Mas todo valor de troca é um quantum determinado; valor de troca determinado quantitativamente. Enquanto tal, é = um determinado quantum de dinheiro. De acordo com a lei geral, essa determinabilidade é dada pelo tempo de trabalho realizado no valor de troca. Por conseguinte, um valor de troca que é o produto, digamosi, de uma jornada, se expressa em um quantum de ouro ou de prata que = uma jornada de tempo de trabalho; que é o produto de uma jornada de trabalho. A medida universal dos valores de troca devém agora a medida entre todo valor de troca e o dinheiro com o qual é equiparado. (O ouro e a prata são determinados primeiramente pelos seus custos de produção nos países onde são produzidos.
Nos |países mineradoresi, todos os preços dependem finalmente dos custos de produção dos metais preciosos; |a remuneração paga ao minerador fornece a escalai com a qual se calcula a remuneração de todos os outros produtores [...] Em um país que não possui minas, o valor em ouro e prata de todas as mercadorias não submetidas a qualquer monopólio depende do ouro e da prata |que podem ser obtidos pela exportação do resultado de uma dada quantidade de trabalho, da taxa de lucro corrente, e, em cada caso individual, do montante de salários pagos e do tempo durante o qual foram adiantadosi.[119]
Em outras palavras, da |quantidade de ouro e prata que, direta ou indiretamentei, será obtida dos países possuidores de minas por uma certa quantidade de trabalho (produtos exportáveis). O dinheiro é, antes de tudo, o que expressa a relação de igualdade de todos os valores de troca: nele, eles são homônimos.)
O valor de troca posto na determinabilidade do dinheiro é o preço. No preço, o valor de troca é expresso como um determinado quantum de dinheiro. No preço, o dinheiro aparece, primeiramente, como a unidade de todos os valores de troca; em segundo lugar, como unidade da qual os valores de troca contêm uma determinada quantidade, de modo que, por comparação com o dinheiro, é expressa a determinabilidade quantitativa dos valores de troca, a sua relação quantitativa recíproca. O dinheiro é posto aqui, portanto, como a medida dos valores de troca; e os preços, como os valores de troca medidos em dinheiro. Que o dinheiro seja a medida dos preços, portanto, que nele os valores de troca sejam comparados entre si, é uma determinação que se impõe por si mesma. Contudo, o mais importante para o desenvolvimento: que, no preço, o valor de troca é comparado com o dinheiro. Após o dinheiro ser posto como o valor de troca autônomo, separado das mercadorias, a mercadoria singular, o valor de troca particular, é agora igualada novamente ao dinheiro, i.e., é posta igual a um determinado quantum de dinheiro, expressa como dinheiro, traduzida em dinheiro. Pelo fato de que são igualadas ao dinheiro, as mercadorias são relacionadas novamente umas às outras, como o eram de acordo com seu conceito como valores de troca: elas coincidem e se comparam em proporções determinadas. O valor de troca particular, a mercadoria, é expresso, subsumido, posto sob a determinabilidade do valor de troca autonomizado, o dinheiro. Como isso acontece (i.e., como é descoberta a relação quantitativa entre o valor de troca determinado quantitativamente e uma quantidade de dinheiro determinada), ver acima. Porém, dado que o dinheiro tem uma existência autônoma fora das mercadorias, o preço da mercadoria aparece como relação externa dos valores de troca ou das mercadorias com o dinheiro; a mercadoria não é preço, da mesma maneira que era valor de troca em razão de sua substância social; essa determinabilidade não coincide imediatamente com ela; mas, ao contrário, é mediada por sua comparação com o dinheiro; a mercadoria é valor de troca, mas tem um preço. O valor de troca estava em unidade imediata com ela, era sua determinabilidade imediata, com a qual a mercadoria também imediatamente se decompunha, de modo que se tinha, de um lado, a mercadoria e, de outro, seu valor de troca (no dinheiro); agora, no entanto, no preço, a mercadoria se relaciona, por um lado, com o dinheiro como algo que está fora dela, e, por outro, ela própria é posta idealmente como dinheiro, já que o dinheiro tem uma realidade distinta dela. O preço é uma propriedade da mercadoria, uma determinação na qual ela é representada como dinheiro. O preço não é mais uma determinabilidade imediata da mercadoria, mas uma determinabilidade refletida. Ao lado do dinheiro real, a mercadoria existe agora como dinheiro posto idealmente.
Essa determinação mais imediata, tanto do dinheiro como medida quanto da mercadoria como preço, é ilustrada de maneira mais simples pela diferença entre dinheiro real e dinheiro de conta. Como medida, o dinheiro serve sempre como dinheiro de conta, e a mercadoria, como preço, é sempre transformada só idealmente em dinheiro.
A avaliação da mercadoria pelo vendedor, a oferta feita pelo comprador, os registros contábeis, as obrigações, as rendas, os inventários etc., em síntese, tudo aquilo que causa ou precede o ato material do pagamento tem de ser expresso em dinheiro de conta. O dinheiro real só intervém para realizar os pagamentos e saldar (liquidar) as contas. Se tenho de pagar 24 livres e 12 sous[m], o dinheiro de conta apresenta 24 unidades de um tipo e 12 de outro, ao passo que, na realidade, pagarei com duas peças materiais: uma peça de ouro, valendo 24 livres, e uma peça de prata, valendo 12 sous. A massa total de dinheiro real tem limites necessários nas necessidades da circulação. O dinheiro de conta é uma medida ideal que não tem quaisquer limites, a não ser a imaginação. Empregado para expressar toda espécie de riqueza, quando considerada exclusivamente sob o ponto de vista de seu valor de troca; é assim para a riqueza nacional, para a renda do Estado e dos indivíduos singulares; os valores de conta, sob cuja forma esses valores sempre existem, são regulados de acordo com a mesma fórmula; de modo que não há um único artigo na massa de |coisas consumíveisf que não foi muitas vezes convertido pelo pensamento em dinheiro, ao passo que, comparada com essa massa, a soma total de dinheiro efetivo é no máximo = 1:10.[120]
(Essa última relação é ruim. 1:muitos milhões seria mais correto. Mas isso é completamente incomensurável.)
Por conseguinte, se inicialmente o dinheiro expressa o valor de troca, agora a mercadoria expressa, como preço, como valor de troca idealmente posto, realizado na mente, uma soma de dinheiro: dinheiro em uma proporção determinada. Como preço, todas as mercadorias são, sob diferentes formas, representantes do dinheiro, ao passo que, antes, o dinheiro, como o valor de troca autonomizado, era o representante de todas as mercadorias. Depois que o dinheiro é realmente posto como mercadoria, a mercadoria é posta idealmente como dinheiro.
É desde logo claro que, com essa conversão ideal das mercadorias em dinheiro, ou no pôr das mercadorias como preços, a quantidade de dinheiro realmente existente é absolutamente indiferente em duplo sentido: em primeiro lugar: a conversão ideal das mercadorias em dinheiro é prima facie[n] independente da massa de dinheiro real e não é por ela limitada. Nem uma única peça de dinheiro é necessária para esse processo, assim como tampouco uma medida de comprimento (digamos, a vara) precisa realmente ser utilizada para expressar aproximadamente a quantidade ideal de varas. Quando, p. ex., toda a riqueza nacional da Inglaterra é estimada em ouro, i.e., quando é expressa como preço, qualquer um sabe que não há dinheiro bastante no mundo para realizar tal preço. Nesse caso, o dinheiro é necessário somente como categoria, como relação pensada. Em segundo lugar: uma vez que o dinheiro vale como unidade, e, portanto, a mercadoria é expressa de modo que contém uma soma determinada de partes alíquotas do dinheiro, que é medida por ele, a medida entre ambos [é] a medida universal dos valores de troca – os custos de produção ou o tempo de trabalho. Portanto, se 1/3 de onça de ouro é o produto de 1 jornada de trabalho e a mercadoria x é o produto de 3 jornadas de trabalho, a mercadoria x = 1 onça ou £ 3, 17 sh. e 4 d. Na mensuração de dinheiro e mercadoria, intervém novamente a medida original dos valores de troca. Em lugar de ser expressa em 3 jornadas de trabalho, a mercadoria é expressa no quantum de ouro ou de prata que é o produto de 3 jornadas de trabalho. O quantum de dinheiro realmente disponível, evidentemente, nada tem a ver com essa proporção.
(Erro de James Mill: não percebeu que são os custos de produção dos metais preciosos, e não a sua quantidade, que determinam o seu valor e os preços das mercadorias |medidos em valor metálicoi.[121])
Na troca, as mercadorias se medem reciprocamente. Mas esse procedimento exigiria tantos pontos de comparação quantas são as mercadorias em circulação. Se uma mercadoria só fosse trocada por uma, e não por duas mercadorias, ela não poderia servir de termoi de comparação. Daí a necessidade de um |termo comum de comparaçãof. Esse termo pode ser puramente ideal. A determinação da medida [é] a determinação original, mais importante do que a determinação do penhorf. No comércio entre Rússia e China, a prata serve para avaliar todas as mercadorias; mesmo assim, esse comérciof é feito por meio de escambosf.[122]
A operação de medir por meio do dinheiro é análoga ao emprego de pesos na comparação de quantidades materiais. O mesmo nome das duas unidades que estavam destinadas a computar tanto o peso como o valor de cada coisa. Medidas de peso e medidas de valor, o mesmo nome. Foi facilmente encontrado um padrãof que sempre tivesse peso idêntico. Para o dinheiro, tratava-se novamente do valor da libra de prata = seus custos de produção.[123]
(Não só os mesmos nomes. Ouro e prata, originalmente, eram pesados. Assim, entre os romanos, ás = 1 libra de cobre.)
“Ovelhas e bois, e não ouro e prata, dinheiro em Homero e Hesíodo, como medida do valor. No campo de Troia, escambo”[124]. (Da mesma forma, escravos na Idade Média.[125])
O dinheiro pode ser posto na determinação de medida e de elemento universal do valor de troca sem ser realizado em suas outras determinações; logo, também antes de ter assumido a forma de dinheiro metálico. Na troca direta simples. Nesse caso, entretanto, é pressuposto que, em geral, tenha lugar pouca troca; que as mercadorias não estejam desenvolvidas como valores de troca e, por isso, tampouco como preços.
(“|Um padrão comumi no preço de |qualquer coisai pressupõe |sua frequentei e |familiar alienaçãoi. Esse não é o caso em condições sociais simples. Nos países não industriais, há muitas coisas sem preços determinados [...] |Apenas a venda pode determinar os preços, e somente a venda frequente pode fixar um padrãoi. A |venda frequentei de artigos de primeira necessidadei depende da relação entre cidade e campo” etc.)[126]
A determinação de preço desenvolvida pressupõe que o indivíduo singular não produz diretamente sua subsistência, mas que seu produto imediato é valor de troca; pressupõe, portanto, que seu produto primeiro tem de ser mediado por um processo social para devir meio de subsistência para ele. Muitos níveis intermediários entre o completo desenvolvimento dessa base da sociedade industrial e o estado patriarcal, infinitos matizes.
Resulta de a): se sobem os custos de produção dos metais preciosos, caem os preços de todas as mercadorias; se caem os custos de produção dos metais preciosos, sobem os preços de todas as mercadorias. Essa é a lei geral, que, como veremos, é modificada em casos singulares.
Se, nos preços, os valores de troca são convertidos idealmente em dinheiro, na troca, na compra e venda, são convertidos realmente em dinheiro, trocados por dinheiro, para, como dinheiro, se trocarem de novo por mercadoria. O valor de troca particular tem primeiro de ser trocado pelo valor de troca universal para, em seguida, se trocar novamente por um valor de troca particular. A mercadoria só é realizada como valor de troca por meio desse movimento mediado, no qual o dinheiro cumpre o papel de mediador. O dinheiro, por conseguinte, gira em sentido inverso ao das mercadorias. Aparece como o mediador das trocas das mercadorias, como o meio de troca. É engrenagem da circulação, instrumento de circulação para o giro das mercadorias; mas, como tal, tem simultaneamente sua própria circulação – curso de dinheiro, circulação de dinheiro. O preço da mercadoria só é realizado na sua troca por dinheiro efetivo, ou em sua troca efetiva por dinheiro.
Do que foi dito até aqui resulta o seguinte. As mercadorias só serão trocadas por dinheiro real, convertidas em dinheiro efetivo, após terem sido antes convertidas idealmente em dinheiro – i.e., terem recebido determinação de preço – como preços. Os preços são, portanto, o pressuposto da circulação de dinheiro, por mais que sua realização apareça como resultado desta última. As circunstâncias que fazem os preços das mercadorias subirem ou caírem acima ou abaixo de seu valor médio, porque fazem o mesmo com seus valores de troca, devem ser desenvolvidas na seção sobre o valor de troca e precedem o processo de sua efetiva realização em dinheiro; portanto, aparecem de início completamente independentes do processo. As relações entre os números permanecem naturalmente as mesmas se as apresento em frações decimais. É meramente outra denominação. Para fazer as mercadorias circularem de maneira efetiva, é preciso instrumentos de transporte, e isso não pode ser feito pelo dinheiro. Se comprei 1000 libras de ferro pelo montante de £ x, a propriedade do ferro passou às minhas mãos. As minhas £ x cumpriram seu serviço como meio de troca e circularam, do mesmo modo que o título de propriedade. O vendedor realizou, inversamente, o preço do ferro, o ferro como valor de troca. Mas o dinheiro não faz nada para trazer agora o ferro dele para mim; para tanto, necessita-se de uma carroça, de cavalos, de caminhos etc. A efetiva circulação das mercadorias no espaço e no tempo não é executada pelo dinheiro. O dinheiro realiza apenas seu preço e com isso transfere ao comprador o título sobre as mercadorias, àquele que ofereceu os meios de troca. Não são as mercadorias que o dinheiro faz circular, mas os seus títulos de propriedade; e o que é realizado nessa circulação em troca do dinheiro, seja na compra, seja na venda, mais uma vez não são as mercadorias, mas os seus preços. A quantidade de dinheiro que é requerida pela circulação, portanto, é determinada de início pelo nível alto ou baixo dos preços das mercadorias que são lançadas na circulação. Mas a soma total desses preços é determinada, em primeiro lugar: pelos preços das mercadorias singulares; em segundo lugar: pela massa de mercadorias a preços determinados que ingressam na circulação. Por exemplo, para fazer circular um quarter de trigo a 60 sh. é necessário o dobro de sh. do que para fazê-la circular ao preço de 30 sh. E caso se tivesse de fazer circular 500 desses quarters a 60 sh., seriam necessários 30.000 sh., enquanto para a circulação de 200 desses quarters seriam necessários apenas 12.000 sh. Portanto, depende do nível mais alto ou mais baixo dos preços das mercadorias e das quantidades de mercadorias a preços fixados.
Porém, em segundo lugar, a quantidade de dinheiro requerida pela circulação depende não só da soma global dos preços a realizar, mas também da velocidade com que gira o dinheiro, com que o comércio completa tal realização. Se um táler faz, em uma hora, dez compras a um preço de um táler cada uma, troca-se dez vezes, executa, assim, exatamentei a mesma operação que cumpririam dez táleres que efetuassem só uma compra em uma hora. A velocidade é o momento negativo; ela substitui a quantidade; por seu intermédio, uma peça de dinheiro se multiplica.
As circunstâncias que determinam, por um lado, a massa de preços de mercadorias a realizar e, por outro, a velocidade de circulação do dinheiro, devem ser investigadas posteriormente. Até aqui, é evidente que os preços não são altos ou baixos porque circula muito ou pouco dinheiro, mas que circula muito ou pouco dinheiro porque os preços são altos ou baixos; e, ademais, que a velocidade do dinheiro em circulação não depende de sua quantidade, mas sim que a quantidade do meio circulante depende de sua velocidade (|pagamentos vultososi não são contados, são pesados; desse modo, o tempo é abreviado).
Entretanto, como já mencionado, a circulação do dinheiro não parte de um centro único nem retorna a um único centro de todos os pontos da periferia (como sucede com os |bancos de emissãoi e, em parte, com o dinheiro do Estado); pelo contrário, parte de uma infinidade de pontos e retorna a uma infinidade de outros (esse próprio retorno e o tempo em que é percorrido são fortuitos). Por conseguinte, a velocidade do meio de circulação pode substituir a quantidade de meios circulantes somente até um certo ponto. (Fabricantes e arrendatários pagam, p. ex., o trabalhador; este paga o quitandeiro etc.; o dinheiro retorna deste último aos fabricantes e arrendatários.) O mesmo quantum de dinheiro, qualquer que seja sua velocidade, só pode efetuar uma série de pagamentos sucessivamente. No entanto, uma certa massa de pagamentos tem de ser feita simultaneamente. A circulação tem seus pontos de partida simultaneamente em uma massa de muitos pontos. Para a circulação, portanto, é preciso um determinado quantum de dinheiro que sempre se encontrará em circulação e é determinado pela soma global que sai dos pontos de partida simultâneos da circulação, e pela velocidade com a qual tal quantum percorre seu trajeto (retorna). Por mais que essa quantidade de meios em circulação esteja sujeita a fluxos e refluxos, um nível médio se estabelece; na medida em que as transformações permanentes são só muito graduais, só acontecem em longos períodos e, como veremos, são sempre paralisadas por uma massa de circunstâncias acessórias.
(A propósito de a.[o]) (“Medidai, utilizada como atributo do dinheiroi, significa |indicador de valori.” Ridículo afirmar que “|preços devem cairi porque as mercadoriasi são estimadas |como valendo tantas onças de ouro, e a quantidade de ouro está reduzida nesse paísi”. |A eficiência do ouro como um indicador de valor não é afetada por ser maior ou menor sua quantidade em qualquer país particulari. Caso se conseguisse, pela aplicação de |expedientes bancáriosi, reduzir à metade a totalidade da circulação de papel e de metal nesse país, o valor relativo do ouro e das mercadorias permaneceria o mesmo.” Exemplo do Peru no século XVI e transmissãof da França à Inglaterra. Hubbard, VIII, 45.)[127] (“Na costa africana, nem ouro nem prata são medida do valor; em seu lugar, um padrãoi ideal, uma barrai imaginária.” Jacob V, 15.[128])
Em sua determinação como medida, o dinheiro é indiferente à sua quantidade, ou a quantidade de dinheiro existente é indiferente. Em sua determinação como meio de troca, como instrumento de circulação, sua quantidade é medida. Se essas duas determinações do dinheiro podem cair em contradição entre si – a examinar posteriormente.
(O conceito da circulação forçada, involuntária (vide Steuart[129]) ainda não vem ao caso.)
Faz parte essencial da circulação que a troca apareça como um processo, um todo fluido de compras e vendas. O seu primeiro pressuposto é a circulação das próprias mercadorias, a sua incessante circulação partindo de muitos pontos. A condição da circulação de mercadorias é que elas sejam produzidas como valores de troca, não como valores de uso imediato, mas valores de uso mediados pelo valor de troca. A apropriação por meio da e mediada pela alienação [Entäusserung] e venda [Veräusserung] é o pressuposto fundamental. Como realização dos valores de troca, a circulação implica: 1) que o meu produto só é produto na medida em que o é para outro; por conseguinte, singular superado, universal; 2) que só é produto para mim na medida em que foi alienado [entäussert worden], em que deveio produto para outro; 3) que só é produto para o outro na medida em que ele próprio aliena [entäussert] o seu produto; o que já 4) implica que a produção não aparece para mim como fim em si, mas como meio. A circulação é o movimento em que a alienação [Entäusserung] universal aparece como apropriação universal e a apropriação universal, como alienação [Entäusserung] universal. Embora a totalidade desse movimento apareça agora como processo social, e ainda que os momentos singulares desse movimento partam dos desejos conscientes e dos fins particulares dos indivíduos, a totalidade desses processos aparece como uma conexão objetiva que emerge de maneira natural e espontânea; totalidade que, sem dúvida, resulta da interação dos indivíduos conscientes, mas que não está em sua consciência nem lhes está subsumida como totalidade. O seu próprio entrechoque produz um poder social que lhes é estranho, que está acima deles; sua própria interação [aparece] como processo e poder independentes deles. A circulação, porque é uma totalidade do processo social, é também a primeira forma em que a relação social não só aparece como algo independente dos indivíduos, por exemplo, em uma peça de dinheiro ou no valor de troca, mas também como a totalidade do próprio movimento social. A relação social dos indivíduos entre si como poder autonomizado sobre os indivíduos, seja representado agora como poder natural, como acaso ou como qualquer outra forma, é o resultado necessário do fato de que o ponto de partida não é o indivíduo social livre. A circulação, como primeira totalidade dentre as categorias econômicas, serve bem para ilustrar esse fato.
À primeira vista, a circulação se manifesta como um processo de mau infinito. A mercadoria é trocada por dinheiro; o dinheiro é trocado por mercadoria, e isso se repete ao infinito. Essa renovação constante do mesmo processo constitui de fato um momento essencial da circulação. Porém, considerada de maneira mais precisa, a circulação apresenta ainda outros fenômenos: os fenômenos da reunificação ou do retorno do ponto de partida a si mesmo. A mercadoria é trocada por dinheiro; o dinheiro é trocado por mercadoria. Logo, mercadoria é trocada por mercadoria, só que essa é uma troca mediada. O comprador devém novamente vendedor e o vendedor devém novamente comprador. Cada qual é posto assim na determinação dupla e antitética e, desse modo, é a unidade vivente das duas determinações. Todavia, é totalmente falso, como fazem os economistas, se, tão logo surgem as contradições do sistema monetário, são retidos simplesmente os resultados finais, sem o processo que os mediou, se é retida simplesmente a unidade, sem a diferença, a afirmação, sem a negação. Na circulação, a mercadoria é trocada por mercadoria: da mesma maneira, ela não é trocada por mercadoria porquanto é trocada por dinheiro. Em outras palavras, os atos de compra e de venda aparecem como dois atos mutuamente indiferentes, atos separados no espaço e no tempo. Quando se diz que aquele que vende também compra, pelo fato de que compra dinheiro, e que aquele que compra também vende, pelo fato de que vende dinheiro, abstrai-se precisamente da diferença, da diferença específica entre mercadoria e dinheiro. Depois de nos terem mostrado da maneira mais admirável que o escambo, no qual os dois atos coincidem, não é suficiente para uma forma social e para um modo de produção mais desenvolvidos, os economistas subitamente consideram a troca mediada por dinheiro como troca direta, omitindo o caráter específico dessa transação. Depois de nos terem mostrado que é necessário o dinheiro diferente da mercadoria, afirmam |ao mesmo tempoi que não existe nenhuma diferença entre o dinheiro e a mercadoria. Busca-se refúgio nessa abstração porque, no desenvolvimento efetivo do dinheiro, surgem contradições que são desagradáveis à apologética do |senso comumi burguês e, por isso, têm de ser camufladas. Na medida em que compra e venda, que são dois momentos essenciais da circulação, são mutuamente indiferentes, são separadas no espaço e no tempo, elas não precisam de maneira nenhuma coincidir. A sua indiferença pode prosseguir até a consolidação e a aparente autonomia de uma em relação à outra. Contudo, como ambas são momentos essenciais de um todo único, tem de chegar um momento em que a figura autônoma é violentamente rompida e a unidade interna é restabelecida exteriormente por uma violenta explosão. Desse modo, na determinação do dinheiro como mediador, no desdobramento da troca em dois atos, já se encontra o germe das crises, pelo menos sua possibilidade, possibilidade que não pode ser realizada exceto ali onde estão presentes as condições fundamentais da circulação, classicamente constituída, adequada a seu conceito.
Foi mostrado, ademais, que, na circulação, o dinheiro só realiza os preços. O dinheiro aparece de início como determinação ideal da mercadoria; mas o dinheiro trocado pela mercadoria é o preço realizado dela, seu preço efetivo. O preço, por conseguinte, aparece tanto ao lado da mercadoria, externo e independente, como existente idealmente nela. Se não pode ser realizada em dinheiro, a mercadoria deixa de ser capaz de circular, e seu preço devém puramente imaginário; da mesma maneira que, originalmente, o produto transformado em valor de troca deixa de ser produto se não é efetivamente trocado. (Aqui não se trata de aumento e diminuição dos preços.) Considerado sob a), o preço apareceu como determinação nas mercadorias; mas, considerado sob b), o dinheiro aparece como o preço fora da mercadoria. Não é só demanda da mercadoria que é necessário; mas demanda monetizada. Por conseguinte, se o seu preço não pode ser realizado, se não pode ser transformada em dinheiro, a mercadoria aparece como desvalorizada, depreciada. O valor de troca expresso em seu preço tem de ser sacrificado tão logo seja necessária essa transformação específica em dinheiro. Daí as lamentações em Boisguillebert, p. ex., de que o dinheiro é o carrasco de todas as coisas, o Moloch ao qual tudo tem de ser sacrificado, o déspota das mercadorias[130]. No tempo do advento da monarquia absoluta, com a transformação de todos os impostos em impostos em dinheiro, o dinheiro aparece de fato como o Moloch ao qual é sacrificada a riqueza real. Ele também aparece dessa maneira em todo |pânico monetárioi. De um criado do comércio, diz Boisguillebert, o dinheiro devém seu déspota[131]. Mas, de fato, na determinação dos preços já existe aquilo que é posto na troca por dinheiro: que não é mais o dinheiro que representa a mercadoria, mas a mercadoria, o dinheiro. Lamentações sobre o comércio pelo dinheiro como comércio ilegítimo entre muitos autores que representam a transição da idade feudal para a idade moderna: da mesma forma que, posteriormente, entre socialistas.
α) Quanto mais se desenvolve a divisão do trabalho, mais o produto deixa de ser um meio de troca. Intervém a necessidade de um meio de troca universal, um meio independente da produção específica de cada um. Na produção orientada para a subsistência imediata, não se pode trocar cada artigo por qualquer outro, e uma atividade determinada só pode ser trocada por produtos determinados. Quanto mais os produtos se particularizam, diversificam e perdem autonomia, tanto mais necessário se faz um meio de troca universal. De início, o produto do trabalho, ou o próprio trabalho, é o meio de troca universal. No entanto, quanto mais se particulariza, mais deixa de ser um meio de troca universal. Uma divisão do trabalho mais ou menos desenvolvida pressupõe que as necessidades de cada um devieram muito diversificadas e seu produto, muito unilateral. A necessidade da troca e o meio de troca imediato desenvolvem-se em relação inversa. Daí a necessidade de um meio de troca universal ali onde o produto determinado e o trabalho determinado têm de ser trocados pela permutabilidade. O valor de troca de uma coisa nada mais é do que expressão quantitativamente especificada de sua capacidade de servir de meio de troca. No dinheiro, o próprio valor de troca devém coisa, ou o valor de troca da coisa adquire uma existência autônoma fora da coisa. Como é um meio de troca de poder limitado perante o dinheiro, a mercadoria pode deixar de ser meio de troca frente ao dinheiro.
β) A separação da troca em compra e venda torna possível que eu somente compre sem vender (açambarcamentof de mercadorias), ou que somente venda sem comprar (acumulação de dinheiro). Torna possível a especulação. Faz da troca um negócio particular; i.e., funda o estamento dos comerciantes. Essa separação tornou possível uma massa de transações antes da troca definitiva das mercadorias e possibilita a uma massa de pessoas tirar vantagem dessa dissociação. Tornou possível uma massa de transações fictícias. Ora se evidencia que aquilo que aparecia como um ato essencialmente cindido, é um ato essencialmente relacionado; ora que aquilo que era pensado como um ato essencialmente relacionado, na realidade é essencialmente cindido. Nos momentos em que a compra e a venda se afirmam como atos essencialmente diferentes, tem lugar a depreciação geral de todas as mercadorias. Nos momentos em que se torna evidente que o dinheiro é unicamente meio de troca, tem lugar a depreciação do dinheiro. Baixa ou alta geral dos preços.
Com o dinheiro, está dada a possibilidade de uma divisão absoluta do trabalho, em razão da independência do trabalho em relação ao seu produto específico, ao valor de uso imediato de seu produto para si.
A elevação geral dos preços em períodos de especulação não pode ser atribuída a um aumento geral de seu valor de troca ou de seus custos de produção; pois se o valor de troca ou os custos de produção do ouro aumentassem proporcionalmente aos de todas as outras mercadorias, os valores de troca destas últimas expressos em ouro, i.e., seus preços, permaneceriam os mesmos. Tampouco pode ser atribuída a uma queda no preço de produção[132] do ouro. (O crédito ainda não está em questão aqui.) Mas como o dinheiro não é somente mercadoria universal, mas também particular, e como mercadoria particular está sujeito às leis da oferta e da demanda, a demanda geral de mercadorias particulares, em oposição ao dinheiro, tem de provocar sua queda.
Vemos que é da natureza do dinheiro o fato de que ele só resolve as contradições tanto da troca direta como do valor de troca na medida em que as põe universais. Era casual se o meio de troca particular se trocava ou não por um meio de troca particular; agora, no entanto, a mercadoria tem de se trocar pelo meio de troca universal, em relação ao qual sua particularidade está em contradição ainda maior. Para assegurar a permutabilidade da mercadoria, a própria permutabilidade lhe é contraposta como uma mercadoria autônoma. (De meio, devém fim.) A questão era se a mercadoria particular encontra a mercadoria particular. Mas o dinheiro abole o próprio ato de troca em dois atos mutuamente indiferentes.
(Antes das questões sobre a circulação, forte, fraca etc., e, principalmente, sobre o controvertido ponto acerca de a quantidade de dinheiro circulante e de os preços serem mais amplamente desenvolvidos, é preciso considerar o dinheiro em sua terceira determinação.)
Um momento da circulação é que a mercadoria se troca por mercadoria por meio do dinheiro. Mas, da mesma maneira, tem lugar o outro momento, no qual não só mercadoria se troca por dinheiro e dinheiro por mercadoria, mas no qual, igualmente, dinheiro se troca por mercadoria e mercadoria por dinheiro; no qual, por conseguinte, o dinheiro é mediado consigo mesmo pela mercadoria e aparece, em seu curso, como a unidade encerrada em si mesma. Desse modo, o dinheiro não aparece mais como meio, mas como fim da circulação (como, p. ex., no estamento comercial) (no comércio em geral). Se a circulação é considerada não somente como uma alternância incessante, mas nos circuitos que descreve em si mesma, este circuito aparece duplo: mercadoria – dinheiro – mercadoria; de outro lado, dinheiro – mercadoria – dinheiro; i.e., se vendo para comprar, posso igualmente comprar para vender. No primeiro caso, o dinheiro é só meio para obter a mercadoria, e a mercadoria, o fim; no segundo caso, a mercadoria é só meio para obter dinheiro, e o dinheiro, o fim. Isso resulta simplesmente quando os momentos da circulação são tomados em conjunto. Portanto, considerada a circulação simples, tem de ser indiferente o ponto que tomo para fixar como ponto de partida.
Na verdade, entretanto, surge agora uma diferença específica entre a mercadoria em circulação e o dinheiro em circulação. A mercadoria é expulsa da circulação em um certo ponto e só realiza sua determinação definitiva quando é definitivamente removida da circulação, quando é consumida, seja no ato de produção, seja no consumo propriamente dito. A determinação do dinheiro, ao contrário, é de permanecer na circulação, como sua engrenagem; de reiniciar continuamente o seu curso, como perpetuum mobile[p].
A despeito disso, aquela segunda determinação existe na circulação tanto quanto a primeira. Todavia, pode-se dizer: trocar mercadoria por mercadoria tem sentido, porque as mercadorias, embora equivalentes como preços, são qualitativamente diferentes, de maneira que sua troca satisfaz, enfim, necessidades qualitativamente diferentes. Por contraste, trocar dinheiro por dinheiro não tem nenhum sentido, exceto se há uma diferença quantitativa, se menos dinheiro é trocado por mais dinheiro, se é vendido mais caro do que foi comprado, e ainda não [vamos] nos ocupar com a categoria do lucro. O silogismo dinheiro-mercadoria-mercadoria-dinheiro, que extraímos da análise da circulação, apareceria tão somente como uma abstração arbitrária e absurda, mais ou menos como se quisesse descrever o ciclo da vida: morte-vida-morte; muito embora não se possa negar, nesse último caso, que a contínua dissolução do individualizado no elementar é um momento do processo da natureza tanto quanto a contínua individualização do elementar. De maneira similar, no ato da circulação há a conversão contínua das mercadorias em dinheiro, tanto quanto a conversão contínua do dinheiro em mercadorias[133]. No processo real de comprar para revender, o motivo é certamente o lucro que nele se obtém, e o objetivo último é trocar, com a mediação da mercadoria, menos dinheiro por mais dinheiro, uma vez que não há qualquer diferença qualitativa entre dinheiro e dinheiro (e aqui não se trata nem de dinheiro metálico particular nem de tipos particulares de moedas). Contudo, não se pode negar que a operação pode fracassar, de modo que a troca de dinheiro por dinheiro sem diferença quantitativa ocorre frequentemente na realidade e, por isso, pode ocorrer. Mas para que, enfim, seja possível esse processo, no qual se baseia o comércio e que, de acordo com sua amplitude, constitui um fenômeno principal da circulação, o ciclo dinheiro-mercadoria-mercadoria-dinheiro tem de ser reconhecido como forma particular da circulação. Essa forma se diferencia especificamente da forma em que o dinheiro aparece como simples meio de circulação das mercadorias; como termo médio; como premissa menor do silogismo. Junto à determinabilidade quantitativa que tem no comércio, o processo tem de ser examinado em sua forma puramente qualitativa, em seu movimento específico. Segundo: ele já implica que o dinheiro nem vale só como medida, nem como meio de troca, nem como ambos; mas tem uma terceira determinação. O dinheiro aparece aqui, em primeiro lugar, como fim em si, fim para cuja mera realização servem o comércio e a troca de mercadorias. Em segundo lugar, uma vez que com ele aqui o ciclo chega ao fim, o dinheiro sai dele, do mesmo modo que a mercadoria trocada por seu equivalente por meio do dinheiro é lançada para fora da circulação. É certamente verdade que o dinheiro, na medida em que é determinado somente como agente da circulação, permanece constantemente encerrado em seu circuito. Mas aqui fica patente que o dinheiro é também outra coisa além desse instrumento da circulação, que possui também uma existência autônoma fora da circulação e que, nessa nova determinação, pode ser retirado da circulação da [mesma] maneira que a mercadoria, que sempre tem de ser definitivamente retirada dela. Temos assim de examinar o dinheiro nessa sua terceira determinação, na qual contém em si as duas primeiras como determinações, por conseguinte, tanto a determinação de servir de medida, como a de ser meio de troca universal e, assim, a realização do preço das mercadorias.
É da natureza do circuito que cada ponto apareça simultaneamente como ponto inicial e ponto final, e que, na verdade, apareça como um aspecto na medida em que se manifesta como o outro. Por conseguinte, a determinação formal D-M-M-D é tão correta quanto a outra, M-D-D-M, que aparece como a originária. A dificuldade é que a outra mercadoria é qualitativamente diferente; mas não é o caso com o outro dinheiro. Ele só pode ser quantitativamente diferente. – Considerado como medida, a substância material do dinheiro é essencial, muito embora sua disponibilidade, e mais precisamente sua quantidade, o número em que a porção de ouro ou prata serve de unidade, seja completamente indiferente para o dinheiro nessa determinação, e seja empregado em geral somente como unidade imaginária, não existente. Nessa determinação, o dinheiro tem de existir como unidade, não como número. Quando digo que 1 libra de algodão vale 8 d., digo que 1 libra de algodão = 1/116 onça de ouro (a onça a £ 3 17 sh. 7 d.) (931 d.). Nesse caso, isso expressa ao mesmo tempo sua determinabilidade como valor de troca e como equivalente de todas as outras mercadorias que contêm tantas ou quantas vezes a onça de ouro, porque todas elas são igualmente comparadas com a onça de ouro. Essa relação original da libra de algodão com o ouro, pela qual é determinada a quantidade de ouro contida em uma onça de algodão, é posta pela quantidade de tempo de trabalho realizada em ambas, de substância comum efetiva do valor de troca. Isso tem de ser pressuposto a partir do capítuloi que trata do valor de troca enquanto tal. A dificuldade de encontrar essa equação não é tão grande como parece. P. ex., no trabalho que produz diretamente ouro, um quantum determinado de ouro aparece diretamente como o produto de uma jornada de trabalho, p. ex. A concorrência equipara as outras jornadas de trabalho a essa, modificandis modificatis[134]. Direta ou indiretamente. Em uma palavra, na produção imediata de ouro, um quantum determinado de ouro aparece imediatamente como produto e, por isso, como o valor, o equivalente de um tempo de trabalho determinado. Em consequência, basta determinar o tempo de trabalho que está realizado nas diferentes mercadorias e equipará-lo com o tempo de trabalho que produz ouro diretamente para dizer quanto ouro está contido em uma mercadoria determinada. A determinação de todas as mercadorias como preço – como valores de troca medidos –
é um processo que só acontece gradualmente, pressupõe troca frequente e, por essa razão, comparação frequente das mercadorias como valores de troca; mas, uma vez a existência das mercadorias como preços deveio pressuposto – um pressuposto que é ele mesmo um produto do processo social, um resultado do processo de produção social –, a determinação de novos preços aparece simples, dado que os próprios elementos dos custos de produção já estão, nesse caso, presentes na forma de preços, logo, é preciso simplesmente somá-los. (Alienaçãoi frequente, |venda, venda frequentei[135]. Ou melhor, tudo isso deve ter continuidade para que os preços tenham uma certa regularidade.) Entretanto, o ponto a que queríamos chegar aqui é o seguinte: o ouro, em relação às mercadorias, na medida em que deve ser fixado como unidade de medida, é determinado pelo escamboi, pela troca direta; da mesma maneira que a relação de todas as outras mercadorias entre si. No escamboi, entretanto, o valor de troca é o produto somente em si; é sua primeira forma fenomênica; mas o produto ainda não é posto como valor de troca. De início, essa determinação não se estende por toda a produção, mas só tem relação com seu supérfluo e, por isso, é ela mesma mais ou menos supérflua (como a própria troca); com um alargamento fortuito dos círculos das satisfações, dos gozos (relação a novos objetos). Em razão disso, a troca só se dá em poucos pontos (originalmente, ali onde terminavam as comunidades naturais [naturwüchsigen] em seu contato com estrangeiros), está limitada a um pequeno círculo e constitui algo de transitório e incidental em relação à produção; desaparece tão casualmente quanto nasce. A troca direta, na qual o supérfluo da própria produção é trocado fortuitamente pelo supérfluo da produção estrangeira, é apenas a primeira ocorrência do produto como valor de troca em geral e é determinada por necessidades, desejos etc. fortuitos. Mas caso aconteça de a troca continuar, caso devenha um ato continuado que contém em si mesmo os meios para sua permanente renovação, tem lugar, progressivamente, desde o exterior e de modo igualmente fortuito, a regulação da troca recíproca por meio da regulação da produção recíproca, e os custos de produção, que em última instância se resolvem todos em tempo de trabalho, deviriam assim a medida da troca. Isso nos mostra a gênese da troca e do valor de troca da mercadoria. Mas as circunstâncias sob as quais uma relação ocorre pela primeira vez de maneira nenhuma nos mostram tal relação nem em sua pureza nem em sua totalidade. Um produto posto como valor de troca não é mais determinado essencialmente como simples produto; ele é posto em uma qualidade diferente de sua qualidade natural; ele é posto como relação, mais precisamente, como relação universal, não como relação a uma mercadoria, mas a toda mercadoria, a todo produto possível. Expressa, por conseguinte, uma relação universal; o produto que se relaciona a si mesmo como a realização de um quantum determinado do trabalho universal, do tempo de trabalho social, e por isso é o equivalente de todo outro produto na proporção expressa em seu valor de troca. O valor de troca subentende o trabalho social como a substância de todos os produtos, abstraindo totalmente de sua naturalidade. Nada pode expressar uma relação sem se relacionar a uma coisa qualquer; e nada pode expressar uma relação universal sem se relacionar a um universal. Como o trabalho é movimento, o tempo é sua medida natural. O escamboi, em sua forma mais rudimentar, subentende o trabalho como substância e o tempo de trabalho como medida das mercadorias; o que também se evidencia posteriormente, tão logo a troca se regulariza, devém contínua e deve conter em si mesma as condições recíprocas de sua renovação. – A mercadoria só é valor de troca na medida em que é expressa em outra coisa, portanto, como relação. Um alqueire de trigo vale tantos alqueires de centeio; nesse caso, o trigo é valor de troca à medida que é expresso em centeio, e o centeio, valor de troca, à medida que é expresso em trigo. Na medida em que cada uma das duas esteja em relação somente consigo mesma, não é valor de troca. Contudo, o próprio ouro, na relação em que aparece como medida, não é expresso como relação, como valor de troca, mas como quantidade natural de uma certa matéria, um peso natural de ouro ou de prata. Em geral, a mercadoria na qual é expresso o valor de troca de uma outra jamais é expressa como valor de troca, jamais como relação, mas como quantum determinado em sua constituição natural. Se 1 alqueire de trigo vale 3 alqueires de centeio, só o alqueire de trigo é expresso como valor de troca e não o alqueire de centeio. Na verdade, o outro também é posto em si; o 1 alqueire de centeio é então = 1/3 alqueire de trigo; mas isso não está posto, sendo apenas uma segunda relação, que está decerto imediatamente presente na primeira. Quando uma mercadoria é expressa em uma outra, o é como relação, ao passo que a outra é posta como simples quantum de uma determinada matéria. Três alqueires de centeio não são em si um valor, mas apenas centeio que ocupa determinado quantum de espaço, medido por uma medida espacial. O mesmo sucede com o dinheiro como medida, como unidade na qual os valores de troca das outras mercadorias são medidos. É um peso determinado da substância natural na qual é representado, ouro, prata etc. Se um alqueire de trigoi [tem] o preço de 77 sh. 7 d., ele é expresso como uma outra coisa à qual é igual, como 1 onça de ouro, como relação, como valor de troca. Mas uma onça de ouro não é em si um valor de troca; não é expressa como valor de troca; mas como determinado quantum de si mesma, de sua substância natural, de ouro. Se 1 alqueire de trigo tem o preço de 77 sh. 7 d. ou de uma onça de ouro, esse preço pode ser um valor maior ou menor, pois 1 onça de ouro aumentará ou diminuirá em valor em proporção à quantidade de trabalho exigida para sua produção. Mas isso é indiferente para a sua determinação de preço enquanto tal, dado que seu preço de 77 sh. 7 d. exprime exatamente a relação na qual ele é equivalente para todas as outras mercadorias, na qual pode comprá-las. A determinabilidade da determinação de preço, se o alqueire é 77 ou 1780 sh., não faz parte da determinação do preço propriamente dita, i.e., do pôr do trigo como preço. Ele tem um preço, custe ele 100 ou 1 sh. O preço expressa somente seu valor de troca em uma unidade comum a todas as mercadorias; pressupõe, portanto, que esse valor de troca já é regulado por outras relações. O fato de que 1 quarter de trigo tem o preço de 1 onça de ouro – visto que ouro e trigo, como coisas naturais, não têm absolutamente qualquer relação entre si, enquanto tais não são medida um para o outro, são mutuamente indiferentes – é certamente descoberto pelo fato de que a própria onça de ouro, por sua vez, é posta em relação com o tempo de trabalho necessário à sua produção e, desse modo, ambos, trigo e ouro, são postos em relação com uma terceira coisa, o trabalho, e nessa relação são igualados; pelo fato de que, por isso, ambos são comparados um com o outro como valores de troca. Mas isso só nos mostra como o preço do trigo foi descoberto, a quantidade de ouro à qual foi igualado. Nessa própria relação em que o dinheiro aparece como preço do trigo, ele próprio não é posto, por sua vez, como relação, como valor de troca, mas como quantum determinado de uma matéria natural. No valor de troca, as mercadorias (produtos) são postas como relações à sua substância social, o trabalho; mas, como preços, são expressas em quanta de outros produtos de acordo com suas constituições naturais. Certamente, agora pode ser dito que também o preço do dinheiro é posto como 1 quarter de trigo, 3 quarters de centeio e todas as outras quanta de distintas mercadorias cujo preço é 1 onça de ouro. Nesse caso, entretanto, para expressar o preço do dinheiro, seria necessário enumerar a totalidade das mercadorias, cada uma delas na quantidade em que é igual a 1 onça de ouro. O dinheiro teria, por conseguinte, tantos preços quantas fossem as mercadorias cujos preços ele mesmo exprimisse. A determinação principal do preço, a unidade, desapareceria. Nenhuma mercadoria expressaria o preço do dinheiro, porque nenhuma expressaria sua relação a todas as outras mercadorias, seu valor de troca universal. Mas o específico do preço é que o próprio valor de troca deve ser expresso em sua universalidade e, não obstante, em uma mercadoria determinada. Mas mesmo isso é indiferente. Na medida em que o dinheiro aparece como matéria na qual o preço de todas as mercadorias é expresso, é medido, o próprio dinheiro é posto como um quantum determinado de ouro, de prata etc., em síntese, de sua matéria natural; simples quantum de uma matéria determinada e não ele mesmo como valor de troca, como relação. Assim, toda mercadoria na qual uma outra é expressa como preço não é ela própria posta como valor de troca, mas como simples quantum de si mesma. Na determinação do dinheiro como unidade dos valores de troca, como sua medida, como seu ponto universal de comparação, sua matéria natural, ouro, prata, aparece como essencial, visto que o dinheiro, como preço da mercadoria, não é valor de troca, relação, mas um peso determinado de ouro, de prata; p. ex., a libra, com suas subdivisões, e desse modo o dinheiro também aparece originariamente como libra, aes grave[136]. É precisamente isso o que diferencia o preço do valor de troca, e vimos que o valor de troca compele necessariamente à determinação de preço. Daí o absurdo daqueles que fazem do tempo de trabalho enquanto tal um dinheiro, i.e., que desejam estabelecer e não estabelecer a diferença entre preço e valor de troca. O dinheiro como medida, como elemento da determinação do preço, como unidade de medida do valor de troca, apresenta assim o fenômeno de que 1) só é necessário como unidade imaginária uma vez determinado o valor de troca de uma onça de ouro com respeito a uma mercadoria qualquer; de que sua presença efetiva é supérflua e mais ainda, por consequência, a quantidade em que está presente; como indicador (indicadori do valor), é indiferente a sua quantidadei, quantidade em que existe em um país; necessário somente como unidade de conta; 2) enquanto só necessita ser posto idealmente e, de fato, como preço da mercadoria, só é posto nela idealmente, fornece simultaneamente, como quantum simples da substância natural na qual se apresenta como um peso determinado de ouro, prata etc. aceito como unidade, o ponto de comparação, a unidade, a medida. Os valores de troca (mercadorias) são transformados na imaginação em certas porções de ouro ou prata, e postos idealmente = esse quantum imaginário de ouro etc.; como expressando tal quantum.
Mas se passamos agora à segunda determinação do dinheiro, como meio de troca e realizador [Verwiklicher] dos preços, descobrimos que aqui o dinheiro tem de estar presente em quantidade determinada; que o peso de ouro ou de prata posto como unidade é necessário em uma quantidade de peças determinada para ser adequado a essa determinação. Sendo dada, por um lado, a soma dos preços a realizar, que depende do preço de uma mercadoria determinada × sua quantidade, e, por outro, a velocidade de circulação do dinheiro, uma certa quantidade de meio de circulação é requerida. Mas se consideramos mais de perto a forma originária, a forma imediata na qual se apresenta a circulação, M-D-D-M, o dinheiro aparece nela como puro meio de troca. A mercadoria é trocada por mercadoria, e o dinheiro aparece somente como meio de troca. O preço da primeira mercadoria é realizado em dinheiro de modo a realizar com o dinheiro o preço da segunda mercadoria e, assim, obtê-la em troca da primeira. Depois que o preço da primeira mercadoria é realizado, o objetivo daquele que obteve agora o seu preço em dinheiro não é obter o preço da segunda mercadoria, mas ele paga o seu preço para obter a mercadoria. No fundo, o dinheiro serviu-lhe, portanto, para trocar a primeira mercadoria pela segunda. Como simples meio de circulação, o dinheiro não tem nenhuma outra finalidade. O homem que vendeu sua mercadoria por dinheiro deseja comprar de novo a mercadoria, e aquele de quem ele a compra precisa novamente de dinheiro para comprar a mercadoria etc. Nessa determinação como puro meio de circulação, a determinação do próprio dinheiro consiste somente nesse curso que executa pelo fato de que sua quantidade é antecipadamente determinada; sua quantidade de peças. O número de vezes que o próprio dinheiro está presente como unidade nas mercadorias está predeterminado em seus preços e, como instrumento da circulação, aparece simplesmente como quantidade de peças dessa unidade pressuposta. Na medida em que o dinheiro realiza o preço das mercadorias, a mercadoria é trocada por seu equivalente real em ouro e prata; seu valor de troca é efetivamente expresso no dinheiro como uma outra mercadoria; porém, na medida em que esse processo só tem lugar para reconverter o dinheiro em mercadoria, por conseguinte, para trocar a primeira mercadoria pela segunda, o dinheiro só aparece de maneira fugaz, e sua substância consiste unicamente no fato de que o dinheiro aparece continuamente como tal fugacidade, como esse portador dessa mediação. O dinheiro como meio de circulação é somente meio de circulação. A única determinabilidade que lhe é essencial para poder funcionar nesse papel é a da quantidade, do número de unidades com que gira. (Dado que o número de unidades é codeterminado pela velocidade, esta última não precisa ser aqui mencionada em particular.) Na medida em que ele realiza o preço, sua existência material como ouro e prata é essencial; mas na medida em que essa realização é apenas fugaz e deve suprimir a si mesma, essa existência material é indiferente. É somente uma aparência, como se se tratasse de trocar a mercadoria por ouro ou prata como uma mercadoria particular; uma aparência que desvanece quando o processo está concluído, tão logo o ouro e a prata são de novo trocados por mercadoria e, com isso, mercadoria é trocada por mercadoria. Por essa razão, o ouro e a prata como simples meio de circulação, ou o meio de circulação como ouro e prata, é indiferente com respeito a sua qualidade como uma mercadoria natural particular. Suponha que o preço total das mercadorias em circulação = 10.000 táleres. A sua medida é, então, 1 táler = x peso de prata. Suponha agora que 100 táleres sejam necessários para fazer circular tais mercadorias em 6 horas; i.e., cada táler paga o preço de 100 táleres em 6 horas. O que é essencial agora é que 100 táleres, a quantidade de 100 peças da unidade que mede a soma total dos preços das mercadorias, está presente; 100 de tais unidades. Para o próprio processo é indiferente que tais unidades sejam de prata. Isso já se manifesta no fato de que um táler representa, no circuito da circulação, uma massa de prata 100 vezes maior em comparação à que realmente está contida nele, muito embora ele represente em cada troca determinada apenas o peso de prata de 1 táler. Considerado na totalidade da circulação, o 1 táler representa, portanto, 100 táleres, um peso de prata 100 vezes maior do que efetivamente contém. Ele é de fato só um signo para o peso de prata que está contido em 100 táleres. Realiza um preço 100 vezes maior do que o preço que ele, considerado como quantum de prata, efetivamente realiza. Suponha, p. ex., que a £ seja = 1/3 onça de ouro (não chega a tanto). Na medida em que o preço de uma mercadoria de £ 1 é pago, i.e., seu preço de £ 1 é realizado, que a mercadoria é trocada por £ 1, é crucial que a £ contenha efetivamente 1/3 onça de ouro. Fosse ela uma falsa £, composta de um metal não precioso, uma £ somente em aparência, o preço da mercadoria não seria de fato realizado; para realizá-lo, a mercadoria teria de ser paga em uma quantidade de metal não precioso = 1/3 onça de ouro. Visto de acordo com esse momento isolado da circulação, portanto, é essencial que a unidade monetária represente efetivamente um quantum determinado de ouro e de prata. No entanto, se tomamos a totalidade da circulação, a circulação como um processo fechado em si mesmo, M-D-D-M, a coisa se comporta de outra maneira. No primeiro caso, a realização do preço seria só aparente: somente parte de seu preço seria realizada. O preço nela posto idealmente não seria posto realmente. A mercadoria, que é idealmente posta = tantas partes de pesos de ouro, na troca efetiva não se resolveria em tantas partes de pesos de ouro. Mas se uma falsa £ circulasse no lugar de uma autêntica, prestaria absolutamente o mesmo serviço na circulação como um todo do que faria se fosse genuína. Se uma mercadoria A de £ 1 de preço é trocada por 1 falsa libra [esterlina] e essa falsa libra [esterlina] é trocada de novo pela mercadoria B de £ 1, a falsa libra [esterlina] prestou absolutamente o mesmo serviço como se fosse uma libra [esterlina] autêntica. Por isso, nesse processo, a libra [esterlina] efetiva é de fato apenas um signo, desde que não seja considerado o momento em que ela realiza os preços, mas somente a totalidade do processo em que só serve como meio de circulação e em que a realização dos preços é apenas uma aparência, uma mediação fugaz. Aqui, a libra [esterlina] de ouro serve unicamente para que a mercadoria A seja trocada pela mercadoria B de mesmo preço. A realização efetiva do preço da mercadoria A é, aqui, a mercadoria B, e a realização efetiva do preço de B é a mercadoria A, ou C, ou D, o que dá no mesmo para a forma da relação, para a qual é completamente indiferente o conteúdo particular da mercadoria. Mercadorias de mesmo preço são trocadas. Em lugar de a mercadoria A ser trocada diretamente pela mercadoria B, é trocado o preço da mercadoria A pela mercadoria B e o preço da mercadoria B pela mercadoria A. O dinheiro representa, assim, perante a mercadoria, só o seu preço. As mercadorias são trocadas entre si pelos seus preços. O próprio preço da mercadoria expressa nela, idealmente, que ela é a quantidade de uma certa unidade natural (de peso) de ouro ou de prata, que é a matéria em que o dinheiro está corporificado. No dinheiro, ou em seu preço realizado, confronta-se agora com a mercadoria uma quantidade efetiva dessa unidade. No entanto, na medida em que a realização do preço não é finalidade última e, por isso, não se trata de ter o preço da mercadoria como preço, mas como preço de uma outra mercadoria, a matéria do dinheiro é indiferente, p. ex., o ouro ou a prata. O dinheiro devém sujeito como instrumento da circulação, como meio de troca, e a matéria natural na qual se apresenta aparece como um acidentei cuja importância desaparece no próprio ato da troca; porque não é nessa matéria que a mercadoria trocada por dinheiro deve finalmente ser realizada, mas na matéria de outra mercadoria. Pois temos agora na circulação, além dos momentos em que 1) o dinheiro realiza os preços, e 2) faz circular os títulos de propriedade; ainda o momento 3) em que, mediado pela circulação, acontece o que não poderia suceder diretamente, ou seja, que o valor de troca da mercadoria é expresso em qualquer outra mercadoria. Se 1 vara de tecido custa 2 sh. e 1 libra de açúcar, 1 sh., a vara de tecido, mediada por 2 sh., é realizada em 2 libras de açúcar, sendo o açúcar, por conseguinte, transformado na matéria de seu valor de troca, na matéria em que seu valor de troca é realizado. Como simples meio de circulação, em seu papel no processo de circulação como fluxo contínuo, o dinheiro não é nem medida dos preços, pois enquanto tal já está posto nos próprios preços, nem meio de realização dos preços, pois enquanto tal existe em um dos momentos da circulação, mas desaparece na totalidade de seus momentos; ao contrário, é mero representante do preço frente a todas as mercadorias, e serve somente como meio para que mercadorias sejam trocadas pelo mesmo preço. O dinheiro é trocado por uma mercadoria qualquer porque é o representante universal de seu valor de troca e, enquanto tal, é o representante de toda outra mercadoria de mesmo valor de troca, é representante universal, e, nessa condição, está na própria circulação. Ele representa o preço de uma mercadoria frente a todas as outras mercadorias, ou o preço de todas as mercadorias frente a uma mercadoria. Nessa relação, ele é não somente representante do preço das mercadorias, mas signo de si mesmo; i.e., no próprio ato de circulação, a sua matéria, ouro e prata, é indiferente. Ele é o preço; é um determinado quantum de ouro ou de prata; porém, na medida em que essa realidade do preço é aqui somente uma realidade fugaz, uma realidade continuamente destinada a desaparecer, a ser abolida, a não valer como realização definitiva, mas permanecer única e constantemente uma realização intermediária, mediadora; na medida em que aqui não se trata em absoluto da realização do preço, mas da realização do valor de troca de uma mercadoria particular no material de uma outra mercadoria, o material próprio do dinheiro é indiferente, é efêmero como realização do preço, uma vez que esta mesma desaparece; por isso, enquanto está nesse constante movimento, [o dinheiro] só existe como representante do valor de troca, o qual só devém efetivo à medida que o valor de troca efetivo toma o lugar de seu representante de maneira contínua, troca constantemente de lugar com ele, constantemente se troca por ele. Nesse processo, portanto, a sua realidade não é a de que ele é o preço, mas de que ele o representa, é seu representante; representante objetivamente presente do preço, logo, de si mesmo, e, enquanto tal, do valor de troca das mercadorias. Como meio de troca, realiza os preços das mercadorias unicamente para pôr o valor de troca de uma mercadoria na outra como sua unidade, para realizar o seu valor de troca na outra mercadoria, i.e., para pôr a outra mercadoria como o material de seu valor de troca.
Somente na circulação, por conseguinte, o dinheiro é tal signo objetivo; retirado dela, é novamente preço realizado; mas no interior do processo, como vimos, a quantidade, o número desses signos objetivos da unidade monetária, é essencialmente determinada. Portanto, enquanto o dinheiro se encontra na circulação, onde aparece como dinheiro existente perante as mercadorias, sua substância material, seu substrato como quantum determinado de ouro e de prata é indiferente, ao passo que sua quantidade, pelo contrário, é essencialmente determinada, porque nesse caso ele é só um signo para determinada quantidade dessa unidade; contudo, em sua determinação como medida, em que o dinheiro só é usado idealmente, a sua substância material é essencial, embora sua quantidade e sua existência sejam absolutamente indiferentes. Segue-se daí que o dinheiro, como ouro e prata, na condição exclusiva de meio de circulação, meio de troca, pode ser substituído por qualquer outro signo que expresse um quantum determinado de sua unidade e, dessa maneira, o dinheiro simbólico pode substituir o dinheiro real, porque o próprio dinheiro material, como simples meio de troca, é simbólico.
A partir dessas contraditórias determinações do dinheiro como medida, como realização dos preços e como simples meio de troca, explica-se o fenômeno, de outro modo inexplicável, de que o dinheiro se deprecia e os preços se elevam quando o dinheiro metálico, ouro ou prata, é falsificado pela adição de metais inferiores; porque, nesse caso, a medida dos preços não são mais os custos de produção, digamos, da onça de ouro, mas da onça misturada com 2/3 de cobre etc. (as falsificações das moedas, na medida em que consistem simplesmente da falsificação ou modificação dos nomes das partes alíquotas de peso do metal precioso, que, p. ex., a oitava parte de uma onça seja denominada 1 soberanoi, deixam a medida absolutamente a mesma e modificam somente seu nome. Se antes ¼ da onça era denominado 1 soberanoi, e agora é 1/8, o preço de 1 soberanoi expressa não mais do que 1/8 onça de ouro; por conseguinte, são necessários (|cerca dei) 2 soberanosi para expressar o mesmo preço anteriormente expresso por 1 soberanoi); ou ainda, na mera falsificação do nome das partes alíquotas do metal precioso, a medida permanece a mesma, mas a parte alíquota é expressa no dobro de francosf etc. do que antes; de outro lado, se o substrato do dinheiro, ouro ou prata, é completamente suprimido e substituído por papel com o signo de quanta determinados de dinheiro real na quantidade requerida pela circulação, o papel gira ao valor total do ouro e da prata. No primeiro caso, porque o meio de circulação é ao mesmo tempo o material do dinheiro como medida e o material no qual o preço se realiza em definitivo; no segundo caso, porque o dinheiro [está] unicamente em sua determinação como meio de circulação.
Ilustração do equívoco grosseiro a respeito das contraditórias determinações do dinheiro: “|O preço é exatamente determinado pela quantidade de dinheiro que existe para se comprar com ele. Todas as mercadorias do mundo não podem valer mais do que todo o dinheiro do mundoi.” Em primeiro lugar, a determinação de preço nada tem a ver com a venda efetiva; nela, o dinheiro [existe] somente como medida. Em segundo lugar, todas as mercadorias (que se encontram em circulação) poderiam valer mil [vezes] mais do que o dinheiroi existente no mundoi se cada peçai de dinheiro circulasse mil vezes[137].
Como a soma total dos preços a ser realizados na circulação varia com os preços e com a massa das mercadorias lançadas na circulação; como, por outro lado, a velocidade do meio de circulação em curso é igualmente determinada por circunstâncias dele mesmo independentes, a quantidade dos meios de circulação tem de poder variar, se dilatar ou contrair – contração e expansão da circulação.
Do dinheiro como simples meio de circulação pode-se dizer que deixa de ser mercadoria (mercadoria particular) na medida em que seu material é indiferente e que satisfaz somente a necessidade da própria circulação, nenhuma outra necessidade imediata: ouro e prata deixam de ser mercadorias tão logo circulam como dinheiro. Por outro lado, pode ser dito do dinheiro que é somente mercadoria (mercadoria universal), a mercadoria em sua forma pura, indiferente à sua particularidade natural e, por isso, indiferente a todas necessidades imediatas, sem relação natural com determinada necessidade enquanto tal. Os partidários do sistema monetário e mesmo, em parte, do sistema protecionista (ver, p. ex., Ferrier, p. 2)[138] se fixaram no primeiro aspecto, os economistas modernos, no segundo; Say[139], p. ex., que diz que o dinheiro deve ser tratado como uma mercadoria “particular”, uma mercadoria como qualquer outra. Como meio de troca, o dinheiro se manifesta como mediador necessário entre produção e consumo. No sistema de dinheiro desenvolvido, se produz somente para trocar, ou se produz somente à medida que se troca. Eliminado o dinheiro, ou se seria lançado de volta a um estágio muito inferior de produção (correspondente àquele estágio em que a troca direta cumpria um papel acessório), ou se passaria a um estágio mais elevado, no qual o valor de troca não seria mais a primeira determinação da mercadoria porque o trabalho universal, do qual [é] representante, não mais se manifestaria somente enquanto trabalho privado mediado para a coletividade.
Da mesma maneira, resolve-se facilmente se o dinheiro como meio de circulação é produtivo ou não produtivo. De acordo com Adam Smith, o dinheiro é improdutivo[140]. Porém, afirma Ferrier, p. ex.: “Ele cria os valoresf porque estes não existiriam sem ele”[141]. Tem-se de “considerar não apenas seu valor como metal, mas igualmente sua qualidade como dinheiro”[142]. Smith tem razão, na medida em que o dinheiro não é o instrumento de um ramo particular qualquer de produção; Ferrier tem razão, porque um momento da produção universal fundada sobre o valor de troca é o de pôr o produto e o agente de produção na determinação do dinheiro, e porque essa determinação subentende um dinheiro diferente do produto; porque a própria relação de dinheiro é uma relação de produção quando a produção é considerada em sua totalidade.
Na medida em que M-D-D-M é decomposta em seus dois momentos, a despeito dos preços das mercadorias estarem pressupostos (e isso faz grande diferença), a circulação se divide em dois atos da troca direta imediata: M-D; o valor de troca da mercadoria é expresso em outra mercadoria particular, no material do dinheiro, assim como o valor de troca do dinheiro é expresso na mercadoria; da mesma forma em D-M. A esse respeito, A. Smith tem razão quando afirma que o dinheiro, como meio de troca, é somente uma espécie mais complicada de escamboi (troca direta)[143]. Porém, se é considerada a totalidade do processo, e não os dois momentos como atos indiferentes, em que a mercadoria é realizada no dinheiro e o dinheiro na mercadoria, têm razão os adversários de A. Smith quando afirmam que ele interpretou mal a natureza do dinheiro e que a circulação de dinheiro expulsa o escambo; uma vez que o dinheiro serve somente para saldar a “|divisão aritméticai” que resulta da divisão do trabalho[144]. Tais “|cifras aritméticasi” têm tão pouca necessidade de ser de ouro e prata quanto as medidas de comprimento. (Ver Solly, p. 20.)[145]
As mercadorias se convertem de mercadoriasf em gênerosf [denrées] e ingressam no consumo; não o dinheiro, como meio de circulação; em nenhum ponto deixa de ser mercadoria, desde que permaneça na determinação de meio de circulação.
Passamos agora à terceira determinação do dinheiro, que, de início, resulta da segunda forma de circulação:
D-M-M-D, na qual o dinheiro não se manifesta somente como meio, tampouco apenas como medida, mas como fim-em-si-mesmo e, por isso, sai da circulação exatamente como a mercadoria particular que por ora conclui seu movimento circular, e de mercadoriaf devém gênerof [dennrée].
Antes, é preciso observar ainda que, pressuposta a determinação do dinheiro como uma relação imanente da produção universal fundada sobre o valor de troca, sua função como instrumento de produção pode ser demonstrada em alguns casos singulares. “A utilidade do ouro e da prata baseia-se no fato de que substituem trabalho”. (Lauderdale, p. 11.)[146] Sem dinheiro, é necessária uma série de permutasf antes que o objeto desejado seja obtido na troca. Além disso, em cada troca particular seria necessário realizar uma investigação sobre o valor relativo das mercadorias. A primeira tarefa poupa o dinheiro como instrumento de troca (instrumento do comércio); a segunda, como medida do valor e representante de todas as mercadorias. (Idem, l. c.)[147] A afirmação oposta, de acordo com a qual o dinheiro não é produtivo, diz apenas que é improdutivo fora da determinabilidade na qual é produtivo, como medida, instrumento de circulação e representante dos valores, que sua quantidade somente é produtiva à medida que é requerida para satisfazer tais determinações. O fato de que devém não somente improdutivo, mas |gastos gerais de produçãof, tão logo é utilizado em quantidade maior do que a necessária a essa sua determinação produtiva, é uma verdade que vale para qualquer outro instrumento de produção e de troca; tanto para a máquina como para o meio de transporte. Mas caso se pretenda dizer com isso que o dinheiro troca apenas riqueza real existente, então é falso, pois o dinheiro também é trocado e compra trabalho, a própria atividade produtiva, riqueza potencial.
A terceira determinação do dinheiro, em seu desenvolvimento completo, pressupõe as duas primeiras determinações e é a sua unidade. O dinheiro tem, portanto, uma existência autônoma fora da circulação; saiu da circulação. Como mercadoria particular, pode ser transformado de sua forma dinheiro em objetos de luxo, joias de ouro e prata (enquanto o trabalho artesanal é muito simples, como, p. ex., no período inglês mais antigo, [é] constante a transformação de moedas de prata em pratariai e vice-versa. Ver Taylor[148]); ou, como dinheiro, pode ser acumulado e, assim, constituir um tesouro. Na medida em que provém da circulação em sua existência autônoma, o dinheiro se manifesta nessa mesma existência como resultado da circulação; ele se fecha sobre si mesmo pela circulação. Nessa determinabilidade já está contida de maneira latente sua determinação como capital. É negado apenas como meio de troca. No entanto, dado que historicamente pode ser posto como medida antes de se manifestar como meio de troca, e pode manifestar-se como meio de troca antes de ser posto como medida – neste último caso, existiria somente como mercadoria privilegiada –, então pode também o dinheiro manifestar-se historicamente na terceira determinação antes de ser posto nas duas anteriores. Mas o ouro e a prata, como dinheiro, só podem ser acumulados se já existirem em uma das duas determinações, e o dinheiro somente pode se manifestar desenvolvido na terceira determinação se está desenvolvido nas duas anteriores. Do contrário, sua acumulação é apenas acumulação de ouro e prata, não de dinheiro.
(Tratar em detalhe, como um exemplo particularmente interessante, a acumulação de dinheiro de cobre nos períodos mais antigos da República romana.)
Na medida em que o dinheiro, como representante material universal da riqueza, provém da circulação e, enquanto tal, é ele mesmo produto da circulação, circulação que é ao mesmo tempo troca em uma potência mais elevada e uma forma particular da troca, o dinheiro nessa terceira determinação também está em relação com a circulação; confronta a circulação de maneira autônoma, mas essa sua autonomia é apenas o próprio processo da circulação. O dinheiro provém da circulação do mesmo modo pelo qual novamente nela ingressa. Fora de toda relação com a circulação, não seria dinheiro, mas um simples objeto natural, ouro e prata. Nessa determinação, é igualmente pressuposto e resultado da circulação. A sua própria autonomia não é a supressão de sua relação com a circulação, mas relação negativa a ela. Isso está contido nessa autonomia enquanto resultado de D-M-M-D. No próprio dinheiro, enquanto capital, está posto que 1) é igualmente pressuposto e resultado da circulação; 2) sua própria autonomia, por essa razão, é somente relação negativa, mas ainda assim relação com a circulação; 3) ele próprio é posto como instrumento de produção, na medida em que a circulação não mais se manifesta em sua simplicidade primeira, como troca quantitativa, mas como processo de produção, como metabolismo real. Desse modo, o próprio dinheiro é determinado como momento particular desse processo de produção. Na produção, não se trata apenas de uma simples determinação de preço, i.e., de traduzir os valores de troca das mercadorias em uma unidade comum, mas da criação dos valores de troca e, por conseguinte, também da criação da determinabilidade dos preços. Não se trata apenas do simples pôr da forma, mas do conteúdo. Se, em virtude disso, na circulação simples o dinheiro em geral se manifesta como produtivo, na medida em que a própria circulação é em geral um momento do sistema de produção, tal determinação é somente para nós, ainda não está posta no dinheiro. 4) Por isso, o dinheiro, enquanto capital, se manifesta igualmente posto como relação consigo mesmo mediado pela circulação – na relação dos juros e do capital. No entanto, aqui não temos ainda de tratar dessas determinações, mas simplesmente considerar o dinheiro tal como emergiu em sua terceira determinação, como dinheiro autônomo em face da circulação, como emergiu efetivamente de suas duas determinações anteriores.
(“Um aumento do dinheiro [é] somente aumento dos meios de conta.”[149] Isso é correto somente na medida em que o dinheiro é determinado como simples meio de troca. Na outra propriedade, é igualmente aumento dos meios de pagamento.)
“O comércio separou a sombra do corpo e introduziu a possibilidade de possuí-los separadamente.”[150] O dinheiro é agora, portanto, o valor de troca autonomizado (enquanto tal, manifesta-se como meio de troca sempre evanescente) em sua forma universal. Possui, sem dúvida, uma corporalidade ou substância particular, ouro e prata, e é justamente essa que lhe confere sua autonomia, pois aquilo que existe somente em outro como determinação ou relação não é autônomo. Por outro lado, nessa corporalidade autônoma, como ouro e prata, o dinheiro representa não apenas o valor de troca de uma mercadoria em relação às outras, mas o valor de troca em relação a todas as mercadorias, e, não obstante ele próprio possua uma substância, manifesta-se simultaneamente, em sua existência particular como ouro e prata, como o valor de troca universal das outras mercadorias. De um lado, é possuído enquanto valor de troca das mercadorias; de outro, as mercadorias figuram umas tantas substâncias particulares do valor de troca, que pode, desse modo, transformar-se igualmente em qualquer uma dessas mercadorias por meio da troca, uma vez que é indiferente e superior à sua determinabilidade e particularidade. As mercadorias são, por conseguinte, apenas existências contingentes. Ele [o dinheiro] é o “epítome de todas as coisas”[151], no qual se apaga o seu caráter particular; a riqueza universal como conciso compêndio perante a sua extensão e fragmentação no mundo das mercadorias. Como a riqueza aparece na mercadoria particular como um momento de si mesma, ou a mercadoria como um momento particular da riqueza, no ouro e na prata a própria riqueza universal aparece concentrada em uma matéria particular. Toda mercadoria particular, na medida em que é valor de troca, que tem preço, expressa ela mesma tão somente um determinado quantum de dinheiro em uma forma incompleta, porque deve primeiro ser lançada na circulação para ser realizada, mas, devido à sua particularidade, permanece contingente o fato de que seja realizada ou não. No entanto, na medida em que figura não como preço, mas em sua determinabilidade natural, a mercadoria é apenas momento da riqueza por sua relação com uma necessidade particular que satisfaz, e expressa nessa relação 1) apenas a riqueza de uso, 2) apenas um aspecto muito particular dessa riqueza. O dinheiro, ao contrário, abstraindo de sua particular utilidade como mercadoria valiosa, é 1) o preço realizado; 2) satisfaz qualquer necessidade, uma vez que pode ser trocado pelo objeto de qualquer necessidade, pode ser trocado de modo totalmente indiferente por qualquer particularidade. A mercadoria possui essa propriedade unicamente mediada pelo dinheiro. O dinheiro a possui diretamente frente a todas as mercadorias e, por isso, frente ao inteiro mundo da riqueza, à riqueza enquanto tal. No dinheiro, a riqueza universal é não apenas uma forma, mas simultaneamente o próprio conteúdo. O conceito de riqueza está, por assim dizer, realizado, individualizado, em um objeto particular. Na mercadoria particular, na medida em que é preço[152], a riqueza é posta somente como forma ideal que ainda não está realizada; na medida em que é um valor de uso determinado, representa apenas um aspecto completamente isolado da riqueza. No dinheiro, ao contrário, o preço está realizado e a sua substância é a própria riqueza, tanto na abstração de seus modos de existência particulares como em sua totalidade. O valor de troca forma a substância do dinheiro, e o valor de troca é a riqueza. Por isso, o dinheiro é também, por outro lado, a forma corporificada da riqueza ante todas as substâncias particulares das quais consiste a riqueza. Portanto, se, de um lado, forma e conteúdo da riqueza são idênticos no dinheiro, na medida em que ele seja considerado em si mesmo, de outro, o dinheiro é, em oposição a todas as outras mercadorias, a forma universal da riqueza perante as mercadorias, enquanto a totalidade dessas particularidades forma a sua substância. Se o dinheiro, de acordo com a primeira determinação, é a própria riqueza, de acordo com a segunda, é o representante material universal da riqueza. Tal totalidade existe no próprio dinheiro como quintessência imaginária das mercadorias. Portanto, a riqueza (valor de troca como totalidade e como abstração) existe enquanto tal individualizada, com a exclusão de todas as outras mercadorias, no ouro e na prata, como um objeto tangível singular. O dinheiro, por isso, é o deus entre as mercadorias.
Em razão disso, o dinheiro, como objeto tangível singularizado, pode ser acidentalmente buscado, achado, roubado, descoberto, e a riqueza universal pode ser tangivelmente incorporada às posses de um indivíduo singular. De sua figura de servo, na qual se manifesta como simples meio de circulação, converte-se repentinamente em senhor e deus no mundo das mercadorias. Representa a existência celeste das mercadorias, enquanto as mercadorias representam sua existência mundana. Cada forma da riqueza natural, antes de ser deslocada pelo valor de troca, presume uma relação essencial do indivíduo com o objeto, de modo que o próprio indivíduo, de um lado, se objetiva na coisa e, de outro, sua posse da coisa se manifesta como um desenvolvimento determinado de sua individualidade; a riqueza em ovelhas, o desenvolvimento do indivíduo como pastor, a riqueza como cereal, seu desenvolvimento como agricultor, etc. O dinheiro, pelo contrário, como o indivíduo da riqueza universal, como proveniente ele mesmo da circulação e representando exclusivamente o universal, como resultado unicamente social, não pressupõe absolutamente qualquer relação individual com seu possuidor; sua posse não é o desenvolvimento de qualquer um dos aspectos essenciais de sua individualidade, mas, ao contrário, posse do desprovido de individualidade, uma vez que essa [relação] social existe ao mesmo tempo como objeto sensível, exterior, do qual se pode apoderar mecanicamente e que da mesma forma pode ser perdido. Logo, sua relação ao indivíduo manifesta-se como puramente contingente; ao passo que, ao mesmo tempo, essa relação a uma coisa sem absolutamente nenhuma relação com sua individualidade lhe confere, pelo caráter dessa coisa, o poder universal sobre a sociedade, sobre o inteiro mundo dos prazeres, dos trabalhos etc. Seria, p. ex., como se o achar de uma pedra me proporcionasse, independentemente de minha individualidade, a possessão de todas as ciências. A possessão do dinheiro me coloca em relação com a riqueza (social) exatamente na mesma relação que a pedra filosofal me colocaria com as ciências.
Por essa razão, o dinheiro não é apenas um objeto da mania de enriquecimento, mas sim o seu objeto. A mania de enriquecimento é por essência auri sacra fames[153]. A mania de enriquecimento enquanto tal, como uma forma particular de pulsão, i.e., diferente da obsessão por riqueza particular, p. ex., por roupas, armas, joias, mulheres, vinho etc., só é possível quando a riqueza universal, a riqueza enquanto tal, está individualizada em uma coisa particular, i.e., quando o dinheiro está posto em sua terceira determinação. O dinheiro, portanto, não é apenas o objeto, mas, ao mesmo tempo, a fonte da mania de enriquecimento. A ganância também é possível sem dinheiro; a mania de enriquecimento é o produto de um determinado desenvolvimento social, desenvolvimento que não é natural, por oposição ao histórico. Daí a lamentação dos antigos sobre o dinheiro como a fonte de todos os males. A mania por prazer em sua forma universal e a avareza são as duas formas particulares da avidez por dinheiro. A mania abstrata por prazer pressupõe um objeto que contenha a possibilidade de todos os prazeres. A mania abstrata por prazer efetiva o dinheiro na determinação em que ele é o representante material da riqueza; e efetiva a avareza, na medida em que o dinheiro é somente a forma universal da riqueza diante das mercadorias como suas substâncias particulares. Para reter o dinheiro enquanto tal, a avareza tem de sacrificar e renunciar a toda relação com os objetos das necessidades particulares, de modo a satisfazer a necessidade da avidez por dinheiro enquanto tal. A avidez por dinheiro e a mania de enriquecimento são necessariamente o ocaso das antigas comunidades. Daí a oposição ao dinheiro. O próprio dinheiro é a comunidade, e não pode tolerar nenhuma outra superior a ele. Mas isso pressupõe o pleno desenvolvimento dos valores de troca e, por conseguinte, uma organização da sociedade [correspondente] a tal desenvolvimento. Entre os antigos, o valor de troca não era o nexus rerum[154]; só se manifesta assim entre os povos comerciantes, que, no entanto, tinham apenas |comércio itinerantei e não produziam para si mesmos. Ao menos era coisa secundária entre os fenícios, cartagineses etc. Eles podiam viver tão bem nos interstícios do mundo antigo quanto os judeus na Polônia ou na Idade Média. Mais precisamente, esse mesmo mundo era o pressuposto de tais povos comerciantes. Eles pereceram toda vez que entraram em sério conflito com as comunidades antigas. Entre os romanos, gregos etc., o dinheiro se manifesta, de início, de modo ingênuo em suas duas primeiras determinações, medida e meio de circulação, mas pouco desenvolvido em ambas. Entretanto, tão logo se desenvolve seu comércio etc., ou, como entre os romanos, tão logo a conquista lhes traz dinheiro em grande quantidade – em síntese, de maneira repentina, em uma certa etapa de seu desenvolvimento econômico o dinheiro manifesta-se necessariamente em sua terceira determinação, e quanto mais se desenvolve naquela determinação, maior o declínio de sua comunidade. Para atuar produtivamente, como vimos, o dinheiro em sua terceira determinação deve ser não apenas pressuposto, mas, igualmente, resultado da circulação, e, como pressuposto dela mesma, ser um momento seu, algo posto por ela. Esse não era o caso entre os romanos, p. ex., que o estavam roubando do mundo inteiro. É intrínseco à determinação simples do próprio dinheiro que ele só pode existir como momento desenvolvido da produção ali onde existe o trabalho assalariado; que ali, igualmente, longe de dissolver a forma de sociedade, o dinheiro é muito mais uma condição de seu desenvolvimento e um motor do desenvolvimento de todas as forças produtivas, materiais e espirituais. Mesmo hoje em dia, um indivíduo singular pode ganhar dinheiro por acaso, e, assim, sua posse pode ter sobre ele um efeito igualmente dissolvente, tal como teve sobre a antiga comunidade. Mas a própria dissolução desse indivíduo na sociedade moderna é apenas o enriquecimento da parte produtiva da própria sociedade. O possuidor do dinheiro, no sentido antigo, é dissolvido pelo processo industrial ao qual serve a despeito de seu saber e querer. A dissolução afeta apenas sua pessoa. Como representante material da riqueza universal, como o valor de troca individualizado, o dinheiro deve ser imediatamente objeto, fim e produto do trabalho universal, do trabalho de todos os singulares. O trabalho tem de produzir imediatamente o valor de troca, i.e., dinheiro. Por essa razão, tem de ser trabalho assalariado. A mania de enriquecimento, como pulsão de todos, porquanto cada um quer produzir dinheiro, cria a riqueza universal. Só desse modo a mania de enriquecimento universal pode devir a fonte da riqueza universal que se reproduz de maneira contínua. Quando o trabalho é trabalho assalariado, e sua finalidade é imediatamente dinheiro, a riqueza universal é posta como sua finalidade e seu objeto. (A esse respeito, comentar sobre o contexto do sistema militar antigo, tão logo se converteu em sistema mercenário.) O dinheiro como finalidade devém aqui meio da laboriosidade universal. A riqueza universal é produzida para se apoderar de seu representante. Assim são abertas as fontes efetivas da riqueza. Como a finalidade do trabalho não é um produto particular que está em uma relação particular com as necessidades particulares do indivíduo, mas dinheiro, a riqueza em sua forma universal, então, em primeiro lugar, a laboriosidade do indivíduo não tem nenhum limite; é indiferente em relação à sua particularidade e assume qualquer forma que serve à finalidade; é engenhosa no criar novos objetos para a necessidade social etc. É claro, portanto, que, sobre a base do trabalho assalariado, o dinheiro não tem efeito dissolvente, mas produtivo; enquanto a comunidade antiga já em si mesma está em contradição com o trabalho assalariado como fundamento universal. A indústria universal somente é possível ali onde cada trabalho produz a riqueza geral, e não uma forma sua determinada; onde, portanto, também o salário do indivíduo é dinheiro. Caso contrário, são possíveis apenas formas particulares de laboriosidade. O valor de troca como produto imediato do trabalho é dinheiro como produto imediato do trabalho. O trabalho imediato que produz o valor de troca enquanto tal é, por isso, trabalho assalariado. Onde o próprio dinheiro não é a comunidade, tem de dissolver a comunidade. O homem da Antiguidade podia comprar trabalho imediato, um escravo; mas o escravo não podia comprar dinheiro com o seu trabalho. O aumento do dinheiro podia tornar os escravos mais caros, mas não tornava seu trabalho mais produtivo. A escravidão de negros – uma escravidão puramente industrial –, que, em todo caso, desaparece com o desenvolvimento da sociedade burguesa e é com ela incompatível, pressupõe o trabalho assalariado, e se outros Estados livres, com trabalho assalariado, não existissem ao lado de tal escravidão, mas a isolassem, imediatamente todas as condições sociais nos Estados escravistas se converteriam em formas pré-civilizadas.
O dinheiro como valor de troca individualizado e, por isso, como riqueza encarnada, foi buscado na alquimia: figura nessa determinação no sistema monetário (mercantil). A época que precede o desenvolvimento da moderna sociedade industrial é inaugurada com a avidez universal pelo dinheiro, tanto dos indivíduos como dos Estados. O desenvolvimento efetivo das fontes de riqueza ocorre, por assim dizer, à sua revelia, como meio de se apoderar do representante da riqueza. Ali onde o dinheiro não tem origem na circulação – como na Espanha –, mas é encontrado diretamente, empobrece a nação, enquanto as nações que têm de trabalhar para retirá-lo dos espanhóis desenvolvem as fontes da riqueza e efetivamente se enriquecem. Por isso, a busca e a descoberta de ouro em novas partes do mundo, em novos países, desempenham um papel tão importante na história da revolução, pois nesse caso a colonização é improvisada, avança de maneira artificial. A caça ao ouro em todos os países conduz ao seu descobrimento; à formação de novos Estados; antes de tudo, à ampliação das mercadorias ingressando na circulação, [induzindo] novas necessidades, e atraindo distantes regiões do mundo para o processo de troca e de metabolismo. Por conseguinte, sob esse aspecto, como representante universal da riqueza, como valor de troca individualizado, o dinheiro foi igualmente um duplo meio para ampliar a riqueza à universalidade e para estender as dimensões da troca a todo o mundo; para criar, pela primeira vez, quanto à matéria e ao espaço, a efetiva universalidade do valor de troca. No entanto, é inerente à determinação aqui desenvolvida que a ilusão sobre a sua natureza, i.e., a fixação de uma de suas determinações em sua abstração e com a cegueira diante das contradições nela própria contidas, confere-lhe esse significado efetivamente mágico à revelia dos indivíduos. Na verdade, em virtude dessa determinação em si mesma contraditória e, por isso, ilusória, o dinheiro devém um instrumento tão extraordinário no desenvolvimento efetivo das forças produtivas sociais[155].
O pressuposto elementar da sociedade burguesa é que o trabalho produz imediatamente valor de troca, por conseguinte, dinheiro; e então, igualmente, que o dinheiro compra imediatamente o trabalho e, por isso, o trabalhador tão somente na medida em que ele próprio aliena sua atividade na troca. Portanto, trabalho assalariado, por um lado, e capital, por outro, são apenas outras formas do valor de troca desenvolvido e do dinheiro enquanto sua encarnação. Com isso, o dinheiro é, ao mesmo tempo, imediatamente a comunidade real, uma vez que é a substância universal da existência para todos e o produto coletivo de todos. No entanto, a comunidade no dinheiro, como já vimos, é pura abstração, pura coisa exterior e contingente para o singular e, simultaneamente, puro meio de sua satisfação como singular isolado. A comunidade antiga pressupõe uma relação completamente distinta do indivíduo para si. Portanto, o desenvolvimento do dinheiro em sua terceira determinação rompe tal relação. Toda produção é uma objetivação do indivíduo. Porém, no dinheiro (valor de troca), a objetivação do indivíduo não é a sua objetivação em sua determinabilidade natural, mas sua objetivação como posto em uma determinação (relação) social que simultaneamente lhe é exterior.
O dinheiro posto na forma de meio de circulação é moeda. Como moeda, perde seu próprio valor de uso; seu valor de uso coincide com sua determinação como meio de circulação. Tem de ser primeiro refundido para, p. ex., poder funcionar como dinheiro enquanto tal. Tem de ser desmonetizado. Por essa razão, na moeda, o dinheiro é também apenas um signo e é indiferente ao seu material. Como moeda, no entanto, perde também o seu caráter universal, adota um caráter nacional, local. Decompõe-se em moedas de vários tipos, de acordo com o material de que consiste, ouro, cobre, prata etc. Recebe um título político e fala, por assim dizer, uma língua diferente nos diferentes países. Finalmente, em seu próprio país recebe distintas denominações etc. Por isso, o dinheiro, em sua terceira determinação como dinheiro autonomamente saído da e contraposto à circulação, nega ainda seu caráter como moeda. Reapresenta-se como ouro ou prata, seja refundido, seja apenas avaliado de acordo com seu peso de ouro ou prata. Também perde novamente o seu caráter nacional e funciona como meio de troca entre as nações, como meio de troca universal, não mais como signo, mas como um determinado quantum de ouro e prata. Por essa razão, no sistema de troca internacional mais desenvolvido o ouro e a prata reaparecem na mesma forma com a qual cumpriram um papel nos escambos originários. Como já assinalado, o ouro e a prata, assim como a própria troca, aparecem originariamente não no interior do círculo de uma comunidade social, mas sim ali onde tal comunidade termina, em sua fronteira; nos escassos pontos de contato com comunidades estrangeiras. O ouro [ou prata] aparece agora posto como a mercadoria enquanto tal, a mercadoria universal que conserva em todos os lugares o seu caráter de mercadoria. Em virtude dessa determinação formal, vale uniformemente em todos os lugares. Somente assim é o representante material da riqueza universal. Por isso, no sistema mercantilista, o ouro e a prata figuram como medida do poder das distintas comunidades. “Tão logo os |metais preciososi devêm |objetos do comércio, um equivalente universal de todas as coisasi, eles devêm igualmente |medida de poder entre as naçõesi. Daí o sistema mercantilista.” (Steuart.)[156] Por mais que os modernos economistas se pretendam superiores ao sistema mercantilista, em períodos de crises gerais o ouro e a prata se apresentam precisamente nessa determinação, tanto em 1857 como em 1600[157]. Nesse caráter, ouro e prata [desempenham] papel importante na criação do mercado mundial. Assim, a circulação da prata americana do oeste para o leste; por um lado, o vínculo metálico entre América e Europa e, por outro, com a Ásia desde o início da época moderna. Entre as comunidades originárias, esse comércio com ouro e prata, assim como a totalidade da troca, eram assessórios, relacionados ao supérfluo. No comércio desenvolvido, entretanto, é posto como um momento que está essencialmente ligado à produção etc. como um todo. O dinheiro aparece não mais como a troca do excedente, mas como saldo do excedente no processo global da troca internacional de mercadorias. Agora, é moeda tão somente como moeda mundial. Porém, enquanto tal, é essencialmente indiferente à sua determinação formal como meio de circulação, enquanto sua matéria é tudo. Como forma, o ouro e a prata, nessa determinação, permanecem como a mercadoria de acessibilidade geral, a mercadoria enquanto tal.
(Nessa primeira seção, em que são considerados valor de troca, dinheiro, preço, as mercadorias sempre aparecem como dadas[158]. A determinação formal é simples. Sabemos que elas exprimem determinações da produção social, mas a própria produção social é pressuposta. Mas elas não são postas nessa determinação. Dessa maneira, a primeira troca aparece, na verdade, como troca exclusivamente do supérfluo, que não submete nem determina a totalidade da produção. É o excedente existente de uma produção global, que se situa fora do mundo dos valores de troca. Da mesma forma, também na sociedade desenvolvida as coisas se apresentam na superfície como mundo de mercadorias imediatamente existente. Mas essa própria superfície aponta para além de si mesma, para as relações econômicas que são postas como relações de produção. Por isso, a articulação interna da produção constitui a segunda seção; sua síntese no Estado, a terceira; a relação internacional, a quarta; o mercado mundial, a conclusão, em que a produção é posta como totalidade, assim como cada um de seus momentos; na qual, porém, todas as contradições simultaneamente entram em processo. O mercado mundial, portanto, constitui ao mesmo tempo o pressuposto e o portador da totalidade. As crises são, nesse caso, a indicação universal para além do pressuposto e o impulso para a adoção de uma nova configuração histórica.)
“|A quantidade de bens e a quantidade de dinheiro podem permanecer as mesmas e, a despeito disso, o preço pode aumentar ou diminuiri” (a saber, pelo maior gastoi, p. ex., dos |capitalistas endinheiradosi, rentistas fundiários, funcionários públicos etc. Malthus, X, 43)[159].
Como vimos, o dinheiro, como algo autônomo, destaca-se da circulação e com ela se confronta, é a negação (unidade negativa) de sua determinação como meio de circulação e medida. Já desenvolvemos:
{Na medida em que o dinheiro é meio de circulação, “a quantidade de dinheiro que circula nunca pode ser utilizada individualmente; ela sempre deve circular”[160]. O indivíduo somente pode usar o dinheiro à medida que se desfaz do seu, que o põe, em sua determinação social, como ser para outro. Essa é uma razão, como assinala corretamente Storch, pela qual a matéria do dinheiro “não pode ser imprescindível para a existência do ser humano”[161], como, p. ex., peles, sal etc., que entre certos povos servem como dinheiro. Pois a quantidade do mesmo que se encontra em circulação está perdida para o consumo. Por isso, em primeiro lugar, os metais [desfrutam] em geral a preferência como dinheiro em relação às outras mercadorias e, em segundo lugar, os metais preciosos são preferíveis aos metais utilizáveis como instrumentos de produção. É característica dos economistas a maneira como Storch o expressa: a matéria do dinheiro deveria “ter valor direto, mas com base em uma |necessidade artificialf”[162]. O economista denomina |necessidade artificialf, primeiro, as necessidadesf que têm origem na existência social do indivíduo; segundo, aquelas que não fluem de sua crua existência como objeto natural. Isso mostra a pobreza intrinsecamente desesperada que constitui o fundamento da riqueza burguesa e de sua ciência.}
Primeiro: o dinheiro é a negação do meio de circulação enquanto tal, da moeda. Mas simultaneamente a contém como sua determinação, negativamente, na medida em que pode ser reconvertido em moeda de maneira contínua; positivamente, como moeda mundial; mas, enquanto tal, é indiferente à determinação formal e é essencialmente mercadoria enquanto tal, mercadoria onipresente, não determinada pelo lugar. Essa indiferença se expressa duplamente: primeiro, no fato de que agora é dinheiro somente como ouro e prata, não como signo, não com a forma de moeda. Por essa razão, a feiçãof que o Estado dá ao dinheiro na moeda não tem qualquer valor, mas somente seu conteúdo metálico. Mesmo no comércio doméstico o dinheiro tem um valor apenas temporário, local, “porque não é mais útil àquele que o possui do que àquele que possui mercadorias à venda”[163]. Quanto mais o comércio doméstico é condicionado por todos os lados pelo comércio exterior, tanto mais desvanece também o valor dessa feiçãof: não existe na troca privada, mas aparece somente como imposto. Logo: na qualidade de tal mercadoria universal, como moeda mundial, o retorno do ouro e da prata ao ponto de partida, enfim, a circulação enquanto tal não é necessária. Exemplo: Ásia e Europa. Daí as lamentações dos partidários do sistema monetário de que o dinheiro desaparece entre os pagãos, não reflui. (Ver Misselden a[bout] 1600.[164]) Quanto mais a circulação exterior é condicionada e envolvida pela doméstica, tanto mais o dinheiro mundial enquanto tal entra em circulação (rotação). Esse estágio ainda não nos concerne aqui e ainda não entra na relação simples que aqui consideramos.
Segundo: o dinheiro é a negação de si mesmo como mera realização dos preços das mercadorias, na qual a mercadoria particular sempre permanece sendo o essencial. O dinheiro devém, ao contrário, o preço realizado em si mesmo e, enquanto tal, o representante material da riqueza, tanto como a forma universal da riqueza perante todas as mercadorias quanto perante substâncias particulares da riqueza; mas
Terceiro: o dinheiro também é negado na determinação na qual é apenas a medida dos valores de troca. Como forma universal da riqueza e como seu representante material, ele não é mais medida ideal de outra coisa, de valores de troca. Porque ele mesmo é a realidade adequada do valor de troca, e o é em sua existência metálica. A determinação de medida deve ser posta aqui nele mesmo. O dinheiro é sua própria unidade e a medida de seu valor, a sua medida como riqueza, como valor de troca, é a quantidade que ele representa de si mesmo. A quantidade de um quantum de si mesmo que serve de unidade. Como medida, sua quantidade era indiferente; como meio de circulação, era indiferente a sua materialidade, a matéria da unidade; como dinheiro, nessa terceira determinação, a quantidade de si mesmo como um quantum material determinado é essencial. Pressuposta sua qualidade como riqueza universal, não há nele qualquer diferença além da quantitativa. Representa mais ou menos da riqueza universal conforme é possuído a cada momento como determinado quantum daquela riqueza, em maior ou menor quantidade. Se o dinheiro é a riqueza universal, é-se tanto mais rico quanto mais dele se possua, e o único processo importante é o acumular dinheiro, tanto para o indivíduo singular como para as nações. De acordo com sua determinação, [o dinheiro] apresentava-se antes como se originando da circulação. Agora, esse seu retirar da circulação e seu estocar aparecem como o objeto essencial da pulsão de enriquecimento e como o processo essencial do enriquecer. No ouro e prata possuo a riqueza universal em sua forma pura, e quanto mais os acumulo, tanto mais me aproprio da riqueza universal. Se ouro e prata representam a riqueza universal, como quantidades determinadas a representam somente em determinado grau, suscetível de ser expandido indefinidamente. Essa acumulação de ouro e prata, que se apresenta como sua repetida retirada da circulação, é ao mesmo tempo o pôr-em-segurança da riqueza universal frente à circulação, na qual a riqueza continuamente se perde na troca por uma riqueza particular que, por fim, desaparece no consumo.
Entre todos os povos antigos, o acumular de ouro e prata aparece originalmente como privilégio sacerdotal e real, posto que o deus e rei das mercadorias cabe apenas a deuses e reis. Só eles merecem possuir a riqueza enquanto tal. Nesse caso, tal acumulação serve, por um lado, somente para a ostentação da abundância, i.e., da riqueza como uma coisa extraordinária, festiva; como presente para templos e seus deuses; para objetos de arte públicos; finalmente, como meio de garantia para o caso de necessidade extraordinária, para aquisição de armas etc. Mais tarde, a acumulação devém política entre os antigos. O tesouro do Estado, como fundos de reserva, e os templos são os bancos originários nos quais é conservado esse Santíssimo. O acumular e estocar atingem seu máximo desenvolvimento nos bancos modernos; nesse caso, entretanto, com determinação ulteriormente desenvolvida. Por outro lado, no âmbito privado, o estocar apresenta-se como pôr-em-segurança da riqueza em sua forma pura ante as vicissitudes do mundo exterior, forma na qual ela pode ser enterrada etc., em síntese, em uma relação inteiramente secreta com o indivíduo. Isso em escala histórica ainda maior na Ásia. Repete-se em todos os pânicos, guerras etc. na sociedade burguesa, que, nesse caso, retrocede ao estado bárbaro. Da mesma forma, o acumular de ouro etc. como adorno e ostentação entre os semi-bárbaros. Mas uma parte muito grande e crescente do ouro é retirada da circulação como objeto de luxo na sociedade burguesa mais desenvolvida. (Ver Jacob etc.[165]) Como representante da riqueza universal, é precisamente o seu conservar, sem abandoná-lo à circulação e sem utilizá-lo para necessidades particulares, que constitui a prova da riqueza do indivíduo; e, na mesma medida em que o dinheiro se desenvolve em suas diferentes determinações, i.e., em que a riqueza enquanto tal devém a medida universal do valor do indivíduo, desenvolve-se o impulso à sua ostentação, logo, à exibiçãoi de ouro e prata como representantes da riqueza universal, precisamente como o sr. Rothschild, que expôs, como brasões dignos dele, duas notas bancárias de £ 100.000, cada qual guarnecida por uma moldura. A ostentação bárbara de ouro etc. é somente uma forma mais ingênua do que essa moderna, pois se dá com menor relação ao ouro como dinheiro. No primeiro caso, ainda se tratava do simples esplendor do ouro. No segundo, trata-se de ironia refletida. A ironia reside no fato de que o ouro não é usado como dinheiro; o importante aqui é a forma antitética à circulação.
A acumulação de todas as outras mercadorias é originariamente menor do que a de ouro e prata; 1) por causa de sua perecibilidade. Os metais representam em si o durável perante as outras mercadorias; são também preferencialmente acumulados [em razão de] sua maior raridade e seu excepcional caráter como instrumentos de produção par excellence[q]. Os metais preciosos, por não estarem sujeitos à oxidação pelo ar etc., são, por sua vez, menos perecíveis do que os metais não preciosos. O que perece nas outras mercadorias é justamente sua forma; mas essa forma lhes confere justamente o valor de troca, enquanto o seu valor de uso consiste na supressão dessa forma, no consumo. No dinheiro, ao contrário, é sua substância, sua materialidade, a própria forma na qual ele representa a riqueza. Se o dinheiro, segundo sua determinação espacial, se manifesta como a mercadoria universal em todos os lugares, o mesmo também sucede de acordo com sua determinação temporal. Conserva-se como riqueza em todas as épocas. Duração específica da riqueza. É o tesouro que nem as traças nem a ferrugem devoram[166]. Todas as mercadorias são somente dinheiro perecível; o dinheiro é a mercadoria imperecível. O dinheiro é a mercadoria onipresente; a mercadoria, somente dinheiro local. Mas a acumulação é um processo que se desenrola no tempo. Nesse sentido, diz Petty:
O efeito maior e final do comércio não é a riqueza enquanto tal, mas sobretudo a abundância de prata, ouro e joias, que não são perecíveis nem tão transformáveis como outras mercadorias, mas riqueza em todos os tempos e lugares. Abundância de vinho, cereal, aves, carne e assim por diante, são riquezas, mas hic et nunc[167] [...] Por conseguinte, a produção de tais mercadorias e os efeitos de tal comércio que provê um país de ouro e prata são mais vantajosos do que outros. (p. 3[168])
Se, mediante o imposto, o dinheiro é tomado daquele que o come e bebe, e [é] dado àquele que o utiliza no melhoramento da terra, na pesca, na exploração de minas, em manufaturas ou mesmo em roupas, há sempre um benefício para a comunidade; pois mesmo roupas não são tão perecíveis como refeições; se é usado para o equipamento de casas, o benefício é um pouco maior; na construção de casas, ainda maior; no melhoramento de terras, exploração de minas, pesca, mais ainda; o benefício máximo, sobretudo, se investido para conseguir ouro e prata para o país, porque essas são as únicas coisas que não são perecíveis, mas são consideradas riqueza em todos os tempos e lugares. (p. 5[169])
Assim escrevia um autor do século XVII. Vê-se como a acumulação de ouro e prata recebia o verdadeiro stimulus de sua concepção como representante material e forma universal da riqueza. O culto ao dinheiro tem seu ascetismo, sua renúncia, seu autossacrifício – a parcimônia e frugalidade, o desprezo dos prazeres mundanos, temporais e efêmeros; a busca do tesouro eterno. Daí a conexão entre o puritanismo inglês ou também do protestantismo holandês com o ganhar dinheiro. No início do século XVII, um escritor (Misselden) expressou a coisa de modo bastante ingênuo: “A matéria natural do comércio é a mercadoria, a artificial, o dinheiro. Muito embora o dinheiro, na natureza e no tempo, venha depois da mercadoria, tal como é usado hoje, se converteu no principal.” Ele compara isso com os dois filhos do velho Jacob, que pousou a mão direita sobre o mais novo e a esquerda sobre o mais velho. (p. 24.[170])
Nós consumimos uma abundância tão grande de vinho da Espanha, da França, do Reno, do Levante, das Ilhas: as passas da Espanha, os corintos do Levante, as cambraias de Hainaut e da Holanda, as sedas da Itália, o açúcar e o tabaco das Índias Ocidentais, as especiarias das Índias Orientais; tudo isso não é necessário para nós e, no entanto, é comprado com dinheiro vivo [...] Se fossem vendidos menos produtos estrangeiros e mais nacionais, o excedente teria de afluir para nós na forma de ouro e prata, como tesouro.” (l. c[171])
Os modernos economistas ridicularizam naturalmente semelhante argumento na seção geral dos tratados de economia. Porém, quando é considerada, em particular, a ansiedade na doutrina do dinheiro e o temor febril com que, nos tempos de crise, a entrada e a saída de ouro e prata são vigiadas na prática, fica patente que o dinheiro, na determinação na qual o concebiam com ingênua unilateralidade os partidários dos sistemas monetarista e mercantilista, ainda continua sendo perfeitamente válido, não apenas na imaginação, mas como categoria econômica real.
A atitude oposta, que representa as necessidades efetivas da produção contra essa supremacia do dinheiro, [aparece] de modo mais contundente em Boisguillebert. (Ver as passagens convincentes em meu caderno.[172])
2) A acumulação de outras mercadorias, abstraindo sua perecibilidade, é, sob dois aspectos, essencialmente diferente da acumulação de ouro e prata, que são aqui idênticos ao dinheiro. De um lado, a acumulação de outras mercadorias não tem a característica da acumulação de riqueza enquanto tal, mas de riqueza particular, sendo ela própria, por isso, um ato particular de produção que não se resume ao simples acumular. Armazenar cereais requer instalações particulares etc. Acumular ovelhas não faz de ninguém pastor; acumular escravos ou terra torna necessárias relações de dominação e servidão etc. Tudo isso requer, portanto, determinadas relações e atos distintos da acumulação simples, da multiplicação da riqueza enquanto tal. De outro lado, para depois realizar a mercadoria acumulada como riqueza universal, para me apropriar da riqueza em todas as suas formas particulares, devo praticar o comércio com a mercadoria particular que acumulei, comerciante de cereais, comerciante de gado etc. Disso me desobriga o dinheiro como representante universal da riqueza.
A acumulação de ouro e prata, de dinheiro, é a primeira manifestação histórica do acúmulo de capital e o primeiro grande meio para tanto; porém, enquanto tal, ainda não é acumulação de capital. Para isso, o reingresso do acumulado na própria circulação deveria ser posto como momento e meio do acumular.
O dinheiro, em sua determinação última, acabada, manifesta-se pois, sob todos os aspectos, como uma contradição que se resolve a si mesma; que tende à sua própria resolução. Como forma universal da riqueza, se lhe confronta o inteiro mundo das riquezas reais. É a pura abstração dessas riquezas – por isso, retido dessa maneira, é pura ilusão. Ali onde a riqueza parece existir enquanto tal em forma absolutamente material, tangível, o dinheiro tem sua existência apenas em minha cabeça, é uma pura quimera. Midas[173]. Por outro lado, como representante material da riqueza universal, é realizado somente à medida que é lançado novamente na circulação, que desaparece ante os distintos modos particulares da riqueza. Na circulação, o dinheiro permanece como meio de circulação; mas para o indivíduo que acumula, está perdido, e essa desaparição é o único modo possível de afirmá-lo como riqueza. A dissolução do acumulado em prazeres singulares é a sua realização. O dinheiro pode agora ser acumulado por outros singulares, mas então o mesmo processo recomeça. Eu só posso pôr efetivamente o seu ser para mim à medida que o abandono como mero ser para outro. Se desejo retê-lo, então ele evapora da mão em um mero fantasma da riqueza efetiva. Ademais: o seu multiplicar por meio da acumulação, sendo sua própria quantidade a medida de seu valor, revela-se falso. Se as outras riquezas não se acumulam, ele próprio perde seu valor à medida mesmo que seja acumulado. O que se manifesta como sua multiplicação é, de fato, sua diminuição. A sua autonomia é pura aparência; sua independência da circulação só existe referida a ela, como dependência dela. Pretende ser mercadoria universal, por causa de sua particularidade natural, [mas] é, por sua vez, uma mercadoria particular, cujo valor depende tanto da demanda e da oferta como também varia com seus custos de produção específicos. E como ele próprio se encarna no ouro e na prata, devém unilateral em cada forma efetiva; de modo que, se um aparece como dinheiro, o outro aparece como mercadoria particular e vice-versa, e, assim, ambos aparecem em ambas as determinações. Como o absolutamente seguro, riqueza inteiramente independente de minha individualidade, o dinheiro é, ao mesmo tempo, como aquilo que me é inteiramente exterior, o inseguro-absoluto que pode ser separado de mim por qualquer acaso. O mesmo sucede com as determinações inteiramente contraditórias do dinheiro como medida, meio de circulação e dinheiro enquanto tal. Finalmente, [ele] se contradiz ainda na última determinação, porque deve representar a riqueza enquanto tal; mas, de fato, representa somente um quantum idêntico de valor variável. Por isso, se cancela como valor de troca consumado.
Como simples medida, [o dinheiro] já é negado em si como meio de circulação; como meio de circulação e medida, é negado em si como dinheiro. A sua negação na última determinação é, portanto, simultaneamente a negação nas duas primeiras. Negado como mera forma universal da riqueza, o dinheiro tem assim de se realizar nas substâncias particulares da riqueza real: porém, na medida em que, desse modo, se afirma efetivamente como representante material da totalidade da riqueza, o dinheiro tem de se manter ao mesmo tempo como a forma universal. O seu ingresso na circulação deve ser ele mesmo um momento de seu manter-se-em-si-mesmo [Bleisichbleiben], e seu manter-se-em-si-mesmo deve ser um ingresso na circulação. O que significa que, como valor de troca realizado, o dinheiro deve ser posto ao mesmo tempo como processo no qual o valor de troca se realiza. É simultaneamente a negação de si como uma forma puramente coisal, forma da riqueza exterior e contingente frente aos indivíduos. Deve aparecer, ao contrário, como a produção da riqueza, e a riqueza, como resultado das relações mútuas dos indivíduos na produção. Por conseguinte, o valor de troca é determinado agora como processo, não mais como simples coisa para a qual a circulação é apenas um movimento externo, ou que existe como indivíduo em uma matéria particular: [é determinado] como relação consigo mesmo mediante o processo de circulação. Por outro lado, a própria circulação não é mais [determinada] unicamente como simples processo de troca de mercadorias por dinheiro e de dinheiro por mercadorias, não mais apenas como o movimento mediador para realizar os preços das distintas mercadorias, para equiparar reciprocamente as mercadorias como valores de troca, processo no qual ambos aparecem fora da circulação: por um lado, o valor de troca pressuposto, a retirada definitiva da mercadoria no consumo e, portanto, a destruição do valor de troca; por outro, a retirada do dinheiro, sua autonomização perante a sua substância, que é também uma outra forma de sua destruição. O próprio valor de troca, e agora não mais o valor de troca em geral, mas o valor de troca medido, deve manifestar-se como pressuposto, ele mesmo posto pela circulação, e, como posto pela circulação, deve manifestar-se como seu pressuposto. Do mesmo modo, o processo de circulação deve manifestar-se como processo de produção dos valores de troca. Portanto, por um lado, é o retorno do valor de troca ao trabalho e, por outro, o retorno do dinheiro ao valor de troca; que, no entanto, está posto agora em uma determinação aprofundada. Na circulação, o preço determinado está pressuposto, e ela o põe como dinheiro apenas formalmente. A própria determinabilidade do valor de troca, ou a medida dos preços, deve agora ela mesma manifestar-se como ato da circulação. Posto desse modo, o valor de troca é o capital, e a circulação é simultaneamente posta como ato da produção.
Para retomar: na circulação, tal como ela se manifesta como circulação de dinheiro, é pressuposta a simultaneidade de ambos os polos da troca. No entanto, pode ocorrer diferença temporal entre a existência das mercadorias a trocar. Pode decorrer da natureza dos serviços recíprocos que a prestação seja efetuada hoje, mas que a contraprestação só possa ser efetuada após um ano etc. “Na maioria dos contratos”, diz Senior, “apenas uma das partes contratantes tem a coisa disponível e a empresta; e se a troca deve ter lugar, deve-se cedê-la de imediato sob a condição de receber o equivalente somente em um período posterior. Uma vez que o valor de todas as coisas varia em um determinado período, adota-se como meio de pagamento a coisa cujo valor menos varia, que por um período mais longo mantém uma dada capacidade média de comprar coisas. Assim o dinheiro devém expressão ou representante do valor.”[174] De acordo com essa passagem, a última determinação do dinheiro nada tem a ver com suas determinações anteriores. Mas ela é falsa. É somente quando o dinheiro é posto como representante autônomo do valor que os contratos, p. ex., não são mais avaliados em quanta de cereais ou em serviços a efetuar. (O último, p. ex., universalmente vigente no feudalismo.) É uma reflexãoi do sr. Senior que o dinheiro possui uma “capacidade média mais prolongada” de garantir seu valor. |O fatoi é que, como material universal dos contratos (mercadoria universal dos contratos, diz Bailey[175]), o dinheiro é considerado como mercadoria universal, representante da riqueza universal (diz Storch[176]), valor de troca autonomizado. O dinheiro já deve estar muito desenvolvido em suas duas primeiras determinações para se apresentar universalmente em tal papel na terceira. No entanto, verifica-se de fato que, não obstante a quantidade de dinheiro se mantenha uniformemente a mesma, o seu valor varia; que, afinal, como quantum determinado, [o dinheiro] está sujeito à variabilidade de todos os valores. Nesse caso, a sua natureza como mercadoria particular impõe-se sobre sua determinação universal. Como medida, a variação lhe é indiferente, pois “em um meio variável sempre podem ser expressas duas relações diferentes ao próprio meio, precisamente como em um meio constante”[177]. Como meio de circulação, a variação também lhe é indiferente, já que a sua quantidade como meio de circulação é posta pela medida. Porém, como dinheiro, tal como aparece nos contratos, é essencial, afinal, nessa determinação se evidenciam suas contradições.
A retomar em seções particulares: 1) Dinheiro como moeda. Nesse caso, muito sumariamente sobre o sistema de moedas. 2) Historicamente, as fontes de ouro e prata. Suas descobertas etc. A história de sua produção. 3) Causas das variaçõesi no valor dos metais preciosos e, consequentemente, do dinheiro de metal; efeitos dessas variações sobre a indústria e as diferentes classes. 4) Sobretudo: quantidadei da circulação com referência ao aumento e à redução dos preços. (Século XVI, século XIX.) Nesse caso, a ser visto como o dinheiro, como medida, é afetado pela quantidadei crescente etc. 5) Sobre a circulação: velocidade, quantum necessário, efeito da circulação; mais, menos desenvolvida etc. 6) Efeitos dissolventes do dinheiro.
(Retomar isso.) (Aqui, as investigações especificamente econômicas.)
(O peso específico do ouro e da prata, muito peso contido em volume relativamente pequeno, quando comparado com outros metais, repete-se no mundo dos valores, de modo que contém grande valor (tempo de trabalho) em volume relativamente pequeno. O tempo de trabalho nela realizado, valor de troca, é o peso específico da mercadoria. Isso torna os metais preciosos particularmente apropriados à função na circulação (já que se pode levar no bolso uma porção significativa de valor) e na acumulação, já que se pode guardar em segurança e acumular grande valor em pequeno espaço. O ouro [não] se transforma durante a acumulação, como o ferro, o chumbo etc. Permanece o que é.)
“Se a Espanha nunca tivesse possuído as minas do México e do Peru, jamais teria necessitado o cereal da Polônia”[178].
Illi unum consilium habent et virtutem et potestatem suam bestiae tradunt. Et ne quis possit emere aut vendere, nisi qui habet characterem aut nomen bestiae, aut numerum nominis ejus[179]. “As quantidades correspondentes de mercadorias cedidas umas pelas outras constituem o preço da mercadoria”[180]. “O preço é o |o grau do valor permutávelf”[181].
Como vimos, na circulação simples enquanto tal (no valor de troca em seu movimento), a ação recíproca dos indivíduos é, quanto ao conteúdo, somente satisfação mútua e interessada de suas necessidades e, quanto à forma, trocar, pôr como igual (equivalentes), de modo que a propriedade também é posta aqui somente como apropriação do produto do trabalho mediante o trabalho e o produto do trabalho alheio mediante o trabalho próprio, na medida em que o produto do próprio trabalho é comprado mediante o trabalho alheio. A propriedade do trabalho alheio é mediada pelo equivalente do trabalho próprio. Essa forma da propriedade – assim como a igualdade e a liberdade – está posta nessa relação simples. Isso se modificará no ulterior desenvolvimento do valor de troca e revelará, enfim, que a propriedade privada do produto do próprio trabalho é idêntica à separação entre trabalho e propriedade; de modo que trabalho = criará propriedade alheia e propriedade = comandará trabalho alheio.
[a] O “Capítulo do dinheiro” compreende o Caderno I e as sete primeiras páginas do Caderno II. O Caderno I é de outubro de 1857, mas não foi datado por Marx. (N. E.)
[1]Os algarismos entre parênteses referem-se à paginação do livro de Alfred Darimon, De la réforme des banques (Paris, Guillaumin, 1856).
[b] Todo o mal resulta do predomínio da obstinação em conservar os metais preciosos na circulação e nas trocas. (N. T.)
[2] Leia-se “108”. Marx tomou o número 101 de Darimon. O mesmo erro de cálculo se repete mais adiante.
[3] No manuscrito, seis meses.
[4]Deveria constar “diminui”. Esse erro, que também se repete adiante, não interfere de maneira relevante nas conclusões extraídas por Marx das tabelas estatísticas de Darimon.
[5] Deveria constar “a diminuição”.
[6] Deveria constar “71.329.817”.
[7] Deveria constar “21.810.382”.
[8] Deveria constar “76.990.349”.
[9] Alfred Darimon, De la réforme des banques, cit., p. 8-9.
[10] Ibidem, p. 2.
[11] Ibidem, p. 3.
[12] Alusão irônica às palavras de Egmont, personagem de J. W. V. Goethe em Egmont: tragédia em cinco atos, ato 5: “Prisão. Diálogo com Ferdinand” (São Paulo, Melhoramentos, 1949).
[13] Alfred Darimon, De la réforme des banques, cit., p. 3-4. Trata-se da Exposição Universal da Indústria, que ocorreu em Paris de maio a novembro de 1855.
[14] A fonte usada por Marx não foi descoberta.
[15] Frédéric Bastiat e Pierre-Joseph Proudhon, Gratuité du crédit. Discussion entre M. Fr. Bastiat et M. Proudhon (Paris, Guillaumin, 1850).
[16] Assim reza a tese principal da obra de Proudhon, Qu’est-ce que la propriété? (Paris, Prévot, 1841) [ed. bras.: O que é a propriedade?, São Paulo, Martins Fontes, 1988].
[17]Alfred Darimon, De la réforme des banques, cit., p. 4.
[18]No livro de Darimon, esse terceiro capítulo se intitula “Petite histoire des banques de circulation” [Breve história dos bancos de circulação] (De la réforme des banques, cit., p. 20-7).
[19] Ibidem, p. 22.
[20] David Ricardo, The high price of bullion, a proof of the depreciation of bank notes (Londres, J. Murray, 1810).
[21] Pierre-Joseph Proudhon, Système des contradictions économiques ou Philosophie de la misère (Paris, Guillaumin, 1846, tomo 1), p. 68-70 [ed. bras.: Sistema das contradições econômicas ou Filosofia da miséria, São Paulo, Ícone, 2003].
[22] As porcentagens são obviamente incorretas. O exemplo deveria ser algo como: “O quarter de cereais aumenta de 50 para 100 shillings, logo em 50 sh., mas os tecidos de algodãoi caem de 100 para 20 sh. Em relação ao cereal, a prata caiu somente 50%, e os tecidos de algodão caíram (em consequência da demanda paralisada etc.) 80% em relação à prata”.
[c] Moeda de ouro inglesa, que valia 1 libra esterlina. (N. T.)
[23] Potencialmente. Aristóteles usa esse termo com frequência, em especial na Metafísica, livros VII e VIII.
[24] Wilhelm Weitling, Garantien der Harmonie und Freiheit (Vivis, Verlage des Verfassers, 1842), p. 153-75.
[25] Georg Wilhelm Friedrich Hegel, “Wissenschaft der Logik”, em Gesammelte Werke (Hamburgo, F. Meiner, 1984, livro 2, seção 1, capítulo 2).
[26] Karl Marx, Misère de la philosophie, réponse à la Philosophie de la misère de M. Proudhon (Paris, A. Franck, 1847), p. 37-62 [ed. bras.: Miséria da filosofia: resposta à Filosofia da miséria do sr. Proudhon, São Paulo, Expressão Popular, 2009].
[27] Ver p. 86-7.
[28] Sobre as barrasi (originalmente eram barras de ferro), Marx leu diferentes autores, entre eles: William Jacob, An historical inquiry into production and consumption of the precious metals (Londres, J. Murray, 1831, v. 2), p. 326-7; e David Urquhart, Familiar words as affecting England and the English (Londres, Trübner & Co., 1856), p. 112.
[29] Já em seu caderno de extratos “Das vollendete Geldsystem” (Londres, 1851), sintetizado e comentado, resultado de um segundo grau de elaboração do material, Marx formulou, na página 19, em conexão com duas passagens de Petty (mencionadas em outro texto – ver p. 174-5): “O dinheiro é a mercadoria imortal; todas as mercadorias são unicamente dinheiro perecível”.
[30]“Trade of 1856: Decrease of Consumption”, The Economist (Londres), n. 700, 24/1/1857, p. 86.
[31] “Foreign Correspondence – France, Paris, Feb. 10”, The Morning Star (Londres), n. 286, 12/2/1857.
[32] Adendo de Marx.
[33] “The double standard in France”, em suplemento de The Economist (Londres), n. 700, 24/1/1857, p. 24.
[34] Alusão a uma frase de Proudhon, criticada por Marx em Miséria da filosofia, cit.: “As teorias econômicas, entretanto, têm sua sucessão lógica e sua série no entendimento” (Pierre-Joseph Proudhon, Système des contradictions économiques, cit., tomo 1, p. 146).
[35] No sentido do francês “se manifeste” (Proudhon fala da “‘manifestação das fases ou categorias econômicasf” [ibidem, p. 145. Esta afirmação de Proudhon é citada por Marx em Miséria da Filosofia, cit.).
[36] Uma expressão favorita de John Gray em seu livro Lectures on the nature and use of money (Edimburgo, A. & C. Black, 1848), p. 67, 108, 123, 125, 142-8 e outras.
[37] Marx resume aqui as observações de John Locke no texto “Further considerations concerning raising the value of money” (1695), em The works of John Locke (7. ed., Londres, H. Woodfall, 1768, v. 2), p. 92.
[d] Em inglês, no original: book accounts. (N. T.)
[38] Adam Smith, An inquiry into the nature and causes of the wealth of nations. With a commentary, by the author of England and America [Edward Gibbon Wakefield] (Londres, C. Knight, 1835-9, v. 1), p. 130.
[39] Guerra de todos contra todos. Thomas Hobbes, “De Cive”, em Opera philosophica (Amstelodami, apud J. Blaeu, 1668), p. 7; Thomas Hobbes, “Leviatan, sive de materia, forma, et potestate civitatis ecclesiasticae et civilis”, em Opera philosophica, cit., p. 64-6, 72 e 83.
[40] Essa indicação refere-se a um manuscrito desconhecido de Marx.
[41] Essas “Observações” não foram preservadas.
[42] Alusão, de um lado, a John Bellers, Essays about the poor, manufactures, trade, plantations, and immorality (1. ed., Londres, T. Sowle, 1699), p. 13 (“|O dinheiro (...) é um penhor para o que é dado por elei.”); e, por outro, a Aristóteles, Ética a Nicômaco (2. ed., Bauru, Edipro, 2007, v. 8), 1133b 11-12: tò nómisma oÎon Êggujtav ÊsqH dmîn (i.e., “o dinheiro é, de certo modo, a nossa garantia”). A passagem de Beller é citada posteriormente (1867) no primeiro livro de O capital (8. ed., São Paulo, Difel, 1982, p. 92, nota 71). Com respeito aos Grundrisse de Marx, Caderno de Extratos I, p. 22, a passagem de Aristóteles é referida no “Índice aos sete Cadernos”, p. 33 (ver MEGA II/2, p. 13 e 27-8). Marx tomou a expressão “penhor mobiliário da sociedade” do livro de Johann Georg Büsch, Abhandlung von dem Geldumlauf in anhaltender Rücksicht auf die Staatswirtschaft und Handlung (2. ed., Hamburgo e Kiel, C. E. Bohn, 1800, parte I), p. 298-9, onde se lê: “[...] o dinheiro [...] como um penhor mobiliário universal, não simplesmente entre os membros de uma sociedade burguesa, mas entre várias sociedades burguesas”. Em seu caderno de extratos “O sistema monetário completo” (p. 34), Marx formula a tese de Büsch com as seguintes palavras: “Dinheiro penhor mobiliário universal da sociedade burguesa”. Büsch remete ao livro de Theodor Schmalz, Encyclopädie der Cameralwissenschaften (Könnigsberg, F. Nicolovius, 1797), § 50, onde o dinheiro é caracterizado como “o penhor universalmente mais solicitado”. Já a fórmula “dinheiro como um penhor” acha-se também no trabalho de John Locke, “Some considerations… (1691)”, em The works of John Locke (7. ed., Londres, H. Woodfall, 1768, vol. 2), p. 15. Essa passagem está extratada no Caderno de Extratos VI, de cerca de janeiro/fevereiro de 1851 (p. 21).
[43] William Shakespeare, Timon de Atenas (Rio de Janeiro, Lacerda, 2003), ato IV, cena 3.
[44] A maldita fome por ouro. Virgílio, Eneida (Rio de Janeiro, Martins, 2004), canto III, verso 57.
[45] Por excelência, na forma mais pura, em grau máximo.
[46] Ver p. 92, nota 28.
[47] Adam Smith, Recherches sur la nature et les causes de la richesse des nations (trad. G. Garnier, Paris, H. Agasse, 1802, tomo 1), p. 60 [ed. bras.: Uma investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações, São Paulo, Hemus, 2008]: “|O trabalho foi o primeiro preço, a moeda paga na compra primitiva de todas as coisasf.” Em seus excertos dessa obra, anotados em Paris em 1844, Marx sublinhou essa frase (página 6 do primeiro dos dois cadernos com extratos da obra de Smith). Ver MEGA IV/2, p. 339.
[48] Ibidem, p. 47: “|[...] todo homem previdente [...] teve naturalmente de se empenhar em administrar seus negócios, de modo a possuir sempre consigo, além do produto particular de sua indústria, uma certa quantidade de uma mercadoria ou outra que, em sua opinião, poucas pessoas recusariam em troca dos produtos de sua indústriaf.” Em seus excertos dessa obra, anotados em Paris, em 1844, Marx sublinhou as palavras em itálico (página 6 do primeiro dos dois cadernos com extratos da obra de Smith). Ver MEGA IV/2, p. 338.
[49] James Steuart, An inquiry into the principles of political economy (Dublin, James Williams e Richard Moncrieffe, 1770, v. 1), p. 88: “|a diferença entre a agricultura exercida como um negócio e como um meio direto de subsistênciai.” Em seu Caderno de Extratos VIII, escrito em 1851, Marx reproduziu essa passagem como se segue: “para distinguir entre |agricultura como um negócioi e |agricultura como um meio direto de subsistênciai”.
[50] Marx menciona as duas passagens da obra de William Petty, Several essays in political arithmetick: the titles of which follow in the ensuing pages (Londres, Peacock & Phoenix, 1699), em um texto seguinte do “Capítulo do dinheiro” (ver p. 174-5).
[51] “A terra não só dispõe daquilo que ano após ano floresce e amadurece, mas também possui bens duráveis. Pois há nela pedra em profusão etc. (a saber, o mármore) [...] Mas há também campos que cultivados nada produzem, mas quando minerados alimentam muitas vezes mais pessoas do que se fossem semeados com cereal.” Xenofonte, De vectigalibus, I, 4.
[52] Ver p. 116, nota 48.
[e] Após o fato. (N. T.)
[53] “As pessoas também se distinguem por sua beleza e grande estatura; elas são simples e não têm índole comercial, pois não costumam usar moedas nem conhecem números acima de cem, realizando suas trocas em espécie. [...] “Elas tampouco sabem lidar com medidas e pesos precisos.” Estrabão, Geographica, livro XI, capítulo 4, § 4.
[54] Por excelência, na forma mais pura, em grau máximo.
[55] A fonte dessa citação em inglês não foi encontrada. Marx cita a mesma passagem, entre aspas, em seu esquema do texto “Para a crítica da economia política” (ver Caderno B’, p. 14). Ali, consta “|este não é o caso comi” em lugar de “o que não vale, p. ex., para”.
[f] Ouro. (N. T.)
[g] Antiga unidade de peso para medicamentos e metais preciosos. (N. T.)
[56] As aspas não foram fechadas no manuscrito. A fonte usada por Marx não pôde ser encontrada.
[h] Prata. (N. T.)
[57] Joseph Beete Jukes, Lectures on gold for the instruction of emigrants about to proceed to Australia. Delivered at the Museum of Practical Geology (Londres, D. Bogue, 1852), p. 172.Ênfases de Marx.
[i] Destaque de Marx. (N. T.)
[58] Ibidem, p.171-2. A primeira frase foi enfatizada por Marx. No livro citado, ela está formulada da seguinte maneira: “|Uma consideração superficial das circunstâncias sob as quais o ouro é encontrado explicará suficientemente a sua descoberta muito cedo pelo homemi.” As aspas não foram fechadas no manuscrito.
[59] Ibidem, p. 8.
[60] Ibidem, p. 10 e 12.
[61] Ibidem, p. 93-5. Ênfase de Marx.
[62] Ênfase de Marx.
[63] Ibidem, p. 95-7.
[64] Ibidem, p. 97.
[65] Ibidem, p. 98.
[66] Ibidem, p. 72.
[67] Ibidem, p. 72-3.
[j] Cobre e ouro, respectivamente. (N. T.)
[68] Jacob Grimm, Geschichte der deutschen Sprache (2. ed., Leipzig, Weidmannsche, 1853, tomo 1), p. 7 e 9.
[69] Dureau de La Malle, Économie politique des Romains (Paris, L. Hachette, 1840, tomo 1), p. 48-9.
[70] Marx remete ao seu Caderno de Extratos XIV, que foi elaborado em Londres, aproximadamente em agosto/setembro de 1851. As primeiras dezessete páginas desse caderno contêm extratos do livro de Dureau de La Malle. A passagem citada não se encontra na página 2, mas na página 1.
[71] Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 56.
[72] Ibidem, p. 57. Ênfase de Marx.
[73] Antoine-Jean Letronne, Considérations générales sur l’évaluation des monnaies grecques et romaines, et sur la valeur de l’or et de l’argent avant la découverte de l’Amérique (Paris, Firmin-Didot, 1817); August Böckh, Die Staatshaushaltung der Athener (Berlin, Realschulbuchhandlung, 1817); William Jacob, An historical inquiry into production and consumption of the precious metals (Londres, J. Murray, 1831).
[74] Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 63-4.
[75] Ibidem, p. 52.
[76] Deserto arenoso abundante em ouro.
[77] Ibidem, p. 54.
[78] Ibidem, p. 54-5.
[79] Ibidem, p. 55.
[80] Deveria constar “(1840)”, ano em que o livro de Dureau de La Malle foi publicado.
[81] Ibidem, p. 55-6.
[82] Ibidem, p. 56.
[83] Ibidem, p. 57.
[84] Idem.
[85] Ibidem, p. 57: “Eles trabalhavam com (ferramentas de) bronze; ainda não havia ferro enegrecido”. Hesíodo, Os trabalhos e os dias (São Paulo, Iluminuras, 1991), verso 151. Marx cita de acordo com Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 57.
[86] “O uso do bronze era conhecido antes do que o do ferro.” Lucrécio, Da natureza das coisas (São Paulo, Cultura, 1941), livro V, 1286. Marx cita de acordo com Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 57.
[87] Ibidem, p. 58: “|M. Jacob menciona antigas minas de cobre na Núbia e na Sibériaf.” Referência ao livro de William Jacob, An historical inquiry into production and consumption of the precious metals, cit., v. 1, p. 35 e 42.
[88] Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 58.
[89] Ibidem, p. 64.
[90] Idem.
[91] “|Isto é interditado de acordo com uma antiga decisão do Senado que ordenava a preservação da Itália (i.e., de suas minas de prata)f..” Ibidem, p. 65-6. A citação de Plínio é de Dureau de La Malle, acrescida de uma nota de rodapé: “Plín., Hist. nat., III, 24”, i.e., Plinius [Plínio], Historia naturalis [História natural], livro III, seção 24 (de acordo com a numeração atual, livro III, capítulo 20, § 138).
[92] Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 65.
[93] Germain Garnier, Historie de la monnaie, depuis les temps de la plus haute antiquité, jusqu’au règne de Charlemagne (Paris, Agasse, 1819, tomo I), p. 7. A observação “(ver Caderno III, p. 22)” refere-se ao Caderno de Extratos III.
[94] Johann Friedrich Reitemeier, Geschichte des Bergbaues und Hüttenwesens bey den alten Völkern (Göttingen, Bey Johann Christian Dieterich, 1785), p. 14-6. No Caderno de Extratos III indicado por Marx faltam essas passagens do livro de Reitmeier.
[95] Ibidem, p. 32. No Caderno de Extratos, essa citação se encontra na página 33, não na 34.
[96] William Jacob, An historical inquiry into production and consumption of the precious metals, cit., v. 1, p. 142. Marx se refere ao Caderno de Extratos IV ( p. 3).
[97] Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 62-3.
[98]Gustav von Gülich, Geschichtliche Darstellung des Handels, der Gewerbe und des Ackerbaus der bedeutendsten handeltreibenden Staaten unsrer Zeit (Jena, F. Frommann, 1845, v. 5), p. 110-1.
[99] Ibidem, p. 111.
[100] Ibidem, p. 131.
[101] Dureau de La Malle, Économie politique des Romains, cit., p. 66-7. A expressão aes rude significa “dinheiro de bronze não cunhado”.
[102] Ibidem, p. 68.
[103] Ibidem, p. 72-3.
[104] Ibidem, p. 76.
[105] Ibidem, p. 77.
[106] Ibidem, p. 81-2.
[107] Ibidem, p. 85-6.
[108] Ibidem, p. 87.
[109] Ibidem, p. 88-9.
[k] Erário. (N. T.)
[110] Ibidem, p. 90-1.
[111] Ibidem, p. 95.
[112] Ibidem, p. 96.
[113] Ibidem, p. 65 e 69. As letras “u.c.” significam “urbis conditae”, i.e., “a contar da construção da cidade” (Roma, no caso).
[114] Ibidem, p. 86.
[115] Ibidem, p. 84.
[116]Ibidem, p. 96.
[l] Frase incompleta no original. (N. E.)
[117] Germain Garnier, Histoire de la monnaie, cit., p. 253.
[118] Adam Smith denomina o dinheiro “|a grande roda da circulaçãoi” (Adam Smith, An inquiry into the nature and causes of the wealth of nations, cit., v. 2, p. 272, 276 e 284).
[119] Nassau William Senior, Three lectures on the cost of obtaining money and on some effects of private and government paper money (Londres, J. Murray, 1830), p. 14-5 e 13-4.
[m] Antigas moedas francesas. (N. T.)
[120] Germain Garnier, Histoire de la monnaie, cit., p. 72-3 e 77-8. Marx reproduziu essa citação de acordo com o seu Caderno de Extratos III, de 1850.
[n] À primeira vista. (N. T.)
[121] Thomas Tooke, An inquiry into the currency principle: the connection of the currency with prices, and the expediency of a separation of issue from banking (2. ed., Londres, Longman, Brown, Green, and Longmans, 1844), p. 136. Marx reproduz a versão sintetizada dessa passagem, de acordo com o seu Caderno de Extratos de 1854-1855, onde ele organizou citações sobre os temas “Sistema monetário, sistema de crédito, crises”, com uma referência à página 40 de seu Caderno de Extratos VII (de 1851), onde a passagem do livro de Tooke é reproduzida em detalhe.
[122] Heinrich Storch, Cours d’économie politique, ou Exposition des principes qui déterminent la prospérité des nations, avec des notes explicatives et critiques par J.-B. Say (Paris, J. P. Aillaud, 1823, tomo 1), p. 81-4 e 87-8. Retirado do caderno de extratos “O sistema monetário completo” (p. 7).
[123] Marx oferece aqui uma síntese das explicações de Jean-Charles Sismondi no tomo 2 de seus Études sur l’économie politique (Bruxelas, Societé Typographique Belge, Londres, Dulau et Comp., 1838, tomo 2), p. 264-8. Retirado do caderno de extratos “O sistema monetário completo” (p. 10-1). Nesse caderno, sintetizado e comentado, a frase “Medidas de peso e medidas de valor os mesmos nomes”, sublinhada no texto do “Capítulo do dinheiro”, é formulada da seguinte maneira: “Medidas de peso e medidas de valor são as mesmas a partir do momento em que os seres humanos tornaram sua subsistência dependente da troca, em que tornaram o valor de troca (ele próprio, por sua vez, determinado pelo tempo de trabalho) a avaliação de todas as mercadorias”.
[124] William Jacob, An historical inquiry into production and consumption of the precious metals (Londres, J. Murray, 1831, v. 1), p. 109.
[125] Ibidem, p. 351.
[126] James Steuart, An inquiry into the principles of political economy, cit., p. 395-6. Marx cita essas passagens de acordo com o seu caderno de extratos condensado “Sistema monetário, sistema de crédito, crises”, de 1854-5 (p. 21), onde remete às páginas 25-8 de seu Caderno de Extratos VIII, de 1851, que contém extratos pormenorizados das páginas 367-419 do volume 1 da obra de Steuart.
[o] Ver p. 135. (N. E.)
[127]John Gellibrand Hubbard, The currency and the country (Londres, Longman, Brown, Green, and Longmans, 1843), p. 44-6. Marx cita essa passagem de acordo com seu Caderno de Extratos de 1851, que originalmente trazia o número VIII, mas que, posteriormente, recebeu o número VII. Na página 45 desse caderno, encontram-se extratos das páginas 34-47 do livro de Hubbard.
[128] William Jacob, An historical inquiry into production and consumption of the precious metals, cit., v. 2, p. 326-7. Marx cita essa passagem de acordo com sua versão bastante condensada no caderno de extratos “Sistema monetário, sistema de crédito, crises”, de 1854-
-1855 (p. 21-2), onde faz referência à página 15 de seu Caderno de Extratos V de 1851, na qual reproduz em detalhes a passagem do livro de Jacob.
[129] James Steuart, An historical inquiry into the principles of political economy, cit., v. 2, p. 389. Em seu caderno de extratos condensado “Sistema monetário, sistema de crédito, crises”, de 1854-1855 (p. 22), escreveu Marx: “Diferença muito importante entre |circulação voluntária e involuntáriai: devido à |falta de moedai é interrompida só a comprai, i.e., |circulação voluntáriai; jamais o pagamentoi, i.e., |circulação involuntáriai. Esta jamais pode ser interrompida. |Devedores têm de descobrir dinheiro, enquanto houver algum no paísi, mesmo que tenham de dar |um acrei por um shilling ou uma casa por meia coroa. (Steuart, op. cit., 69).” O “op. cit.” refere-se aqui ao Caderno de Extratos VIII, de 1851, onde a respectiva passagem de Steuart é reproduzida na página 69.
[130] Pierre Boisguillebert, “Dissertation sur la nature des richesses, de l’argent et des tributs”, em Eugéne Daire, Économistes financiers du XVIIIe siècle (Paris, Guillaumin, 1843), p. 395 e 413.
[131] Ibidem, p. 399. Todas as declarações de Boisguillebert foram retiradas do caderno de extratos “Das vollendete Geldsystem”, p. 20.
[132] Esse termo já aparece em Marx, em um de seus cadernos de extratos de Bruxelas, de 1845. Em seus extratos do livro de Louis Say, Principales causes de la richesse ou de la misère des peuples et des particuliers (Paris, Chez Déterville, 1818), Marx escreve na página 3 de seu caderno: “A propriedade do ouro e da prata – de poder ser trocado por qualquer coisa – resulta, portanto, do fato de que seu preço de produção, |o tempo e a dificuldade dedicados a extraí-los e purificá-los, é muito pouco variávelf”.
[p] Movimento perpétuo. (N. T.)
[133]Riscado no manuscrito: <Nesse particular, cabe aqui observar, primeiramente, que ambos os momentos da circulação são gerados pelo terceiro, que antes denominamos seu processo infinito; e que, mediado por ele, o ponto final pode e tem de levar sempre para além do circuito, não importa se tomamos o dinheiro ou a mercadoria como ponto de partida. Portanto, mercadoria-dinheiro-dinheiro-mercadoria-dinheiro; mas, da mesma maneira, dinheiro-mercadoria-mercadoria-dinheiro-mercadoria; se, portanto, nenhum dos dois movimentos fecha a si mesmo, ainda assim tem de ser considerado em sua determinabilidade; nesse contexto, não parece tão curiosoi que um único momento do movimento consista em que o dinheiro se troque consigo mesmo pela mediação da mercadoria, que apareça como um objetivo em si momentâneo. Um comerciante compra açúcar por dinheiro, ele vende…>.
[134] Após as necessárias modificações.
[135] Ver p. 140.
[136] Antigo dinheiro de cobre não cunhado, denominação posterior do antigo “Ass” de peso integral (uma libra), depois da qual foi introduzido um novo “As”, mais leve.
[137] Passagem extraída de “The panic and the people”, London Weekly Dispatch, n. 2925, 8/11/1857, p. 1.
[138]A indicação de página refere-se ao Caderno de Extratos de Marx, sem numeração ou data, que foi redigido em Bruxelas em cerca de abril/maio de 1845. Alude à citação ali extratada de François-Louis-Auguste Ferrier, Du Gouvernement considéré dans ses rapports avec le commerce (Paris, Perlet, 1805), p. 35: “A prata deixa de ser mercadoriaf |assim que devém dinheirof, pois então se torna |intermediário indispensável entre a produção e o consumof, e nesse caso |não pode mais satisfazer imediatamente nenhuma necessidadef.”
[139]Jean-Baptiste Say, Traité d’économie politique (3. ed., Paris, Deterville, 1817, tomo 2), p. 460-1 [ed. bras.: Tratado de economia política, São Paulo, Abril Cultural, 1983].
[140] Adam Smith, An inquiry into the nature and causes of the wealth of nations (6 v. [corr. 1-4], Londres, C. Knight, 1835-9), v. 2 (1836), p. 271-85; v. 3 (1839), p. 70-106 [ed. bras.: Uma investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações, São Paulo, Hemus, 2008].
[141] François-Louis-Auguste Ferrier, Du Gouvernement considéré dans ses rapports avec le commerce, cit., p. 52: “|o dinheiro cria os valores, porque sem dinheiro não haveria nem valores, nem indústria, nem comérciof.”
[142] Ibidem, p. 18: “|O tradutor de Smith [...] não considera no dinheiro senão o seu valor, sem refletir sobre a propriedade que ele possui como dinheirof [...].”
[143]Com a expressão “|somente [...] uma espécie mais complicada de escamboi”, Edward Solly formula em seu livro, The present distress, in relation to the theory of money (Londres, J. Ridgway, 1830), p. 3, o ponto de vista de Adam Smith, tal como está expresso em seu An inquiry into the nature and causes of the wealth of nations, cit., v. 1, cap. 4.
[144] Edward Solly, The present distress, in relation to the theory of money, cit., p. 5: “|a divisão aritmética que resulta da divisão do trabalhoi.”
[145] A indicação de página refere-se ao Caderno de Extratos III, de 1850. A passagem correspondente no livro de Solly [ibidem, p. 5-6] tem o seguinte teor: “|Dizer que essas somas aritméticas deveriam ser de ouro ou prata é dizer que medidas de distância em pés deveriam ser de ouro ou pratai.”
[146]A indicação de página refere-se a um caderno de extratos de Bruxelas, de 1845. A passagem correspondente no livro de James Lauderdale, Recherches sur la nature et l’origine de la richesse publique, et sur les moyens et les causes qui concourent à son accroissement (trad. E. Lagentie de Lavaisse, Paris, Dentu, 1808), p. 140, tem o seguinte teor: “|O ouro e a prata, como dinheiro, não são apreciados senão por sua utilidade para substituir o trabalhof.”
[147]Marx reproduz de modo abreviado a explicação feita por Lauderdale nas páginas 140-4 de Recherches sur la nature et l’origine de la richesse publique, cit.
[148] James Taylor, A view of the money system of England, from the conquest (Londres, J. Taylor, 1828).
[149] Jean-Charles Sismondi, Études sur l’économie politique (Bruxelas/Londres, Societé Typographique Belge/Dulan et Comp., 1838, tomo 2), p. 278.
[150] Ibidem, p. 300.
[151] Referência à expressão de Pierre Boisguillebert “précis de toutes les denrées” em sua obra “Dissertation sur la nature des richesses, de l’argent et des tributs”, em Eugène Daire, Économistes financiers du XVIIIe siècle (Paris, Guillaumin, 1843), p. 399.
[152] Acima dessa primeira linha da página 1 do Caderno de Extratos II consta: “Capítulo do dinheiro. (Continuação)”. À direita e um pouco mais acima, sem marca de inserção: “(Abundância, Acúmulo)”.
[153] A maldita fome de dinheiro. Virgílio, Eneida (Rio de Janeiro, Martins, 2004), canto III, verso 57.
[154]Em seu caderno de extratos “O sistema monetário completo” (p. 41), Marx escreveu o seguinte comentário: “Os laços têm de estar organizados como laços políticos, religiosos etc., na medida em que o poder do dinheiro não é o nexum rerum et hominum [aquilo que une as coisas e pessoas] (p. 34).” Não foi possível determinar a que se refere a indicação “p. 34”, uma vez que as quatro páginas anteriores desse caderno, em que sem dúvida era mencionada a fonte aqui extratada por Marx, não foram preservadas.
[155] Na margem superior dessa página, sem marca de inserção: “(|escambo, venda, comércioi) 3 etapas da troca. (Steuart.)”.
[156] Citado de acordo com o caderno de extratos “Sistema monetário, sistema de crédito, crises” (p. 21), onde Marx faz referência ao seu Caderno de Extratos VIII, p. 24.
[157]Cf. p. 172, nota 164.
[158] Cf. p. 61-2.
[159]Thomas Robert Malthus, Principles of political economy considered with a view to their practical application (Londres, W. Pickering, 1836), p. 391 [ed. bras.: Princípios de economia política e considerações sobre sua aplicação prática, São Paulo, Nova Cultural, 1996]. A indicação de fonte e página “X, 43” refere-se ao Caderno de Extratos X, de Marx.
[160] Heinrich Storch, Cours d’économie politique, ou Exposition des principes qui déterminent la prospérité des nations, avec des notes explicatives et critiques par J.-B. Say (Paris, J. P. Aillaud, 1823, tomo 2), p. 113-4.
[161] Ibidem, p. 113.
[162] Ibidem, p. 114.
[163] Ibidem, p. 175.
[164] Edward Misselden, Free trade, or, the meanes to make trade flourish (Londres, S. Waterson, 1622), p. 19-24.
[165] William Jacob, An historical inquiry into production and consumption of the precious metals (Londres, J. Murray, 1831, v. 2), p. 270-323.
[q] Por excelência. (N. T.)
[166]Bíblia, O Novo Testamento, Evangelho de Mateus 6, 19. Tomado do caderno de extratos “O sistema monetário completo” (p. 19). Também são tomadas desse caderno (p. 18-9) as outras citações posteriormente aduzidas de Petty e Misselden, bem como as afirmações de Marx sobre a mercadoria como “dinheiro efêmero”, sobre o dinheiro como “mercadoria eterna” e como ‘mercadoria onipresente”, sobre a mercadoria como “só dinheiro local” e sobre o “ascetismo” da formação de tesouro.
[167] Aqui e agora.
[168] A indicação de página refere-se ao caderno de extratos de Marx de julho de 1845. A citação provém do livro de William Petty, Several essays in political arithmetick, the titles of which follow in the ensuing pages (Londres, Peacock & Phoenix, 1699), p. 178-9.
[169]A indicação de página refere-se ao mesmo caderno de extratos citado anteriormente. A passagem extratada se encontra no livro de Petty [ibidem, p. 195-6].
[170]A indicação de página refere-se ao mesmo Caderno de Extratos citado anteriormente. A passagem extratada se encontra no livro de Edward Misselden, Free trade, or, the meanes to make trade flourish, cit., p. 7. A comparação com o “velho Jacob” refere-se à Bíblia, Antigo Testamento, Livro Primeiro de Moisés (Gênesis) 48, 13-20.
[171] Ibidem, p. 12-3.
[172] Referência ao caderno de extratos sem data ou numeração escrito por Marx em cerca de junho/julho de 1845, em Bruxelas. Os trechos comentados dos escritos de Boisguillebert são extraídos por Marx da coletânea organizada por Eugène Daire, Économistes financiers du XVIIIe siécle, cit. Eles estão publicados em: MEGA I/3, p. 563-83.
[173] O lendário rei da Frígia, “o Midas da fábula”, figura em uma das passagens extratadas por Marx dos escritos de Boisguillebert (ver nota anterior). De acordo com a saga grega, um deus satisfez o desejo do rei de que tudo por ele tocado se transformasse em ouro, porém isso incluiu também os alimentos. Um banho o libertou dessa funesta dádiva.
[174]Nassau William Senior, Principes fondamentaux de l’économie politique, tirés de leçons édites et inédites de Mr. N. W. Senior, par le comte Jean Arrivabene (Paris, J. P. Aillaud, 1836), p. 116-7.
[175]Samuel Bailey, Money and its vicissitudes in value (Londres, E. Wilson, 1837), p. 3: “[…] |a mercadoria geral de contratoi.”
[176] Heinrich Storch, Cours d’économie politique, cit., p. 135: “[...] |o numerário representa todas as outras riquezasf [...]”.
[177] Samuel Bailey, Money and its vicissitudes in value, cit., p. 9-10.
[178] Piercy Ravenstone, Thoughts on the funding system, and its effects (Londres, J. Andrews, 1824), p. 20.
[179] “Todos [i.e., dez futuros reis] têm o mesmo pensamento: transmitir à Besta a sua força e o seu poder. [A Besta fez com que todos [...] tivessem uma marca na mão direita ou na fronte] e que ninguém pudesse comprar ou vender a menos que tivesse a marca com o nome da Besta ou o número de seu nome.” Bíblia (Vulgata), O Novo Testamento, Revelação de João 17, 13 e 13, [16-] 17. Para a interpretação, comparar com Friedrich Engels, “Mitschrift einer Vorlesung von Ferdinand Benry über die Johannes-Apokalypse”, em MEGA, IV/1, p. 429-30. Do mesmo autor, “The Book of Revelation”, em Progress (Londres, 1883, v. 2), p. 112-6.
[180] Heinrich Storch, Cours d’économie politique, cit., tomo 1, p. 72.
[181]Ibidem, p. 73.