21

Celia sentiu-se gratificada por ver Lady Emily, Roger Pearson e o professor Henry Longworth na primeira fila do auditório. Não era apenas isso, mas também os ocupantes da sua mesa no jantar da noite anterior estavam lá.

Tinha aproximadamente o mesmo número de pessoas na audiência que Longworth tivera. No momento antes de começar a falar, sentiu uma onda de nervosismo paralisá-la, como era costume. Mas a seguir esse sentimento desapareceu.

— Uma palestra acerca de joias deve começar com uma definição da própria palavra. Joia é uma palavra oriunda do francês, jouel, que significa brinquedo. Apesar de os primeiros humanos criarem joias de conchas e outros objetos, o primeiro metal precioso usado para se fazer joias deve ter sido o ouro. É fácil perceber a razão pela qual o ouro seria uma escolha tão natural. Porque existe espalhado por todo o mundo e as sociedades primordiais tinham facilidade em recolher esse metal brilhante nas suas jazidas. O ouro tinha a vantagem de ser muito fácil de trabalhar. As primeiras sociedades aperceberam-se de que este metal não ganhava manchas nem se corroía. Este sentido de permanência rapidamente levou a que fosse associado aos deuses e à imortalidade em muitas culturas e em textos antigos. O Antigo Testamento faz alusão a um Bezerro de Ouro e Jasão e os Argonautas procuraram o Tosão de Ouro por volta de 1200 a.C. O desejo pelo ouro era o tema constante nos reinos do Médio Oriente. O rei da Babilónia escreveu: «Quanto a ouro, enviem-me o que tiverem à mão, o mais depressa possível.» O rei dos hititas escreveu numa carta: «Enviem-me grandes quantidades de ouro, mais ouro do que foi enviado ao meu pai.» A imagem mais antiga do antigo Egito reflete-se em ouro, porque este é considerado a matéria da carne dos deuses e a cor da divindade.

Ao longo dos vinte minutos que se seguiram, Celia falou da evolução das joias e de quando várias pedras preciosas tinham começado a ser usadas.

Decidiu que, uma vez que Lady Em admitira abertamente estar na posse do colar de Cleópatra e ir usá-lo a bordo, iria relacionar a história do colar e de outras joias fantásticas que tinham adornado Cleópatra ao longo dos seus trinta e nove anos de vida. A atenção inquestionável da audiência confirmou que fizera a escolha certa.

Deleitou o público com histórias acerca da joalharia egípcia no geral, o que incluía: ornamentos para a cabeça e pescoço; colares e cintas que adornavam o corpo; pulseiras; anéis para dedos e bandas para os pulsos e tornozelos.

O que não sabia é que o seu ouvinte mais atento entre a audiência era uma pessoa que já conhecia a história de todas as gemas que ela mencionara e que estava a felicitá-la em silêncio pela precisão da sua apresentação.

Ela disse à audiência que o foco da sua segunda palestra incidiria sobre o papel singular da esmeralda na história das joias. Depois disso, iria falar da história de diamantes lendários, tais como o Koh-i-Noor, que fazia agora parte da coroa da rainha Isabel, e o diamante Hope, que tinha sido doado ao Smithsonian.

Celia terminou a sua palestra dizendo:

— Lady Emily Haywood, que aqui se encontra hoje, é a atual proprietária do colar de valor inestimável que pertenceu a Cleópatra e julgo saber que ela tenciona usá-lo nesta viagem antes de o doar ao Instituto Smithsonian, quando regressar a Nova Iorque. À semelhança do diamante Hope, o colar poderá ser visto por milhões de visitantes todos os anos.

Lady Em levantou-se.

— Celia, tem de contar a história da lenda da maldição do colar de Cleópatra.

— Tem a certeza de que quer que o faça, Lady Em?

— Absoluta.

Hesitante, Celia explicou a maldição.

— Depois de ter sido obrigada a usar o colar na viagem pelo mar quando foi levada como refém para Roma, Cleópatra lançou uma maldição sobre ele: «Quem usar este colar no mar, jamais chegará vivo a terra.»

Apressou-se a acrescentar que as lendas, dada a sua própria natureza, não se baseiam em verdades e que tinha a certeza de que isso se passava com o colar de Cleópatra.

A julgar pelos aplausos, Celia soube que a sua palestra correra muito bem. Várias pessoas vieram ter com ela para lhe dizerem que tinham gostado muito e três mulheres perguntaram-lhe se as joias antigas que haviam herdado poderiam ter mais valor material do que elas pensavam.

Ela respondia sempre da mesma maneira àquela pergunta.

— Quando regressar a Nova Iorque, traga-me a joia que quer avaliar à Carruthers e terei todo o gosto em avaliá-la.

Uma mulher que aparentava ter sessenta e muitos anos não aceitou um não como resposta. Usava um anel no terceiro dedo da mão esquerda.

— Não é magnífico, este diamante? — perguntou. — O meu novo amigo deu-mo antes de embarcarmos. Ele disse-me que tinha quatro quilates e que fora extraído da mina na África do Sul apenas no ano passado.

Celia vasculhou a sua bolsa, à procura de uma pequena lupa de usar junto ao olho. Levou a lupa ao olho e examinou o anel. À primeira vista, viu imediatamente que a pedra era um zircónio. Disse:

— Vamos até à janela, para podermos vê-lo com mais luz.

Sorrindo e agradecendo às mulheres que se encontravam junto dela, Celia dirigiu-se à janela.

— Está a viajar com amigos? — perguntou de modo ligeiro.

— Oh, sim, estou. Com quatro amigas. Intitulamo-nos as «Viúvas à Vela». Viajamos pelo mundo inteiro juntas. É claro que todas concordamos que seria mais agradável estarmos com os nossos maridos, mas é o que é e temos de tirar o melhor proveito da situação.

— Mas disse que tem um namorado — afirmou Celia.

— Tenho, sim. É dez anos mais novo. Eu tenho setenta anos, mas ele disse-me que sempre namorou com mulheres mais velhas. Ele é divorciado.

— Desculpe. Não lhe perguntei o seu nome.

— Chamo-me Alice Sommers.

— Onde conheceu o seu amigo? — perguntou Celia, tentando imprimir à pergunta um tom descontraído.

O rosto de Alice Sommers ruboresceu.

— Eu sei que é capaz de achar patético, mas por pura diversão inscrevi-me num serviço de encontros na Internet, chamado Eu e Tu, Juntos, e o Dwight reagiu ao meu perfil.

Mais um aldrabão, pensou Celia, e a julgar pela facilidade com que as quatro viúvas viajavam, elas estão muito bem na vida.

— Alice — disse Celia. — Vou ser honesta. Isto não é um diamante verdadeiro. É um zircónio. Apesar de ser bonito, não vale nada. Não é fácil dizer-lhe isto, porque provavelmente vai sentir-se magoada e envergonhada, porque foi assim que eu me senti. O meu noivo ofereceu-me um lindo anel de noivado, mas descobri que ele andava a enganar pessoas para investirem no fundo de risco dele e que tinha usado esse dinheiro para, entre outras coisas, comprar aquele anel. O meu conselho é que atire o anel ao oceano e aproveite a companhia das amigas que viajam consigo.

Alice Sommers ficou a ouvir. Por um instante, permaneceu em silêncio, a seguir mordeu o lábio.

— Sinto-me uma tonta — disse. — E as minhas amigas tentaram avisar-me! Celia, pode ir comigo até ao convés e ver-me atirar esta porcaria borda fora?

— Com todo o gosto — respondeu Celia, com um sorriso. Mas quando estava a seguir Alice para o exterior, deu-se conta de que lhe tinha dado material para fofocar. Uma das amigas iria pesquisar o seu nome na Internet e ficar a par de todos os pormenores do envolvimento dela com Steven. E, sendo assim que funcionava o mundo, aquela situação iria espalhar-se entre os passageiros do navio como um fogo indomável.

Nenhuma boa ação fica impune, pensou ela quando, um minuto mais tarde, Alice Sommers, com um sorriso, tirou o zircónio do dedo, atirou-o bem alto e viu-o desaparecer nas águas cada vez mais turbulentas.