12

Devon Michaelson ficou satisfeito ao verificar que não havia mesa disponível no Salão da Rainha e dirigiu-se ao Bar Lido para beber um gim martíni. Viu dois casais bem-postos no bar que felizmente estavam concentrados a conversar. Quando soou a indicação para o jantar, ele desceu até à sala de jantar.

À semelhança do que acontecia no Titanic, os passageiros da primeira classe jantavam em grande estilo. Tratava-se de uma versão mais pequena da sala de jantar mais luxuosa do Titanic. Decorada em estilo jacobino, pintada de cor de amendoim, com móveis, cadeiras e mesas de carvalho e com um design destinado a conferir luxo e conforto permanentes. As mesas eram adornadas por candeeiros que imitavam castiçais. As amplas janelas panorâmicas eram emolduradas por cortinados de seda. Uma orquestra tocava calmamente em cima de uma plataforma elevada. Toalhas finas de linho davam o mote a porcelana de Limoges e talheres de prata.

Michaelson seria seguido até à sala de jantar por um casal que ele diria estar na casa dos sessenta anos. Quando os três se sentaram, ele estendeu a mão e apresentou-se:

— Devon Michaelson.

— Willy e Alvirah Meehan — anunciaram e aquele nome avivou a memória de Devon.

Onde os tinha visto ou ouvido falar deles?, pensou. Enquanto eles falavam, aproximou-se da mesa um outro homem. Alto, de cabelo escuro, olhos castanhos calorosos e sorriso fácil, sentou-se e apresentou-se:

— Ted Cavanaugh.

Um momento mais tarde, chegou uma quarta passageira.

— Anna DeMille — anunciou em voz alta.

Devon atribuiu-lhe cerca de cinquenta anos. Era muito magra, com cabelo preto moldado ao nível do queixo, sobrancelhas pretas carregadas e um sorriso aberto.

— Mas que grande aventura — exclamou ela. — Eu nunca estive num navio assim tão chique.

De olhos arregalados, Alvirah olhava em redor da sala de jantar.

— Isto é lindíssimo — declarou. — Nós já estivemos em cruzeiros, mas nunca vi nada tão espetacular. Só de pensar que já houve pessoas a viajar assim. É de cortar a respiração.

— Querida, no Titanic ficaram mesmo sem respiração. A maioria dos passageiros afogou-se — comentou Willy.

— Bom, isso não nos vai acontecer — afirmou Alvirah, com firmeza. Voltou-se para Ted Cavanaugh. — Ouvi-o comentar na receção que o seu pai é o embaixador aposentado do Egito. Eu sempre quis lá ir. Eu e o Willy fomos ver a exposição do rei Tut quando esteve em Nova Iorque.

— É admirável, não é? — comentou Ted.

— Eu sempre achei uma pena que tantos túmulos tivessem sido saqueados — disse Alvirah.

— Eu não podia estar mais de acordo — respondeu Ted, com convicção.

— Já viram as celebridades todas que estão esta sala? — perguntou Anna DeMille. — Até parece que nós também estamos na passadeira vermelha, não parece?

Ninguém respondeu, pois o primeiro prato foi servido naquele preciso momento. Uma dose generosa de caviar de beluga com natas, em pequenos triângulos de pão tostado foi servida, acompanhada por pequenos copos de vodca bem frio.

Depois de ter atacado os aperitivos, Anna dirigiu a sua atenção para Devon.

— E o senhor, o que faz? — perguntou-lhe.

A identidade falsa de Devon era de um engenheiro aposentado que vivia em Montreal. Isso não bastou a Anna.

— Está a viajar sozinho? — inquiriu com curiosidade.

— Sim, a minha mulher morreu com um cancro.

— Oh, lamento. Quando é que isso aconteceu?

— Há um ano. Estávamos a planear fazer esta viagem juntos. Eu trouxe a urna com as cinzas dela para espalhar no oceano Atlântico. Era o último desejo dela.

Aquilo devia parar com o interrogatório, pensou ele. Mas Anna ainda não estava satisfeita.

— Oh, vai fazer uma cerimónia fúnebre? — perguntou ela. — Li que há pessoas que fazem isso. Se quiser companhia, eu tenho todo o gosto em estar presente.

— Não, quero fazê-lo sozinho — disse ele, passando o dedo indicador por baixo do olho, para limpar uma lágrima que ali se formava.

Oh, meu Deus, pensou ele. Será que não me consigo livrar desta mulher?

Alvirah pareceu perceber que ele não queria que lhe fizessem mais perguntas pessoais.

— Anna, conte-me tudo, como foi ganhar esta viagem? — perguntou-lhe. — Nós ganhámos um jackpot na lotaria. É por isso que podemos estar aqui.

Quando Alvirah desviou a atenção de Anna dele, Devon ficou grato por poder centrar-se na mesa que tinha à sua direita. Observou com atenção as pérolas de Lady Haywood. Magníficas, pensou. Mas eram um mero adorno quando comparadas com as suas esmeraldas. Um desafio merecedor do ladrão de joias internacional conhecido como «Homem das Mil Caras». Nenhuma despesa fora poupada para garantir que ele ficava perto de Lady Em e do precioso colar de Cleópatra.

Devon lembrou-se de repente do que tinha ouvido acerca de Alvirah Meehan. Ela tinha sido crucial na resolução de vários crimes. Mas era melhor que não se envolvesse desta vez. Entre ela e Anna, estas duas mulheres podem dificultar-me o trabalho, pensou, taciturno.

Depois do caviar, de uma pequena tigela de sopa, de uma salada e de um prato de peixe, foi servida a seleção de pratos principais. A acompanhar cada um dos pratos, foi servido um vinho adequado. Após a sobremesa, foi posta à frente de cada um dos comensais uma pequena tigela meio cheia de água.

Willy olhou para Alvirah, com uma expressão suplicante. Alvirah olhou para Ted Cavanaugh e viu-o mergulhar os dedos na tigela e a seguir secá-los no guardanapo que tinha no colo. Depois disso, empurrou a tigela e o respetivo pires para a esquerda do seu prato. Alvirah seguiu o exemplo dele e Willy imitou-a a ela.

— É a isto que se chama uma tigela para dedos? — perguntou Anna.

Que lhe haviam de chamar?, pensou Devon, secamente, para com os seus botões.

— Mais alguns jantares como este e fico gordíssima — suspirou Anna.

— Ainda tem muito caminho pela frente — disse Willy, a sorrir.

Anna voltou a sua atenção para Devon. Quando o jantar estava a terminar, disse-lhe:

— Sei que há um programa de entretenimento no salão de baile esta noite. Gostava de me acompanhar?

— Obrigado, mas não me parece.

— Bom, nesse caso, que tal uma bebida à noite?

Devon levantou-se.

— Não — respondeu com firmeza.

Tencionava seguir o grupo de Lady Haywood no caso de eles irem assistir ao espetáculo ou a um dos bares do navio beber um copo. Queria insinuar-se junto da companhia dela. Mas isso não iria acontecer com alguém como Anna DeMille pendurada nele.

— Lamento, mas tenho alguns telefonemas para devolver. Boa noite a todos.