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Lady Em começou a escolher as joias que ia usar essa noite no cocktail dado pelo comandante.
— Acho que vou usar o colar da Cleópatra hoje — disse a Brenda. — Estava a pensar usá-lo pela primeira vez no jantar de amanhã, mas porque não hei de usá-lo hoje também? Há cinquenta anos que o tenho e nunca o usei em público.
Os seus olhos adquiriram uma expressão sonhadora quando recordou os jantares íntimos com Richard, em que ele lhe contava a história de como o pai tinha comprado o colar. Olhou para Brenda.
— O que acha?
— Porque não? — ripostou Brenda, com indiferença, recompondo-se de imediato. — Lady Em, o que quero dizer é que tem tão poucas oportunidades para usá-lo, porque não há de exibir o colar em várias ocasiões neste navio, especialmente porque, graças à Celia Kilbride, está toda a gente fascinada para o ver.
— E talvez para ver se a maldição de Cleópatra se vai cumprir nos próximos dias — comentou Lady Em secamente, questionando-se em seguida sobre o porquê de um arrepio lhe ter percorrido o corpo.
— De maneira nenhuma — disse Brenda, com firmeza. — Estou consigo há vinte anos, Lady Em, e nunca a ouvi dizer uma coisa dessas. E tenho de lhe dizer que não gosto de a ouvir falar assim. Eu nunca vi o colar de Cleópatra e já não gosto dele.
— As únicas pessoas que o viram nos últimos cem anos foram o meu marido, o pai dele e eu — comentou Lady Em.
Brenda pareceu-lhe tão convicta e tão sincera ao expressar a sua preocupação, que Lady Em afastou a suspeita de que havia algo na atitude da sua assistente de longa data que não tinha nada de lealdade. Tenho andado tão incomodada com a situação com o Roger, que talvez tenha sido brusca com ela nos últimos dias, pensou, e isso não é nada justo para ela.
Havia bolsas com joias em cima da cama e ela começou a abri-las, uma a uma. A primeira continha o colar de pérolas, os brincos e o anel que tinha usado na primeira noite a bordo. Provavelmente são as minhas joias mais valiosas depois do colar, pensou Lady Em.
— Brenda, eu sei que provavelmente já lhe contei que a mulher que foi casada com Caruso, o cantor de ópera, durante vinte e um anos, escreveu as memórias acerca da sua vida em comum. Nesse livro, ela relatou uma ida ao Delmonico’s a seguir à ópera e de todas as pessoas importantes irem até junto da mesa de ambos homenageá-lo. Nas suas memórias ela escreveu: «Enquanto eu me encontrava envolta em pele de marta, pérolas e encanto.»
— Julgo que me contou, sim — respondeu Brenda à sua patroa, com delicadeza.
— De certeza que contei — concordou Lady Em alegremente. — Julgo que é porque, à medida que envelhecemos, falamos cada vez mais do passado — disse, pegando numa pulseira de diamantes. — Há anos que não uso esta. As joias muito caras que trouxe para usar no cruzeiro foram as pérolas que usei na noite em que zarpámos, o colar de rubis e diamantes e, claro, o colar de esmeraldas. Esse, vou usar esta noite. Mas adoro esta pulseira. O Richard comprou-ma uma manhã em que passámos pela Harry Winston na Quinta Avenida. Parámos para ver os artigos expostos na montra e eu por acaso manifestei admiração por ela. O Richard puxou-me para o interior da loja, e dali a instantes, eu tinha a pulseira no pulso. Deu oitenta mil dólares por ela. Quando eu protestei, ele disse-me: «Não é assim tão cara. Usa-a em piqueniques.» Meu Deus, ele mimava-me tanto. E era o homem mais generoso do mundo. Ajudava tantas obras de beneficência. — A expressão dela alterou-se quando examinou a pulseira com mais atenção. — Há algo de errado com estes diamantes. Já não têm aquele tom azulado.
Ergueu o olhar para Brenda e viu a expressão de consternação e medo que se apoderou dela. O que se passa com ela?, pensou. A seguir, olhou de novo para a pulseira. Esta não é a pulseira que o Richard me deu, pensou. Eu sei que não é. Há anos que não uso algumas das minhas joias, refletiu. Será possível que ela me ande a roubar e que ande a substituir as minhas peças por lixo?
Naquele momento, estava certa de que tinha razão. Não a deixes perceber que sabes, advertiu-se.
— Bom, quando tiver oportunidade, Brenda, pode puxar-lhe o lustro com o pano de polir — disse. — E, se isso não resultar, eu peço à Celia Kilbride que lhe faça uma boa limpeza quando voltarmos para casa — disse. Suspirou. — Já basta de brincar com as minhas joias. Acho que vou descansar um pouco. Pedi ao Roger para estar aqui às onze horas. Quero falar com ele em privado. Porque não tira algum tempo para si?