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Tinha sido praticamente impossível para Celia adormecer. A responsabilidade de guardar o colar de Cleópatra, ainda que apenas durante algumas horas naquela noite, era esmagadora. O facto de Brenda Martin, a assistente de Lady Em e Roger Pearson, o seu consultor financeiro, andarem a roubá-la, era nauseante. Como deve ser triste chegar aos oitenta e seis anos e perceber que pessoas que achávamos serem amigos íntimos e que eram empregados bem pagos podiam tratar-nos assim. É uma pena Lady Em não ter familiares próximos, pensou Celia.
Nem eu, foi o seu próximo pensamento desanimador. Desde que aquela situação terrível tinha começado, ela começara a sentir cada vez mais saudades do pai. De uma maneira insana, começou a sentir ressentimentos por ele não ter voltado a casar e ela poder ter tido irmãos. Meios-irmãos, corrigiu-se, mas já me chegaria. Ela sabia que apenas alguns dos seus amigos que haviam investido dinheiro no fundo de risco de Steven acreditavam que ela estaria envolvida no esquema. Não obstante, quase todos tinham sido frios com ela. O dinheiro que andaram a poupar para comprar uma casa nova, ou um apartamento, ou para começar uma família, desaparecera. Culpada por associação, pensou ela com amargura, quando os seus olhos começaram finalmente a fechar-se.
O sono que por fim chegara dera origem a cinco horas de descanso profundo e pesado. Eram nove e meia quando finalmente acordou com a voz do comandante Fairfax.
— É com enorme pesar que anunciamos o falecimento de Lady Emily Haywood, que terá ocorrido algures durante a noite…
Lady Em está morta! Isso é impossível, pensou Celia. Sentou-se e saiu da cama, com a cabeça a mil. Eles sabem que o colar da Cleópatra desapareceu? Terão aberto imediatamente o cofre à procura dele? O que irão dizer se eu for ter com o comandante, entregar-lhe o colar e explicar as circunstâncias em que Lady Em mo deu?
Enquanto pensava naquele problema, começou a acalmar-se. Se entregasse o colar ao comandante, mostraria que não era uma ladra. Que ladrão se daria ao trabalho de roubar uma coisa para algumas horas mais tarde a devolver?
Para de ser paranoica, disse a si mesma. Vai correr tudo bem.
Os pensamentos dela foram interrompidos pelo som do telefone a tocar. Era o seu advogado, Randolph Knowles.
— Celia, lamento ter de lhe dizer isto. Acabo de falar com o FBI. Eles querem mesmo interrogá-la mal chegue a Nova Iorque.
Mal tinha desligado o telefone quando ele tocou novamente. Era Alvirah.
— Celia, eu não quero que esteja às escuras. Estive a ver o noticiário da manhã. O artigo da People já está a ser discutido — disse e fez uma pausa. — E deve ter ouvido o anúncio do comandante a propósito do falecimento de Lady Em.
— Ouvi, sim.
— É claro que o comandante não falou disso, mas nas notícias estão a anunciar que ela foi assassinada e que o valioso colar da Cleópatra desapareceu.
Quando a chamada acabou, Celia arrastou-se até ao sofá e sentou-se petrificada, em silêncio. Lady Em assassinada?, pensou. E o colar desaparecido? Tentou permanecer calma, apesar das implicações assombrosas do que aquilo significava explodirem na sua mente.
Eu tenho o colar, pensou num frenesim. Eu estive no quarto de Lady Em algumas horas antes de ela morrer, de ser morta. Alguém acreditará que Lady Em mo entregou? Com a história da People a ser publicada hoje e o Steven a jurar que eu estava metida na fraude do fundo de risco com ele, quem irá acreditar que eu não roubaria se tivesse essa oportunidade? Qualquer negociante de antiguidades trafulha pagaria uma fortuna pelo colar para depois o vender a um desses colecionadores privados que querem um tesouro destes para sua satisfação pessoal. Ou as incríveis esmeraldas podiam ser vendidas uma a uma a joalheiros. E quem teria contactos para organizar uma venda privada? Como gemóloga que viaja pelo mundo, eu teria.
Foi ao cofre, retirou de lá o colar e contemplou as esmeraldas perfeitas. Teve dificuldade em perceber por que motivo estava a considerar seriamente se devia ir até à sua varanda e atirar o colar ao oceano por baixo de si.