Isabelle
Vejo a mamã e o empregado a voltar para o posto de abastecimento. Consigo abrir a porta do carro e saio. Tenho o coração a bater desenfreado e o sangue aflui-me às orelhas com a força de uma queda de água. Sinto o corpo pesado e o andar instável.
Há mais carros no estacionamento, mas estão vazios. Há um autocarro aqui perto e um camião ao lado. Vou a cambalear até à estrada e abano os braços para um carro que vira para mim. O condutor vê-me. É um senhor de idade com um boné castanho e óculos de armação grossa. Acena-me, passa por mim e desaparece.
Passam outros carros na estrada principal. Ninguém me vê, ninguém repara nas minhas débeis tentativas para abanar os braços. Grito a pedir ajuda, mas tenho a voz muito fraca. Limpo com a manga o suor que me escorre pela cara. Olho para baixo e reparo que estou descalça. A relva onde me encontro está molhada e tenho as meias roxas ensopadas.
Olho para a direita, depois para a esquerda. Podemos estar em qualquer sítio da Suécia. Bandeiras vermelhas e brancas com o nome da cadeia de postos de abastecimento. Um jardim-infantil à direita, a autoestrada à esquerda e, do outro lado, campos e pradarias. Algumas casas e um celeiro ao longe, e depois uma floresta. Viro-me para trás e vejo um letreiro com letras verde-claras por cima de um anexo vermelho. Olho com mais atenção, tentando ler. É o restaurante Ringarums.
Tenho de encontrar alguém que possa ajudar-me, antes que a mamã regresse e me veja. Volto para junto do autocarro. Um homem gordo de uniforme está a acender um cigarro. Pergunto se ele pode ajudar-me. Ele olha para mim e enruga a testa. Chama-me drogada e diz que me ponha ao fresco.
– Preciso de ajuda – digo, e aproximo-me. – Por favor, posso esconder-me no autocarro?
O homem dá-me um empurrão e vira-me costas. Caio sentada no alcatrão. Sinto um espasmo de dor na coxa. Sinto a cabeça a latejar por causa de a mamã ter batido com ela na parede. Tento pôr-me de pé, mas tenho o corpo no limite da exaustão.
– Olá – diz uma voz. Um jovem de cabelo loiro comprido e barba agacha-se ao meu lado. – Estás bem? Ele magoou-te? – Pousa uma mão no meu ombro.
– Ajuda-me.
– Estás sozinha? – Levanta-se, olha em redor e de relance para o posto de abastecimento.
Agarro-lhe a mão e puxo-o para mim.
– Tenho de sair daqui – murmuro.
Ele ajuda-me pôr-me de pé.
– Tenho o carro ali – diz ele, apontando para um Volvo prateado.
Enfio o braço no dele o mais depressa que consigo. Ele passou um braço por cima dos meus ombros para eu me apoiar. O carro está muito longe. Há a possibilidade de a mamã me ver.
Ele abre a porta e eu entro para o banco de trás. No lugar do passageiro está uma rapariga com cabelo à escovinha e feições asiáticas. Vira-se para trás e olha para mim.
– O que te aconteceu? Parece que levaste uma tareia.
– Ela tem de ir para o hospital – diz o homem. – Foi espancada.
– Queres que te levemos ao hospital? – diz a mulher.
Eu abano a cabeça. Começam a discutir um com o outro. Eu imploro-lhes que arranquem.
– Nós vamos para Västervik – diz ele. – Queres vir connosco?
Digo que sim com a cabeça.
Por fim, ele liga o carro e começa a andar para a saída.
Fecho os olhos e encosto a cabeça ao vidro.