Ao se iniciar a década de 1920, o consumo das famílias era a grande mola propulsora da economia dos Estados Unidos. Entre outros tipos de gastança, as pessoas iam regularmente ao cinema, compravam aparelhos de rádio e gramofones — trazendo a música dos teatros para dentro de casa —, frequentavam restaurantes, sorveterias e lanchonetes. Os automóveis deixaram de ser privilégio dos muito ricos, graças à redução dos custos de produção propiciada pelas linhas de montagem de Detroit.
A revolução feminina americana de costumes também começara. As mulheres já podiam usar cabelos curtos, sem serem consideradas indecentes, e mostrar as pernas — as barras das saias subiram do tornozelo para o joelho. No dia 18 de agosto de 1920 foi ratificada a 19a emenda à Constituição, instituindo o sufrágio feminino.
Com o advento da Lei Seca, boa parte da população passara a delinquir. Enquanto dezenas de milhares de cidadãos aprenderam a fazer bebidas alcoólicas caseiras, um número muito maior começou a frequentar os speakeasies, bares clandestinos — mas não tão clandestinos que não pudessem ser encontrados com facilidade — onde uísque, vinho, cerveja, gim, rum e outras beberagens contrabandeadas da Europa e do Canadá eram consumidas à larga. O hábito deu grande impulso aos gângsteres e à corrupção policial.
Fregueses bebendo em um speakeasy
Nova York, década de 1920
Latinstock/© Bettmann/corbis/Corbis (DC)
Beber escondido em caves, cujas portas equipadas de olho mágico só eram abertas para clientes da casa, era muito mais divertido do que beber legalmente. Os jovens, então, adoravam o clima de cumplicidade criado pelo novo hábito.
Além do cinema, dos gramofones, das saias curtas, dos carros de Detroit e das noitadas em speakeasies, outras modas excitantes estavam surgindo. Entre elas a de se especular com ações, atividade que, tal como acontecia com a compra de automóveis, deixara de ser exclusiva dos ricos. Pois agora os bancos ofereciam “empréstimos com chamadas de margem” (margin calls ou call loans) para pessoas de classe média.
Se um investidor, por exemplo, dispunha de mil dólares para investir na Bolsa, as sociedades corretoras lhe ofereciam, digamos, um empréstimo de 3 ou 5 mil para a compra de ações a termo. Os mil dólares e as próprias ações serviam como garantia dessas compras. Se o mercado caísse, as corretoras, que eram financiadas pelos bancos, davam duas opções aos clientes: reforçar suas margens, ou seja, acrescentar mais dinheiro aos mil dólares iniciais, ou vender as ações compradas a termo e realizar o prejuízo.
Só que isso raramente acontecia, pois o mercado de ações não fazia outra coisa a não ser subir. Por causa dessa alta, muita gente que jamais sonhara com a hipótese enriquecia facilmente. E espalhava para os amigos.
“Pode comprar. Os bancos emprestam quase todo o dinheiro. Se você for audacioso e tiver um pouco de sorte, pode transformar quinhentos dólares em 10 mil. Foi o que aconteceu comigo.”
Os especuladores às vezes exageravam.
No ano de 1920, o volume de empréstimos feitos pelos bancos americanos às corretoras para financiar compras sob margem dos clientes atingiu 1,5 bilhão de dólares.
Charles Chaplin, que em 1918, aos 29 anos, se casara com a atriz Mildred Harris, de apenas 16, não conseguia encontrar inspiração para criar novas histórias para Carlitos. Foi num estado de espírito acabrunhado que certa noite Chaplin compareceu ao teatro Orpheum, em Los Angeles, para assistir ao show de um bailarino, John Coogan. O espetáculo não tinha nada de excepcional. Mas ao final da apresentação, Coogan chamou seu filho, Jackie, de apenas 6 anos, para participar dos agradecimentos.
As reverências e o modo engraçado como Jackie Coogan se dirigiu à plateia encantaram a todos. As pessoas gostaram tanto dos trejeitos e da personalidade do menino que este foi obrigado a retornar ao palco por diversas vezes.
Se os expectadores gostaram, Charles Chaplin simplesmente ficou extasiado. E prometeu a si próprio que não descansaria até conseguir que o garotinho participasse de um filme de Carlitos.
Foi assim que nasceu The Kid (O garoto), no qual Carlitos era um consertador de vidraças, cabendo a seu parceiro, interpretado pelo menino Jackie, quebrá-las antes com pedradas. Numa cena que entrou para a antologia do cinema, o garoto se prepara para jogar uma pedra numa vidraça que logo o “sócio” iria se apresentar para substituir. Só que quando traz o braço para trás para preparar o lançamento, a mão de Jackie esbarra no uniforme de um policial que o observa atentamente.
O menino olha para o guarda, abre um sorriso, joga a pedra para cima e a apara na mão. Só então inicia uma desabalada carreira.
The Kid era um filme para fazer as pessoas alternarem risos com choros, coisa jamais tentada em Hollywood. Em certo momento, um agente do juizado de menores tira o menino do vagabundo para levá-lo a um orfanato. Só que Carlitos consegue resgatar Jackie.
Apesar de fazer fé no futuro da fita, Charles Chaplin jamais poderia imaginar que The Kid seria um dos maiores sucessos da era do cinema mudo.
Nas eleições presidenciais de 1920, realizadas no dia 2 de novembro, o candidato republicano Warren G. Harding saiu vencedor, batendo por larga margem o democrata James Cox. Caberia a Harding governar os Estados Unidos nos primeiros anos dos Roaring Twenties. Sua plataforma era priorizar o desenvolvimento do país, mesmo que em detrimento da austeridade fiscal.
Logo após a eleição de Harding, e antes de sua posse, um atentado à bomba em Wall Street matou 38 pessoas em frente ao prédio do Banco Morgan. A explosão causou pânico na Bolsa de Valores de Nova York, que levou um tombaço.
Os autores da chacina não foram identificados. No entanto, dois anarquistas italianos, o sapateiro Nicola Sacco e o vendedor ambulante de peixes Bartolomeo Vanzetti, suspeitos de um duplo homicídio ocorrido durante um assalto em Massachusetts no início do ano de 1920, sem que houvesse nenhuma prova consistente contra eles, foram julgados, condenados à morte e executados na cadeira elétrica sete anos mais tarde. Segundo as autoridades policiais e judiciárias, alguém teria de servir como exemplo para evitar que atentados como o de Wall Street se repetissem.
Em 1920, William (Billy) Crapo Durant, que reassumira a presidência do Conselho de Diretores da General Motors cinco anos antes, voltou a ver a empresa enfrentar problemas financeiros causados por um programa expansionista ambicioso demais e pela construção do faraônico edifício Durant, em Detroit. Billy Durant recorreu aos bancos, que lhe recusaram suporte.
Próximo passo, Durant tentou Wall Street, oferecendo 64 milhões de dólares em ações ao público. Mas o mercado ainda se ressentia da queda provocada pelo atentado a bomba e os papéis não encontraram receptividade.
Billy Durant não teve outro remédio senão aceitar uma proposta conjunta do Banco Morgan e da DuPont, que adquiriram a GM por míseros 20 milhões de dólares. Durant não esperou ser demitido da presidência do Conselho. Renunciou antes.
Uma das primeiras providências dos novos donos da empresa foi mudar o nome do novo e pomposo prédio sede de Durant Building para General Motors Building.