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Jack Morgan, o banqueiro do mundo

Enquanto os Estados Unidos se tornavam a maior potência econômica do planeta, superando inclusive o Império britânico, a União Soviética — que era como a Rússia e os países sob seu domínio passaram a se chamar desde 1922 — tentava edificar uma sociedade próspera baseada no socialismo. Já a Alemanha sofria para cumprir as cláusulas draconianas do Tratado de Versalhes.

Adolf Hitler, um cabo austríaco, pintor de paredes de origem, que recebera a Cruz de Ferro por atos de bravura na frente ocidental durante a Grande Guerra, liderava agora o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, ou simplesmente Partido Nazista, como era mais conhecido.

Apesar de sua pouca instrução, Hitler era dotado de enorme carisma e atraía seguidores em todo o país com sua oratória repleta de slogans repetitivos e citações bombásticas, acompanhada de gestos teatrais, que magnetizavam os ouvintes. Para o líder nazista e seus adeptos, os políticos e os militares que haviam assinado o armistício de 1918 e aceitado as cláusulas de Versalhes, assim como os judeus, eram os vendilhões da pátria.

Com os cofres do Tesouro vazios por causa dos pagamentos de reparações de guerra às potências vencedoras, o governo alemão não teve outro remédio a não ser imprimir dinheiro. Em volume tão grande que resultou numa inflação devastadora.

Em 1914, quando estourou a Grande Guerra, um dólar custava 4,2 marcos. Em 1922, a cotação subira 166.500% para 7 mil. Um ano depois, no verão de 1923, o dólar era trocado por 200 mil marcos. No final do outono esse valor subiu para inacreditáveis 4,2 trilhões de marcos. Em novembro de 1923, a taxa mensal de inflação na Alemanha atingiu 10.121% e a moeda simplesmente perdeu seu poder de compra. O próprio dólar em espécie só tinha utilidade quando eram cédulas de baixo valor, pois ninguém seria ingênuo o bastante para comprar alguma coisa com uma nota de vinte dólares, por exemplo, e receber o troco em notas de 20 bilhões de marcos, que em poucas horas nada valeriam.

Na noite de quinta-feira, 8 de novembro de 1923, no auge do pique inflacionário, Adolf Hitler tentou dar um golpe de Estado em Munique, na Bavária, que ficaria conhecido como o Putsch da Cervejaria, pois foi numa das maiores e mais famosas da cidade, a Bürgerbräukeller, que os conspiradores se reuniram para iniciar o movimento.

Quando, após discursos que vararam a madrugada, os golpistas saíram às ruas no dia seguinte, na esperança de que multidões se juntassem a eles, foram atacados pela polícia. Na fuzilaria que se seguiu, dezesseis nazistas e quatro policiais foram mortos. Hitler conseguiu fugir, mas foi preso pouco depois. Julgado e sentenciado a cinco anos de detenção, cumpriria apenas um. Na prisão ele escreveria o livro Mein Kampf (Minha luta), no qual expunha suas teorias raciais e expansionistas e que se tornaria a bíblia do nazismo.

Nas eleições presidenciais americanas de 1924, vencidas pelo republicano Calvin Coolidge, pela primeira vez o rádio foi usado durante a campanha pelos três candidatos. Graças ao engenhoso trabalho de David Sarnoff, a RCA, agora dirigida por ele, transmitiu os discursos pronunciados nas convenções dos partidos Republicano, Democrata e Progressista para todo o país.

Mil novecentos e vinte e quatro foi também um ano de mudanças na indústria automobilística em Detroit. Até então a Ford era a única montadora que se interessava por fabricar carros populares, tendo produzido 10 milhões de unidades do Modelo T. Agora havia uma concorrente de peso nesse segmento, a General Motors, que oferecia ao público modelos tão baratos quanto o T, só que equipados com mais recursos. Em vez da partida com manícula, por exemplo, uma manivela que fazia o motor pegar, de difícil manuseio para as mulheres e perigosa até para os homens, que não raro quebravam o braço no procedimento, os Chevrolets da GM dispunham de um sistema elétrico de partida que acionava um motor de arranque, além de outras novidades.

Model Ts at St. Louis City Hall

Os Modelos T, da Ford Motor Company

St. Luis, Missouri, EUA, década de 1920

Latinstock/© corbis/Corbis (DC)

O Bancitaly, de Amadeo Peter Giannini, era agora uma poderosa instituição bancária com 115 milhões de dólares de capital. Ao contrário dos outros banqueiros, Giannini considerava sua empresa um órgão de utilidade pública, que existia apenas para servir às pessoas, e recusava-se a receber salário por seu cargo de presidente do banco.

A Casa Morgan, sob a direção de Jack Morgan, filho do falecido J. P., continuava atuando em diversos países. Em 1923 a instituição fez vultosos empréstimos para Cuba e para a Áustria, nações que corriam risco de se tornarem insolventes. Pouco depois, quando Cuba ameaçou criar impostos específicos para empresas e cidadãos americanos, Jack Morgan enviou um emissário a Havana, que conseguiu que o país desistisse das medidas. Moscou não gostou da interferência. O Kremlin declarou que o “capitalismo orquestrado por Morgan estava tentando dirigir o mundo”.

Em 1924, Frances Louise Tracy, viúva de J. Pierpont e mãe de Jack Morgan, morreu. Jack passou a ser o acionista majoritário do banco que já dirigia desde a morte do pai. Nesse ano, a Casa Morgan emprestou grandes quantias à França e ao Japão. Os Morgan eram de fato os banqueiros do mundo, papel que anos mais tarde caberia ao FMI e ao Banco Mundial.

Irving Berlin não podia se queixar da vida. Sua canção What’ll I Do?, lançada em 1924, vendeu 2 milhões de cópias em discos e partituras. As ondas de rádio enviavam What’ll I Do? para todas as cidades de costa a costa, assim como as músicas compostas anteriormente por Berlin.

A prosperidade dos Estados Unidos parecia não conhecer limites, para grande regozijo dos especuladores. Eles agora deixavam um pouco de lado o mercado de ações para investir num boom imobiliário que germinava na Flórida. Os preços dos terrenos, que podiam ser comprados com entradas módicas de até 10%, não raro triplicavam ou quadruplicavam em poucos meses.

“Alavancagem” voltava a ser a palavra mágica, a chave da riqueza fácil e quase instantânea.

Deus abençoe a América era o título da música guardada e esquecida no fundo do baú da casa de Irving Berlin em Nova York.