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Ricos e felizes

O mercado americano de ações continuava em franca expansão no início de 1925. Para financiar as operações com chamada de margem de seus clientes, as sociedades corretoras filiadas às bolsas haviam tomado emprestados dos bancos 2,5 bilhões de dólares. Era a “alavancagem” a pleno vapor.

Veio então o estouro da bolha imobiliária da Flórida. O pretexto foram dois furacões que atingiram o estado. Mas a desculpa foi apenas isso, uma desculpa, já que não há nenhuma imprevisibilidade em furacões na península. Eles acontecem quase todos os anos.

O motivo real foi que, em determinado momento, o número de vendedores de promessas de venda de terrenos ultrapassou o de novos investidores querendo entrar na ciranda do lucro fácil. Os preços pararam de subir e então desabaram. Uma multidão de especuladores queria vender suas promessas ao mesmo tempo e o pânico foi inevitável.

O desastre na Flórida refletiu-se negativamente no mercado de ações de Nova York, mas não por muito tempo. Logo a Bolsa voltou a subir.

A sociedade corretora Merrill Lynch, de Charles Merrill e Edmund Lynch, se especializara no lançamento de ações novas ao público (IPOs — Initial Public Offering), principalmente de empresas do ramo de mercearias, supermercados, lojas de departamento e cadeias varejistas. Esses papéis atraíam cada vez mais a classe média para as bolsas, que se democratizavam.

Após quatorze anos de viuvez, Irving Berlin casou-se novamente em janeiro de 1926, na cidade de Nova York. Ele tinha agora 37 anos. Sua noiva, a jornalista Ellin Mackay, de 22, era filha do magnata dos telégrafos Clarence Mackay, que se opôs ao casamento, ao qual não compareceu, entre outras coisas por Berlin ser judeu, quinze anos mais velho do que Ellin, vir de uma categoria social inferior, fora o “agravante” de ser um artista, embora muito rico. A família Mackay era católica e extremamente conservadora.

Mary Ellin, a primeira filha de Irving e Ellin, nasceu em 25 de novembro de 1926. Clarence, o avô, não foi conhecer a neta.

Na Inglaterra, no dia 3 de maio de 1926, 3,5 milhões de trabalhadores sindicalizados, a maioria ligada ao Partido Trabalhista, cruzaram os braços, interrompendo as atividades dos transportes públicos, das fábricas, das minas de carvão e dos moinhos. Com os gráficos também em greve, os jornais deixaram de ser publicados.

O governo conservador, liderado pelo primeiro-ministro Stanley Baldwin, mobilizou todos os efetivos policiais e militares do país para enfrentar os grevistas. Já o Chancellor of the Exchequer (chanceler do Erário, cargo equivalente ao de ministro da Fazenda), Winston Churchill, advertiu que o governo de Sua Majestade (George V) não hesitaria em usar esse aparato bélico para combater o movimento.

Em uma semana, 4 mil grevistas foram presos durante enfrentamentos com as forças oficiais. O Flying Scotsman, trem expresso que ligava Londres a Edimburgo, foi descarrilado por sabotadores. Finalmente a greve foi subjugada.

Nessa ocasião, Clarence Charles Hatry, magnata do vidro, agora com 39 anos, dono da British Glass Industries e um dos empresários mais bem-sucedidos do Reino Unido, tinha planos grandiosos, como sempre fora de seu feitio. Através de suas instituições financeiras, o Drapery and General Investment Fund e o Corporation and General Securities, Hatry pretendia fazer uma série de fusões e aquisições.

Clarence Hatry planejava adquirir o controle acionário da United Steel Company, que representava 10% da indústria britânica de ferro e de aço. Em seguida, o magnata fundiria a United com outras companhias siderúrgicas independentes.

Imodestamente, Hatry queria ser o rei do vidro, do ferro e do aço no Reino Unido. Para financiar todas essas operações, ele teria de vender ações do novo conglomerado ao público.

Em 1926, Joe Kennedy, que se mudara com a família de Boston para Nova York, sempre ansioso por explorar um novo campo de atividades, decidiu investir no show business. Viajou para a Califórnia e lá adquiriu uma pequena produtora de Hollywood, à qual deu o nome de FBO — Film Booking Office. Logo o novo estúdio rodava melodramas e faroestes em série. Eles levavam não mais do que uma semana para serem produzidos, ao custo médio de 30 mil dólares.

A FBO revelou-se bastante lucrativa, mas Kennedy queria mais. Sua intenção era ser um dos grandes do negócio. Procurou David Sarnoff, da RCA, e o convenceu a investir em seu estúdio, garantindo em troca exclusividade na rede de salas de exibição da Radio.

Kennedy comprou também a cadeia Keith-Albee de cinemas e tea­tros de vaudeville, pagando por ela 4,2 milhões de dólares.

Cinco milhões de residências americanas dispunham de aparelhos radiofônicos e a RCA formara uma rede transmissora à qual deu o nome de National Broadcasting Company (NBC), que disputava ouvintes com a concorrente Columbia Broadcasting System (CBS).

No dia 23 de agosto de 1926, os americanos, ou melhor, as americanas, enlutaram-se com a morte do astro de Hollywood Rudolph Valentino, aos 31 anos. O acontecimento provocou cenas de histeria em massa, assim como uma série de suicídios de fãs.

Nessa época, uma viagem de trem entre Nova York e Los Angeles durava cinco dias e cinco noites, o que nos melhores expressos não tinha nada de sacrificante. Tanto no Twentieth Century Limited, entre Nova York e Chicago, como no Santa Fe Super Chief, que ligava Chicago a Los Angeles, os passageiros de primeira classe, não raro astros e estrelas famosos do cinema, assim como grandes empresários, dispunham de compartimentos luxuosos.

As cabines de mogno, com detalhes em bronze polido e brocados vermelhos, eram equipadas com confortáveis poltronas, que à noite se convertiam em leitos. Havia comodidades tais como telégrafo, banhos de chuveiro, serviços de barbeiros, cabeleireiros e manicures, além de um requintado vagão-restaurante.

Enquanto os passageiros, durante o almoço, admiravam os campos da Nova Inglaterra, as pradarias do Meio-Oeste, os cânions do Colorado e os desertos do Arizona e do Novo México, podiam se deliciar com trutas frescas capturadas nos rios das montanhas, e entregues por pescadores nas estações ao longo da rota, ou guisados de perus selvagens, fornecidos por caçadores das matas à beira da linha férrea.

À noite o jantar, não menos sofisticado, era seguido por conversas animadas que iam até altas horas, regadas por bebidas que os agentes da Lei Seca não conseguiam impedir que fossem contrabandeadas para bordo do trem.

Naquele ano de 1926, 4,301 milhões de automóveis foram produzidos nos Estados Unidos. Os Roaring Twenties se encaminhavam para seu auge, uma época, conforme alguns prediziam convictos, na qual todos seriam ricos nos Estados Unidos da América. Ricos e felizes.