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Jantar em Hollywood

A constante defasagem da ticker-tape trazia enormes inconvenientes para os investidores e especuladores de todo o país. Alguém, por exemplo, em Wichita, no Kansas, querendo pular fora de determinado papel, poderia ver na ticker que seu título estava cotado a oitenta dólares. Então dava uma ordem de venda a mercado, supondo que a transação sairia por volta daquele preço. Só que, devido ao atraso, a ação talvez pudesse estar a 75 dólares. E era nesse nível bem mais baixo que saía o negócio, provocando a fúria do vendedor.

Bobagens e mais bobagens continuavam sendo ditas pelos otimistas mais recalcitrantes. O professor Fisher, de Yale, agora afirmava que a queda dos últimos dias era apenas “o resultado de um comportamento lunático, mas passageiro, por parte dos investidores”.

Noutra explicação, não menos tola, Fisher disse que os preços das ações ainda não refletiam os benefícios causados pela Lei Seca à produtividade dos trabalhadores americanos. O professor só não mencionou o fato de que a lei já estava em vigor no país havia dez anos.

Para a maioria das pessoas que tinham aplicado seu dinheiro na Bolsa nos últimos anos, os lucros de suas carteiras ainda eram substanciais. Mas a sessão de quarta-feira, dia 23 outubro de 1929, foi a última oportunidade de pular fora da ciranda da felicidade dos Roaring Twenties.

Nessa quarta, o mercado abriu calmo. Quem quis vender na abertura, pelos preços de fechamento da véspera, ainda pôde fazê-lo. Só que a calmaria teve vida curta. Logo começaram a surgir ondas de vendedores, alguns premidos por chamadas de margens dos bancos, outros, ursos oportunistas, vendendo a descoberto.

Ao final do dia, a média industrial do Times caíra de 415 para 384, voltando ao nível de junho. A AT&T perdera quinze pontos, ou quinze dólares; a General Electric, vinte; a Westinghouse, 25; a J. I. Case, 46; a Commercial Solvents, setenta; a Otis Elevator, 43; a Westinghouse, 35; e a Adam Express catastróficos 96 dólares por ação. O volume de negócios atingiu 6.374.960 ações, o segundo maior da história.

Ao atraso, agora rotineiro, da ticker-tape, juntou-se uma tempestade prematura de neve que interrompeu as comunicações em diversos pontos do Meio-Oeste, deixando os investidores dessas áreas sem ter a menor ideia do que acontecia em Wall Street.

Richard Whitney, vice-presidente em exercício da Bolsa de Nova York, não testemunhou a queda. Resolvera enforcar o dia, sem avisar aos seus subalternos onde poderia ser encontrado, e foi assistir às corridas de cavalos no hipódromo de Essex Fox Hounds, em Far Hills, Nova Jersey.

Com o presidente Edward Simmons em viagem de lua de mel e seu vice cabulando o serviço, a Bolsa não dispunha de ninguém para discutir, se fosse o caso, com as autoridades monetárias um modo de impedir o agravamento da situação.

Em Hollywood, o ator Charles Chaplin e o compositor Irving Berlin foram jantar juntos. Chaplin ficou surpreso quando Berlin — cuja canção Blue Skies, escrita três anos antes, liderava as paradas de sucesso — lhe disse que tinha vários milhões de dólares em ações.

“Você está louco, Irving”, o comediante censurou o amigo. “O mercado está se esfarinhando. Você vai perder uma fortuna. Eu liquidei minha carteira na primavera do ano passado.”

“Ano passado?”, Berlin abriu um sorriso de deboche. “Então você deixou de ganhar uma fortuna. Perdeu toda essa alta.”

“Mas não vou perder a baixa. Eu já disse. O mercado vai levar um tombo gigantesco. Liquida tudo.”

“Não se ofenda, Charlie”, o compositor assumiu um ar de censura, “mas eu acho esse negócio de vender impatriótico. Antiamericano. Eu vou continuar comprando todos os meses. Na alta, na baixa, não quero saber. Parte do que eu ganho irá sempre para o mercado de ações”.

O dia seguinte provaria que Charles Chaplin estava certo. E as próximas seis décadas, que Irving Berlin — cuja morte só aconteceria aos 101 anos — não estava de todo errado. Mas só alguém com a determinação e a tenacidade daquele bielorrusso/americano de 41 anos teria nervos para suportar os acontecimentos da quinta-feira, 24 de outubro de 1929, quando os americanos, sem acreditar no que viam, pararam para acompanhar o terremoto que tomou conta de Wall Street.