Além de ativo especulador da Bolsa, James Riordan era presidente da New York County Trust Company. Sua morte foi uma surpresa para o mercado. Às 17h40 de sexta-feira, 8 de novembro de 1929, portanto menos de duas semanas após o crash, ele sentou-se numa poltrona de sua elegante casa em Manhattan e suicidou-se com um tiro no ouvido.
Assim que soube da tragédia, John Jakob Raskob, o homem do Empire State e sócio de Riordan na New York County, fez o possível e o impossível para que a imprensa não soubesse do ocorrido até o final do expediente bancário de sábado, dia 9, que aconteceu ao meio-dia.
Com a colaboração da polícia metropolitana de Nova York, inclusive do médico legista que cuidou do corpo de Riordan, a iniciativa de John Raskob teve êxito. Nas primeiras horas, só o círculo mais íntimo de parentes e amigos do morto ficou sabendo do suicídio. Raskob pôde então examinar as contas do banco, o que fez durante o restante do sábado e o dia todo de domingo.
Para grande espanto de John Jakob Raskob, não havia nenhum rombo na New York County Trust Company. Na segunda-feira, com toda a opinião pública já ciente do que acontecera, Raskob assumiu as rédeas da instituição e usou de todo o seu prestígio para minimizar os efeitos de um início de pânico dos correntistas. Contou com a ajuda do prefeito da cidade, James Walker, que mandou o tesouro municipal fazer um vultoso depósito no banco.
A County Trust continuou de pé, agora com John Raskob na presidência. Riordan, embora tenha perdido boa parte de sua fortuna especulando na Bolsa, não tocara em um só centavo do dinheiro da Trust.
É comum se mostrar o grande crash de 1929 como tendo sido o detonador de uma onda de suicídios. Hollywood, por exemplo, adora essa versão. Em diversos filmes, especuladores e homens de negócios os mais diversos são mostrados saltando de andares altos dos hotéis de Nova York. Ficcionistas também são fãs do tema, como também eram os comediantes da época, politicamente mais do que incorretos.
“O senhor está se registrando para dormir ou para pular?”, perguntava, num diálogo tragicômico de um show de variedades da Broadway, o recepcionista de um hotel nova-iorquino. “Se for para pular, senhor, por favor, pague adiantado.”
Tudo isso é puro folclore, além de exagero. Houve realmente um aumento no índice de suicídios após o crash e durante a depressão, mas foi uma coisa mais pontual. Só que houve gente que se aproveitou dessas mortes para especular na Bolsa.
No sábado, 12 de março de 1932, por exemplo, Ivar Kreuger, um financista e especulador international de grande notoriedade — operava, nem sempre de modo muito honesto, nas bolsas dos dois lados do Atlântico Norte —, apontou uma arma semiautomática contra a própria cabeça e se matou.
O suicídio ocorreu em Paris, às onze da manhã, hora local, com a Bolsa de Nova York tendo todo seu meio pregão de sábado pela frente. Policiais parisienses foram subornados e a notícia retida até que especuladores do círculo de Kreuger pudessem vender a descoberto ações da Kreuger and Toll e da Lee, Higginson and Company — empresas ligadas ao financista morto — no mercado americano.
Jesse Livermore tornara-se o mais famoso e mais bem-sucedido urso dos Estados Unidos e talvez do mundo. Como emérito ganhador nas baixas, não era de se espantar que ele tenha faturado horrores no crash.
Nos dias de pânico generalizado do final de outubro de 1929, Livermore se deu muito bem. Ficou vendido a descoberto e rachou de ganhar dinheiro.
No dia 13 de novembro, uma quarta-feira, Jesse Livermore percebeu que o mercado já caíra demais. E trocou a pele de urso pela de touro. Liquidou suas posições vendidas e adquiriu todos os papéis que lhe foram oferecidos. Mais uma vez acertou na mosca. Assim como continuou ganhando ao longo de 1930.
Os lucros agora eram menores, pois o mercado já não absorvia grandes lotes. Esse marasmo não só continuou como cresceu em 1931. Seria a ocasião de Livermore parar de operar. Daria para viver de renda a vida toda e ainda durante umas cinco reencarnações.
Um erro comum nas pessoas que têm sucesso em determinado momento da vida é o de confundir o fato (correto) de que foram vencedores porque estavam do lado certo com o fato (incorreto) de que qualquer posição que assumam passa a ser imediatamente a certa. Isso acontece em todos os ramos de atividade e em todas as profissões. E com Jesse Livermore não foi diferente.
A partir de 1931, Livermore passou a errar sistematicamente. E não admitia isso. Nem para os outros, nem para si mesmo. Achava que o mercado estava errado e não ele. O dinheiro que entrara nos tempos de acerto começou a sair, primeiro devagarzinho, depois, à medida que Jesse se impacientava e aumentava suas apostas, aos borbotões. Ao final do ano, metade de sua fortuna se fora.
Em 1932, Jesse Livermore parecia um novato, amador precipitado, que apostava todas as fichas em qualquer mão, por pior que fossem suas cartas. Nesse ano ele jogou fora 30 milhões de dólares, seus últimos 30 milhões.
Como se não bastassem os reveses na Bolsa, Livermore descobriu que Dorothy, sua mulher alcoólatra, o traía com um agente da Lei Seca. O casal se divorciou em Reno.
No mês de março de 1933, aos 58 anos, Livermore se casou com Harriet Metz Noble, uma viúva rica natural de Omaha, Nebraska, concertista de piano e vinte anos mais nova do que ele. Mais do que depressa, Jesse pediu a ela um empréstimo de 136 mil dólares.
“É para depositar como margem de uma operação infalível”, ele disse a Harriet. “Impossível perder.” Só que o impossível aconteceu e Harriet Noble jamais viu seu dinheiro de volta.
Jesse Livermore vendeu seus imóveis, seu Rolls-Royce amarelo. Tomou dinheiro emprestado a juros e não pagou. Gângsteres a soldo de agiotas o ameaçaram. Ele precisou se esconder desses cobradores truculentos, assim como de oficiais de justiça que o procuravam para entregar intimações de sociedades corretoras das quais ele era devedor.
Desse modo inglório, Livermore atravessou toda a Grande Depressão. Até que em 28 de novembro de 1940, ele, impecavelmente vestido como nos seus tempos de fama, entrou no Sherry-Netherland Hotel, na esquina da Quinta Avenida com a rua 59 Leste. Foi até o bar, onde entornou dois martínis, e depois seguiu para o banheiro masculino.
Mirando-se no espelho, o grande Jesse Livermore, o urso de Boston, o maior especulador dos Roaring Twenties, uma figura mítica de Wall Street, sacou uma pistola do bolso do paletó, apontou-a para a testa e atirou. Quando caiu no chão, já estava morto. Em seu bolso foi encontrado um lápis de ouro, última lembrança de sua época de esplendor, e um caderninho em cujas páginas Livermore rabiscara dezenas de vezes:
“Minha vida foi um fracasso” (My life has been a failure), “Minha vida foi um fracasso”, “Minha vida foi…”
Como herança, Jesse Livermore deixou apenas os direitos autorais de um livro que publicara oito meses antes e que fora um fracasso editorial. Seu título: Como operar com ações (How to Trade in Stocks).
Após a morte do autor, o livro passou a vender bem. Aliás, vende até hoje, passados mais de setenta anos. É só entrar num dos bons sites de livrarias virtuais americanas que How to Trade in Stocks está lá.