pombo-correio

Os garotos da Rua Noel Rosa

onde um talo de samba viça no calçamento,

viram o pombo-correio cansado

confuso

aproximar-se em voo baixo.

 

Tão baixo voava: mais raso

que os sonhos municipais de cada um.

Seria o Exército em manobras

ou simplesmente

trazia recados de ai! amor

à namorada do tenente em Aldeia Campista?

 

E voando e baixando entrançou-se

entre folhas e galhos de fícus:

era um papagaio de papel,

estrelinha presa, suspiro

metade ainda no peito, outra metade

no ar.

 

Antes que o ferissem,

pois o carinho dos pequenos ainda é mais desastrado

que o dos homens

e o dos homens costuma ser mortal,

uma senhora o salva

tomando-o no berço das mãos

e brandamente alisa-lhe

a medrosa plumagem azulcinza

cinza de fundos neutros de Mondrian

azul de abril pensando maio.

 

3235-58-Brasil

dizia o anel na perninha direita.

Mensagem não havia nenhuma

ou a perdera o mensageiro

como se perdem os maiores segredos de Estado,

que graças a isto se tornam invioláveis,

ou o grito de paixão abafado

pela buzina dos ônibus.

 

Como o correio (às vezes) esquece cartas,

teria o pombo esquecido

a razão de seu voo?

Ou sua razão seria apenas voar

baixinho sem mensagem como a gente

vai todos os dias à cidade

e somente algum minuto em cada vida

se sente repleto de eternidade, ansioso

por transmitir a outros sua fortuna?

 

Era um pombo assustado

perdido

e há perguntas na Rua Noel Rosa

e em toda parte sem resposta.

 

Pelo que a senhora o confiou

ao senhor Manuel Duarte, que passava,

para ser devolvido com urgência

ao destino dos pombos militares

que não é um destino.