Eu mudei para cá por causa de um garoto que não sei como vou encontrar.
Pelo menos moramos no mesmo bairro. Foi o que Chad disse quando o encontrei, por acaso, na loja de conveniência Gas’n’Sip, pouco antes da minha mudança. Então você pensou que encontrar Scott não seria tão difícil assim? Só que, aqui, é Nova York. Existem milhões de pessoas em cada quadra. Poderíamos morar aqui a vida inteira sem nunca nos encontrarmos.
Meu estômago está embrulhado. Estou tão aflita que não consigo nem distinguir se é somente nervosismo ou fome também. Antes de papai sair para trabalhar, ele me deu dinheiro para a semana. Depois me disse onde comprar o melhor pãozinho e café, a mais importante dica de sobrevivência, segundo ele. Foi estranho como presumiu que eu bebo café, em vez de ficar falando que eu não podia tomar, como a mamãe. O estômago embrulhado me impediu de comer antes da aula. Agora, gostaria de ter comido alguma coisa mesmo assim.
Dou mais uma olhada no auditório. É a reunião do terceiro ano, então, se Scott veio para esta escola, ele tem de estar em algum lugar aqui, neste momento. Toda vez que olho ao redor, as pessoas me encaram de volta. Eu me forço a não olhar. Não quero ganhar a reputação instantânea de maníaca que fica encarando.
Foi um risco trazer o celular. Se for confiscado, posso dizer que não conhecia as regras. Coloco as mãos dentro da minha bolsa e verifico minhas mensagens: nada de Candice ainda.
Por um lado, parece com qualquer outro primeiro dia de escola. Todos vestem suas melhores roupas novas, os alunos estão nervosos, os professores distribuem as regras das aulas, que logo serão esquecidas. Os lápis são novos e as pessoas estão contando como foi o verão, tristes pela liberdade que não terão até junho. Por outro lado, é profundamente diferente. As salas de aula são relativamente impecáveis, os professores parecem mais profissionais. Tem até um verdadeiro código de disciplina. Fiquei chocada ao descobrir que os alunos sofrem consequências, de verdade, se não seguem as regras. Minha escola antiga era enorme, portanto, você podia ir embora com qualquer coisa porque ninguém saberia que você existiu. Eu tenho a impressão de que as coisas não funcionam dessa forma aqui.
Até a quinta aula ainda não tinha visto Scott em lugar nenhum. Começo a pensar que ele não está nesta escola. É a única escola para as pessoas que moram nesta região; porém, em Nova York, as escolas funcionam de um jeito diferente. Você não é obrigado a ir à mais próxima de onde mora. Scott poderia ir para alguma escola aleatória no Brooklin, pelo que eu sei.
Encontrá-lo é a única coisa que me importa. Não vim aqui para fazer novos amigos. Já tenho April e Candice. Deixá-las foi muito difícil, mas nós conversamos o tempo todo. E não será difícil nos visitarmos, já que o trem daqui para lá e de lá para cá passa o dia todo. Então, quem precisa de mais amigos? E, de qualquer maneira, qual o sentido de fazer novos amigos? Nós todos tomaremos rumos diferentes no final do ano. Por fim, todo mundo vai embora. Quanto mais próxima você ficar de alguém, mais vai doer depois que ele partir.
Então é isso: não vou me juntar ao time dos entusiasmados.
Um pouco antes da oitava aula, quando já estou achando que nunca mais verei Scott Abrams, entro rápida e desesperadamente em um corredor, à procura de uma sala que, aparentemente, não existe. O sinal toca. Procuro meu horário na bolsa para checar novamente o número da sala.
— Perdida? — alguém diz.
— Um pouco. Bem, sim. Estou tentando encontrar a sala 238. Você...
Olho para cima...
E ali está ele:
Scott Abrams.
— Ei — fala ele —, conheço você!
— Engraçado — digo eu.
Porque é claro que ele me conhece. Ele disse que deveríamos ter conversado mais, que adora meu origami. Só que não está sorrindo, nem algo parecido.
Então Scott diz:
— De onde eu te conheço?
O mundo...
Se...
Despedaçando.
— Hum... Sou Brooke Greene. Nós estávamos...
— É verdade! Desculpe, estou meio perdido no tempo e no espaço, tentando achar a sala 238.
— Estou assim também.
— Você acha que é uma conspiração?
— Tudo que sei é que a sala 238 deveria estar em algum lugar entre a 236 e a 240, mas não está.
Recado para si mesma: não comece a chorar.
Eu colocaria isto no arquivo “É Claro”, se não fosse tão trágico. Meu arquivo mental “É Claro” está abarrotado de coisas como esta. Como em: “Claro que me mudei para Nova York por um garoto que não sabe que existo!”.
Mas tem “O Saber”: sei que pertenço a Scott. Sei que aqui é meu lugar.
— Não é melhor perguntarmos na secretaria? — sugiro.
— Boa ideia!
Quando chegamos à metade do corredor, Scott diz:
— Espere! Por que você está aqui?
— Estou nesta escola.
— É tão estranho!
— Eu sei.
— Quando você se mudou?
— Há alguns dias.
— Por quê?
Não vou admitir de jeito nenhum. Pelo menos não agora.
— Ah, porque...
Por outro lado, se eu me abrir e contar tudo, ele finalmente saberá. Não foi por isso que vim? Para fazê-lo entender que pertencemos um ao outro? O problema é que pode ser que eu seja a única que consiga ver nosso potencial neste momento. Se o assustar, talvez nunca fiquemos juntos.
Decido pela verdade, com a omissão de uma parte.
— Estou morando com o meu pai agora.
— É legal?
— É, muito legal. Eu adoro aqui.
— Eu também. Qualquer lugar onde você consiga um sanduíche às 3 horas da madrugada já é o meu tipo de cidade.
Chegamos à secretaria. A funcionária está ao telefone.
Nós esperamos.
Quando Scott se apoia no balcão, seu braço toca levemente o meu. Nossos braços ficam totalmente encostados.
E ele não afasta o braço.
— Onde é o apartamento do seu pai? — pergunta Scott.
— Perry Street.
— Moro na West 11th.
— Elas são próximas?
Scott sorri.
— Ei, vizinha!
Depois da escola, quando atendo o telefone, April nem me espera dizer “oi”. Ela pergunta:
— Ai, meu Deus, você encontrou o Scott?
— Encontrei. Como você sabe?
— Chad me contou.
— Desde quando você conversa com Chad?
— Desde hoje. Nós dois ficamos até mais tarde e ele veio conversar comigo.
— Mas como Chad sabe que encontrei Scott?
— Scott contou para ele.
— O quê?!
— Eu sei...
— Quando?
— Scott ligou para ele logo depois das aulas.
— O que ele disse?
— Apenas que vocês têm uma aula juntos e que ele ficou muito surpreso de ver você.
— Ele ficou?
— Claro!
— Assim, surpreso de um jeito bom?
— Com toda a certeza!
Sem dúvida, as coisas estão dando certo. Nós moramos bem perto um do outro. Estamos na mesma escola. Temos uma aula juntos. Nós até conseguimos sentar próximos. Na hora que encontramos a sala 238, só restavam dois lugares na frente. Minha aversão à primeira fileira não era nada comparada ao meu desejo de sentar perto dele.
Scott Abrams contou a seu melhor amigo sobre mim.
Fico aliviada porque April está entusiasmada com isso. Quando contei a ela que estava mudando para cá, ela não ficou exatamente feliz. April ainda achava que dizer para Scott como me sentia era uma má ideia. E que segui-lo até aqui era uma ideia pior ainda. Apesar de saber que eu, há muito tempo, queria morar em Nova York, ou seja, não tinha vindo para cá somente por causa de um garoto... Bem, nós duas sabíamos que, na verdade, tinha. April não queria que me machucasse mais do que já havia me machucado, mas, no final do verão, ela cedeu. Viu como eu estava arrasada e sabia que eu tinha de fazer isso.
Conto para April cada detalhe do que aconteceu com Scott hoje.
— Não acredito que as duas únicas carteiras vazias eram próximas e vocês ficaram juntos na sala! — exclama ela. — Que perfeito!
— Extremamente. Agora não tenho de me arrastar atrás dele como uma trepadeira.
— E então... quando você vai contar para ele?
— Estou em dúvida. Talvez seja melhor esperar um pouco. Quero dizer, vou vê-lo todos os dias. Talvez seja melhor dar mais um tempo para ele se acostumar comigo aqui.
— Parece um bom plano.
— É muito chato ele não ter me reconhecido, né?
— Bem, não é o ideal, mas também foi o primeiro dia dele em uma escola nova. Vocês dois estavam meio deslocados. Eu não me preocuparia. Além disso, ele contou para Chad sobre você e tudo... Duvido que faria isso se não estivesse feliz por você estar aí.
Faz sentido. Nós poderíamos analisar a situação para sempre, porém, a única forma de saber com certeza o que Scott pensa é perguntando para ele.
April e eu comparamos nossos primeiros dias. Sempre soube que minha escola antiga era uma porcaria, mas agora fica confirmado que é ainda pior do que pensava.
Então eu digo:
— O que aconteceu com a Candice? Ela não respondeu minhas duas últimas mensagens e não está retornando as ligações.
— Não sei. Quer que eu pergunte?
— Quero. É estranho, faz dois dias que não conversamos.
— Vou falar para ela te ligar.
— Me liga amanhã.
— Claro! Boa sorte com Scott.
Sorte não é exatamente do que preciso. O que quero é ter certeza de que não tumultuei minha vida inteira para nada.