Sumário: 9.1. Introdução – 9.2. Requisitos estruturais da petição inicial: 9.2.1. Juízo singular ou colegiado a que é dirigida a petição inicial; 9.2.2. Indicação das partes e sua qualificação; 9.2.3. Os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido; 9.2.4. Pedido; 9.2.5. Valor da causa; 9.2.6. Provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; 9.2.7. Requerimento para citação do réu – 9.3. Documentos indispensáveis à propositura da demanda.
O princípio da inércia da jurisdição impede que o juiz inicie um processo de ofício, devendo aguardar a manifestação da parte interessada, sendo extremamente excepcional a exceção a essa regra, conforme analisado no Capítulo 1, item 1.4.3. A forma de materializar o interesse em buscar a tutela jurisdicional é a petição inicial, conceituada pela melhor doutrina como peça escrita no vernáculo e assinada por patrono devidamente constituído em que o autor formula demanda que virá a ser apreciada pelo juiz, na busca de um provimento final que lhe conceda a tutela jurisdicional pretendida.
A petição inicial tem duas funções: uma de provocar a instauração do processo e outra de identificar a demanda, decorrência natural da necessidade de menção às partes, causa de pedir e pedido. Essa segunda característica da petição inicial – indicar os elementos da ação – gera alguns interessantes efeitos processuais1:
a) permite a aplicação do princípio da congruência, indicando os limites objetivos e subjetivos da sentença;
b) permite a verificação de eventual litispendência, coisa julgada ou conexão, quando comparada com outras ações;
c) fornece elementos para a fixação da competência;
d) indica desde logo ao juiz a eventual ausência de alguma das condições da ação;
e) pode vir a influenciar na determinação do procedimento.
Por tratar-se de peça que inicia o processo, permitindo o seguimento do procedimento mediante a citação do réu, e gerando todos os efeitos referidos, a lei processual exige que tal peça preencha alguns requisitos formais, o que torna a petição inicial um ato processual solene. A ausência de quaisquer deles pode gerar uma nulidade sanável ou insanável, sendo na primeira hipótese caso de emenda da petição inicial e, na segunda, de indeferimento liminar de tal peça.
O artigo legal que primordialmente trata dos requisitos estruturais da petição inicial é o art. 282 do CPC. Além desse dispositivo legal, também o art. 39, I, do CPC indica outro requisito estrutural essencial para a regularidade da petição inicial: o endereço do patrono que a subscreve. Nesse tocante, cumpre esclarecer que a indicação do endereço em papel timbrado, nota de rodapé, ou na procuração2, cumpre perfeitamente a exigência formal. Nas excepcionais hipóteses de dispensa do advogado esse requisito não será exigido.
O primeiro requisito previsto pelo art. 282 do CPC, e que constará no topo da primeira página da petição inicial, é o “juiz ou tribunal” a que esta é dirigida. Sendo a primeira peça do processo, necessária é a indicação do juízo que a receberá nesse primeiro momento procedimental. A indicação do destinatário da petição – reconhecendo-se tanto a ação originária de primeiro grau como a de competência originária de Tribunal – é necessária para a remessa da petição inicial e formação dos autos perante o órgão pretensamente competente para o conhecimento da demanda.
A indicação jamais será pessoal, mesmo quando a petição inicial for “distribuída por dependência”, ou ainda em comarcas de vara única com somente um juiz, exigindo-se a indicação do juízo, e não do juiz (consequência do caráter impessoal do Poder Judiciário). Dessa forma, ainda que seja possível identificar o juiz que receberá a demanda, não será ele indicado no endereçamento, e sim o juízo que representa3. Mesmo sabendo-se que será exatamente aquele juiz específico que receberá a petição inicial distribuída por dependência, não é correta a indicação pessoal do juiz. Apesar de incorreto do ponto de vista técnico, a indicação pessoal do juiz nos casos em que isso for possível – distribuição por dependência e comarcas com apenas um juiz – desde que acompanhada pela indicação do juízo, gera mera irregularidade, não produzindo efeitos significativos no processo.
O equívoco é corrigido pelo art. 293, I, do PLNCPC, que prevê o endereçamento da petição inicial ao juízo ou ao tribunal, dando a entender que “juízo” seja o órgão jurisdicional de primeiro grau de jurisdição.
Deve constar da petição inicial a qualificação das partes, com indicação de nome completo, estado civil, profissão, domicílio e residência. Tais elementos identificadores se prestam a duas funções principais: permitir a citação do réu e a individuação dos sujeitos processuais parciais, o que se mostrará importante para distingui-los de outros sujeitos e fixar com precisão os limites subjetivos da demanda e da futura e eventual coisa julgada material4.
Diante das razões justificadoras para a indicação de tais dados, o que importa na análise do preenchimento do requisito é se a irregularidade ou mesmo a ausência de algum deles gera alguma espécie de prejuízo ao réu ou ao processo. Sem a comprovação de efetivo prejuízo, não haverá nulidade, aplicando-se ao caso o princípio da instrumentalidade das formas5. A indevida troca de um nome por outro é mera irregularidade, podendo ser corrigida a qualquer tempo, se o verdadeiro réu recebe a citação e contesta regularmente a demanda. O mesmo ocorre com os dados pessoais do réu, que nem sempre serão de amplo conhecimento do autor.
Caso o autor tenha conhecimento de dados adicionais que possam auxiliar na localização e individuação do réu, deve levar tais informações ao conhecimento do juízo na petição inicial. A indicação de número de RG (Registro Geral), CPF (Cadastro de Pessoa Física) e CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) é prática comum e bem aceita na prática forense. Pode-se ainda imaginar a indicação de locais onde a pessoa possa ser encontrada, como o local em que comumente desfruta seus momentos de lazer (bar, restaurante, clube social, parques etc.) ou ainda em que exerça função ou profissão (escritório, consultório, empresa etc.). Outra circunstância possível é a indicação do apelido do réu, ou seja, a forma como ele é conhecido na sociedade à qual pertence (p. ex., “camarão”, “alemão”, “bigode” etc.), o que poderá auxiliar o oficial de justiça a localizá-lo6.
O trabalho do patrono do autor nem sempre é fácil na indicação dos requisitos previstos pelo art. 282, II, do CPC, considerando-se que nem sempre saberá com exatidão todos os dados do réu demandados pela lei. A indicação de informações não previstas em lei pode ser de extrema utilidade, ao menos para permitir que a citação seja realizada, restando ao próprio réu, em sua contestação ou qualquer outra espécie de resposta, regularizar sua qualificação, com a indicação de dados que faltaram à petição inicial por desconhecimento do autor.
A indicação do estado civil das partes é importante em razão de normas processuais que exigem a presença de ambos os cônjuges em determinadas ações (art. 10, §§ 1.º e 2.º, do CPC – ações reais imobiliárias), ou ainda o consentimento do cônjuge não litigante. Esse pressuposto processual poderá ser analisado à luz da petição inicial quando houver a exata indicação do estado civil das partes7.
Há uma interessante exceção à regra prevista pelo inciso ora em comento, qual seja o litisconsórcio passivo multitudinário, que exige do autor a colocação no polo passivo da demanda de número considerável de pessoas (uma verdadeira multidão). Tomem-se como exemplo clássico as ações possessórias decorrentes de esbulho por grupos de pessoas. Nessas situações, sem conseguir responsabilizar o “órgão” ou “entidade” à qual pertencem os invasores – já que esses maliciosamente evitam se constituir em pessoas jurídicas – seria nítida ofensa ao princípio do acesso à justiça exigir do autor a perfeita identificação e qualificação de cada um dos réus, ou ainda a indicação de suas profissões e residências8. A solução é permitir a indicação de algumas pessoas que o autor consiga identificar ou ainda do líder do movimento, se identificável, em nítida mitigação do dispositivo legal9.
Por fim, ainda que se reconheça a existência de dificuldades na indicação de todos os dados exigidos pela lei quanto ao réu, o mesmo não ocorre relativamente ao autor, dado que este é o sujeito responsável pela contratação do patrono que elabora a petição inicial. Somente um desconhecimento considerável da lei ou a má-fé em omitir determinado dado podem explicar uma qualificação deficitária do autor, não se devendo admitir que a demanda prossiga com tal irregularidade. Será caso de emenda da petição inicial em dez dias (art. 284 do CPC), seguida de indeferimento (art. 295, VI, do CPC) se o vício não for sanado10.
O art. 293, II, do PLNCPC passa a exigir na qualificação das partes o número do cadastro de pessoas físicas ou do cadastro nacional de pessoas jurídicas e o endereço eletrônico. Em especial a indicação do endereço eletrônico suscita algumas questões: (i) nem todos os litigantes têm endereço eletrônico; (ii) haverá real dificuldade do autor em saber o endereço eletrônico do réu; (iii) caso o autor omita essa informação, como o juiz saberá se ele tem ou não endereço eletrônico?
Apesar de o art. 282, III, do CPC indicar como requisito da petição inicial “o fato” no singular, e os “fundamentos jurídicos do pedido” no plural, é pacífico o entendimento que a petição inicial pode perfeitamente ter um ou mais fatos e um ou mais fundamentos jurídicos. Trata-se da apresentação fática – causa de pedir próxima – e das consequências jurídicas que o autor pretende que tais fatos tenham no caso concreto – causa de pedir remota. Considerando que dos fatos nasce o direito, cumpre ao autor narrá-los e demonstrar a razão jurídica para que, em decorrência desses fatos, seja merecedor da tutela jurisdicional pretendida. A causa de pedir é tema tratado no Capítulo 3, item 3.3.4.
Registre-se que a exigência da narrativa dos fatos constitutivos do direito do autor já em sua petição inicial se limita aos fatos jurídicos, também chamados de fatos principais. Ainda que seja recomendável a narrativa também dos fatos simples, também chamados de fatos secundários, estes não fazem parte da causa de pedir, de forma que podem ser levados ao processo depois do momento inicial de propositura da demanda11.
O Poder Judiciário não pode servir como mero órgão consultivo, devendo sempre ser chamado à atuação para entregar ao autor o que este pretender receber. Dessa forma, é requisito essencial da petição inicial a indicação de sua pretensão jurisdicional. O pedido pode ser analisado sob a ótica processual, conhecido como pedido imediato, representando a providência jurisdicional pretendida – condenação, constituição, mera declaração – e sob a ótica material, conhecido como pedido mediato, representado pelo bem da vida perseguido, ou seja, o resultado prático (vantagem no mundo prático) que o autor pretende obter com a demanda judicial.
Enquanto o autor pode pleitear diversas tutelas jurisdicionais diferentes e incalculáveis bens da vida, o réu, ao contestar a pretensão do autor, fará sempre o mesmo pedido: sentença de improcedência (sentença declaratória da inexistência do direito material alegado pelo autor). Em razão dessa circunstância se justifica que a sentença – desde que de improcedência e em demanda que não seja declaratória – possa ser de natureza diversa da natureza da demanda, fixada pelo pedido imediato do autor.
As considerações sobre as características do pedido são realizadas no Capítulo 3, item 3.3.3.
O art. 258 do CPC estabelece que “a toda causa será atribuído um valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediato”. Desse modo, ainda que o bem material objeto da pretensão do autor não tenha um valor economicamente aferível, é necessária a indicação de valor à causa, ainda que seja calculada de forma meramente estimativa.
A exigência de atribuição ao valor da causa decorre de diversos reflexos que esse requisito gera sobre o processo12:
a) determinação de competência do juízo segundo as leis de organização judiciária, como a fixação de competência dos “Foros Regionais”;
b) definição do rito procedimental (ordinário, sumário, sumaríssimo);
c) recolhimento das taxas judiciárias;
d) fixação do valor para fins de aplicação de multas, no caso de deslealdade ou má-fé processual (art. 14 – ato atentatório à dignidade da jurisdição; art. 17 – litigância de má-fé; art. 538, parágrafo único – embargos meramente protelatórios, todos do CPC);
e) fixação do depósito prévio na ação rescisória no valor correspondente a 5% do valor da causa (do processo originário – art. 488, II, do CPC);
f) nos inventários e partilhas o valor da causa influi sobre a adoção do rito de arrolamento;
g) honorários advocatícios também poderão ser fixados à luz do valor da causa.
A lei pode expressamente prever uma regra específica a respeito do valor da causa de determinadas ações judiciais, sendo nesse caso afirmado que existe um critério legal ao valor da causa. O art. 259 do CPC indica as regras específicas para o cálculo do valor da causa:
I) na ação de cobrança de dívida, a soma do principal, da pena e dos juros vencidos até a propositura da ação, podendo os juros ser convencionais ou legais; moratórios ou compensatórios;
II) havendo cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles;
III) sendo alternativos os pedidos, o de maior valor;
IV) se houver também pedido subsidiário, o valor do pedido principal;
V) quando o litígio tiver por objeto a existência, validade, cumprimento, modificação ou rescisão de negócio jurídico, o valor do contrato, sendo admitido valor inferior a esse (valor do benefício econômico) quando a demanda não tiver como objeto o contrato integralmente, mas apenas uma ou algumas cláusulas;
VI) na ação de alimentos, a soma de 12 prestações mensais, pedidas pelo autor;
VII) na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, a estimativa oficial para lançamento do imposto.
O tema é versado pelo art. 267 do PLNCPC, que além de repetir as regras já existentes, por vezes com algumas adequações terminológicas, como nos incisos I e V, traz algumas interessantes novidades. No inciso VIII, contra posição consolidada do Superior Tribunal de Justiça, o projeto exige no pedido de dano moral a indicação do valor pretendido pelo autor. O § 2.º trata do pedido que tenha como objeto prestações vencidas e vincendas, determinando que ambas sejam computadas no cálculo do valor da causa, sendo o valor das prestações vincendas igual a uma prestação anual, se a obrigação for por prazo indeterminado ou por tempo superior a um ano; será o valor da soma das prestações se a obrigação tiver prazo inferior a um ano.
Não sendo hipótese de aplicação do critério legal caberá ao autor descobrir o valor referente à vantagem econômica que se busca com a demanda judicial. Basta verificar o valor econômico do bem da vida material perseguido e indicá-lo como valor da causa13. Não tendo o bem da vida valor econômico ou sendo esse valor inestimável, caberá ao autor dar qualquer valor à causa, sendo nesse caso comum a utilização na praxe forense da expressão “meramente para fins fiscais”.
Registre-se que, havendo cumulação de pedidos, sempre que o valor da causa para um deles for regido pelo critério legal ou tiver valor economicamente aferível e para o outro for causa de valor da causa meramente estimativo, o valor da causa da ação será tão somente o do primeiro pedido14. A indicação de qualquer valor à causa só se justifica quando não há alternativa para o autor, o que não será o caso na situação exposta.
Edison ingressa com ação judicial pleiteando a condenação de Jussara ao pagamento de danos morais e matérias. Com relação aos danos morais, Edison faz pedido genérico, deixando ao juízo o arbitramento do valor, e com relação aos danos materiais Edison faz pedido determinado para reparação de seu prejuízo, que entende ter sido de R$ 5.000,00. O valor da causa será de R$ 5.000,00, não sendo preciso se somar a esse valor algum outro, meramente estimativo, somente para deixar claro que também se está pedindo condenação de Jussara ao pagamento de danos morais.
Caso os operadores do direito levassem a regra prevista no art. 282, VI, do CPC mais a sério, as petições iniciais viriam, a exemplo do que ocorre no procedimento sumário, com a devida especificação de provas (assim, por exemplo, o autor já indicaria quais as testemunhas que pretende ouvir ou ainda os quesitos de perícia requerida). Acontece, entretanto, que atualmente o dispositivo legal não encontra tal aplicação, bastando ao autor a indicação genérica de todos os meios de prova em direito admitidos, para que o requisito seja considerado preenchido15.
Tal prática, já arraigada em nossa praxe forense, enseja ao juiz, na fase de saneamento do processo, a prolação de despacho para que as partes especifiquem as provas que pretendem produzir, indicando e justificando os meios de prova requeridos. É medida tomada pelos juízes justamente em decorrência da generalidade do protesto realizado na petição inicial, sendo bastante improvável – para não dizer impossível – que a parte no momento em que é instada a especificar provas requeira todos os meios de prova admitidos.
Há doutrina que entende ser completamente inútil a exigência legal, afirmando não se poder entender que a ausência de requerimento de provas na petição inicial gere preclusão para o autor. Nesse entendimento, mesmo não tendo feito pedido de provas na petição inicial, a partir do momento em que o juiz intima as partes para a especificação de provas, poderá o autor livremente as requerer16. O mesmo raciocínio seria aplicado ao réu quanto à exigência de requerer a produção de provas em contestação (art. 300 do CPC). O Superior Tribunal de Justiça entende que, mesmo tendo sido realizado o pedido genérico na petição inicial (autor) ou contestação (réu), haverá preclusão da prova na hipótese de a parte não reiterar sua vontade de produzi-las no momento em que for intimada para especificá-las17.
Ainda que se entenda correto o entendimento que aponta a exigência do art. 282, VI, do CPC uma “ridícula inutilidade”, entendo ser interessante o requerimento genérico na petição inicial (bem como na contestação), não para evitar a preclusão, mas para permitir a alegação de cerceamento de defesa na hipótese de julgamento antecipado da lide. Em minha visão, o autor que deixa de pedir provas em sua petição inicial permite ao juiz um julgamento antecipado da lide, sem que possa em grau recursal alegar cerceamento de defesa, visto que nada requerendo em termos de produção probatória permite ao juiz o julgamento imediato, sem a necessidade de produção de provas18.
O art. 296 do PLNCPC exige do autor, já na petição inicial, o arrolamento e a qualificação de suas testemunhas, com indicação do nome, profissão, estado civil, idade, número de cadastro de pessoa física e do registro de identidade, endereço completo da residência e do local de trabalho. Além de impor a toda petição inicial regra atualmente aplicável somente ao procedimento sumário (que deixa de existir no PLNCPC), aumenta o número de requisitos na qualificação das testemunhas atualmente existentes no art. 407, caput, do CPC.
Da previsão legal há duas novidades interessantes, uma comissiva e outra omissiva. A novidade comissiva é a utilização da expressão “se possível” quanto ao ônus de indicar os requisitos legais referentes às testemunhas. Nem sempre a parte terá acesso a todas as informações exigidas pela lei, devendo a omissão de dados ser encarada à luz do princípio da instrumentalidade das formas, como já é atualmente defendido pela melhor doutrina. A novidade omissiva fica por conta da indicação de quesitos e assistentes técnicos na petição inicial, regra que não consta do PLNCPC. Apesar de a prova pericial ser mais rara que a prova testemunhal, se o objetivo do legislador era concentrar atos processuais para agilizar o procedimento, restou paradoxal a exigência de arrolamento imediato das testemunhas e do mero pedido genérico de produção de prova pericial.
A última exigência do art. 282 do CPC é o requerimento de citação do réu. Parece que a única utilidade de tal requisito é a do autor indicar a forma pela qual pretende que ocorra a citação, sempre que lhe for possível a escolha, segundo os termos do art. 222 do CPC19. Ademais, seria importante tal indicação quando o autor optasse, desde já, pela citação editalícia, respondendo, no caso de opção temerária, nos termos do art. 233 do CPC.
Fora da indicação da forma de citação, o requisito se mostra, no mínimo, uma obviedade, considerando que naturalmente o juiz procederá à citação no caso de entender que a petição inicial preenche os requisitos mínimos formais exigidos pela lei e não é caso de aplicação do art. 285-A do CPC20. A ausência de pedido expresso de citação não impede que esta ocorra, em pronunciamento oficioso do juiz, não podendo o réu alegar em contestação inépcia da petição inicial se a citação, embora não requerida expressamente pelo autor, tenha sido regularmente realizada.
Determina o art. 283 do CPC que a petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da demanda. A ausência de tais documentos enseja a possibilidade de emenda da petição inicial, considerando-se que o vício gerado pela não juntada de tais documentos é sanável21. Não ocorrendo a emenda com a juntada dos documentos indispensáveis à propositura da demanda, a petição inicial será indeferida (art. 295, VI, do CPC). Caso o juiz só perceba a ausência de tais documentos após a citação do réu, não mais se admitirá o indeferimento da petição inicial, que deve ocorrer sempre liminarmente, mas diante da resistência do autor em não juntar aos autos tais documentos, o processo deve ser extinto sem resolução de mérito por falta de pressuposto processual (art. 267, IV, do CPC).
Documentos indispensáveis à propositura da demanda são aqueles cuja ausência impede o julgamento de mérito da demanda, não se confundindo com documentos indispensáveis à vitória do autor, ou seja, ao julgamento de procedência de seu pedido22. Esses são considerados documentos úteis ao autor no objetivo do acolhimento de sua pretensão, mas, não sendo indispensáveis à propositura da demanda, não impedem a continuidade da demanda, tampouco a sua extinção com resolução do mérito23. Numa demanda de divórcio, a certidão de casamento é um documento indispensável à propositura da demanda, porque sem esse documento é impossível o julgamento de mérito, o mesmo não se podendo dizer de um documento que comprove o adultério do cônjuge, que pode ser importante para a parte que o apresente em juízo, mas cuja ausência não impedirá o julgamento de mérito da demanda.
Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça permite o ingresso de ação revisional de contrato mesmo que o autor não apresente com a petição inicial uma cópia do contrato que se busca rever. É interessante porque, na sociedade massificada em que vivemos, com ampla presença dos contratos de adesão, é possível a elaboração de uma petição inicial nesse tipo de ação sem a necessidade de sua instrução com cópia do contrato celebrado entre as partes. Diante dessa nova realidade, o Superior Tribunal de Justiça entende pela viabilidade do pedido de exibição do contrato, ao invés de ser elaborado por meio de ação cautelar precedente de exibição de documento, seja elaborado incidentalmente, ainda que continue a acreditar ser o contrato documento indispensável à propositura da ação24.
1 Dinamarco, Instituições, n. 989, p. 355.
2 Nery-Nery, Código, p. 249.
3 Dinamarco, Instituições, n. 992, p. 358; Theodoro Jr., Curso, n. 354, p. 398; Calmon de Passos, Comentários, p. 187.
4 Theodoro Jr., Curso, n. 354, p. 398.
5 Dinamarco, Instituições, n. 993, p. 360.
6 Figueira Jr., Código, p. 36.
7 Calmon de Passos, Comentários, p. 187; Scarpinella Bueno, Código, p. 856.
8 STJ, 4.ª Turma, REsp 154.906/MG, Rel. Min. Barros Monteiro, j. 04.05.2004.
9 Dinamarco, Instituições, n. 993, p. 360; Figueira Jr., Código, p. 36-42.
10 STJ, 1.ª Turma, REsp 295.642/RO, Rel. Min. Francisco Falcão, j. 13.03.2001.
12 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 291; Carmona, Em torno, p. 30.
13 Em sentido assemelhado, Carmona, Em torno, p. 29; Calmon de Passos, Comentários, p. 195; Greco Filho, Direito, n. 23, p. 108.
14 STJ, REsp 692.580/MT, 4.ª Turma, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 25.03.2008, DJe 14.04.2008.
15 STJ, REsp 713.800/MA, 3.ª Turma, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 11.03.2008, DJe 01.04.2008.
16 Dinamarco, Instituições, n. 1.000, p. 377; Scarpinella Bueno, Código, p. 859; STJ, 3.ª Turma, REsp 329.034/MG, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 14.02.2006. Contra: Nery-Nery, Código, p. 551; Greco Filho, Direito, n. 23, p. 109.
17 Dinamarco, Instituições, n. 806, p. 90; Calmon de Passos, Comentários, p. 195-196.
18 REsp 329.034/MG, 3.ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 14.02.2006.
19 STJ, 3.ª Turma, REsp 406.862/MG, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, rel. p/ acórdão Min. Nancy Andrighi, j. 08.11.2002.
20 Scarpinella Bueno, Código, p. 860.
21 Dinamarco, Instituições, n. 1001, p. 377; Calmon de Passos, Comentários, p. 196. Contra: Nery-Nery, Código, p. 551.
22 STJ, 1.ª Turma, AgRg no Ag 908.395/DF, Min. José Delgado; j. 27.11.2007; REsp 846.227/MS, 3.ª Turma, Rel. Nancy Andrighi, j. 22.05.2007.
23 Dinamarco, Instituições, n. 1006, p. 381; Nery-Nery, Código, p. 552.
24 Calmon de Passos, Comentários, p. 198; Marinoni-Mitidiero, Código, p. 293.
25 Informativo 413/STJ: 3ª Turma, REsp 896.435/PR, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 27.10.2009.