Sumário: 51.1. Introdução – 51.2. Espécies de tutela antecipada – 51.3. Antecipação de tutela de parcela incontroversa da pretensão (art. 273, § 6.º, do CPC) – 51.4. Efeitos antecipáveis – 51.5. Processos e procedimentos compatíveis – 51.6. Requisitos positivos: 51.6.1. Prova inequívoca da verossimilhança da alegação; 51.6.2. Receio de dano irreparável ou de difícil reparação; 51.6.3. Abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu – 51.7. Requisito negativo – irreversibilidade – 51.8. Legitimação – 51.9. Discricionariedade e fundamentação da decisão – 51.10. Momento da antecipação: 51.10.1. Inaudita altera parte; 51.10.2. Sentença; 51.10.3. Fase recursal – 51.11. Eficácia temporal da tutela antecipada – 51.12. Revogação ou modificação – 51.13. Efetivação – 51.14. Tutela antecipada contra a Fazenda Pública.
No capítulo anterior a tutela antecipada foi comparada com a tutela cautelar, tendo sido algumas de suas características já enfrentadas. No presente capítulo o objetivo é analisar as principais características desse instituto jurídico de forma individualizada e mais aprofundada.
Apesar de a tutela antecipada ser invariavelmente associada à tutela de urgência, a análise do art. 273 do CPC permite a conclusão de que na realidade existem três espécies distintas de tutela antecipada.
A primeira e mais comum é a tutela antecipada como espécie de tutela de urgência, que já foi parcialmente objeto de análise no capítulo anterior. Os requisitos para a sua concessão são a prova inequívoca da verossimilhança da alegação (art. 273, caput, do CPC) e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I, do CPC). Trata-se de tutela provisória e concedida mediante cognição sumária (juízo de probabilidade).
A segunda espécie é a tutela antecipada sancionatória, que funciona como forma de apenar a parte que, na forma prevista em lei, viola os princípios da boa-fé e lealdade processual. Seus requisitos são a prova inequívoca da verossimilhança da alegação (art. 273, caput, do CPC) e o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório (art. 273, II, do CPC). Trata-se de tutela provisória, concedida mediante cognição sumária (juízo de probabilidade).
Não existe nenhuma vinculação da tutela antecipada fundada no abuso do direito de defesa e manifesto propósito protelatório do réu com a circunstância de o tempo funcionar como inimigo da efetividade da tutela jurisdicional. Ao dispensar o preenchimento do requisito do fundado receio de dano, o legislador desvinculou de forma absoluta e indiscutível essa espécie de tutela antecipada do âmbito da tutela de urgência1.
A total desvinculação dessa espécie de tutela antecipada do âmbito da tutela de urgência exime o pretendente da demonstração de qualquer perigo sobre o direito que o tempo de duração do processo em tese pudesse gerar. Significa dizer que o direito não precisa correr qualquer risco de perecimento, sendo possível à parte aguardar tranquilamente o encerramento do processo para a obtenção efetiva de sua pretensão.
Parcela da doutrina, apesar de reconhecer a dispensa da comprovação do requisito do perigo gerado pela demora do processo, afirma corretamente que, mesmo nessa espécie de tutela antecipada, afasta-se o chamado “dano marginal”, gerado de forma natural por qualquer demora na solução da demanda2. É claro que ao autor é sempre melhor obter a satisfação fática o quanto antes, ainda que o seu direito não corra qualquer risco, mas essa é uma mera consequência prática da antecipação de tutela.
Segundo a melhor doutrina, essa espécie de tutela antecipada funciona como forma de sanção processual à parte – em especial ao réu – que abusa de seu direito de defesa ou pratica atos protelatórios fora do processo com efeitos processuais. Apesar de o abuso de direito de defesa não se confundir com os atos protelatórios, na prática o resultado é sempre o mesmo: a criação injustificada de obstáculos – processuais ou materiais – a impedir que o processo judicial chegue ao seu final, com a definitiva entrega do bem da vida ao autor. Justamente por não entender legítima a criação de tais obstáculos, o legislador regula a obtenção da satisfação fática do direito da parte (geralmente do autor) por meio da tutela antecipada como forma de sancionar a parte contrária, invertendo o ônus do tempo no processo3.
A terceira espécie de tutela antecipada é aquela que gera maior polêmica quanto à sua natureza. Para a sua concessão estão dispensados o requisito tradicional da prova inequívoca da verossimilhança, bem como o perigo de dano ou o ato desleal. Seu único requisito está previsto no art. 273, § 6.º, do CPC: um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.
O art. 273, § 6.º, do CPC prevê que a tutela antecipada poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. Ainda que o dispositivo legal preveja o termo “poderá”, não existe nesse caso discricionariedade judicial, não havendo genuinamente uma escolha fundada em juízo de oportunidade ou conveniência entre conceder ou negar a tutela antecipada, conforme melhor explicado no Capítulo 51, item 51.9. Trata-se inegavelmente da mais polêmica espécie de tutela antecipada.
A primeira e relevante questão diz respeito à natureza jurídica do fenômeno processual previsto no art. 273, § 6.º, do CPC. É realmente uma espécie diferenciada de tutela antecipada ou um julgamento antecipado parcial da lide?
Há parcela da doutrina que entende não se tratar de genuína tutela antecipada, mas sim de julgamento antecipado parcial da lide, sendo que, em vez de um parágrafo no art. 273 do CPC, o legislador deveria ter incluído um parágrafo no art. 330 do CPC. Para essa corrente doutrinária a cognição do juiz, ao decidir parcela da pretensão do autor, é exauriente, fundando-se a decisão num juízo de certeza. Tratando-se de resolução do mérito fundada em juízo de certeza, a decisão será apta a gerar coisa julgada material, não podendo ser revogada nem modificada pela decisão final da demanda, sendo inaplicável a espécie o art. 273, § 4.º, do CPC4.
Existe outra corrente doutrinária que defende a natureza de tutela antecipada, afirmando-se que o art. 273, § 4.º, do CPC é totalmente aplicável à tutela antecipada de parcela incontroversa da pretensão do autor. Para essa corrente doutrinária, apesar de o juízo de verossimilhança ser ainda mais robusto que nas outras espécies de tutela antecipada, o juiz não decide com fundamento em cognição exauriente, sendo admissível que ao final da demanda reformule seu entendimento e revogue ou modifique a decisão concessiva de tutela antecipada5.
Entendo que a opção do legislador em qualificar o julgamento de parcela da pretensão quando incontroversa é determinante para a solução do impasse doutrinário. Seria possível, ainda que discutível diante de nosso sistema recursal atual, a criação do fracionamento do julgamento de mérito por meio da admissibilidade de julgamento antecipado parcial da lide, com decisão fundada em cognição exauriente e apta a gerar a coisa julgada material. Por uma opção legislativa, o processo continuaria somente para decidir a parcela controversa da pretensão, e sua decisão não afetaria o que já teria sido resolvido definitivamente. Não foi isso, entretanto, que a Lei 10.444/2002 criou ao incluir o § 6.º ao art. 273 do CPC6.
Se o legislador tratou do fenômeno como espécie de tutela antecipada, não resta dúvida da aplicação dos §§ 4.º e 5.º do art. 273 do CPC a essa espécie de tutela antecipada, significando que a tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer momento. Como analisado no Capítulo 51, item 51.12, somente novas circunstâncias justificam a alteração de decisão concessiva de tutela antecipada, o que se torna possível com o aprofundamento da cognição judicial. Surge então a seguinte questão: sendo o pedido incontroverso, a cognição do juiz não seria exauriente? E sendo exauriente, como seria possível um aprofundamento da cognição? E não sendo possível esse aprofundamento, como legitimar uma revogação ou modificação da tutela antecipada?
Ainda que se considere a cognição exauriente nessa espécie de tutela antecipada, o conhecimento superveniente de matérias de ordem pública, que podem inclusive ser levadas ao processo ex officio pelo juiz, são aptas a extinguir o processo sem resolução do mérito, acarretando a imediata revogação da tutela antecipada anteriormente concedida. Essa possibilidade de revogação demonstra que a decisão concessiva de tutela antecipada não era definitiva, não sendo apta a gerar coisa julgada material7.
Insisto que essa conclusão decorre essencialmente da opção legislativa de tratar o fenômeno descrito no art. 273, § 6.º, do CPC como espécie de tutela antecipada. Se tivesse optado pela expressa previsão de julgamento antecipado parcial da lide, não tenho dúvida de que a extinção sem resolução do mérito do processo não afetaria a decisão concessiva da tutela antecipada já transitada em julgado, protegida pela coisa julgada material. Mas, insista-se, não foi essa a opção do legislador, quem sabe por que tenha percebido a incongruência de recorrer contra a decisão que resolve parcela do mérito definitivamente por agravo de instrumento, e de decisão que resolve posteriormente outra parcela do mérito por apelação8.
Além da polêmica envolvendo a natureza jurídica do instituto ora analisado, a interpretação do art. 273, § 6.º, do CPC também suscita outras interessantes questões. Primeiro, é importante observar que o dispositivo legal é aplicável às hipóteses de pedido único ou de cumulação de pedidos; na primeira hipótese deve haver parcela incontroversa do pedido único e na segunda parcela, de um dos pedidos ou mesmo um pedido (ou alguns) entre os cumulados9. O essencial é que parcela da pretensão do autor seja controvertida para que o processo prossiga quanto a essa parcela, e outra seja incontroversa, para que seja objeto de antecipação. Mas o que significa o “pedido incontroverso” previsto no dispositivo legal?
Para parcela da doutrina, para que o pedido seja incontroverso, é necessário o reconhecimento jurídico do pedido10 ou ao menos a ausência de impugnação quanto à parcela do pedido11. São situações distintas, com consequências também diferentes.
No reconhecimento jurídico do pedido a atividade do juiz é meramente homologatória, de forma que a cognição do juiz nesse caso será fictamente exauriente. Na realidade, o conhecimento do juiz a respeito das questões fáticas e jurídicas da demanda passa a ser irrelevante, porque, havendo a autocomposição por ato unilateral do réu, caberá ao juiz simplesmente homologar o reconhecimento jurídico do pedido. Entendo que nesse caso não haverá espaço no processo para o juiz se retratar da homologação como consequência do aprofundamento de sua cognição, que será irrelevante porque o juiz está vinculado à vontade do réu em se submeter à pretensão do autor. A decisão, entretanto, não é definitiva, porque, havendo superveniente sentença de extinção do processo sem a resolução do mérito, a decisão homologatória será extinta e a tutela antecipada, revogada.
Na hipótese de ausência de impugnação, a atividade do juiz é genuinamente decisória, mas a mera ausência de impugnação não leva necessariamente ao acolhimento do pedido do autor. A ausência de impugnação quando muito permite ao juiz presumir os fatos alegados pelo autor verdadeiros, mas a aplicação da regra do iura novit curia (o juiz conhece o direito) permite a rejeição do pedido mesmo nesses casos. Significa dizer que, entendendo que o autor não tem o direito que alega ter, naturalmente não haverá antecipação de tutela, mesmo que parcela do pedido do autor não tenha sido impugnada pelo réu12.
Nessa hipótese, entendo que o juiz decidirá mediante cognição presumidamente exauriente, o que significa dizer que naquele momento do processo o juiz entende que tem o conhecimento de todos os dados e informações necessários para resolver parcela do mérito. Prosseguindo o processo, não resta dúvida de que o juiz não buscará outros elementos de convencimento relativos à parcela do mérito já resolvida, mas é possível imaginar uma situação na qual, mesmo não procurando tais elementos, eles cheguem ao seu conhecimento. Ainda que se limite à parcela do mérito controvertida, poderá o juiz tomar conhecimento de elementos que demonstrem seu equívoco na decisão concessiva de tutela antecipada, podendo se valer de tais elementos para revogar a tutela anteriormente concedida.
Sarah ingressa com ação de reintegração de posse cumulada com indenização por perdas e danos contra João, que em sua contestação não impugna o alegado esbulho possessório, limitando-se a impugnar a existência de perdas e danos. Tratando-se de posse velha (não é cabível liminar), Sarah requer a concessão de tutela antecipada para se reintegrar imediatamente na posse, diante da ausência de impugnação de João, o que é concedido pelo juiz. É natural que, durante a instrução probatória que se seguirá, esteja o juiz preocupado exclusivamente com a questão das perdas e danos, mas não se pode excluir a possibilidade de que as testemunhas tragam informações ao juízo que demonstrem não ter ocorrido qualquer esbulho por parte de João. Entendo que nesse caso, tratando-se de tutela antecipada, o instituto previsto no art. 273, § 6.º, do CPC, será possível a aplicação do art. 273, § 4.º, do CPC, com a consequente revogação da tutela antecipada.
Como se pode notar do exposto, na tutela antecipada tradicional – de urgência e sancionatória –, é mais comum o juiz perceber que errou e revogar a tutela antecipada, porque o aprofundamento da cognição judicial dar-se-á justamente sobre a matéria da antecipação. Na tutela antecipada do art. 273, § 6.º, do CPC, o aprofundamento da cognição dar-se-á sobre a parcela controvertida do pedido, ou seja, recairá sobre questões alheias ao objeto de antecipação, sendo que o conhecimento de elementos a respeito desse objeto dar-se-á somente de forma indireta e não buscada originariamente. É possível, portanto, afirmar que nessa espécie de tutela antecipada a chance de revogação é muito menor, porque o juiz não procura descobrir novos elementos para verificar se acertou ou errou na concessão da tutela antecipada, mas de qualquer forma poderá, ainda que acidentalmente, adquirir esse novo convencimento que o convença de seu equívoco13.
Registre-se, finalmente, a existência de corrente doutrinária que defende o cabimento da tutela antecipada do art. 273, § 6.º, do CPC mesmo na hipótese de impugnação do réu. Para alguns, se a impugnação não for séria, com fundamento contrário a fato notório, em cujo favor milite presunção absoluta de veracidade ou existência, contra súmula dos tribunais superiores etc., caberá a antecipação de tutela14. Para outros, mesmo que for séria a impugnação, não sendo necessária a instrução probatória, será cabível a antecipação de tutela, ou seja, estando parcela da pretensão preparada para imediato julgamento, antecipa-se a tutela nos termos do art. 273, § 6.º, do CPC15. Naturalmente que nessas duas hipóteses só haverá antecipação se o juiz entender que o autor tem o direito material alegado.
O art. 283 do PLNCPC prevê que as medidas conservam a sua eficácia na pendência do processo em que esteja veiculado o pedido principal, mas podem, a qualquer tempo, ser revogadas ou modificadas, em decisão fundamentada, exceto quando um ou mais dos pedidos cumulados ou parcela deles mostrar-se incontroversa, caso em que a solução será definitiva.
Tradicionalmente, a tutela antecipada é associada às tutelas condenatória, executiva e mandamental, parecendo não haver divergência a respeito de seu cabimento quando o pedido do autor tiver tal natureza. Já no tocante às tutelas constitutiva e declaratória há alguma divergência doutrinária não a respeito do cabimento da tutela antecipada, o que inclusive encontra-se pacificado no Superior Tribunal de Justiça16, mas ao objeto da antecipação. Entendo que a resposta correta passa necessariamente pela definição do objeto da antecipação por meio do instituto previsto no art. 273 do CPC.
Apesar de o termo “tutela antecipada” ter se popularizado, sendo comumente utilizado – inclusive nesse livro – como corretamente a doutrina majoritária afirma não é propriamente a tutela jurisdicional o objeto da antecipação17. A antecipação é dos efeitos práticos que seriam gerados com a concessão definitiva da tutela pretendida pelo autor e não da tutela jurisdicional em si. Portanto, não se antecipada a tutela constitutiva ou declaratória da mesma forma que não se antecipa a tutela condenatória, mas sim os efeitos que essas tutelas geram no plano dos fatos.
A tutela condenatória imputa ao réu o cumprimento de uma prestação, sendo que essa imputação não pode ser objeto de antecipação, porque depende da certeza de que o réu deva cumprir a prestação pretendida pelo autor18. Ocorre, entretanto, que o efeito prático principal da tutela condenatória é a satisfação do direito gerada pela aplicação dos meios materiais de execução. Esse efeito executivo pode ser objeto de antecipação de tutela19, sendo essa a razão pela qual se admite “condenar” o réu a retirar o nome do autor do Serasa, pressionando-o com as astreintes, medida de execução indireta, bem como determinar a entrega de medicamentos por meio de busca e apreensão, medida de execução por sub-rogação.
Por meio da tutela constitutiva obtém-se a alteração da situação jurídica mediante a criação, extinção ou modificação de uma relação jurídica. É corrente na doutrina a afirmação de que o juiz não pode antecipar essa alteração da situação jurídica, que só pode ser concedida de forma definitiva, em razão de sua irreversibilidade20. Seria absurdo admitir, por exemplo, um divórcio provisório por meio de tutela antecipada, bastando para verificar a incompatibilidade de tal providência a eventual revogação da tutela antecipada pela tutela definitiva. E se as partes, divorciadas por meio de tutela antecipada já se casaram novamente? E se já tiveram filhos nesse novo casamento21?
No tocante à tutela declaratória, a própria concepção de certeza jurídica torna incompatível a existência de uma certeza provisória; se há certeza, há definitividade, e se há provisoriedade, é porque não há certeza. A sentença declaratória, ao declarar a existência, inexistência ou modo de ser de uma relação jurídica – e excepcionalmente de fato –, gera uma certeza jurídica a respeito dessa declaração, que naturalmente não pode ser objeto de antecipação. Mas é possível que a certeza jurídica decorrente da declaração definitiva gere efeitos práticos, sentidos no plano dos fatos, que poderão ser objeto de antecipação. Não se pode afirmar que uma lei é provisoriamente inconstitucional, mas o efeito prático da certeza dessa inconstitucionalidade, que é a vedação à sua aplicação, poderá ser obtido em sede de antecipação de tutela.
Não concordo com a afirmação doutrinária de que não se antecipam os efeitos principais da tutela, mas apenas seus efeitos secundários ou reflexos. Entendo que na tutela condenatória o efeito principal é o efeito executivo, que permitirá a prática de atos materiais de execução, sendo pacífico na doutrina que esse efeito executivo é objeto de antecipação. Na realidade, independentemente da espécie de tutela, é sempre o efeito executivo (entendido em seu sentido mais amplo) o objeto de antecipação22.
A essa conclusão poder-se-ia objetar com a alegação de que as tutelas declaratórias e constitutivas independem de efeito executivo para gerar satisfação ao autor; a declaração gera imediata e automaticamente a certeza jurídica; a criação, modificação ou extinção da relação jurídica gera imediata e automaticamente a alteração da situação jurídica das partes. Quanto a isso não há dúvida, mas é preciso lembrar que essas espécies de tutela criam uma eficácia negativa, que impede a prática de atos contrários ao que foi declarado e/ou constituído23. E essa eficácia negativa se satisfaz por meio de execução, sendo justamente esse efeito executivo objeto de antecipação de tutela nas tutelas declaratória e constitutiva.
Não é correta a lição de que qualquer efeito executivo ou mandamental que se pretenda obter já deve ser requerido na petição inicial em cumulação com o pedido declaratório, com a alegação de que a sentença declaratória não obriga o réu a fazer ou a não fazer algo24. Numa ação declaratória de inexigibilidade de débito não será necessário o pedido de condenação do réu a retirar o nome do autor dos cadastros de devedores para que essa medida seja concedida em sede de tutela antecipada25. A concessão da tutela de urgência nesse caso não decorre de pedido principal do autor nesse sentido, mas como consequência do dever do réu não praticar atos que contrariem a declaração de que o autor não é devedor.
Ao ingressar com ação declaratória de inexigibilidade de débito, o autor requer em tutela antecipada a retirada de seu nome do Serasa. A certeza jurídica de inexistência de débito não pode ser antecipada, mas, uma vez declarado que o autor não é devedor, poderá exigir do réu a retirada de seu nome do cadastro dos devedores, porque a manutenção de seu nome nesse cadastro significaria conduta contrária ao direito declarado. Não há outra forma de impor essa conduta ao réu senão por atos materiais de execução, sendo exatamente o que ocorre no caso concreto. São esses efeitos executivos objeto de antecipação de tutela.
Numa ação revisional de aluguel não se pode afirmar que a tutela antecipada altere a situação jurídica locatícia entre as partes, mas, uma vez modificada a relação jurídica e fixado definitivamente um novo valor de aluguel, criam-se para as partes direitos e deveres que podem ser exigidos reciprocamente para que não se contrarie o direito constituído. O locatário deve pagar o novo valor e o locador deve aceitar o pagamento, com todas as consequências advindas dessas regras de comportamento. Quando o juiz antecipa a tutela numa revisional de aluguel, determinando provisoriamente um novo aluguel, não está, como entendem alguns doutrinadores26, antecipando a constituição do novo aluguel, mas simplesmente os efeitos executivos que essa constituição, que só pode ser definitiva, gera no plano prático, impondo uma regra de comportamento às partes.
Parcela minoritária da doutrina defende a possibilidade de antecipação da própria declaração e da constituição da nova situação jurídica, sustentando que o problema não é o seu cabimento, mas a viabilidade e a utilidade destas tutelas em face das diversas situações concretas27. Essa corrente doutrinária afirma que não se pode admitir uma constituição provisória em ações de estado, mas é possível a constituição provisória de um aluguel ou de uma servidão de passagem. Na declaração, reconhecem que a antecipação, ainda que possível, não gera qualquer utilidade ao autor.
O entendimento não parece correto, porque a constituição provisória de um direito é inconcebível e contraditória. A certeza provisória que seria gerada pela antecipação da declaração ainda mais. Ainda que se admita que a tutela constitutiva não dependa de atos executivos para a sua satisfação, os efeitos práticos derivados dessa constituição, consubstanciados na necessidade de a parte contrária não adotar um comportamento contrário ao direito constituído em favor do autor são obtidos por meios executivos. E é justamente aqui que se justifica a antecipação de efeitos da tutela declaratória e constitutiva: não se antecipam a tutela nem o efeito principal dessa tutela, mas os efeitos práticos que ditam regras de comportamento às partes em respeito ao que foi declarado ou constituído.
O art. 273 do CPC está no Livro I do codex processual, que supostamente se refere ao processo de conhecimento, ainda que inúmeras regras desse Livro se apliquem à teoria geral do processo, não se limitando ao processo de conhecimento. A questão a ser enfrentada é se a tutela antecipada seria privativa do processo de conhecimento ou se poderia ser requerida em outros processos. Antes de enfrentar tal questão, entretanto, interessante verificar a abrangência do instituto no processo de conhecimento.
Não resta nenhuma dúvida acerca da aplicabilidade da tutela antecipada no procedimento ordinário e sumário, considerados como espécies de procedimentos comuns pelo Código de Processo Civil. Também aos procedimentos especiais – previstos no Código de Processo Civil e em leis extravagantes – se aplica a tutela antecipada, como se nota de decisões do Superior Tribunal de Justiça que admitem essa espécie de tutela de urgência satisfativa no despejo28 e consignação em pagamento29, entre outros. Mesmo na tutela monitória – a par do debate acadêmico a respeito de ser ação, processo ou procedimento – admite-se a tutela antecipada30.
Na hipótese do procedimento especial que já tem a previsão expressa de liminar, que exercerá nesses casos a função da tutela de urgência satisfativa, deve-se analisar se há diferença entre os requisitos da liminar e da tutela antecipada à luz do pedido e da condição apresentada pela parte. Se o autor pedir a tutela antecipada porque sabe que não preencheu os requisitos para a concessão da liminar, como fica claro na hipótese de tutela antecipada sancionatória, o juiz deverá decidir normalmente o pedido31. Caso o autor apenas tenha se confundido, requerendo tutela antecipada em vez da liminar, o pedido não deverá ser rejeitado pelo juiz somente em razão desse equívoco, que melhor fará em admiti-lo como pedido de liminar, em aplicação do princípio da fungibilidade.
Da mesma forma, no procedimento sumaríssimo admite-se a tutela antecipada porque o instituto processual é totalmente compatível com os princípios dos Juizados Especiais, apesar da omissão da Lei 9.099/1995 (Juizados Especiais Estaduais), e da Lei 10.259/2001 (Juizados Especiais Federais)32. Na realidade, a omissão é irrelevante, mas o art. 4.º da Lei 10.259/2001, ao mencionar a possibilidade de o juiz deferir medidas cautelares no curso do processo poderia, além de ter se preocupado em proibir o processo cautelar autônomo, aproveitado a oportunidade para prever expressamente também a tutela antecipada.
Como já afirmado, a antecipação de tutela tem como objeto os efeitos executivos da tutela, o que cria em tese uma incompatibilidade da tutela antecipada com o processo/fase de execução, considerando-se que não é possível antecipar efeitos que a parte já tem. Acredito que a tutela antecipada fundada no perigo de lesão grave ou de difícil reparação não se justifica, porque, havendo tal perigo, o exequente não deverá pedir a satisfação imediata, mas a garantia de que sua satisfação ocorra no momento procedimental adequado, o que será feito por meio de cautelar. Mas vislumbro hipótese bem singular de concessão da tutela antecipada sancionatória.
Com as alterações legislativas que sofreu o processo de execução, os atos de satisfação já não dependem de garantia do juízo, não mais se podendo justificar a tutela antecipada pelo ingresso de embargos à execução manifestamente protelatórios. Ocorre, entretanto, que só poderão ser adotados após a citação do executado, sendo possível imaginar hipótese de resistência injustificada à realização do ato citatório, em conduta tipificada como abusiva e desleal. Entendo que nesse caso será admissível a antecipação de tutela para já determinar os atos de satisfação do direito do exequente mesmo antes da citação do executado, com fundamento no art. 273, II, do CPC33.
Registre-se que, havendo embargos à execução, ação incidental de conhecimento, é admissível o pedido de tutela antecipada tanto pelo embargante como pelo embargado, desde que preenchidos os requisitos legais. Basta imaginar a hipótese de o executado requerer a tutela antecipada para a retirada imediata de seu nome dos cadastros dos devedores em embargos à execução no qual se discute a existência da dívida exequenda34.
A liminar da cautelar é satisfativa como qualquer outra, considerando-se que gera a satisfação do direito cautelar da parte; daí ser correto afirmar que a liminar cautelar é uma antecipação da tutela cautelar35. Entendo, entretanto, cabível a antecipação de tutela no processo cautelar, mas para tanto deve-se levar a sério o disposto no art. 804 do CPC, sob pena de se concluir equivocadamente que não existe interesse de agir na tutela antecipada em razão da previsão expressa de liminar no procedimento cautelar36. Segundo analisado no Capítulo 52, item 52.5, a liminar cautelar só se justifica antes da citação do requerido, de forma que, surgindo a necessidade de tutela de urgência satisfativa após esse momento procedimental, seja em razão de perigo de lesão ou de atos de má-fé do requerido, caberá a antecipação da tutela37.
Salvo a tutela antecipada prevista no art. 273, § 6.º, do CPC, a tutela antecipada sempre dependerá de prova inequívoca de verossimilhança da alegação, entendido como o requisito positivo comum da tutela antecipada. Além desse requisito, tratando-se de tutela antecipada de urgência, também deverá ser demonstrado o perigo de lesão grave de difícil ou incerta reparação e, sendo tutela antecipada sancionatória, o abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório, sendo esses os requisitos positivos alternativos.
O requisito da prova inequívoca da verossimilhança da alegação consta do art. 273, caput, do CPC, de forma que será exigido tanto para a tutela antecipada como espécie de tutela de urgência (art. 273, I, do CPC), como para a tutela antecipada sancionatória (art. 273, II, do CPC).
A interpretação literal do art. 273, caput, do CPC certamente levará o operador a uma conclusão no mínimo paradoxal, considerando-se que o termo inequívoco significa aquilo de que não se tem mais dúvida, que não admite mais discussão, o que é, naturalmente, incompatível com a ideia de verossimilhança, que cuida tão somente da aparência da verdade, o que, é evidente, nada tem de certo ou inequívoco, podendo vir a se demonstrar falsa a primeira impressão a respeito dos fatos. É nesse clima de aparente incompatibilidade entre os termos “inequívoca” e “verossimilhança” que deve ser interpretado o dispositivo legal ora comentado.
Não parece ser correto o entendimento de que a exigência de uma prova inequívoca demandaria a existência de uma prova no caso concreto, que já seria suficiente para o juiz decidir de forma definitiva a demanda judicial38. Esse entendimento, além de sacrificar a amplitude necessária para a aplicação da tutela antecipada – de urgência e sancionatória –, despreza por completo a segunda parte do requisito legal, que menciona expressamente a verossimilhança da alegação, ou seja, não exige do juiz um juízo de certeza a respeito dos fatos, mas tão somente de probabilidade.
É preciso lembrar que a verdade é algo meramente utópico e inalcançável, não sendo diferente no processo judicial, no qual a melhor doutrina aponta que a certeza adquirida pelo juiz no momento da prolação de sua decisão definitiva decorre de uma aparência da verdade gerada justamente pela prova produzida. Ainda que não seja possível falar em obtenção da verdade para o julgamento definitivo, a questão da verossimilhança estará sempre ligada à mera alegação de fato, enquanto a aparência da verdade exigida para o julgamento definitivo estará fundada na prova efetivamente produzida no caso concreto39. Dessa forma, estar-se-ia diante de duas espécies diferentes de aparência da verdade:
(i) verossimilhança, bastando para tanto a alegação de um mero fato que aparente ser verdadeira, e
(ii) verdade possível – ou quase verdade –, decorrendo a aparência da verdade justamente das provas produzidas no processo.
Na hipótese do requisito ora analisado, é preciso observar que o legislador fica no meio-termo entre exigir do autor apenas a verossimilhança de sua alegação, ou desde já toda a prova necessária para preencher o requisito da quase verdade, exigida como forma de legitimação da decisão definitiva a ser proferida no processo. Parece haver duas exigências diversas no requisito legal ora analisado: em primeiro lugar, deverá existir uma alegação de fato que aparentemente seja verdadeira, tomando-se por base para essa análise as máximas de experiência, ou seja, aquilo que costuma ocorrer. Em segundo lugar, se exigirá uma prova que corrobore a alegação que já parece ser verdadeira, sem que com isso seja exigida do autor uma produção probatória exaustiva que aproxime o máximo possível o juiz da verdade, naquilo que parcela da doutrina convencionou chamar de verdade possível ou quase verdade.
Significa dizer que, além de a alegação parecer verdadeira, deverá existir uma prova forte suficiente para confirmar, ao menos na cognição sumária a ser realizada pelo juiz, que aquela alegação fática parece ser realmente verdadeira40. É evidente que aquilo que parece ser verdadeiro, mesmo que corroborado por uma prova, poderá se mostrar falso conforme a cognição do juiz se aprofundar no caso concreto. De qualquer forma, a existência de prova a corroborar a alegação de fato que por si só já parece ser verdadeira gera uma grande probabilidade de a alegação realmente ser verdadeira, o que já é suficiente para a concessão da tutela antecipada.
Há, entretanto, outros posicionamentos doutrinários a respeito da prova inequívoca. Para determinada corrente doutrinária, prova inequívoca é aquela à qual só é possível atribuir um sentido único, que só comporta um determinado entendimento41. Concordo com a crítica a esse entendimento de que mesmo a prova com duplo sentido pode ser apta a gerar o convencimento necessário à concessão da tutela antecipada42, porque apesar de não ser o ideal, é inegável que esse tipo de prova pode justificar até mesmo uma decisão definitiva fundada em cognição exauriente. Para outros, é a prova suficiente para o surgimento do verossímil43, com o que não se concorda por ser a verossimilhança a aparência de verdade gerada pela mera alegação de fato, e não de prova. Como já exposto, prefiro o entendimento de que a “prova inequívoca” seja prova séria o suficiente para corroborar a alegação verossímil feita pelo autor.
A prova inequívoca e a verossimilhança da alegação são dois requisitos cumulativos para a concessão da tutela antecipada, de forma que, mesmo que exista uma prova robusta a respeito de um fato, se aparentemente a alegação desse fato não mostrar-se verdadeira, será inviável a concessão da tutela antecipada. Apesar de ser circunstância difícil de ser imaginada no caso concreto, é possível que exista uma prova pré-constituída que contraria uma máxima de experiência.
João ingressa com demanda trabalhista afirmando que durante dois anos trabalhou 20 horas por dia, todos os dias da semana. Instrui sua petição inicial com cartão de ponto corroborando sua alegação, além de um certificado internacional concedido à empresa-ré que atesta ser ela exemplo internacional no controle de pessoal. Até se pode afirmar que as provas documentais juntadas aos autos por João são formalmente sérias e corroboram de forma clara a alegação de fato feita na petição inicial. Ocorre, entretanto, que a alegação de fato é inverossímil, não sendo comum um ser humano aguentar trabalhar 20 horas diárias durante todos os dias durante dois anos. Nesse caso, haverá prova inequívoca, mas não verossimilhança da alegação, e, como o art. 273, caput, do CPC exige a presença de ambos, não será concedida tutela antecipada em favor de João.
Por outro lado, a prova produzida como apta a garantir a tutela antecipada também poderá ser apta a garantir à parte a vitória definitiva na demanda, tudo a depender da necessidade de aprofundamento da cognição probatória desenvolvida pelo juiz. Significa dizer que determinadas provas são tão robustas acerca da alegação de fato que, ainda que existam outras provas produzidas, ela por si só já é suficiente para a decisão favorável definitiva. O que se pretende afirmar é que a prova inequívoca exigida para a concessão da tutela antecipada não deve ser robusta e completa a ponto de permitir, em qualquer hipótese, um julgamento definitivo favorável ao autor, mas é plenamente possível que, em determinadas situações concretas, seja exatamente isso o que ocorra, tamanha a carga de convencimento apresentada no caso concreto pelo beneficiado pela tutela antecipada. Basta imaginar uma confissão extrajudicial documentada, juntada à petição inicial, que já permitirá a tutela antecipada e, não tendo sido durante a instrução probatória produzida qualquer prova robusta em sentido contrário, aquela prova originariamente juntada já será suficiente para o julgamento favorável definitivo.
Conforme devidamente analisado no Capítulo 50, item 50.2.2.4, o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação previsto no art. 273, I, do CPC, como requisito da tutela antecipada de urgência, é o tradicional periculum in mora exigido para a concessão da tutela cautelar. Aplica-se a esse requisito a máxima do tempo como inimigo, ou seja, o tempo necessário para a concessão da tutela definitiva coloca em manifesto perigo a efetividade do resultado final do processo. Para afastar esse perigo, até porque justiça tardia e ineficaz é sinônimo de injustiça, antecipa-se a tutela em favor da parte que demonstrar a boa probabilidade de seu direito existir.
Segundo autorizada doutrina, o risco de dano deve ser concreto, atual e grave44, ou seja, deve ser iminente, provocar um sério prejuízo à parte e não decorrer de mero temor subjetivo, mas de dados concretamente demonstrados. Entende-se que os inconvenientes gerados pela demora processual, consequências naturais do procedimento desenvolvido em respeito ao contraditório e à ampla defesa, não sejam suficientes para a concessão da tutela antecipada45.
O art. 273, I, do CPC qualifica o dano a que estaria exposta a parte como irreparável ou de difícil reparação. Haverá dano irreparável sempre que os efeitos do dano forem irreversíveis, como ocorre com a violação a direitos não patrimoniais, tais como o direito à integridade física. No tocante aos direitos patrimoniais, haverá dano irreparável sempre que for impossível a reparação na forma específica, ou seja, sempre que a demora na entrega da prestação jurisdicional criar uma situação jurídica que não poderá no futuro ser modificada, voltando-se ao status quo ante46. Haverá dano de difícil reparação sempre que a tutela reparatória for abstratamente eficaz, mas mostrar-se improvável no caso concreto, como se pode concluir da situação econômica da parte contrária47.
Partindo-se do pressuposto de que a lei não contém palavras inúteis, é preciso distinguir as duas expressões contidas no art. 273, II, do CPC, que apesar de próximas designam fenômenos processuais distintos.
Para parcela doutrinária o manifesto propósito protelatório é mais amplo que o abuso do direito de defesa48, mas aparentemente não se trata propriamente de diferença resultante da extensão das condutas. A forma mais adequada de interpretar o dispositivo legal é considerar que o abuso de direito de defesa representa atos protelatórios praticados no processo, enquanto no manifesto propósito protelatório do réu há um determinado comportamento – atos ou omissões – fora do processo, com ele relacionados49.
Há pelo menos duas interpretações possíveis ao termo “defesa” utilizado no art. 273, II, do CPC. Numa interpretação ampliativa pode-se entender qualquer ato que busque a defesa dos interesses da parte e numa interpretação mais restritiva o termo “defesa” pode ser entendido exclusivamente como contestação50.
Não parece legítimo o entendimento restritivo, evidenciando-se que o abuso do direito de defesa poderá se manifestar em outros atos processuais que não a contestação, o que inclusive poderá se notar em outras espécies de resposta do réu, como as exceções rituais, que, por gerarem a suspensão do procedimento principal, poderão ser utilizadas de forma abusiva. Mas nem só nesse momento inicial do processo será possível detectar o abuso do direito de defesa, até porque o direito de defesa não é algo que se exaure após a apresentação de resposta do réu. Como o direito de defesa existe durante todo o processo, é evidente que o abuso em seu exercício possa ocorrer durante todo o trâmite procedimental.
A maioria dos atos tipificados como de litigância de má-fé pelo art. 17 do CPC também poderão configurar o abuso do direito de defesa exigido pela tutela antecipada sancionatória. Nesses casos, inclusive, é ainda mais fácil a tipificação do ato praticado pela parte, considerando-se sua expressa previsão legal. Ocorre, entretanto, que seria empobrecer em demasia o alcance da norma legal a vinculação do instituto de forma absoluta aos atos de litigância de má-fé51.
O que se pretende demonstrar é que existem atos que não são tipificados como de litigância de má-fé, mas ainda assim poderão se enquadrar no abuso do direito de defesa, como também o contrário será possível52. Apesar de não interessar uma análise casuística do instituto processual ora examinado, cumpre registrar ao menos a hipótese de tutela antecipada de parcela incontroversa da pretensão do autor, que antes do art. 273, § 6.º, do CPC já vinha sendo admitida pela doutrina com base no art. 273, II, do CPC. Ainda que não existisse qualquer litigância de má-fé em impugnar tão somente uma parcela da pretensão do autor, permitindo que outra parcela se tornasse incontroversa, a doutrina de forma majoritária entendia possível a antecipação da tutela mediante uma interpretação extensiva da ideia de sanção prevista na espécie de tutela antecipada ora analisada53.
Costuma-se dizer que a mente criminosa ou de má-fé é muito criativa, de forma que seria impossível indicar todas as manobras realizáveis durante o procedimento em nítido abuso do direito de defesa da parte. Além de sempre existir uma manobra nova a se verificar no caso concreto, melhor nem descrever as já conhecidas para que algum patrono não se entusiasme com suas novas descobertas...
Seguindo a concepção adotada, com o objetivo de diferenciar o ato praticado em abuso do direito de defesa do ato praticado com manifesto propósito protelatório, é correto afirmar que nessa segunda hipótese os atos são praticados fora do processo, evidentemente gerando consequências processuais. A redação do dispositivo legal nesse tocante não foi feliz, porque o mero propósito não é suficiente para ensejar a antecipação de tutela, sendo necessário que o ato praticado efetivamente tenha protelado a entrega da prestação jurisdicional. Ainda que o objetivo do réu tenha sido tornar mais moroso o trâmite processual, se não conseguiu no caso concreto atingir efetivamente tal objetivo, não haverá nenhum prejuízo ao andamento do processo. Poderá até mesmo ser punido por ato de litigância de má-fé (art. 17 do CPC), atentatório à dignidade da jurisdição (art. 14, V do CPC) ou atentatório à dignidade da justiça (art. 600 do CPC), mas não haverá razão para antecipar a tutela como forma de sancionar o réu54.
Mais uma vez é grande o número de atos praticados fora do processo que tem como objetivo atrasar o andamento procedimental, e mais uma vez deixa-se de indicar uma relação de tais atos por duas razões já expostas: ser sempre meramente exemplificativa qualquer relação que se imagine a respeito de tais atos e deixar de trazer ao conhecimento de patronos e partes menos preocupadas com a boa-fé e a lealdade processual práticas escusas até então desconhecidas.
Nesse momento da análise dos atos praticados com manifesto propósito protelatório – melhor seria falar em atos com resultado protelatório – surge uma interessante questão. Esses atos, praticados fora do processo, poderiam ser praticados antes do início da demanda judicial ou somente poderão existir a partir do momento em que o processo está proposto? É interessante notar que o dispositivo legal já menciona o termo “réu”, figura jurídica que evidentemente só passará a existir quando houver demanda judicial em trâmite. Isso, entretanto, não será suficiente para se chegar a qualquer conclusão, considerando-se a dispensabilidade do termo para a compreensão do fenômeno.
Ainda que possa ser de difícil comprovação no caso concreto a existência desses atos anteriormente à propositura da demanda judicial, a melhor doutrina que já se manifestou sobre o tema defende a possibilidade da concessão liminar também dessa espécie de tutela antecipada por atos praticados pelo réu antes mesmo da propositura da demanda55.
Há inclusive na doutrina um interessante exemplo: existência de um contrato preliminar de compra e venda de imóvel com cláusula de prazo para entrega de bem, sendo outorgada a escritura e pago integralmente o valor e não havendo a entrega do imóvel, situação em que seria cabível o pedido de antecipação de tutela na ação de imissão de posse, ainda que seja possível ao autor aguardar o final do processo sem qualquer perigo de dano56. Como não se vislumbra qualquer possibilidade de resistência processual séria da parte, o ato de não sair do imóvel, mesmo antes da existência do processo, já é suficiente para configurar o manifesto propósito protelatório.
A interpretação extensiva, portanto, é a mais adequada tanto ao abuso do direito de defesa como ao manifesto propósito protelatório, admitindo-se que qualquer ato processual ou material, praticado antes ou durante o processo, seja apto a permitir, desde que presente no caso concreto a prova inequívoca da verossimilhança da alegação, a concessão da tutela antecipada nos termos do art. 273, II, do CPC.
Aduz o art. 273, § 2.º, do CPC que não se concederá a antecipação de tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. A norma tem nobre preocupação com o direito ao contraditório e a ampla defesa, servindo como salvaguarda do direito à segurança jurídica do réu57, mas deve ser interpretada à luz da efetividade da tutela jurisdicional. Na realidade, a correta interpretação desse dispositivo legal é essencial para a tutela antecipada ser um efetivo instrumento no acesso à ordem jurídica justa ou mais uma previsão que em razão de suas limitações terá pouca aplicação prática e ainda menos relevância jurídica.
A interpretação literal do dispositivo legal deve ser evitada, até porque a doutrina majoritária entende que a irreversibilidade não diz respeito ao provimento que antecipa a tutela, e sim aos efeitos práticos gerados por ele58. O pronunciamento é sempre reversível, mediante a interposição do recurso cabível ou a prolação de outra decisão que virá substituí-lo. Daí a afirmação de que a irreversibilidade não é a jurídica, sempre inexistente, mas a fática, que é analisada pela capacidade de retorno ao status quo ante na eventualidade de revogação da tutela antecipada.
Tomando-se por base a irreversibilidade fática, deve-se analisar a situação fática anterior à concessão da tutela antecipada e aquela que será criada quando a tutela for efetivada. Sendo possível após sua revogação o retorno à situação fática anterior à sua concessão, a tutela antecipada será reversível, não sendo aplicado o impedimento do art. 273, § 2.º, do CPC. Caso contrário, haverá irreversibilidade, sendo, ao menos em tese, vedada pela lei a concessão da tutela antecipada.
Ocorre, entretanto, que, mesmo quando a tutela antecipada é faticamente irreversível, o juiz poderá excepcionalmente concedê-la, lembrando a doutrina que um direito indisponível do autor não pode ser sacrificado pela vedação legal. Nesse caso, valoram-se os interesses em jogo, e, sendo evidenciado o direito à tutela antecipada, é indevida a vedação legal à sua concessão. São, por exemplo, muitas as tutelas antecipadas em demandas em que se discute a saúde do autor, com a adoção de medidas faticamente irreversíveis, tais como a liberação de remédios, imediata internação e intervenção cirúrgica.
É óbvio que a mera indisponibilidade do direito não é suficiente para a concessão da tutela antecipada, devendo sempre o juiz analisar o efetivo preenchimento dos requisitos legais59. Não é porque a operação é necessária à sobrevivência do autor que o juiz concederá, por esse simples fato, a tutela antecipada em seu favor somente porque o Plano de Saúde ou Hospital sempre poderão cobrar o valor da operação posteriormente na hipótese de revogação da tutela antecipada.
E nem se fale que nesse caso a tutela antecipada seria admitida porque será possível ao réu converter seu eventual prejuízo em perdas e danos. Há doutrina que afirma existir a irreversibilidade de fato e de direito, sendo essa última sempre resolvida em perdas e danos e, por isso, não impeditiva da concessão de tutela antecipada60. Na realidade, esse entendimento faz do dispositivo legal letra morta, porque todos os prejuízos se convertem em perdas e danos; ainda que em algumas situações não seja o ideal a compensação pecuniária, ela é sempre possível61.
Situação mais delicada para o juiz ocorre quando a não concessão de tutela antecipada pode gerar um sacrifício irreversível ao pretenso direito daquele que requer a tutela de urgência e sua concessão gera um sacrifício irreversível ao réu. Claro, tudo conversível em perdas e danos, mas ainda assim o direito de alguma das partes terá de ser sacrificado. Imagine-se um pedido de tutela antecipada feito na sexta-feira para proibir a veiculação de matéria jornalística em revista dominical já pronta para ser distribuída: concedida a tutela antecipada, estar-se-á sacrificando o interesse de informar da empresa; não concedida, estar-se-á sacrificando o direito à privacidade do autor.
É uma situação-limite, que podemos chamar de “irreversibilidade de mão dupla”, ou como prefere a doutrina, “recíproca irreversibilidade”62, na qual caberá ao juiz a ponderação do direito mais provável no momento de análise do pedido da tutela antecipada63, aplicando-se o princípio da razoabilidade. Em lição de autorizado processualista, deve-se valorar comparativamente os riscos, balanceando os dois males para escolher o menor64. Típica hipótese é a tutela antecipada para atendimento médico quando o autor demonstra que sem ele sofrerá uma lesão irreparável65. Nesse caso, ainda com mais razão, será interessante na hipótese de concessão da tutela antecipada a determinação de caução ao autor, conforme analisado no Capítulo 50, item 50.3.1.1.
Segundo o art. 273, caput, do CPC o juiz poderá antecipar os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, sugerindo a interpretação literal do dispositivo que somente o autor tem direito à tutela antecipada, já que somente ele faz “pedido inicial”. A interpretação literal, entretanto, não é a mais adequada para o caso concreto, porque mesmo quem não é autor poderá requerer em seu benefício a concessão de tutela antecipada.
Não resta dúvida de que a partir do momento em que o réu assume uma posição ativa no processo passa a ter legitimidade para requerer a concessão da tutela antecipada. Ao fazer uma reconvenção ou um pedido contraposto, o réu automaticamente passa a ser autor da pretensão veiculada por essas formas de resposta, qualificadas pela melhor doutrina como contra-ataques do réu66. Também é indubitável que o réu em ação dúplice pode requerer a concessão de tutela antecipada67, porque nessa singular espécie de ação o pedido de improcedência do pedido do autor elaborado pelo réu na contestação já é suficiente para entregar-lhe o bem da vida em disputa, de forma que ele, ao contestar, passa automaticamente a assumir também uma posição ativa no processo. A ação é dúplice porque o autor e o réu, a partir do momento de contestação, passam a ter posições ativas e passivas na relação jurídica processual.
A questão remanesce, entretanto, na possibilidade de o réu, ao simplesmente contestar o pedido do autor buscando evitar que ele receba a tutela jurisdicional pretendida, elaborar pedido de antecipação de tutela. Como já afirmado no Capítulo 11, item 11.5, o réu faz um pedido de natureza declaratória negativa quando se defende, qual seja a declaração de que o direito material do autor não existe. Na hipótese de o réu pretender obter a antecipação dos efeitos executivos dessa futura declaração, nenhum óbice haverá ao pedido de antecipação de tutela na contestação68.
Edison e Felipe recebem em suas residências um comunicado do Banco Surreal apontando dívidas que ambos não reconhecem como suas e informando que o nome de ambos já foi inscrito no Serasa. Como nenhum deles jamais manteve qualquer relação jurídica com o Banco Surreal, ficam intrigados com a referida cobrança, mas reagem de forma diferente. Edison, mais diligente e preocupado com as consequências de uma eventual cobrança e da mancha em sua reputação em razão do indevido cadastramento, ingressa com ação declaratória de inexistência de débito afirmando não ter qualquer dívida com o Banco Surreal e requer em tutela antecipada a retirada imediata de seu nome do Serasa. Felipe, mais cabeça fresca, não toma nenhuma providência imediata, mas quando finalmente é citado em ação de cobrança promovida pelo Banco Surreal, se vê obrigado a contestar a demanda, alegando que não tem qualquer dívida com o autor e pedindo a improcedência do pedido, ou seja, a declaração de inexigibilidade do débito. Como se pode notar, o pedido que Felipe faz em contestação é idêntico ao que fez Edison em sua petição inicial. Se um tem legitimidade para pedir a tutela antecipada, necessariamente também terá o outro.
Mesmo ciente da absoluta excepcionalidade da situação, trago uma situação concreta tirada de minha experiência profissional na qual o réu requereu a antecipação de tutela da futura procedência do pedido do autor. Determinada instituição financeira, ao não localizar um veículo objeto de alienação fiduciária, ingressa com ação de cobrança contra o fiador, que em sua contestação limita-se a impugnar o valor cobrado pelo banco. No momento de apresentar a contestação, descobre onde está o carro e requer ao juiz a concessão de tutela antecipada de sua futura condenação, com o objetivo de buscar, apreender e entregar-lhe o carro, porque, uma vez condenado e satisfazendo o direito do autor, se sub-rogaria no crédito e, consequentemente, também nas garantias, no caso o carro. É verdade que, em razão do perigo de o carro novamente desaparecer, seria cabível um pedido cautelar, mas entendo que a tutela antecipada nesse caso, apesar da excepcionalidade, deveria ser deferida, como de fato foi.
No tocante aos terceiros intervenientes, aplicam-se as mesmas considerações já feitas, até porque o opoente é autor o nomeado à autoria, o denunciado à lide e chamado ao processo são réus. Apenas na assistência simples há uma especialidade digna de nota; apesar de ter legitimidade para pedir a tutela antecipada em favor do assistido o assistente tem interesse condicionado à vontade daquele para tal pedido69, de forma que, havendo manifestação de vontade expressa do assistido no sentido de não quer a tutela antecipada, apesar de legitimado faltará interesse jurídico ao assistente no pedido dessa espécie de tutela de urgência.
Questão interessante é a legitimidade do Ministério Público que funciona como fiscal da lei na demanda para requerer a concessão de tutela antecipada. Apesar de a corrente doutrinária majoritária defender o contrário, entendo pela impossibilidade porque, como já tive oportunidade de defender, a tutela antecipada depende de pedido da parte interessada, conforme previsão do art. 273, caput, do CPC. Sendo o Ministério Público fiscal da lei, fiscalizar a boa aplicação do art. 273 do CPC é deixar à parte interessada o pedido de concessão de tutela antecipada70. Naturalmente que isso não impede que o promotor simplesmente peticione afirmando que a parte tem direito à tutela antecipada71, expondo suas razões, o que muito provavelmente levará o patrono da parte a requerer a sua concessão.
Segundo o art. 273, caput, do CPC, o juiz poderá conceder a antecipação dos efeitos da tutela, em redação que pode levar o intérprete à conclusão de que exista alguma espécie de discricionariedade ao juiz na decisão de concessão ou não da tutela antecipada. Não é o momento adequado para enfrentar o tormentoso tema da existência ou não de discricionariedade judicial, que até entendo existir, ao menos nos poderes instrutórios do juiz, até porque, se o juiz tivesse o dever de produzir a prova, a ausência dessa atividade geraria alguma espécie de vício, o que efetivamente não ocorre. A exposição, entretanto, ficará limitada ao dispositivo legal mencionado.
Conforme corretamente entende a doutrina majoritária, não existe discricionariedade para o juiz conceder ou não a tutela antecipada, sendo o termo “poderá” entendido como “deverá”. O que se afirma é que o juiz não pode simplesmente escolher entre conceder ou não a tutela antecipada imaginando que ambas as soluções serão consoantes o direito. Estando preenchidos no caso concreto os requisitos legais, o juiz é obrigado a conceder a tutela antecipada, também sendo obrigado a indeferi-la se acreditar que os requisitos não estão preenchidos72. Será até mesmo teratológica uma decisão na qual o juiz afirme a presença dos requisitos, mas, por acreditar que a melhor solução é a não concessão da tutela antecipada, deixa de concedê-la, ou que, mesmo ausentes os requisitos, resolve por concedê-la por entender essa solução a mais oportuna ou conveniente.
O juiz tem certa liberdade na apreciação do preenchimento dos requisitos para a concessão da tutela antecipada em razão da utilização pelo legislador de normas abertas, com conteúdo indeterminado ou vago: “grave lesão”; “difícil ou incerta reparação”; “verossimilhança da alegação”; “prova inequívoca”; “abuso do direito de defesa”; “manifesto propósito protelatório”. Mas essa liberdade valorativa no preenchimento dos requisitos não se confunde com a liberdade em conceder ou não a tutela antecipada. A decisão está condicionada à atividade prévia do juiz, na qual a sua interpretação é indispensável, mas está vinculada ao resultado dessa atividade.
A exigência expressa da obrigatoriedade de fundamentação da decisão que concede a tutela antecipada, prevista no art. 273, § 1.º, do CPC, parece demonstrar que a discricionariedade não faz parte da atividade judicial quando decide sobre o pedido de tutela antecipada, tanto que deverá expor com clareza as razões que o levaram a deferir ou indeferir a tutela requerida pela parte. Ao exteriorizar suas razões do decidir, o juiz demonstra seu raciocínio e se vincula à sua fundamentação, devendo conceder a tutela antecipada se exteriorizar que entendeu preenchidos os requisitos e indeferi-la se mostrar que entendeu que os requisitos não foram preenchidos.
Ainda quanto ao art. 273, § 1.º, do CPC, o legislador certamente levou em consideração a importância da decisão que concede a tutela antecipada, especialmente quando essa decisão é de natureza interlocutória, que geralmente tem como objeto questões incidentais de menor relevância para a pretensão das partes. Na realidade, nem precisaria existir o art. 273, § 1.º, do CPC, bastando a aplicação do art. 93, IX, da CF, que exige a fundamentação em todas as decisões judiciais, mas pela norma se faz um apelo ao juízes para que cumpram a regra constitucional73. O reforço da exigência feito no dispositivo ora comentado só torna mais triste e incompreensível a insistência de muitos juízes em decidir pedidos de tutela antecipada de forma monossilábica ou de forma muito mais concisa do que o recomendável.
A doutrina vem corretamente entendendo que a tutela antecipada pode ser concedida a qualquer momento do processo, o que significa no início, com a propositura da demanda, até o final, com o trânsito em julgado. Apesar dessa amplitude, existem alguns momentos que merecem uma análise específica em razão de suas singularidades.
A praxe forense vem demonstrando que a tutela antecipada pode ser concedida inaudita altera parte, o que significa dizer que é admissível a concessão dessa espécie de tutela de urgência antes mesmo da citação do réu74. A alegação de que a concessão da tutela antecipada nesse momento afronta o princípio do contraditório é corretamente rejeitada em razão da evidência de que nesse caso existe o respeito a esse princípio, sob forma do chamado contraditório diferido, analisado no Capítulo 2, item 2.4.2.5.
Apesar da possibilidade de concessão de tutela antecipada nesse momento inicial do procedimento, quando a relação jurídica processual ainda não se completou, é correta a lição doutrinária que ensina ser excepcional a concessão inaudita altera parte75. Somente se justifica conceder uma tutela de urgência de natureza satisfativa antes da oitiva do réu em situações de extrema urgência, nas quais a mera espera da citação e resposta do réu já seja suficiente para o perecimento do direito do autor. Também a hipótese de a ciência motivar o réu a adotar alguma conduta que venha a frustrar a eficácia de uma futura antecipação de tutela pode justificar no caso concreto sua concessão liminarmente. Resumidamente, só se justifica a tutela antecipada antes da citação se a convocação do réu prejudicar a eficácia da medida76.
Significa dizer que, sempre que for possível aguardar a manifestação do réu após sua citação sem grandes repercussões negativas na esfera de interesse do autor, deve-se esperar esse momento para conceder a tutela antecipada. Ainda que o contraditório diferido seja apto a preservar o princípio constitucional consagrado no art. 5.º, LV, da CF, é evidente que o contraditório tradicional, com decisão somente após a concessão de oportunidade para a parte contrária se manifestar, é o ideal, limitando-se seu sacrifício a situações excepcionais.
Mesmo naquelas situações em que a demanda aparentemente perde o seu objeto em razão da satisfação irreversível gerada pela concessão da tutela antecipada, o contraditório diferido, apesar de ser incapaz de fazer a situação fática e jurídica retornar ao status anterior, serve para definir eventual responsabilidade civil por tutela antecipada concedida em razão de enganosa percepção de que o autor tivesse o direito material que alegava ter. O réu sempre terá interesse em continuar com o processo, porque, uma vez julgado improcedente o pedido do autor, fará jus a receber pelas perdas e danos suportadas em razão de efetivação de tutela antecipada posteriormente revogada.
Fernanda ingressa com demanda judicial contra Aline alegando que tem o direito de vestir determinado vestido na festa de formatura de ambas, sendo que Aline indevidamente mantém com ela o tal vestido. Concedida a tutela antecipada um dia antes da festa, e sendo o vestido usado por Fernanda na festa de formatura, o que obrigará Aline a comparecer à mesma festa com um vestido alternativo, a satisfação de Fernanda será irreversível. Ainda assim, Aline terá interesse em continuar a demanda para demonstrar que Fernanda não tinha direito sobre o vestido, o que permitirá a Aline responsabilizar civilmente Fernanda por todos os danos que suportou por não ter comparecido à festa de formatura com o vestido de seus sonhos. O contraditório diferido, portanto, se não é capaz de retornar ao estado fático anterior, garantia o ressarcimento pecuniário de Aline.
Registre-se que muitas vezes o autor requer já na petição inicial a tutela antecipada, sendo tal conduta bastante frequente na praxe forense, podendo-se até afirmar que esse é o momento mais comum do autor requerer a concessão da tutela prevista no art. 273 do CPC. Caso o juiz entenda que a eventual concessão após a oitiva do réu não acarretará maiores sacrifícios ao autor, não deve expressamente indeferir o pedido de tutela antecipada, mas simplesmente decidir que resolverá o pedido somente após a manifestação do réu.
Parece indiscutível que esse pronunciamento do juiz é verdadeiramente uma decisão interlocutória que rejeita a pretensão do autor em obter a tutela antecipada, sendo recorrível por agravo de instrumento. Obviamente, a não concessão de tutela antecipada no momento em que o autor requer sua concessão gera uma sucumbência passível de ser revertida pelo recurso cabível, no caso o agravo de instrumento. Afirmar que se trata de mero despacho porque o juiz nada decidiu, somente postergando a decisão, é esquecer que justiça tardia é sinônimo de injustiça.
Infelizmente, o Superior Tribunal de Justiça tem julgados nos quais entende ser despacho o pronunciamento do juiz que determinou que sem alguns documentos que deveriam ser juntados aos autos não se poderia conceder a tutela antecipada77. Se essa não é uma decisão denegatória do pedido do autor, como explicar a possibilidade de o tribunal, num eventual reexame, entender que os documentos que instruíram a petição inicial são suficientes para o preenchimento dos requisitos previstos no art. 273 do CPC e conceder a tutela antecipada? Com o devido respeito que a corte merece, são julgamentos lamentáveis, que partindo de uma premissa absolutamente equivocada admitem passivamente o perecimento do direito do autor sem que ele possa se insurgir contra a decisão que lhe denegou uma tutela antecipada, mesmo tendo preenchido todos os requisitos para a sua concessão.
Num primeiro momento pode parecer incongruente o julgamento de procedência do pedido do autor e a concessão de tutela antecipada na mesma decisão. Pode-se imaginar que, sendo a procedência do pedido a concessão da tutela definitiva, fundada em cognição exauriente (juízo de certeza), não teria nenhuma utilidade a antecipação de tutela na sentença, tutela provisória que deve existir justamente enquanto não advir a tutela definitiva. Se o autor já obteve a tutela definitiva, como entender que ao mesmo tempo receba também a tutela antecipada?
A dúvida só tem alguma justificativa para aqueles que desconsideram que o instituto processual previsto no art. 273 do CPC não antecipa a tutela, mas seus efeitos executivos, ou seja, a tutela só pode ser concedida definitivamente, sendo objeto da antecipação somente os efeitos práticos dessa tutela. Dessa forma, sempre que o recurso contra a sentença de procedência tiver efeito suspensivo, o autor, apesar de ter obtido a tutela definitiva em sentença, não terá recebido os efeitos executivos de tal tutela, porque o recurso impedirá a geração de efeitos da sentença, obstando a satisfação imediata de seu direito. A utilidade da tutela antecipada nesse caso mostra-se evidente, entregando ao autor algo que ele não ganhou com a sentença de procedência: os efeitos práticos da tutela obtida78. Dessa forma, restou pacificado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pelo cabimento da antecipação de tutela na sentença79.
Ocorre, entretanto, que nem todo recurso contra a sentença tem efeito suspensivo, de forma que, ausente esse efeito do recurso, como ocorre com o recurso inominado dos Juizados Especiais Estaduais, a sentença de procedência passa imediatamente a gerar efeitos, inclusive os executivos, sendo nesse caso absolutamente desnecessário antecipar a tutela na sentença. Como se diz na gíria popular, será “chover no molhado”.
Há problemas a resolver a respeito do recurso cabível ao réu, que, além de perder a demanda, tem contra si concedida uma tutela antecipada na sentença. Esses problemas, entretanto, jamais poderão servir de desculpa ou impedimento para que o juiz não conceda a tutela antecipada na sentença, ou, como preferem alguns doutrinadores, monte uma pequena encenação, com a concessão por decisão interlocutória momentos antes da prolação da sentença, ainda que numa mesma folha de papel80. Funcionaria assim o engodo: estando o processo pronto para julgamento, o juiz chama os autos à conclusão e profere antes uma decisão interlocutória concedendo a tutela antecipada e depois uma sentença julgando procedente o pedido do autor. Quem sabe abre até duas conclusões para formalizar de forma indiscutível a existência de duas decisões diferentes e autônomas. O problema recursal estaria resolvido, mas à custa de uma encenação, uma simulação que não pode ser saudavelmente admitida81.
Ainda pior a opinião doutrinária a defender que mesmo que o juiz tenha materialmente proferido somente uma decisão, que naturalmente será uma sentença com um capítulo de concessão da tutela antecipada, deve-se imaginar que existem duas decisões, uma de natureza interlocutória e outra de natureza sentencial. Afirma-se que formalmente há somente uma decisão, mas materialmente existem duas82. Nesse verdadeiro exercício de ficção jurídica o problema recursal estaria novamente resolvido, mas enxergar duas decisões onde só existe uma não parece ser a técnica mais apropriada para solução de problema de qualquer natureza.
Não resolve o problema recursal a adoção da elegante teoria dos capítulos da sentença, imaginando-se recorrível por agravo de instrumento o capítulo da sentença que concedeu a tutela antecipada e por apelação o capítulo que julgou procedente o pedido do autor. Como já analisado no Capítulo 21, item 21.3, o princípio da singularidade impede a divisão da decisão em capítulos para fins de recorribilidade, de forma que da sentença, independentemente de conter capítulos que resolvem questões incidentais, caberá a apelação83. O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que contra sentença que concede originariamente tutela antecipada cabe o recurso de apelação84.
O único recurso cabível ao réu, portanto, será a apelação, mas nesse caso, como já demonstrado no Capítulo 24, item 24.2.2, o recurso não terá efeito suspensivo, de forma que mesmo impugnada a sentença o capítulo que antecipou os efeitos da sentença terá eficácia imediata. Como deve o réu proceder se pretender impedir a geração de tais efeitos? Entendo que a forma procedimental para atingir tal objetivo dependerá fundamentalmente da urgência do réu no caso concreto.
Sendo hipótese de urgência extrema, poderá o réu apelar e imediatamente ingressar com uma petição autônoma devidamente instruída perante o tribunal competente requerendo a concessão de efeito suspensivo à apelação no tocante ao capítulo da sentença que concedeu a tutela antecipada, com fundamento no art. 558 do CPC. Uma vez distribuída a petição, o órgão colegiado que a receber torna-se prevento para a apelação, que será a ele encaminhado quando finalmente os autos chegarem ao tribunal. É a melhor forma entre todas as possíveis, sem a necessidade de interposição de recursos ou de outras ações judiciais: forma mais rápida, simples, barata e em sintonia com o sincretismo processual.
É impressionante e muito frustrante que no clima de sincretismo que vivemos atualmente alguns cartórios distribuidores continuem se negando a receber essa petição, apontando-a como aberração jurídica ou coisa do gênero. Recentemente tal fato deu-se no cartório distribuidor do Tribunal de Justiça de São Paulo. O que não percebem os aterrorizados em distribuir uma petição atípica e não uma petição inicial ou recurso, é que tal conduta, apegada a um obscurantismo medieval, só força a parte a ingressar com uma nova ação.
Já antevendo as dificuldades que enfrentará na distribuição da peça atípica com fundamento no art. 558 do CPC, é provável que o réu opte pelo ingresso de cautelar inominada com pedido de liminar perante o tribunal, que será o competente para essa ação em razão do disposto no art. 800, parágrafo único, do CPC85. Note-se que a fundamentação e o pedido serão exatamente iguais àqueles que o réu teria feito por meio de mera petição, mas certamente nesse caso não terá grandes dificuldades práticas junto ao cartório distribuidor para fazer chegar com certa rapidez o pedido a um relator.
Em tese também poder-se-ia imaginar nessa situação o ingresso de mandado de segurança, mas entre as três alternativas já apontadas certamente essa é a menos indicada. Até hoje há um trauma forense quanto à utilização do mandado de segurança para dar efeito suspensivo ao agravo de instrumento à época em que esse recurso era interposto no primeiro grau. Ainda que teoricamente seja cabível o mandado de segurança nessa situação, é recomendável à parte evitá-lo, valendo-se da ação cautelar inominada com pedido de liminar ou mesmo a petição atípica fundada no art. 558 do CPC, se resolver encarar o cartório distribuidor.
As incertezas quanto ao melhor e mais adequado instrumento para que o réu possa evitar a geração imediata da tutela antecipada concedida em sentença criam um estado de absoluta insegurança jurídica, não sendo possível que a escolha de uma das alternativas seja considerada um erro grosseiro. Essa afirmação tem o claro propósito de indicar que o princípio da fungibilidade deve ser aplicado ao caso presente.
Poder-se-ia objetar a tomada de providências junto ao tribunal antes de o juízo de primeiro grau se manifestar a respeito do recebimento da apelação, em especial quanto aos efeitos em que a receberá. Alguns desembargadores se recusam a analisar a cautelar inominada com essa equivocada fundamentação. Note-se que o art. 800, parágrafo único, do CPC é suficientemente claro ao prever a competência do tribunal para as medidas cautelares após a interposição do recurso, e não após o seu recebimento, como analisado no Capítulo 52, item 52.2.
Ainda que extremamente improvável, o juízo de primeiro grau até pode receber a apelação no duplo efeito quanto ao capítulo que antecipou a tutela, e nesse caso a providência acautelatória tomada pelo tribunal tornar-se-ia prejudicada. Mas essa improvável circunstância não retira do tribunal a competência de analisar antes do recebimento da apelação o pedido do réu, lembrando-se que, mesmo que a apelação seja recebida no duplo efeito, o tempo necessário para que isso ocorra já pode ser suficiente para o perecimento do direito. É melhor proteger o direito do réu, ainda que no futuro a proteção não seja mais necessária, do que negá-la com a suposição de que ela virá, de forma eficaz, por uma decisão futura e eventual que provavelmente nem existirá.
Na hipótese de o réu ter uma urgência média, pode aguardar o recebimento da apelação. Como já afirmado, é improvável que o juiz sentenciante a receba no duplo efeito quanto ao capítulo da sentença que antecipou a tutela, e isso por uma razão evidente: o juiz que antecipa a tutela na sentença quer que a sua decisão gere efeitos imediatamente, não havendo muito sentido lógico antecipar a tutela e suspender os efeitos de sua decisão quando a apelação é interposta. De qualquer forma, se o réu se dispuser a aguardar esse momento procedimental, vale a pena pedir ao juiz de primeiro grau a concessão de efeito suspensivo, acreditando que as razões recursais possam convencê-lo do equívoco na concessão da antecipação de tutela.
Como o juízo de primeiro grau antecipa a tutela na sentença por meio de cognição exauriente (juízo de certeza), dificilmente receberá a apelação no duplo efeito. De qualquer forma, o réu terá obtido uma decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento, podendo levar a questão ao tribunal por meio desse recurso. Fundamentalmente as razões e o pedido desse agravo de instrumento serão os mesmos da ação cautelar ou mera petição que teriam sido interpostas antes da decisão de recebimento da apelação: relevância da fundamentação da apelação, perigo de grave dano irreparável ou de difícil reparação e pedido para que o capítulo da sentença que antecipou a tutela tenha seus efeitos suspensos até o julgamento da apelação.
Na remota hipótese de uma urgência mínima, o réu poderá aguardar a chegada dos autos ao tribunal após a interposição da apelação. Nesse caso, poderá realizar o pedido de concessão do efeito suspensivo, nos termos do art. 558 do CPC, quanto ao capítulo da sentença que antecipou a tutela em favor do autor como mero tópico da apelação, que será apreciado pelo relator ao qual o recurso for distribuído. Até se pode suspeitar que a disposição de aguardar esse momento procedimental já demonstre que o réu não tem nenhuma urgência, mas, apesar de ser comum a demora da remessa dos autos ao tribunal, ainda mais demorado é o julgamento da apelação, de forma que o réu pode não sofrer grave dano se esperar a manifestação do relator, mas o suportará se tiver que aguardar o julgamento de seu recurso.
A competência do tribunal na concessão de tutela antecipada é indiscutível quando atua com competência originária, podendo antecipar os efeitos práticos de seu futuro acórdão de procedência do pedido do autor86. A Lei 11.280/2006, ao modificar a redação do art. 489 do CPC, passou a admitir expressamente a concessão de tutela antecipada na ação rescisória, sendo esse um exemplo da possibilidade de concessão dessa espécie de tutela de urgência pelo tribunal nas ações de competência originária.
Também na atividade recursal é possível que o tribunal antecipe a tutela, havendo inclusive expressa previsão legal quanto a essa possibilidade no agravo de instrumento (art. 527, III, do CPC). Com o agravo de instrumento, é simples imaginar o pedido de tutela antecipada sendo direcionado ao tribunal, considerando-se que o recurso é interposto diretamente no órgão que analisará o pedido de tutela de urgência. Mais uma vez o problema é a interposição do recurso no juízo a quo, como ocorre, por exemplo, na apelação.
O problema de ordem prática já indicado no item anterior voltará a ocorrer. Ainda que os autos do processo ainda não estejam no tribunal, entendo cabível a utilização de mera petição requerendo a tutela antecipada que, uma vez distribuída, criará prevenção do órgão colegiado para receber a apelação quando os autos do processo finalmente chegarem ao tribunal. Mais uma vez, entretanto, haverá a dificuldade em convencer o cartório distribuidor acerca da possibilidade e normalidade de distribuição de uma mera petição em processo cujos autos não estão no tribunal. Nesse caso, a injustificável recusa na aceitação da mera petição criará uma situação no mínimo singular: a parte que pretende receber a tutela antecipada ingressará com uma cautelar inominada com pedido de liminar para a obtenção de uma tutela antecipada87! Há doutrinadores que defendem o cabimento do mandado de segurança88.
Existe corrente doutrinária que entende não ser possível requerer a tutela antecipada quando o processo estiver em fase de julgamento de recurso extraordinário e/ou especial, afirmando que nesses recursos não é possível aos tribunais superiores analisar os fatos, o que seria necessário na análise da prova inequívoca da verossimilhança da alegação, requisito para a concessão da tutela antecipada89.
Discordo desse entendimento porque a vedação à revisão da matéria fática diz respeito ao julgamento dos recursos extraordinário e especial, e a antecipação da tutela naturalmente significa que tais recursos ainda estejam sendo julgados. Não existe nenhuma vedação à análise fática pelos tribunais superiores para evitar o perecimento de um direito ou sancionar uma parte que atua de má-fé, até porque o efeito devolutivo dos recursos limita a atuação do tribunal em seu julgamento, e não na adoção de medidas que façam tal julgamento ter a efetividade que dele se espera. Como ressaltado corretamente por corrente doutrinária que admite a tutela antecipação em sede de recurso extraordinário e especial, impedir sua concessão sacrificaria a efetividade da jurisdição90.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu pelo fornecimento de medicamento (insulina) enquanto se aguardava o julgamento do recurso especial. Apesar de a parte interessada ter se valido de ação cautelar, é nítida a natureza de tutela antecipada da medida de urgência concedida pelo tribunal91.
Registre-se posicionamento firmado do Superior Tribunal de Justiça de que não cabe em sede de recurso especial enfrentar o acerto ou equívoco das instâncias inferiores na concessão ou denegação da tutela antecipada. O fundamento é que essa revisão demandaria um reexame da matéria fática, única forma de aferir a presença ou não da prova inequívoca da verossimilhança, sendo tal análise obstada pela Súmula 792. Não concordo com esse entendimento, porque nesse caso a revisão fática se dará de forma indireta, do mesmo modo que ocorre na revisão de valor de condenação em danos morais e honorários advocatícios, admitida pacificamente pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme demonstrado no Capítulo 31, item 31.3.1. De qualquer forma, a vedação não diz respeito à concessão de tutela antecipada em grau recursal, mas à utilização do recurso especial para impugnar decisões de instâncias inferiores que tenham como objeto a tutela antecipada.
A tutela antecipada concedida durante o trâmite procedimental em primeiro grau deverá ser confirmada ou rejeitada pela sentença, desde que não haja decisão anterior que a tenha revogado, nos termos do art. 273, § 4.º, do CPC. Na hipótese de concessão de tutela antecipada no tribunal, o mesmo fenômeno ocorre, devendo a tutela antecipada ser revogada ou confirmada no acórdão que decidirá a ação de competência originária do tribunal ou o recurso. Sendo a tutela antecipada mais frequente no primeiro grau de jurisdição, serão focados nesse momento procedimental alguns temas relevantes a respeito da eficácia temporal da tutela antecipada.
A sentença deverá confirmar ou rejeitar a tutela antecipada anteriormente concedida, e o ideal é que isso seja realizado de forma expressa pelo juiz, não deixando qualquer margem à dúvida. Não havendo tal manifestação expressa, saber o status da tutela antecipada dependerá do conteúdo da sentença:
(a) havendo procedência do pedido do autor, a tutela antecipada terá sido implicitamente confirmada;
(b) havendo improcedência do pedido do autor ou extinção sem resolução do mérito, a tutela antecipada terá sido implicitamente revogada.
Interessante e peculiar situação ocorre no julgamento de improcedência do pedido do autor e na expressa manutenção da tutela antecipada93. Parece contraditório o juiz entender, por cognição exauriente e com juízo de certeza, que o autor não tem o direito material alegado, mas, ainda assim, manter a tutela antecipada que foi concedida por meio de cognição sumária e juízo de mera probabilidade. Mas a postura se justifica sempre que o juiz entender que sua sentença tem consideráveis chances de ser reformada em razão de posicionamento jurisprudencial contrário do tribunal que julgará o eventual recurso de apelação e que a revogação imediata causaria uma grave lesão de difícil e incerta reparação ao autor94. O que parece num primeiro momento contraditório na realidade é uma mostra de grandeza do juiz, que, mesmo não sendo obrigado a seguir entendimentos do tribunal, tem consciência de que fatalmente a última decisão no processo não será a sua, tendo a sensibilidade para não prejudicar o autor em razão de seu posicionamento pessoal a respeito do tema resolvido na demanda.
Yolanda ingressa com ação judicial pleiteando a condenação do Poder Público para entrega de medicamento, obtendo tutela antecipada. O juiz, no momento de sentenciar, entende que o Poder Público não tem o dever de entregar medicamento como pretende a autora, julgando o pedido totalmente improcedente. Sabe, porém, que nos tribunais de segundo grau e no Superior Tribunal de Justiça o entendimento majoritário – para não dizer pacificado – é em sentido contrário, e que eventual revogação da tutela antecipada concedida irá impedir o acesso ao medicamento, o que poderá ser extremamente danoso à saúde de Yolanda. Nessa conjuntura, julga o pedido improcedente e mantém a tutela antecipada para que o Poder Público continue a fornecer o medicamento até o julgamento do futuro e eventual recurso de apelação a ser oferecido por Yolanda. Naturalmente que, não havendo apelação, a sentença transita em julgado com a rejeição do pedido de Yolanda, que naturalmente não terá mais direito a receber o medicamento.
Outra questão interessante diz respeito ao deferimento ou indeferimento do pedido de tutela antecipada por meio de decisão interlocutória agravada e superveniência da sentença. Entendo que, estando pendente de julgamento o agravo de instrumento, mesmo que em sede recursal, esse recurso perderá o objeto com o advento da sentença95. Mesmo que de forma inadvertida se tenha o julgamento do agravo de instrumento depois de já existir a sentença – basta imaginar que o tribunal não tomou conhecimento da prolação da sentença –, esta prevalece, porque o julgamento do agravo de instrumento é juridicamente inexistente.
Esse, entretanto, não é o entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que defende a manutenção do agravo de instrumento contra decisão concessiva de tutela antecipada mesmo com o advento da sentença de procedência que confirma a tutela antecipada já concedida96. A fundamentação da decisão, que tenta extrair da diferença entre antecipação de efeitos da tutela e concessão definitiva de tutela a justificativa para a manutenção do recurso não convence, sendo processualmente incompatível a manutenção do agravo de instrumento em trâmite.
Mais interessante é a questão de concessão da tutela antecipada por meio de julgamento de agravo de instrumento e consequente prolação de sentença de improcedência do pedido. Pergunta-se o que deve prevalecer: a decisão proferida pelo Tribunal em sede recursal mediante cognição sumária ou a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau fundada em cognição exauriente? Deve prevalecer o critério da hierarquia, mantendo-se a tutela antecipada concedida pelo tribunal em sede recursal, ou o critério da cognição, prestigiando-se a sentença proferida pelo juízo de primeiro grau mediante cognição exauriente?
Há julgamento do Superior Tribunal de Justiça que defende o entendimento de que depende do caso concreto a opção pela hierarquia e a cognição. Na hipótese de a sentença ser proferida sem alteração do quadro existente quando da concessão da tutela antecipada pelo tribunal, ou seja, com a manutenção dos mesmos elementos de fato e de prova existentes naquele momento processual, deve prevalecer o critério da hierarquia. Por outro lado, se a sentença fundar-se em elementos que não existiam àquela época, deve prevalecer o critério da cognição, porque nesse caso o juízo de primeiro grau terá conhecimento mais amplo ao proferir a sentença daquele que teve o tribunal na análise da tutela antecipada97. Em julgamento posterior, entretanto, o tribunal entendeu que prevalece o critério da cognição, inclusive como forma de estímulo à atuação dos juízes de primeiro grau98.
O art. 273, § 4.º, do CPC prevê a possibilidade de revogação ou modificação da tutela antecipada a qualquer momento, em decisão fundamentada. Na simples leitura de referido dispositivo legal nota-se que o legislador entendeu que, durante a constância do processo, a tutela antecipada pode ser revogada ou modificada pelo próprio juízo que a concedeu.
A possibilidade de revisão da decisão que antecipa a tutela coaduna-se com a própria característica de provisoriedade da medida, que existe apenas enquanto a decisão definitiva não a substituir. Proferida por meio de uma cognição não exauriente, com limite de duração predeterminado – enquanto a sentença não vier a tomar seu lugar –, é indiscutível o seu caráter provisório, como já demonstrado no Capítulo 50, item 50.2.2.1.
É evidente que a tutela antecipada pode ser reformada ou modificada por decisão de recurso interposto contra a decisão que a concedeu, mas parece não ser essa a hipótese tratada pelo dispositivo legal ora analisado. Também não parece ser a hipótese de juízo de retratação pelo próprio juízo que concedeu a tutela antecipada, sempre que o recurso interposto o admitir, como ocorre no agravo de instrumento. A possibilidade de retratação por parte do juiz, quando informado da interposição do referido recurso, afasta a incidência de preclusão judicial que impede a prolação de nova decisão, contrária à anterior.
O problema toma forma mais complexa quando o agravo de instrumento não é interposto ou já foi julgado. Poderia, ainda assim, o juiz modificar o seu pronunciamento? Se positiva a resposta, seria possível tal modificação ocorrer ex officio, ou somente com o pedido da parte interessada? Haveria algum requisito para legitimar a modificação do entendimento anterior?
Considerando a tutela antecipada com evidente natureza cautelar, seria imperiosa a aplicação, de forma subsidiária e análoga, do disposto no art. 807 do CPC, que permite ao juiz, sem nenhuma manifestação das partes, revogar ou alterar medida cautelar deferida. Entende essa corrente doutrinária que, se ambas têm a mesma natureza jurídica, não há nenhum motivo para que sejam nesse tocante tratadas de maneira diferente99. A fundamentação seria a mesma que possibilita a revisão da decisão no caso das cautelares. Acima do interesse privado da parte estaria o interesse do próprio Poder Judiciário em decidir de forma correta, justa e eficaz100. Como já exposto no Capítulo 50, item 50.2.1, há diferenças entre a tutela cautelar e a tutela antecipada, não sendo admissível a aplicação por analogia das interpretações do art. 807 do CPC.
Quanto à possibilidade de revogação ou modificação ex officio da decisão que antecipa a tutela, a maioria da doutrina se posiciona contrariamente, de forma a entender imprescindível a manifestação da parte interessada para que possa ser revista a decisão pelo magistrado que a proferiu. Dessa forma, ainda que o § 4.º do art. 273 do CPC não tenha se referido expressamente a essa exigência, tomando-se em conta principalmente o princípio dispositivo e o interesse precípuo da parte em modificar a situação decorrente da antecipação, entende-se pela necessidade de manifestação do interessado101.
Autorizada doutrina entende que a revogação ou a modificação da tutela antecipada fica condicionada a uma transformação da situação de fato, de tal maneira que os pressupostos autorizadores da concessão da medida simplesmente deixem de existir. Nesse caso, não se tratará de alteração de decisão, mas de prolação de uma nova, já que calcada em outra situação fática e/ou outro quadro probatório102.
Ampliando corretamente as situações nas quais o juiz estaria liberado para modificar o seu entendimento prévio, há opinião doutrinária de que não apenas a mudança da situação de fato permite ao juiz a modificação da decisão, mas também a superveniência de “novas circunstâncias”. Essas “novas circunstâncias” resultariam da mudança dos fatos ou do surgimento de outra evidência sobre uma situação fática inalterada103. Há ainda uma terceira corrente doutrinária que defende o entendimento de que as novas circunstâncias podem ser tanto fáticas como jurídicas104.
As duas primeiras correntes têm mais semelhanças do que propriamente divergências. Note-se que, em ambas, o objeto de conhecimento do juiz que pode sofrer modificação é restrito ao aspecto fático da demanda. A conclusão é vedar ao juiz simplesmente alterar o seu entendimento jurídico do caso em questão e modificar, assim, o seu julgamento. Fica reservada essa possibilidade para quando se verificar mudança fática ou, ainda, para situações em que, mesmo imutáveis os fatos, novos argumentos das partes interessadas demonstrem outra visão e entendimento daqueles fatos. Ao se permitir a simples modificação de opinião do juiz, estar-se-iam abrindo as portas para uma insegurança que não deve ser bem recebida pelos operadores do direito105.
O direito reconhecido em sede de antecipação de tutela estaria sempre condicionado à vontade do juiz de manter sua decisão, a seu humor, a seu bel-prazer, o que não deve ser permitido. Situação ainda pior ocorreria nos casos em que os juízes são sucessivamente substituídos, e cada qual que passasse pelo Juízo modificasse a decisão do anterior e se criasse um clima de permanente e ameaçadora instabilidade e insegurança106.
Segundo a previsão do art. 273, § 3.º, do CPC, a efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4.º e 5.º, e 461-A. Antes propriamente de analisar o conteúdo desse dispositivo legal, duas observações preliminares se fazem necessárias: o art. 588 foi revogado pela Lei 11.232/2005, tendo sido substituído pelo art. 475-O do CPC; o termo efetivação significa execução da tutela antecipada107, que não dependerá de processo autônomo, desenvolvendo-se por mera fase procedimental108.
Com as devidas adaptações, o dispositivo ora comentado faz expressa menção a três dispositivos legais:
(a) art. 475-O do CPC, que trata da execução provisória;
(b) art. 461, §§ 4.º e 5.º, do CPC, que descrevem de forma exemplificativa as medidas materiais executivas à disposição do juízo para a efetivação de decisões que tenham como objeto obrigação de fazer ou não fazer;
(c) art. 461-A do CPC, que prevê a aplicação das regras do art. 461, §§ 4.º e 5.º, do CPC à efetivação das decisões que têm como objeto obrigação de entregar coisa.
Mesmo que não houvesse a expressa menção ao art. 475-O do CPC, não restaria dúvida de que a execução da decisão que concede a tutela antecipada é provisória, porque a decisão executada é provisória, podendo ser revogada ou anulada com o advento da coisa julgada material. Mas a utilização do termo “no que couber” permite ao juiz do caso concreto deixar de aplicar as regras procedimentais da execução provisória que se mostrarem contraproducentes à efetivação da tutela antecipada.
Essa a razão pela qual entendo que, mesmo diante do momento procedimental em que seria exigida a caução, e ausentes as condições legais para a sua dispensa, poderá o juiz dispensá-la se entender que a exigência frustrará os objetivos da tutela antecipada. Note-se que a dispensa da caução numa execução provisória de decisão proferida com cognição exauriente está limitada às situações legais, mas na tutela antecipada a utilização da expressão “no que couber” dá ao juiz uma liberdade procedimental considerável, servindo o art. 475-O do CPC apenas como um parâmetro para sua atuação109.
Como analisado no Capítulo 1, item 1.8.4, a execução de título executivo de fazer, não fazer e entregar coisa não segue um procedimento previsto em lei, tendo o juiz a liberdade de estabelecer no caso concreto o procedimento que mais lhe pareça adequado para a efetivação da tutela. O mesmo ocorre na efetivação da tutela antecipada, podendo o juiz se valer de todos os atos materiais de execução previstos no art. 461, §§ 4.º e 5.º, do CPC, adequando-os às exigências do caso concreto.
Parece mais complicada a hipótese de efetivação de tutela de pagar quantia certa deferida por meio de tutela antecipada. Tratando-se de tutela de urgência, é invariavelmente incompatível com a necessidade de imediata satisfação o procedimento estabelecido pelos arts. 475-J, 475-L, 475-M e 475-R do CPC. Nessa espécie de efetivação, portanto, mais do que nunca se aplicará o termo “no que couber”, permitindo ao juiz a antecipação de atos processuais executivos, ainda que em descompasso com o procedimento legal, se tal postura for necessária para a efetiva satisfação do direito pela parte que obteve uma tutela antecipada110.
A efetivação da execução de pagar quantia certa depende da anuência em pagar pelo demandado, o que raramente ocorre. Tendo sido intimado para cumprir sua obrigação e quedando-se inerte, restará ao demandante tentar localizar o patrimônio do demandado e convertê-lo dentro das formas legais em satisfação de seu direito. Mas a burocracia que envolve a maioria desses atos executivos é incompatível com a urgência exigida para a efetivação da tutela antecipada, de forma que caberá ao juiz a tomada de providências que agilizem essa efetivação, tais como a penhora de dinheiro on line, alienação antecipada etc. Há doutrina, inclusive, que defende a aplicação de multa coercitiva, ainda que se trate de obrigação de pagar quantia certa111, com o que se discorda, em razão da expressão “conforme sua natureza”, que deixa claro serem as medidas previstas no art. 461, §§ 4.º e 5.º, do CPC somente aplicáveis às obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa. Todo esse procedimento se realizará como mera fase procedimental, porque, mesmo diante da recusa do demandado em pagar, a ação autônoma de execução continua a ser dispensável.
Atualmente está ultrapassado o entendimento de que exista uma vedação generalizada de antecipação de tutela contra a Fazenda Pública. Todos os argumentos foram derrubados por argumentos doutrinários superiores. Os três principais argumentos contrários à possibilidade de concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública são:
(a) reexame necessário;
(b) necessidade de trânsito em julgado para expedição de precatório; e
(c) vedação ao cabimento de “cautelares satisfativas” decorrente da previsão do art. 1.º da Lei 8.952/1994.
O reexame necessário, segundo previsão do art. 475, caput, do CPC, só é exigido de algumas sentenças de mérito que causam determinada lesão à Fazenda Pública, e não de decisão interlocutória, que normalmente é a forma de decisão que concede a tutela antecipada112. O duplo grau obrigatório, inclusive, não impede a execução provisória da sentença, como está expressamente previsto no art. 14, § 3.º, da Lei 12.016/2009 (Lei do Mandado de Segurança), razão maior para a possibilidade de concessão de liminar, espécie de tutela antecipada.
A alegação de que somente com o trânsito em julgado é possível expedir o precatório (art. 100, caput, da CF) merece duas observações: nem sempre o pagamento de pagar quantia certa dependerá de precatório, mas mesmo nessas situações o texto constitucional exige o trânsito em julgado (art. 100, § 3.º, da CF). Nesse caso existe doutrina que defende a tese do “precatório provisório”113, mas esse expediente não vem sendo admitido na praxe forense. É natural que a questão de exigência do trânsito em julgado para o pagamento por precatório ou mesmo de pagamento de dívidas de pequeno valor só tem relevância na obrigação de pagar quantia, sendo argumento inaplicável nas obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa114.
E mesmo nas obrigações de pagar quantia certa, ainda que excepcionalmente, o Superior Tribunal de Justiça115 vem admitindo a tutela antecipada em caso de fornecimento de medicamento não entregue pelo Estado, inclusive com o bloqueio de verbas públicas, na esteira de entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal. Do mesmo tribunal há decisão dispensando o precatório para a satisfação de tutela antecipada para que o Poder Público custeie as despesas médicas e terapêuticas de menor acometida de encefalopatia grave e irreversível em decorrência de vacinação em posto de saúde de município brasileiro116.
Por fim, a alegação de que a vedação à concessão de cautelares satisfativas contra a Fazenda Pública criaria uma vedação geral à concessão da tutela antecipada só pode ser creditada à incapacidade de compreender as diferenças entre tutela cautelar e tutela antecipada. Tais diferenças, inclusive com as devidas críticas à “cautelar satisfativa”, são desenvolvidas no Capítulo 50, item 50.2.1.1.
A discussão a respeito do cabimento da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, na realidade, perdeu muito de sua importância com as previsões legais que vedavam expressamente a tutela antecipada contra a Fazenda Pública, com destaque para a famigerada Lei 9.494/1997. Opinião corrente na doutrina é que só se proíbe pontualmente aquilo que é genericamente permitido117. Apesar de discutível constitucionalidade às restrições legais infraconstitucionais, o Supremo Tribunal Federal em julgamento de ação declaratória de constitucionalidade declarou ser constitucional o art. 1.º da Lei 9.494/1997118, de forma que a discussão tornou-se inútil, considerando-se o direito do Supremo Tribunal Federal de errar por último.
O art. 1.º da Lei 9.494/1997 prevê a aplicação à tutela antecipada de uma série de restrições previstas para a concessão de medidas cautelares e liminares em mandado de segurança contra a Fazenda Pública. Assim, aplicava à tutela antecipada o art. 5.º da Lei 4.348/1964, sendo vedada a reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou a concessão de aumentos ou extensão de vantagens119; o art. 1.º e seu § 4.º da Lei 5.021/1966, que vedava a tutela antecipada para pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias; e arts. 1.º, 3.º e 4.º da Lei 8.437/1992. O art. 1.º da Lei 9.494/1997 prevê que não será cabível contra a Fazenda Pública liminar em procedimento cautelar ou de conhecimento, quando providência semelhante não puder ser concedida em ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal. Atualmente, encontram-se revogadas as Leis 4.348/1964 e 5.021/1966.
Por fim, o art. 3.º da Lei 8.437/1992 prevê que não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação. A melhor doutrina vem interpretando que essa vedação já consta de forma ampla no regime da tutela antecipada, representada pelo § 2.º do art. 273 do CPC120. Ainda que se concorde com esse entendimento, também na tutela antecipada contra a Fazenda Pública não se pode imaginar que a irreversibilidade dessa tutela de urgência seja apta a proibir sua concessão, devendo-se aplicar a regra da proporcionalidade121. Parece ser esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que tem entendimento pacificado pela concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública em demanda na qual se busca sua condenação a entregar medicamento122.
O art. 2.º-B da Lei 9.494/1997 reforça e repete as vedações legais à concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública ao prever que a sentença que tenha por objeto a liberação de recurso, inclusão em folha de pagamento, reclassificação, equiparação, concessão de aumento ou extensão de vantagens a servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive de suas autarquias e fundações, somente poderá ser executada após seu trânsito em julgado. Significa dizer que nesses casos será inviável a tutela antecipada contra a Fazenda Pública.
Cumpre por fim ressaltar que a nova lei do Mandado de Segurança também prevê limitações à concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública. O § 2.º do art. 7.º da Lei 12.016/2009 é um dos pontos mais baixos da nova legislação do mandado de segurança, carregando nítida inconstitucionalidade123 e confirmando a percepção de parcela da doutrina de que realmente a Fazenda Pública em juízo funciona como uma superparte, que tudo pode e contra ela nada se pode, em nítida e indesejável ofensa ao princípio da isonomia124.
O dispositivo legal proíbe expressamente a concessão de liminar em mandado de segurança que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. Para blindar de forma definitiva o Poder Público, o § 5.º do art. 7.º da LMS veda que as matérias anteriormente descritas sejam objeto de tutela antecipada, o que significa dizer que, mesmo a parte optando pela tutela de seu direito pelas vias ordinárias, não fará jus à tutela de urgência satisfativa.
Uma vez concedida a tutela antecipada contra a Fazenda Pública em desrespeito às vedações legais consideradas constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, será cabível o agravo de instrumento, além do pedido de suspensão dos efeitos da medida ao presidente do tribunal competente para o recurso sempre que dela resultar risco de dano grave à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas ou em caso de flagrante ilegitimidade do provimento urgente ou de manifesto interesse público (art. 4.º da Lei 8.437/1992)125. Registre-se que o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal já entendeu cabível o ingresso de reclamação constitucional nesse caso126.
1 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 27, p. 35; Nery Jr., Atualidades, p. 68-69. Contra, pela natureza cautelar: Costa Machado, Tutela, p. 420-421.
2 Bedaque, Tutela, n. 18, p. 328; Dinamarco, A nova, p. 62-63.
3 Marinoni, Antecipação, n. 5.1, p. 273-276.
4 Marinoni, Antecipação, n. 5.4.6, p. 294-295; Carneiro da Cunha, O § 6.º do art. 273, p. 116; Scarpinella Bueno, Tutela, p. 47; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 660-663; Mouta Araújo, Tutela, p. 212-227.
5 Gusmão Carneiro, Da antecipação, p. 66-67; Zavascki, Antecipação, p. 111-112; Bedaque, Código, p. 804.
6 Dinamarco, A reforma, n. 50, p. 96; Wambier-Wambier, Breves, p. 57-58; Bedaque, Código, p. 804.
7 Neves, Preclusões, p. 225-226.
8 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 44, p. 66.
9 Dinamarco, A reforma, n. 49, p. 94; Marinoni, Antecipação, n. 5.4.5, p. 290; Carneiro da Cunha, O § 6.º do art. 273, p. 116.
10 Câmara, Lições, v. 1, p. 447.
11 Bedaque, Código, p. 804; Costa Machado, Código, p. 616; Figueira Jr., Comentários, p. 93; Mouta Araújo, Tutela, p. 215.
12 Zavascki, Antecipação, p. 108.
13 Bedaque, Código, p. 804.
14 Zavascki, Antecipação, p. 110.
15 Marinoni, Antecipação, n. 5.4.6, p. 295; Scarpinella Bueno, Tutela, p. 49; Carneiro da Cunha, O § 6.º do art. 273, p. 120; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 664.
16 STJ, 5.ª Turma, REsp 473.072/MG, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 17.06.2003, DJ 25.08.2003, p. 358.
17 Contra: Nery-Nery, Código, p. 525.
18 Ovídio Baptista, A antecipação, p. 132.
19 Zavascki, Tutela, p. 85; Marinoni, Tutela, n. 2.6.2, p. 43, entende que não há propriamente antecipação do efeito executivo, mas produção antecipada do efeito executivo.
20 Nery-Nery, Código, p. 526; Bedaque, Tutela, n. 27, p. 362.
21 Fadel, Antecipação, n. 11, p. 45; Nery-Nery, Código, p. 526.
22 Bedaque, Tutela, n. 27, p. 361; Theodoro Jr., O processo, p. 86.
23 Zavascki, Tutela, p. 86-87; Bedaque, Tutela, n. 27, p. 363; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 619; Pontes de Miranda, Tratado, I, p. 24, e II, p. 102; Theodoro Jr., O processo, p. 86-87.
24 Marinoni, Antecipação, n. 2.6.3.4, p. 54-55.
25 STJ, 4.ª Turma, REsp 772.028, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 12.12.2005, DJ 1.º.02.2006, p. 571.
26 Câmara, Lições, v. 1, p. 439; Marinoni, Tutela, n. 2.6.3.4, p. 52.
27 Marinoni, Tutela, n. 2.6.3.4, p. 50; Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 34, p. 50.
28 STJ, 5.ª Turma, REsp 702.205/SP, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 12.09.2006, DJ 09.10.2006, p. 346.
29 STJ, 4.ª Turma, REsp 754.619/SC, rel. Aldir Passarinho Junior, j. 10.04.2007, DJ 14.05.2007, p. 314.
30 Marinoni, Tutela, n. 4.5, p. 153.
31 Carlos Augusto de Assis, A antecipação, n. 4.8.1, p. 190-191.
32 Enunciado 26 do Fonaje: “São cabíveis a tutela acautelatória e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis, em caráter excepcional”.
33 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 6.3.4, p. 118.
34 STJ, 3.ª Turma, AgRg no Ag 226.176/RS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 19.12.2000, DJ 02.04.2001, p. 288. Concedendo a tutela de urgência, mas indevidamente chamando-a de cautelar: STJ, 4.ª Turma, REsp 431.294/SP, rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 06.08.2002, DJ 16.09.2002, p. 198.
35 Calmon de Passos, Da antecipação, p. 190.
36 Nery-Nery, Código, p. 525.
37 Contra: Shimura, Arresto, p. 269.
38 No sentido do texto, Bedaque, Tutela, n. 20, p. 335; Zavascki, Antecipação, p. 152-153. Contra: Calmon de Passos, Da antecipação, p. 191-197.
39 Cambi, Direito, p. 59; Neves, Algumas, p. 22-25.
40 Bedaque, Tutela, n. 20, p. 334; Dinamarco, A reforma, n. 106, p. 145; Theodoro Jr., Curso, p. 572-573; Zavascki, Antecipação, p. 77; Câmara, Lições, v. 1, p. 441.
41 Barbosa Moreira, Antecipação, p. 103-104; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 625-628.
42 Marinoni, Antecipação, n. 4.10.5, p. 172-177.
43 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 19, p. 24-25; Furtado Fabrício, Antecipação, p. 413; Fux, Curso, p. 63.
44 Zavascki, Antecipação, p. 79.
45 Theodoro Jr., Curso, p. 573; Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 25, p. 32.
46 Marinoni, Antecipação, n. 4.6.2, p. 157.
47 Scarpinella Bueno, Tutela, n. 4.3, p. 38.
48 Baptista da Silva, A antecipação, p. 139; Zavascki, Antecipação, p. 153; Costa Machado, Tutela, p. 422.
49 Zavascki, Antecipação, p. 153-154; Augusto de Assis, A antecipação, p. 176; Theodoro Jr., Curso, p. 572.
50 Nesse sentido as lições de Costa Machado, Tutela, p. 422-423.
51 Dinamarco, A reforma, p. 148; Scarpinella Bueno, Tutela, p. 40.
52 Indicando essa diferença, Marinoni, Antecipação, p. 332; Augusto de Assis, A antecipação, p. 176.
53 Neves, Nova, p. 94-102.
54 Zavascki, Antecipação, p. 154; Bedaque, Tutela, p. 330.
55 Theodoro Jr., Curso, p. 567. Contra: Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 636.
56 Nery, Atualidades, p. 70.
57 Bedaque, Tutela, n. 22, p. 339; Watanabe, Tutela, p. 34. Com crítica feroz, afirmando tratar-se de “impossibilidade jurídica odiosa criada pela lei”: Fux, Curso, p. 64.
58 STJ, 3.ª Turma, REsp 737.047/SC, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 16.02.2006, DJ 13.03.2006, p. 321; Barbosa Moreira, Antecipação, p. 105; Baptista da Silva, A antecipação, p. 142; Batista Lopes, Tutela, n. 5.1, p. 70; Scarpinella Bueno, Tutela, n. 5, p. 56.
59 Batista Lopes, Tutela, n. 5.1, p. 72; Scarpinella Bueno, Tutela, n. 5, p. 59-60.
60 Nery-Nery, Código, p. 529.
61 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 50, p. 82; Bedaque, Tutela, n. 22, p. 346.
62 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 53, p. 87.
63 Zavascki, Antecipação, n. 13, p. 100; Marinoni, Tutela, n. 4.12, p. 198.
64 Barbosa Moreira, Antecipação, p. 106.
65 Informativo 420/STJ: 3.ª Turma, REsp 801.600-CE, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 15.12.2009.
66 Scarpinella Bueno, Tutela, n. 4.5, p. 42-43; Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 42, p. 62; Theodoro Jr., Curso, n. 372-b, p. 419.
67 Zavascki, Tutela, p. 115; Nery-Nery, Código, p. 525.
68 Marinoni, Tutela, n. 4.3.1, p. 148; Bedaque, Tutela, n. 25, p. 354. Contra: Scarpinella Bueno, Tutela, n. 4.5, p. 43; Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 42, p. 62; Câmara, Lições, v. 1, p. 438.
69 Nery-Nery, Código, p. 524; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 638.
70 Costa Machado, Tutela, 6.1.3.6, p. 515-516; Câmara, Lições, v. 1, p. 438. Contra: Scarpinella Bueno, Tutela, n. 4.5, p. 43; Nery-Nery, Código, p. 525; Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 41, p. 62; Bermudes, A reforma, p. 29.
71 Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 641, falam em sugerir a tutela antecipada.
72 Bedaque, Tutela, n. 24, p. 352; Zavascki, Tutela, p. 120; Scarpinella Bueno, Tutela, p. 64; Arruda Alvim, Tutela, p. 109-110; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 649.
73 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 75, p. 138.
74 Contra: Calmon de Passos, Da antecipação, p. 204-205; Bermudes, A reforma, p. 29.
75 Marinoni, Tutela, n. 4.7.1, p. 159; Bedaque, Tutela, n. 29, p. 365.
76 Bedaque, Tutela, n. 29, p. 366; Arruda Alvim, Tutela, p. 93.
77 STJ, 1.ª Turma, REsp 417.479/RS, rel. Min. Garcia Vieira, j. 25.06.2002, DJ 26.08.2002, p. 178.
78 Scarpinella Bueno, Tutela, n. 10.2, p. 84; Câmara, Lições, v. 1, p. 451.
79 STJ, 3.ª Turma, AgRg no Ag 940.317/SC, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 19.12.2007, DJ 08.02.2008, p. 677.
80 Marinoni, Tutela, n. 4.7.2, p. 162.
81 Para Bedaque, Tutela, n. 29, p. 397, “a exigência não se coaduna com a eliminação de formalidades desnecessárias, nem constitui demonstração de boa técnica processual”. Pela antecipação na própria sentença: Zavascki, Tutela, p. 82; Nery-Nery, Código, p. 528; Gusmão Carneiro, Da antecipação, p. 95; Arruda Alvim, Tutela, p. 90.
82 Marinoni, Tutela, n. 4.7.2, p. 162.
83 Nery-Nery, Código, p. 528.
84 STJ, 3.ª Turma, AgRg no Ag 723.547/DF, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 29.11.2007, DJ 06.12.2007, p. 312; AgRg no Ag 517.887/SP, 6.ª Turma, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 27.10.2005, DJ 21.11.2005, p. 315. Informativo 305/STJ, 3.ª T., REsp 267.540-SP, rel. Humberto Gomes de Barros, j. 21.11.2006.
85 Scarpinella Bueno, Tutela, n. 10.2.5, p. 89.
86 Zavascki, Tutela, p. 130.
87 Sugestão de Scarpinella Bueno, Tutela, n. 10.2.3, p. 87.
88 Zavascki, Tutela, p. 135-137.
89 Batista Lopes, Tutela, n. 13.4, p. 108-109.
90 Zavascki, Tutela, p. 132-133.
91 Informativo 384/STJ, 2.ª T., MC 14.015-RS, rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.02.2009.
92 STJ, 2.ª Turma, AgRg no REsp 1.039.013/SP, rel. Min. Humberto Martins, j. 18.12.2008, DJe 16.02.2009; REsp 764.200/MG, 1.ª Turma, rel. Min. Luiz Fux, j. 04.10.2007, DJ 29.10.2007, p. 181.
93 Contra: Bedaque, Tutela, n. 34, p. 388.
94 No sentido do texto: Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 66, p. 127; Marinoni, Antecipação, n. 4.9, p. 167, entende que basta a manutenção do fundado receio de dano.
95 AgRg no REsp 753.333/RS, 2.ª Turma, rel. Min. Humberto Martins, j. 02.12.2008, DJe 18.12.2008; AgRg no REsp 875.155/RJ, 1.ª Turma, rel. Min. Luiz Fux, j. 04.11.2008, DJe 03.12.2008.
96 STJ, Corte Especial, EREsp 765.105-TO, rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 17.03.2010, DJe 25.08.2010.
97 STJ, REsp 742.512/DF, 2.ª Turma, rel. Min. Castro Meira, j. 11.10.2005, DJ 21.11.2005, p. 206.
98 Rcl 1.444/MA, 1.ª Seção, rel. Min. Eliana Calmon, j. 23.11.2005, DJ 19.12.2005, p. 203.
99 Bedaque, Tutela, p. 300; Marcelo Guerra, Estudos, p. 109.
100 Costa Machado, Tutela, p. 581; Moniz de Aragão, Alterações, p. 240.
101 Dinamarco, A reforma, p. 149-150; Marinoni, A antecipação, n. 4.8, p. 164; Calmon de Passos, Comentários, n. 6.10, p. 69, p. 69. Contra: STJ, 3.ª Turma, REsp 193.298/MS, rel. Min. Waldemar Zveiter, rel. p/ acórdão Min. Ari Pargendler, j. 13.03.2001, DJ 01.10.2001, p. 205; Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 65, p. 126, p. 84.
102 Arruda Alvim Wambier, Da liberdade, p. 543; Araken de Assis, Antecipação, p. 31; Batista Lopes, Tutela, p. 81.
103 Marinoni, Antecipação, p. 164; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 655; Figueira Jr., Comentários, p. 293; Calmon de Passos, Comentários, n. 6.10., p. 69; Moniz de Aragão, Alterações, p. 240.
104 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 65, p. 126.
105 Figueira Jr., Comentários, p. 289; Ferreira, Tutela, p. 182.
106 Scarpinella Bueno, Tutela, n. 8, p. 66.
107 Marinoni, Tutela, n. 4.14.2, p. 210-211.
108 Fux, Curso, p. 68; Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 47, p. 73.
109 Gusmão Carneiro, Da antecipação, n. 47.2, p. 76; Batista Lopes, Tutela, n. 10, p. 87; Câmara, Lições, v. 1, p. 445; Fux, Curso, p. 71.
110 Bedaque, Tutela, n. 33, p. 387; Scarpinella Bueno, Tutela, 12.2.2, p. 104-105; Costa Machado, Código, p. 612.
111 Bedaque, Tutela, n. 33, p. 387; Marinoni, Tutela, n. 4.14.5.2, p. 224-227.
112 Carneiro da Cunha, A Fazenda, n. 11.2, p. 221.
113 Câmara, Lições, v. 1, p. 453.
114 Talamini, Tutela, p. 45; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 670.
115 STJ, 2.ª Turma, AgRg no REsp 935.083/RS, rel. Min. Humberto Martins, j. 02.08.2007, DJ 15.08.2007, p. 268.
116 STJ, 1.ª Turma, REsp 834.678/PR, rel. Min. Luiz Fux, j. 26.06.2007, DJ 23.08.2007, p. 216.
117 Valle Pereira, Manual, n. 17.2.2, p. 488; Carneiro da Cunha, A Fazenda, n. 11.2, p. 221; Viana, Efetividade, p. 209.
118 STF, Plenário, ADC 4/DF, rel. Min. Sydney Sanches, rel. p/ acórdão Min. Celso de Mello, j. 1.º.10.2008 (Informativo 522/STF).
119 Súmula STF/729: “A decisão na ADC-4 não se aplica à antecipação de tutela em causa de natureza previdenciária”.
120 Zavascki, Antecipação, p. 190.
121 Carneiro da Cunha, A Fazenda, n. 11.4, p. 227.
122 STJ, 1.ª Turma, REsp 771.616/RJ, rel. Min. Luiz Fux, j. 20.06.2006, DJ 1.º.08.2006, p. 379.
123 Cerqueira, Comentários, p. 90; Scarpinella Bueno, A nova lei, p. 45-46.
124 Dinamarco, Instituições, v. 1, p. 210-213.
125 Carneiro da Cunha, A Fazenda, n. 11.5, p. 230; Câmara, Lições, v. 1, p. 454-455.
126 STF, Tribunal Pleno, Rcl 1.789/DF, rel. Min. Ellen Gracie, j. 24.12.2002, DJ 07.02.3003, p. 26.