Sumário: 77.1. Introdução – 77.2. Procedimento.
O processo de habilitação, com procedimento previsto nos arts. 1.055 a 1.062 do CPC, tem como objetivo regularizar a sucessão processual quando ocorre a morte de qualquer das partes. Apesar da omissão legal, é compreensível que o processo de habilitação seja limitado às partes na demanda, e não às partes no processo, de forma que, ocorrendo o falecimento do assistente1 ou do membro do Ministério Público que atue no processo, não será cabível o processo de habilitação.
Como se pode notar dessa simples conceituação, a sucessão processual decorrente de ato inter vivos não demanda um processo de habilitação, mas o procedimento previsto no art. 42 do CPC, já devidamente analisado no Capítulo 3, item 3.2.4. Mantendo-se o alienante ou cedente no processo em que se verificou a alienação de coisa litigiosa, e vindo este a falecer, o art. 1.061 do CPC admite a habilitação incidental, sem a necessidade de processo autônomo de habilitação do adquirente ou cessionário, bastando para tanto juntar aos autos o respectivo título, provando sua identidade. Segundo o correto entendimento do Superior Tribunal de Justiça, nesse caso não existe a necessidade de concordância da parte contrária, sendo inaplicável o art. 42, § 1.º, do CPC2.
Nem toda morte da parte, entretanto, admite a sucessão processual, hipótese na qual o processo de habilitação será inadmissível. Tendo o processo como objeto um direito material intransmissível, com a morte de uma das partes o processo deve ser extinto sem a resolução do mérito (art. 267, IX, do CPC).
E nem toda sucessão processual demandará o processo de habilitação, que poderá ser realizada incidentalmente, independentemente de processo autônomo, nos casos previstos no art. 1.060 e no art. 1.061 do CPC:
(I) pelo cônjuge – e também o companheiro – e herdeiros necessários, desde que provem por documento o óbito do falecido e a sua qualidade;
(II) diante da existência em outra causa de sentença transitada em julgado atribuindo ao habilitando a qualidade de sucessor ou herdeiro;
(III) pelo herdeiro incluído sem oposição no inventário;
(IV) estando declarada a ausência ou determinada a arrecadação da herança jacente;
(V) quando oferecidos os artigos de habilitação, a parte reconhecer a procedência dos pedidos e não houver impugnação de terceiros.
Segundo a melhor doutrina, trata-se de processo de conhecimento de natureza contenciosa, considerando-se que a pretensão dos autores dessa demanda de alterar a relação jurídica processual é potencialmente conflituosa. A sentença tem natureza constitutiva porque cria uma nova situação jurídica decorrente da alteração da relação jurídica processual3.
Aduz o art. 1.056 do CPC que a habilitação pode ser requerida pela parte, em relação aos sucessores do falecido; e pelos sucessores do falecido, em relação à parte. Significa dizer que quaisquer dos sujeitos descritos no dispositivo legal podem ser tanto autores como réus da demanda. Conforme corretamente defendido pela melhor doutrina, o juiz não poderá instaurar de ofício o processo de habilitação4 e diante da inércia dos legitimados deverá extinguir sem resolução de mérito o processo que exige a sucessão processual.
A competência para o julgamento do processo de habilitação é do juízo do processo em que ocorrerá a sucessão processual, tratando-se de competência absoluta, de natureza funcional, com aplicação do art. 109 do CPC5. Segundo o art. 1.059 do CPC, achando-se o processo no tribunal, a habilitação processar-se-á perante o relator e será conforme dispõe o regimento interno, sendo que o tema é tratado pelos arts. 288 a 296 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e pelos arts. 283 a 287 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.
Como todo processo, a habilitação tem seu início por meio de uma petição inicial, nos termos dos arts. 282 e 283 do CPC. Conforme previsão do art. 1.057 do CPC, recebida a petição inicial, que naturalmente poderá ser indeferida, o juiz ordenará a citação dos réus para contestar a ação no prazo de cinco dias, sendo limitada a matéria de defesa do réu às questões processuais e à ausência de qualidade de sucessor do autor6. A citação só será pessoal se não houver advogado constituído no processo principal. Não são cabíveis a exceção de incompetência relativa – se existir alguma incompetência, será absoluta – nem a reconvenção, diante da evidente natureza dúplice da ação. A partir desse momento, o procedimento passará a ser aquele previsto nos arts. 802 e 803 do CPC, o que demonstra de maneira manifesta o objetivo do legislador em sumarizar o procedimento. Durante o trâmite da ação de habilitação o processo principal ficará com o seu procedimento suspenso, nos termos do art. 265, I, do CPC.
1 Theodoro Jr., Curso, n. 1.443, p. 321.
2 AgRg no REsp 911.134/RS, 1.ª Turma, rel. Min. Francisco Falcão, j. 03.05.2007, DJ 24.05.2007, p. 335.
3 Câmara, Lições, v. 3, p. 432; Marcato, Procedimentos, n. 166, p. 283. Contra, pela natureza declaratória: Fidélis dos Santos, Procedimentos, n. 432, p. 412.
4 Pinheiro Carneiro, Comentários, n. 85, p. 208; Marcato, Procedimentos, n. 165, p. 282; Câmara, Lições, v. 3, p. 433.
5 Theodoro Jr., Curso, p. 1.444, p. 321; Fidélis dos Santos, Procedimentos, n. 415, p. 405.
6 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 919; Pinheiro Carneiro, Comentários, n. 88, p. 216; Fidélis dos Santos, Procedimentos, n. 418, p. 406.