Nova Iorque
1 de setembro de 2014
(3 noites até ao fim)
Algumas decisões acontecem de repente.
Outras constroem-se ao longo do tempo.
Uma rapariga faz um pacto com as trevas, depois de anos passados a sonhar.
Uma rapariga apaixona-se por um rapaz num momento e decide libertá-lo.
Addie não sabe exatamente quando decidiu.
Talvez sempre tenha sabido desde a noite em que Luc regressou às suas vidas.
Ou talvez tenha sabido desde a noite em que ele escreveu o seu nome.
Ou talvez tenha sabido desde que ele disse estas palavras:
Lembro-me de si.
Não tem a certeza.
Não importa.
O que importa é que, três noites antes do fim, Addie sai da cama. Henry vira-se para o outro lado, no sono, desperta o suficiente para ouvir os passos dela no corredor, mas não o suficiente para a ouvir calçar os sapatos ou esgueirar-se para a escuridão.
São quase duas da manhã — o momento que medeia entre o muito tarde e o muito cedo —, e mesmo Brooklyn aquietou até se transformar num murmúrio enquanto ela percorre os dois quarteirões até ao bar Merchant. Falta uma hora para fechar, a multidão reduzida a alguns clientes persistentes.
Addie senta-se num banco, ao balcão, e pede um shot de tequila. Nunca foi grande fã de bebidas fortes, mas engole o líquido de uma assentada, sente o calor instalar-se no peito enquanto leva a mão ao bolso e encontra o anel.
Os dedos dobram-se sobre o aro de madeira.
Retira-o da algibeira, equilibra o anel bem direito, em cima do balcão.
Fá-lo rodar como uma moeda, mas não há cara ou coroa, não há sim ou não, não há opção para lá daquela que já tomou. Decide quando o anel para: irá pô-lo no dedo. Quando cair..., mas quando este começa a oscilar e a inclinar-se, uma mão pousa em cima dele, comprimindo-o contra o balcão.
A mão é suave e forte, os dedos longos, os pormenores exatamente como os desenhou, outrora.
— Não devias estar com o teu amado?
Não há humor nos olhos de Luc. Estão impassíveis e negros.
— Está a dormir — diz ela —, e eu não consigo.
Luc retirou a mão, e Addie olha para o círculo claro do anel ainda em cima do balcão.
— Adeline — diz ele, acariciando-lhe o cabelo. — Sofrerás. E depois irá passar. Como todas as coisas.
— Menos nós — murmura ela. E depois acrescenta, como que para si mesma. — Fico contente por ter sido apenas um ano.
Luc senta-se no banco ao seu lado.
— E como foi, o teu amor humano? Foi tudo aquilo com que sonhaste?
— Não — diz ela, e é verdade.
Foi complicado. Foi difícil. Foi maravilhoso e estranho e assustador e frágil, tão frágil que magoava, e valeu cada instante. Não lhe diz nada disto. Ao invés, deixa o «não» pairar no ar entre eles, pesado com o fardo da suposição de Luc. Os seus olhos num tom de verde absolutamente enfatuado.
— Mas o Henry não merece morrer para provares que tinhas razão.
A arrogância lampeja, combinada com raiva.
— Um pacto é um pacto — diz. — Não pode ser quebrado.
— E, no entanto, uma vez disseste-me que se podia contornar um pacto, que as condições podiam ser reescritas. Estavas a falar a sério? Ou era apenas parte de um estratagema para me fazeres render?
A expressão de Luc ensombrece.
— Não havia estratagema, Adeline. Mas, se pensas que vou mudar as condições do...
Addie abana a cabeça.
— Não estou a falar do pacto do Henry — diz ela. — Estou a falar do meu. — Treinou as palavras, mas, ainda assim, tropeçam-lhe desajeitadamente da língua. — Não vou pedir a tua compaixão, e sei que não tens caridade. Por isso proponho-te uma troca. Liberta o Henry. Deixa-o viver. Deixa-o lembrar-se de mim, e...
— Entregas a tua alma? — Há uma sombra no seu olhar quando o diz, uma hesitação nas palavras, mais preocupação do que ânsia, e ela sabe então que o apanhou.
— Não — diz ela. — Mas só porque não a queres. — E, antes que ele possa protestar, continua. — Tu queres-me a mim.
Luc não diz nada, mas os seus olhos iluminam-se, com o interesse espicaçado.
— Tens razão — diz ela. — Não sou como eles. Já não sou. E estou cansada de perder. Cansada de lamentar a perda de tudo o que tentei amar. — Estende a mão para tocar no rosto de Luc. — Mas não te vou perder a ti. E tu não me vais perder. Por isso, sim. — Addie olha-o fixamente. — Faz isto, e serei tua, enquanto me quiseres ao teu lado.
Ele parece suster a respiração, mas é ela que não consegue respirar. O mundo balança, oscila, ameaçando cair.
E então, finalmente, Luc sorri, com os olhos verde-esmeralda de vitória.
— Aceito.
Ela deixa-se cair, inclinando-se sobre o corpo, com a cabeça contra o peito, de alívio. E então os dedos de Luc pousam sob o queixo de Addie, inclinando-lhe o rosto para o seu, e beija-a como na noite em que se conheceram, de forma rápida e profunda e esfaimada, e Addie sente os dentes deslizarem pelo lábio inferior, o sabor a cobre florescer-lhe na língua.
E sabe que está feito.