Nova Iorque

4 de setembro de 2014

cap20

— Não — diz Henry, a palavra quase engolida pela tempestade.

A chuva cai torrencialmente sobre o terraço. Sobre eles.

O relógio parou, com o ponteiro virado para cima, em desistência, em rendição. Mas Henry continua ali.

— Não podes fazer isto — diz ele, com a cabeça a andar às voltas. — Não te vou deixar.

Addie lança-lhe um olhar compadecido, porque, como é evidente, não a pode impedir.

Nunca ninguém o conseguiu.

Estele costumava dizer que ela era teimosa como uma rocha. Mas mesmo as rochas se desgastam até se transformarem em nada. E ela não.

— Não podes fazer isto — diz ele de novo, e ela responde:

— Já está feito — e Henry sente-se tonto, sente-se indisposto, sente o chão balançar sob os pés.

— Porquê? — pergunta. — Porque o haverias de fazer?

— Pensa nisto como um agradecimento — diz ela —, por me veres. Por me mostrares o que é ser visto. Ser amado. Agora vais ter uma segunda oportunidade. Mas tens de os deixar verem-te como és. Tens de encontrar pessoas que te vejam realmente.

Está mal.

Está tudo mal.

— Não o amas.

Um sorriso triste atravessa o rosto de Addie.

— Já tive o meu quinhão de amor — diz ela, e está na hora, deve estar na hora, porque a visão dele começa a turvar, os contornos estão a ficar negros.

— Ouve-me. — A voz dela agora é urgente. — A vida às vezes pode parecer muito longa, mas, no fim, passa muito depressa. — Tem os olhos brilhantes das lágrimas, mas está a sorrir. — Por isso, é bom que vivas uma boa vida, Henry Strauss.

Começa a afastar-se, mas a mão dele aperta-se.

— Não.

Ela suspira, com os dedos a passarem-lhe pelo cabelo.

— Deste-me imenso, Henry. Mas preciso que faças mais uma coisa. — Encosta a testa à dele. — Preciso que te lembres.

E Henry sente a mão soltar-se quando a escuridão lhe varre a visão, toldando o horizonte e o terraço e a rapariga inclinada sobre ele.

— Promete-me — diz ela, e o rosto de Addie começa a esbater-se, o movimento dos seus lábios, os caracóis castanhos num rosto em forma de coração, dois olhos muito grandes, sete sardas como estrelas.

— Promete — sussurra, e ele ainda está a levantar as mãos, a apertá-la contra si, a prometer, mas, no momento em que os seus braços se fecham sobre ela, Addie desapareceu.

E ele está a cair.