Nova Iorque

18 de março de 2014

cap6

A campainha toca, e Bea entra.

— O Robbie quer saber se o estás a evitar — diz, à laia de olá.

O coração de Henry afunda-se. A resposta é sim, claro e não. Não consegue esquecer o olhar de mágoa nos olhos de Robbie, mas isso não desculpa a forma como agiu, ou talvez desculpe.

— Vou tomar isso como um sim — diz Bea. — E onde tens estado escondido?

Henry quer dizer Estive convosco no jantar, mas pergunta-se se ela terá esquecido toda a noite ou apenas partes em que Addie tenha estado envolvida.

Por falar nisso.

— Bea, esta é a Addie.

Beatrice vira-se para ela e, por um segundo, apenas por um segundo, Henry acha que ela se lembra. Pela forma como olha para Addie, como se fosse uma peça de arte, mas uma peça com que Bea já tivesse deparado antes. Apesar de tudo, Henry espera que ela assinta, que diga «Oh, que bom ver-te de novo», mas, em vez disso, Bea sorri. Diz:

— Sabes, há algo de intemporal no teu rosto — e ele é embalado pela estranheza do eco, pela força do déjà vu.

Mas Addie limita-se a sorrir e dizer:

— Não é a primeira vez que ouço isso.

Enquanto Bea continua a estudar Addie, Henry estuda-a a ela.

Sempre foi impiedosamente imaculada, mas hoje tem tinta fluorescente nos dedos, um toque de dourado na têmpora, algo semelhante a açúcar em pó na manga.

— O que andaste a fazer? — pergunta ele.

Bea olha para baixo.

— Oh, estive na Artifact — diz ela, como se isso devesse significar alguma coisa. Ao perceber a sua confusão, explica. A Artifact é, de acordo com Beatrice, em parte uma feira e em parte uma exposição de arte, uma combinação interativa de instalações na High Line.

Enquanto Bea fala de salas espelhadas e de abóbadas de vidro cheias de estrelas, de nuvens de açúcar, de penas de lutas de almofadas e de murais feitos com milhares de anotações de estranhos, Addie entusiasma-se, e Henry pensa que deve ser difícil surpreender uma rapariga que viveu trezentos anos.

Por isso, quando Addie se volta para ele, de olhos a cintilar, e diz «Temos de lá ir», não há nada que ele mais desejasse fazer. Claro que há a questão da livraria, o facto de ser o único funcionário e de ainda faltarem quatro horas para fechar. Mas tem uma ideia.

Henry pega num marcador de livros, o único artigo produzido pela loja, e começa a escrever nas costas.

— Olá, Bea — diz, empurrando o cartão improvisado por cima do balcão. — Importas-te de fechar a loja?

— Tenho uma vida — diz ela, mas depois olha para a caligrafia apertada e oblíqua de Henry.

A Biblioteca de The Last Word.

Bea sorri e enfia o cartão no bolso.

— Divirtam-se — diz, acenando-lhes enquanto saem.