No Brasil, fala-se em crise da seguridade social há décadas. De fato, segundo cifras oficiais, o sistema brasileiro vem experimentando crescentes dificuldades financeiras. Cabe, nesta oportunidade, fazer um breve panorama desta crise, embora não somente sob a perspectiva governamental, uma vez que definitivamente haja conclusões que merecem maior reflexão.
Juliana Presotto Pereira Netto, em sua obra,1 indica as razões da crise do sistema, distinguindo-as como sendo de índole: a) estrutural, decorrentes da transição demográfica da sociedade (envelhecimento médio da população); b) conjuntural, decorrentes de problemas econômico-sociais (mudanças no mercado de trabalho); e c) administrativas, decorrentes de problemas com os órgãos e entidades envolvidos (desvios de recursos e de má gestão do sistema).
A relação contribuinte beneficiário é uma das preocupações dos estudiosos do tema. Segundo números oficiais, na década de 50, oito contribuintes financiavam cada beneficiário. Em 1970, essa relação era de 4,2 para 1; o número de contribuintes por beneficiário foi decrescendo: 2,8, em 1980; 1,9 em 1995. Esta relação tem que ver, naturalmente, com o tempo que os segurados, em média, contribuem para o sistema e, depois, percebem (ou geram para seus dependentes) benefícios cuja finalidade é a substituição do salário (via de regra, aposentadorias e pensões). Estima-se que, se as regras de concessão de aposentadorias de pensões fossem mantidas, a expectativa seria de que, em 2030, cada contribuinte teria de sustentar um beneficiário.2
Em que pese não se discutir tais estatísticas, até por falta de dados que demonstrem o contrário, deve-se recordar que a variável “número de contribuintes” é subestimada, já que, para o cálculo, leva-se em conta a população que se encontra trabalhando na chamada “economia formal”: os empregados com carteira assinada, e uma parte dos contribuintes individuais e demais contribuintes – os que vertem efetivamente seus aportes. Deixa-se à margem da estatística, portanto, mais da metade da população economicamente ativa, que se encontra no mercado não formal de trabalho. Um dado mais preciso sobre a saúde financeira do sistema no que diz respeito à relação contribuinte-beneficiário só seria possível com a inserção desses trabalhadores no cômputo, pois, como sustenta Célia Opice Carbone, os trabalhadores informais e por conta própria “encontram-se fora do esforço de arrecadação”. Sugere a socióloga que a alternativa para o sistema previdenciário brasileiro, neste particular, dada a sua base de financiamento principal ser a decorrente das contribuições sobre a folha de salários, é a expansão do emprego.3
Stephanes, discorrendo sobre as mudanças nos regimes europeus, também vê a preocupação daqueles países com a questão do fomento ao emprego:
Na Europa, a busca de novas formas de financiamento não implicou o abandono do modelo clássico de repartição, conforme observa Danny Pieters, secretário geral do Instituto Europeu de Seguridade Social. Faz parte de seu estudo sobre as últimas tendências dos sistemas europeus as seguintes constatações:
– de modo geral, os governos vêm estimulando a adesão a regimes complementares, formada por empresas sem fins lucrativos (mútuas) e fundos de pensão, mas mantêm um regime básico até determinado limite;
– todas as fórmulas de cálculo têm sido feitas de maneira a estabelecer uma relação mais próxima entre as contribuições e os respectivos benefícios;
– muitos países tendem a incrementar o financiamento de seus sistemas com impostos gerais, com a finalidade de desonerar a taxação sobre a folha.
Em função de uma política proativa (sic) de estímulo ao mercado de trabalho, vários países têm indicado expressamente que a seguridade social deveria tratar, em primeiro lugar, de prevenir a incapacidade laboral e o próprio desemprego.4
Ou seja, o caminho talvez seja o extremamente oposto ao recomendado pelos economistas-monetaristas. Estes, preocupados exclusivamente com a competitividade e o lucro das empresas, mas desatentos sobre a questão social, vêm defendendo a quebra do “pacto social” em nome da luta no mercado global. Para este fim, sustentam que a informalidade do mercado de trabalho, com as mudanças na concepção da relação de emprego são fatores irreversíveis e que devem nortear as políticas no campo social; vale dizer, já que não nos devemos pautar pela relação empregado-empregador, o custeio do sistema também não pode mais ser visto com sustentáculo nas contribuições sobre “folha de salários”, já que “salário” é a forma de pagamento de apenas metade da população trabalhadora. Veja-se, a propósito, o pensamento de José Pastore:
O montante de custos fixos relativos aos encargos sociais compulsórios, evidentemente, afeta o nível de salário dos trabalhadores e o nível de emprego legal, pois as empresas só se dispõem a contratar legalmente quando têm muita certeza de poder produzir e vender seus bens e serviços por preços compensadores.5
Ora, então, o problema não é dos encargos, é da relação do preço com a ambição de lucro. A empresa só contrata legalmente se a margem desejada de lucro for garantidamente atingida. Deve-se recordar, todavia, que, numa noção ampla de solidariedade, somente se os mais abastados abrirem mão de parcela dos seus ganhos, os menos favorecidos poderão ter a sonhada proteção social, e, em consequência, uma relação menos desigual na sociedade. Enquanto entendimentos como este, de que Pastore é interlocutor, forem vigorantes, realmente não há como ter um sistema de seguridade economicamente viável e socialmente justo.
É o esgarçado tema do “Custo Brasil”. Reclamam economistas e empresários que, “devido aos encargos sociais, o custo da mão de obra no Brasil seria excessivamente alto, quando comparado com o custo de outros países”.6
Em que pesem os argumentos por nós rechaçados, é imperioso dizer que as informações atuariais indicam de fato cautela. A viabilidade de um regime de segurança social só é possível com a observação prévia dos fenômenos que podem influenciar na prestação dos serviços. É como já foi salientado por Almansa Pastor, citado por Juliana Presotto Pereira Netto: “a visão paradisíaca que oferece um ordenamento de seguridade social termina onde acaba a idealidade platônica, porque o fato é que a porta que conduz a este ordenamento se fecha com a chave dos meios financeiros. Uma proteção de todas as necessidades e extensa a todos os cidadãos, que gravite sobre o Estado, requer extraordinários meios financeiros ‘que, possivelmente a consciência de solidariedade de nenhum país esteja hoje em condições de suportar’”.7
A má gestão dos recursos é outro fator desencadeante e fomentador da crise. Durante muitos anos, o regime serviu para custear não os benefícios, nem formar o fundo de reserva que hoje estaria sustentando as políticas sociais: ao contrário, serviu para construir Brasília e outras obras públicas “faraônicas”. Dilapidou-se assim o lastro existente no sistema, que, segundo Stephanes, deveria ser de, no mínimo, seis meses de despesa.8 Além disso, a falta de controle efetivo sobre a concessão de benefícios acarretou os escândalos das famosas fraudes das décadas de 80 e 90, com a descoberta de verdadeiras quadrilhas de assaltantes do caixa dos fundos previdenciários, compostas por servidores do próprio órgão, advogados e magistrados. A gestão não profissional da Previdência, vale dizer, com os cargos de direção sendo objeto de barganhas políticas e “cabides de emprego” para pessoal totalmente desqualificado, serviu para agravar o quadro e permitir o desajuste entre aportes e pagamentos.
A Emenda Constitucional n. 20/1998 estabeleceu a vinculação das contribuições incidentes sobre a folha de pagamentos de empregados – destes e dos empregadores – exclusivamente ao pagamento de benefícios previdenciários. Conforme relato do ex-Ministro da pasta, Waldeck Ornélas, a regra em questão, juntamente com a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal, garante o regime contra a utilização indevida dos aportes. Foi instituído o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, de modo que, “além de vinculados, esses recursos estarão agora em uma conta orçamentária específica, tornando fácil visualizar as receitas e as despesas da Previdência Social. Os números estarão separados inclusive do custeio do próprio INSS”.9
Outro aspecto grave da questão gerencial é o fato de que, ainda hoje, o INSS é um mau pagador. A política de discutir em Juízo até as últimas instâncias, valendo-se de todos os recursos e medidas procrastinatórias possíveis para postergar o pagamento de direitos assegurados por decisões judiciais, além de lamentável, do ponto de vista social, gera um efeito “bola de neve” sobre os valores a serem quitados. A dívida principal, quanto mais tempo demora para ser paga, é atualizada monetariamente e acrescida dos juros moratórios. Neste aspecto, de nada adiantará alterar-se o art. 100 da Constituição, para permitir pagamento de débitos judiciais sem a expedição do precatório (§ 3°, acrescentado pela Emenda n. 20/98), para condenações do INSS, se a política de procrastinar feitos permanecer.
Por outra vertente, o número de sonegadores de contribuições sociais é assombroso. Segundo números citados pelo ex-ministro da pasta, há uma dívida histórica de R$ 29 bilhões, sendo considerado como recuperáveis apenas R$ 12 bilhões,10 em face do decurso de tempo de grande parte dos débitos, muitos já alcançados pela decadência ou prescrição.
A ampliação das coberturas sem a necessária fonte de custeio foi, durante muito tempo, outro fator de desequilíbrio financeiro das contas da Previdência. Apesar de ser princípio constitucionalmente previsto desde a Constituição de 1967, jamais foi cumprido na época de vigência do texto constitucional anterior. A legislação mal produzida, sem a menor preocupação com a relação custeio-despesa na concessão de benefícios, também acarretou acréscimos no déficit previdenciário.
Extremamente esclarecedor é o exemplo citado por Stephanes:
Um trabalhador de 37 anos conseguiu provar 34 anos de serviço, o que induz à conclusão absurda de que ele começou a trabalhar com três anos de idade.
Tal situação ocorre, por exemplo, mediante a utilização, como tempo de atividade rural, do período em que o menor, de 14 a 18 anos, vive com a sua família no campo. Este tempo de serviço pode, muitas vezes, ser contado para fins de aposentadoria em razão de distorções legais. Também podia ser contado o período de aprendizagem do menor entre 12 e 14 anos. Imagine alguém que tenha estudado em regime de aprendizagem dos 12 aos 14 anos e averbado tempo de atividade rural dos 14 aos 18 anos. Este cidadão hipotético terá 6 anos de serviço aos 18 anos de idade.
Se a mesma pessoa trabalhar por mais 13 anos em mina de subsolo, cuja aposentadoria especial é aos 15 anos de serviço, terá 36 anos de serviço aos 31 anos de idade, por causa do sistema de conversão de tempo de serviço especial em tempo de serviço comum (6 anos + 13 anos x 2,33 = 36,3 anos).11
É evidente que, na realidade, tal fato pode ocorrer. Também é verdade que, se alguém se aposenta nestas condições, não necessariamente é uma pessoa que se possa dizer tenha “burlado” o sistema: só o faz porque a lei permite. Assim, a legislação referente ao cômputo do tempo de serviço “fictício” tem sido objeto de alterações, e a aposentadoria especial tem sido revista quanto a critérios para a sua concessão. O problema é que os ajustes não podem afetar direitos já adquiridos em face da norma anterior, nem prejudicar os trabalhadores que, efetivamente, trabalham em atividade rural, ou condições nocivas à saúde, apenas para evitar sangria de recursos. Assim, as mudanças introduzidas, por exemplo, no art. 57 da Lei n. 8.213/91, com a exigência de comprovação de exposição à atividade nociva, durante o tempo necessário ao implemento do direito ao benefício, têm sido “um remédio forte demais”, já que têm afetado o direito daqueles que exerceram atividades ditas especiais, mas não têm como comprovar o trabalho efetivo nestas condições (antes de 1995, a lei exigia somente o enquadramento em categorias que eram consideradas especiais, não havendo necessidade, até então, de comprovar o efetivo exercício de atividade insalubre ou perigosa).
A falta de um acompanhamento adequado da expectativa de vida e das despesas com benefícios também é sentida, pois tal preocupação só desponta a partir da segunda gestão de Stephanes no comando da Previdência. Trata-se de uma das medidas de suma importância para o controle das contas, uma vez que não se pode pensar em termos de políticas de proteção somente a curto prazo. Felizmente, os atuais governantes têm demonstrado maior atenção para este detalhe.
Em relação aos regimes próprios de previdência dos agentes públicos, promulgou-se a Emenda n. 41/2003 e a Emenda n. 47/2005, que modificaram substancialmente a previdência dos ocupantes de cargos públicos. Muitas das medidas aprovadas já haviam sido propostas, sem contudo obter êxito em votações anteriores no Congresso Nacional. A justificativa para a aprovação das Emendas Constitucionais foi o déficit decorrente dos gastos dos entes públicos com aposentadorias e pensões, conforme acentuado por Stephanes:
A despesa com benefícios previdenciários dos servidores públicos é maior que a receita obtida com as contribuições individuais. Em 1996, os servidores da União recolheram aproximadamente R$ 2,6 bilhões para a previdência, enquanto as despesas com os Encargos Previdenciários da União chegaram a R$ 17,1 bilhões. A diferença é de cerca de R$ 14,5 bilhões. Observe (sic) que a parte patronal não está incluída neste cálculo; caso estivesse, o déficit seria em torno de R$ 10 bilhões.
Esse déficit tem sido parcialmente coberto mediante a utilização de recursos da Seguridade Social (Cofins e Contribuição sobre o Lucro Líquido), com virtual prejuízo para as áreas de saúde e assistência social. Em 1997, segundo o Tesouro Nacional, a folha de salários custou R$ 42,1 bilhões, dos quais R$ 17,1 bilhões com o pagamento de aposentados e pensionistas. Em 1990, os gastos com inativos eram de R$ 8,7 bilhões, ou um quarto das despesas globais com pessoal à época.12
Em que pese o art. 40 da Constituição Federal, com a redação conferida desde a Emenda n. 20/98, ter fixado como direito de todo servidor público federal, estadual ou municipal, o acesso a um regime previdenciário diferenciado, cuja aposentadoria se calcula sobre o valor da última remuneração, a verdade é que ainda estamos bem distantes de ter assegurado a efetividade desta norma. Os agentes públicos de Municípios que não instituíram regime próprio de Previdência, ou que, depois de instituídos, concluíram pela inviabilidade financeira de sua manutenção, por estarem vinculados ao INSS, acabam tendo seus benefícios calculados conforme a regra dos trabalhadores da iniciativa privada, ocasionando aí um hiato entre a norma constitucional e a prática administrativa.
Muito se fala sobre o chamado déficit do sistema previdenciário. A matéria, embora noticiada como “lugar-comum” na imprensa, não tem a unanimidade entre os estudiosos do assunto. Os auditores fiscais do INSS, em documento intitulado “Seguridade e Desenvolvimento: um projeto para o Brasil”, indicam que o suposto déficit não existe. Há razões fundadas para concordar. Números divulgados oficialmente pelas páginas do Governo Federal na internet e que foram tabulados pela FUNDAÇÃO ANFIP registram que a arrecadação do sistema de Seguridade Social foi de R$ 392,3 bilhões em 2009, enquanto, para o mesmo exercício, houve uma despesa geral de R$ 359,7 bilhões, já incluídos os benefícios assistenciais, os gastos com a saúde, com os benefícios de legislação especial, com a administração do INSS e outros, resultando num saldo positivo de R$ 32,6 bilhões. Esse superávit teria chego a R$ 78 bilhões em 2011, conforme notícia publicada no site da referida Entidade:
Sustentado por dados da ANFIP, parlamentar desmente déficit da previdência social
Em pronunciamento nesta terça-feira (17) no Plenário da Câmara, o deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) afirmou que o argumento de que a previdência social não se sustenta é uma falácia. O parlamentar citou os dados preliminares da publicação Análise da Seguridade Social em 2011, da ANFIP, para demonstrar que, naquele ano, o sistema de Seguridade Social, do qual a previdência social é um dos pilares, apresentou um superávit de R$78 bilhões. “E sem contar a DRU, a Desvinculação de Receitas da União, que certamente poderia permitir que esse superávit fosse maior do que os R$78 bilhões”, completou Faria de Sá. O deputado fez ainda duras críticas aos grupos que defendem a privatização da previdência pública. “Não adianta a grande rede de comunicação, patrocinada por grandes bancos e grupos financeiros, dizer que a previdência está quebrada. Estão aqui, na publicação da ANFIP, os dados oficiais da Seguridade Social do ano de 2011 – R$78 bilhões de superávit. Calem a boca, seus mentirosos.”
O lançamento da Análise da Seguridade Social em 2011 está previsto para o dia 9 de maio, na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados.13
A questão é que o Ministério da Previdência Social não considerava todas as contribuições para o sistema, mas apenas algumas delas, deixando de fora, por exemplo, a COFINS e a Contribuição sobre o Lucro Líquido. Também no que tange à despesa, contava-se apenas com os benefícios da Previdência Social e não com todas as despesas das três áreas. Esta é a razão do desencontro das contas.
Em verdade, nem todas estas contribuições acabam indo para os cofres da Seguridade Social. O Governo Fernando Henrique Cardoso conseguiu criar, por Emenda Constitucional, o chamado Fundo Social de Emergência, que hoje é chamado de Desvinculação de Receitas da União, e que é responsável pelo desvio de recursos da COFINS e da CSLL para os cofres da União. Curiosamente, os Governos seguintes não o extinguiram, apesar das críticas a esse Fundo, notadamente quanto ao uso (indevido) de contribuições sociais para fins diversos da sua finalidade. Neste sentido, as informações constantes da Análise da Seguridade Social em 2011, feita pela ANFIP:
Ao retirar R$ 52,6 bilhões do Orçamento da Seguridade Social em 2011, a DRU cumpre um papel de esvaziar o financiamento, suprimindo a maior parte do superávit da Seguridade. Essa subtração de recursos não aparece nos relatórios como uma transferência de recursos da Seguridade Social para o Orçamento Fiscal. É como se esses recursos fossem, por natureza, do Orçamento Fiscal.
Quando o governo subtrai esses mais de R$ 52 bilhões e ainda infla o Orçamento da Seguridade Social com um enorme volume de despesas estranhas a esse Orçamento, constrói um chamado déficit.14
Na verdade, a situação por que passam os regimes próprios de previdência, tal como o regime gerido pelo INSS, decorre de vários outros fatores históricos, que aos poucos estão sendo corrigidos, entre eles:
–A má gestão dos recursos, pela utilização das contribuições dos servidores para outros fins que não a formação do “fundo previdenciário”;
–A falta de fixação de contribuições capazes de gerar a sustentabilidade (entes públicos não contribuíam com a sua parte);
–Legislações mal formuladas ou irreais sob o ponto de vista financeiro/atuarial (pensões e aposentadorias que eram calculadas pelo valor integral, sem contribuição correspondente);
–Ações judiciais “empurradas para a frente” (gastos adicionais com juros e honorários);
–Dívida Ativa bilionária e renúncia fiscal (isenção/imunidade das entidades filantrópicas);
–Desconhecimento das políticas previdenciárias (altos índices de exclusão na rural e urbana);
–Benefícios concedidos como privilégios (aposentadorias precoces, pensões vitalícias a dependentes de militares e ex-combatentes).
A verdade é que as Emendas Constitucionais n. 41 e 47, em linhas gerais, tornaram a previdência dos agentes públicos não igual, mas pior que a dos demais trabalhadores brasileiros, em muitos pontos. Observe-se, apenas, a questão da idade mínima (somente fixada para os regimes próprios, mas não para o RGPS), a criação da contribuição de aposentados e pensionistas (também não atingidos os do RGPS) e as regras para o cálculo da pensão por morte, que reduzem substancialmente o valor a ser recebido pelos dependentes do servidor falecido, enquanto no RGPS o valor da pensão corresponde, sempre, ao valor da aposentadoria devida ao segurado falecido, apurada pela média dos seus salários de contribuição, sem redutor algum.
Pode afinar também que o Brasil caminha para a convergência dos regimes de previdência social (RGPS e RPPS), como foi declarado na Exposição de Motivos dos Ministros da Previdência e da Casa Civil sobre a Proposta de Emenda Constitucional nº 40 (PEC nº 40), enviada ao Presidente da República em 29.04.2003, para posterior encaminhamento ao Congresso Nacional. Pela importância do texto, transcreve-se abaixo:
5 – Trata-se de avançar no sentido da convergência de regras entre os regimes de previdência atualmente existentes, aplicando-se aos servidores públicos, quando possível, os requisitos e critérios mais próximos dos exigidos para os trabalhadores do setor privado. Com este vetor, busca-se tornar a Previdência Social mais equânime, socialmente mais justa e viável financeira e atuarialmente para o longo prazo. Esta convergência de regras proposta na Emenda Constitucional em anexo, que inclui a criação de um teto comum de benefícios e contribuições para os segurados futuros dos diversos regimes previdenciários existentes no Brasil, será um passo decisivo na direção em que aponta o Programa de Governo de Vossa Excelência citado mais acima.15
Pode-se concluir que as reformas da Previdência Social são um processo constante e permanente para adequação dos sistemas às modificações socioeconômicas, demográficas e no mercado de trabalho.
As mudanças ocorridas até o momento deverão ser acrescidas de novas regras que deverão ser aprovadas nos próximos anos com vistas à redução dos gastos sociais, atendendo a uma tendência mundial.
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1 PEREIRA NETTO, Juliana Presotto. A previdência social em reforma: o desafio da inclusão de um maior número de trabalhadores. São Paulo: LTr, 2002, p. 86.
2 Livro Branco da Previdência Social. Site do MPAS: www.mpas.gov.br.
3 CARBONE, Célia Opice. Seguridade social no Brasil: ficção ou realidade?. São Paulo: Atlas, 1994, p. 103.
4 Reforma da previdência sem segredos. Rio de Janeiro: Record, 1998, p. 21.
5 PASTORE, José. Encargos sociais no Brasil: implicações para o salário, emprego e competitividade. São Paulo: LTr, 1997, p. 34.
6 SPOSATI, Aldaíza. “Globalização: um novo e velho processo”, in Desafios da globalização (Org.). Ladislau Dowbor et alii, Petrópolis: Vozes, 1997.
7 PEREIRA NETTO, Juliana Presotto. A previdência social em reforma..., cit., p. 41.
8 Idem, ibidem, p. 48.
9 ORNÉLAS, Waldeck. A previdência sem “caixa preta”. Site do MPS: www.mps.gov.br.
10 STEPHANES, Reinhold. Reforma da previdência..., cit., p. 65.
11 Idem, ibidem, pp. 66-67.
12 STEPHANES, Reinhold. Reforma da previdência..., cit., p. 100.
13 Disponível em: <http://www.anfip.org.br/publicacoes/noticias/publicacoes_noticiasindex.php?id=23932>. Acesso em 28.11.2012.
14 Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil. Análise da Seguridade Social 2011. Brasília: ANFIP, 2012. p. 91. Disponível em: <http://www.anfip.org.br/publicacoes/livros/includes/livros/arqs-pdfs/analise2011.pdf.> Acesso em 28.11.2012.
15 Brasil. Ministério da Previdência Social. Estudos e Pesquisas da Secretaria de Políticas de Previdência Social 2003-2009. Brasília: MPS, 2009. 380p. (Coleção Previdência Social, Série Estudos; v. 31) p. 258.