O ser meditativo

Se há um personagem bíblico que soube vencer a raiva e o medo, o nome dele é Jacob, o filho de Isaac. É curioso que seja ele o símbolo do personagem meditativo, porque foi, provavelmente, quem mais enfrentou obstáculos.

A dificuldade se apresentou na vida de Jacob no mesmo instante em que ele veio ao mundo, quando nasceu agarrado ao calcanhar do irmão gêmeo Esaú. Assim narra a Bíblia:

“E saiu o primeiro, vermelho, todo ele, como vestido de pelo, e chamaram seu nome Esaú. E depois saiu seu irmão, e sua mão agarrava o calcanhar de Esaú; e chamou seu nome Jacob.”

GÊNESIS 25.25-26

Nesse momento, um grande dilema era criado. Por todas as suas qualidades – que ele iria mostrar desde cedo –, Jacob deveria, por mérito, ser o sucessor de seu pai no comando da família. No entanto, por uma diferença de apenas alguns segundos, seu irmão foi considerado o primogênito.

Quando os dois ficaram adultos, a mãe, Rebeca, formulou um plano ardiloso para transferir a primogenitura para Jacob. Ela cobriu o corpo sem pelo de Jacob com uma pele de cabra, de forma que o pai, já cego, o confundisse com Esaú e assim o abençoasse como o novo patriarca.

Esaú chegou logo depois e, ao se dar conta do que havia acontecido, jurou que mataria o irmão. E, por isso, Jacob se afastou.

Foi morar com seu tio Labão na cidade de Harã e se apaixonou pela filha dele, sua prima Raquel. O tio obrigou Jacob a trabalhar sete anos de graça para lhe dar a mão da filha. Depois, Labão o enganou, forçando-o a se casar com sua outra filha, Léa, dobrando assim para 14 anos o tempo de trabalho gratuito.

Passaram-se 20 anos até que Jacob conseguisse se livrar das garras do tio trapaceiro e voltar para casa com as duas esposas e os muitos filhos. Ele ainda sentia muito medo do reencontro com o irmão.

A Bíblia, nesse momento, narra a misteriosa noite em que Jacob lutou contra o anjo da morte. Foi uma luta difícil, da qual ele não saiu derrotado, mas ferido. Naquela noite ele mergulhou dentro de si como nunca havia feito.

É importante entender que cada palavra da Bíblia possui um significado. Por exemplo, Jacob, em hebraico, significa também trapaceiro. E até então sua história havia sido marcada por uma grande trapaça, quando, ao enganar o irmão, tomou a sucessão do patriarcado.

Jacob poderia ter argumentado que o plano era de sua mãe, ou que ele era muito mais apropriado para o cargo do que seu irmão. Ambas seriam razões pertinentes, mas justificariam a mentira?

Aquela foi a noite mais longa de sua vida. Sozinho no deserto, sem a companhia dos parentes, Jacob estava com a cabeça a mil. Foi tomado por pensamentos obscuros, pela ansiedade de rever o irmão e, principalmente, pelo medo da morte. E então, diante do silêncio do deserto, ele entrou em profunda meditação.

Jacob ficou face a face com o maior de seus inimigos: aquele que morava dentro dele. Era necessário dar um mergulho muito profundo dentro de si. E isso lhe doeu muito, causou-lhe um ferimento enorme. Mas, ao amanhecer, ele era um novo homem e tinha um novo nome: Israel.

O nome Israel tornou-se um símbolo. Muito mais que um espaço geográfico, ou que a representação de uma etnia, essa denominação contém a força de superação que Jacob adquiriu ao lutar contra seu medo e sua inclinação negativa.

Há também um grande código por trás da palavra Israel. A palavra original hebraica é formada pelas iniciais dos sete patriarcas bíblicos: Abrahão e Sara, Isaac e Rebeca, e Iacov (escreve-se assim em hebraico, em vez de Jacob) com suas duas esposas, Raquel e Léa.