8

Verão, Quinze Anos Antes

Os meus passos soaram na gravilha da entrada do jardim, o ar estava pesado com humidade e sentia-se um cheiro rico a musgo, fungos e terra húmida. O Sam tinha começado a correr na primavera e estava determinado a converter-me à sua causa. Tinha preparado um programa completo para principiantes, a começar neste dia, o meu primeiro dia na cabana. Tinha-me avisado para tomar um pequeno-almoço leve, nunca depois das sete da manhã, e para me encontrar com ele na entrada do jardim às oito horas.

Parei quando o vi.

Estava a fazer alongamentos, de costas para mim, usava auscultadores e puxava um braço por cima da cabeça enquanto se inclinava para o lado. Aos 15 anos, o seu corpo tinha-se tornado quase estranho para mim. Não sei bem como, mas tinha crescido pelo menos mais 15 centímetros desde a última vez que o vira, nas férias de Natal. Já tinha reparado no dia anterior, quando ele e o Charlie vieram ajudar-nos com as malas («Já é oficialmente uma tradição anual», ouvi o Charlie dizer ao meu pai.), mas não tive tempo para inspecionar pormenorizadamente o Sam, antes de ele e o Charlie nos deixarem para fazerem os seus turnos na Taberna. Nesse verão, o Sam trabalhava três noites por semana na cozinha, e eu já sofria com o tempo de separação. Nesse momento, a sua camisola preta de corrida levantou-se um pouco e deixou à mostra um bocado de pele bronzeada. Fiquei a olhar, pasmada, com o sangue a subir-me ao pescoço.

O cabelo continuava denso e rebelde, e ele ainda usava a pulseira no pulso esquerdo, mas já devia ter muito mais do que um metro e oitenta, e as pernas tinham esticado quase infinitamente a seguir à bainha dos calções. Quase tão improvável como a sua altura era o facto de ele também estar mais sólido. Tinha os ombros, os braços e as pernas mais cheios, e o rabo… bem, já não se podia dizer que parecia um disco de jogar na praia.

Dei-lhe uma palmada no ombro.

— Credo, Percy! — exclamou, virando-se e tirando os auscultadores.

— Bom dia também para ti, estranho — respondi, abraçando-o pela cintura. — Seis meses é demasiado tempo — continuei, encostada ao seu peito. Ele apertou-me com força.

— Cheiras a verão — replicou. Depois, agarrou-me pelos braços e afastou-se. O seu olhar pousou no meu top de desporto elástico. — Pareces uma verdadeira corredora.

Tinha sido ele. Eu tinha uma gaveta cheia de roupa de desporto comprada segundo as indicações que ele me tinha dado. Tinha vestido uns calções e um top desportivo, bem como um soutien de desporto, que o Sam tinha incluído na sua lista de forma embaraçosa, e uma das tangas de algodão que a Delilah me tinha oferecido antes de ir na sua viagem de férias à Europa só com a sua mãe, e que ele não tinha incluído na lista. O cabelo, que já me ficava muito abaixo dos ombros, estava apanhado num rabo de cavalo no topo da cabeça.

— Finge até conseguires, não é?

Ele concordou e depois, ficando muito sério, ensinou-me uma série de alongamentos. No meu primeiro agachamento, ele pôs-se por trás de mim e segurou-me pelas ancas. Quase me desequilibrei para trás com a força do seu aperto.

Quando já tinha alongado o suficiente, ele passou a mão pelo cabelo e voltou ao plano.

— Bem, vamos começar pelas coisas mais básicas. A parte mais importante de aprender a correr é… — E ficou à espera de que eu terminasse a frase.

— Bom calçado? — alvitrei, olhando para os meus Nike novos. Ele abanou a cabeça, desiludido.

— Não leste o artigo «Do sofá aos cinco quilómetros» que te enviei por e-mail?

Ele tinha-o visto numa revista de corrida e juntara-lhe uma complicada tabela de tempos e distâncias. Eu tinha-o lido… uma vez… mais ou menos.

— A parte mais importante de aprender a correr é andar — afirmou, com as mãos nas ancas. Reprimi uma gargalhada. Aquela atitude mandona era completamente nova, quase adorável e decididamente cómica. — Portanto, vamos passar a primeira semana a fazer três quilómetros para lá e para cá, aumentando todos os dias a distância que corres, até que, no fim da semana, já corres os três quilómetros completos. Terás dois dias de descanso por semana e, no fim da segunda semana, já deverás correr os cinco quilómetros.

Quase não entendi uma palavra do que ele tinha dito, mas cinco quilómetros parecia-me ser bastante longe.

— Quanto é que tu costumas fazer? — perguntei.

— Daqui à vila e depois o regresso. Cerca de 12 quilómetros. — Fiquei boquiaberta. — Treinei até conseguir. Tu também hás de lá chegar.

— Não. Nem pensar! — gritei. — Há demasiadas colinas!

— Calma. Um dia de cada vez. — Fez um gesto na direção da estrada, começando a andar. — Vem daí. Durante os primeiros cinco minutos, andamos.

Olhei para ele, desconfiada, mas apressei o passo e acertei o meu com o dele.

Se o dia infernal de caminhada no campo que havia na minha escola primária ainda não o tivesse tornado óbvio há anos, era impossível não o ver naquele momento: eu não nascera para correr. Passados dez minutos, já limpava a transpiração da cara e tentava ignorar o fogo que sentia nos pulmões e nas coxas.

— Três novidades? — perguntou o Sam, sem vestígios de cansaço.

— Nada de conversa — repliquei, carrancuda.

Depois disso, ele abrandou o passo. Quando chegámos a metade do caminho, tirei o top, limpei a cara com ele e prendi-o na parte de trás dos calções. Durante a última parte do percurso, as minhas pernas tremiam tanto como as de um veado bebé.

— Não sabia que transpiravas tanto — disse o Sam, quando me viu limpar a cara ao top, mais uma vez.

— E eu não sabia que eras tão masoquista — respondi. Aquela coisa das corridas já não era assim tão adorável.

— O curso de escrita melhorou mesmo o teu vocabulário — retorquiu, e eu quase podia ver o sorrisinho por trás daquilo.

O acesso a casa dos Floreks surgiu antes do nosso e eu segui-o.

— Tenho de dar um mergulho no lago agora mesmo — disse eu, rodeando a casa e descendo a colina em direção água, com o Sam atrás de mim, com um sorrisinho na cara.

— Não sei qual é a graça — bufei.

— Não me estou a rir — respondeu, levantando as mãos.

Assim que chegámos à doca, tirei as sapatilhas e as meias, depois, despi os calções e atirei-os para o lado.

— Credo! — guinchou o Sam, atrás de mim. Virei-me.

— Que foi? — perguntei-lhe, ao aperceber-me de que estava a usar a tanga cor-de-rosa e de que o Sam estava a ver o meu traseiro extremamente despido. Eu estava demasiado exausta e chateada para me preocupar com isso. — Há problema? — perguntei, e os olhos dele fixaram-se nos meus, no meu traseiro e, de seguida, nos meus olhos outra vez. Ele gemeu «Foda-se» baixinho e ergueu os olhos para o céu. Tinha as duas mãos a tapar o meio das pernas. Arqueei as sobrancelhas. Sem saber o que fazer, corri para a ponta da doca e atirei-me à água, nadando submersa durante o maior tempo possível.

— Vens? — gritei-lhe, com um sorriso malicioso na cara, quando vim à superfície. — A água fria é capaz de te acalmar.

— Primeiro, tens de olhar para o outro lado — insistiu ele, ainda com as mãos no mesmo sítio.

— E se não olhar? — provoquei, nadando para mais perto.

— Vá lá, Percy, por favor. — Ele parecia estar em genuíno sofrimento, o que era bem feito, por me ter obrigado a participar nas suas corridas. Mas, por dentro, eu estava extasiada. Afastei-me para que ele pudesse saltar para a água. Estávamos a cerca de dois metros um do outro, a agitar a água e a entreolharmo-nos.

— Desculpa — disse ele, aproximando-se. — Foi só uma reação do meu corpo.

Uma reação do corpo?

— Eu percebi — respondi, mais do que desiludida. — Miúda seminua é igual a ereção. Biologia básica.

Depois de nadarmos, quando subi para a doca, o Sam virou a cabeça. Deitei-me de costas, deixando que o sol me secasse, com as mãos a fazerem de almofada por baixo da cabeça. O Sam deitou-se ao meu lado, na mesma posição, com os calções a pingar água.

Virei a cabeça para ele e disse-lhe:

— Acho que é melhor deixar aqui um biquíni para a próxima vez.

*

Deixei um dos meus biquínis e uma toalha extra em casa dos Floreks, para poder nadar no lago assim que regressássemos da tortura que eram as corridas do Sam. Ele tinha jurado que eu ia acabar por adorar, mas, no fim da segunda semana, tudo o que ganhei foi um monte de sardas espalhadas pela cara e pelos ombros.

Tínhamos acabado de regressar de uns cinco quilómetros preguiçosos, tirei o biquíni da corda, acenei à Sue, que estava a tratar do jardim, e meti-me na casa de banho para trocar de roupa, enquanto o Sam fazia o mesmo no quarto dele. Tirei a roupa suada, vesti o biquíni de tiras que a minha mãe tinha finalmente autorizado, amarelo com margaridas brancas, e dirigi-me à cozinha para esperar pelo Sam. Estava a beber um copo de água junto ao lava-louça quando alguém pigarreou atrás de mim.

— Bom dia, alegria!

O Charlie estava encostado à ombreira da porta, de boxers e tronco nu, o seu uniforme preferido. Não que eu me importasse. O Charlie estava em grande forma para quem tinha 17 anos.

— Nem sequer são nove da manhã — arquejei, ainda sem ter recuperado o fôlego. — Que estás a fazer a pé?

— Boa pergunta — disse o Sam, entrando na cozinha. Tirou-me o copo da mão e encheu-o de novo. Enquanto o Sam bebia, o Charlie olhou-me de alto a baixo sem vergonha, demorando-se na zona do peito. Quando os seus olhos chegaram de novo aos meus, franziu as sobrancelhas sobre os olhos verdes.

— Pareces um tomate, Pers — retorquiu, virando-se depois para o Sam. — Porque é que continuas a obrigá-la a fazer os teus exercícios? A nossa família é que tem corações fracos, não a dela.

O Sam puxou o cabelo para trás.

— Não estou a obrigá-la. Pois não, Percy? — E olhou para mim em busca de apoio. Eu encolhi-me.

— Não… tecnicamente, não estás a obrigar-me… — divaguei, quando vi a expressão amarfanhada dele.

— Mas não gostas — concluiu o Charlie, estreitando os olhos na minha direção.

— Gosto de como me sinto depois de acabar — afirmei, tentando encontrar algo positivo para dizer. O Charlie pegou numa grande maçã que estava na cesta da fruta e deu-lhe uma dentada.

— Devias experimentar nadar, Pers — disse ele, de boca cheia.

— Nadamos todos os dias — respondeu o Sam, naquele tom inexpressivo que reservava para quando o irmão o aborrecia.

— Não, nadar grandes distâncias. Atravessar o lago — explicou o Charlie. O Sam olhou para mim e tentei não parecer muito entusiasmada. Tinha olhado inúmeras vezes para a extremidade mais afastada do lago e perguntado a mim própria se conseguiria nadar até lá. Parecia-me incrível.

— Isso parece-me interessante — respondi.

— Posso ajudar-te a treinar, se quiseres — ofereceu-se o Charlie. Mas, antes que eu pudesse responder, o Sam interveio:

— Não, nós estamos bem assim.

O Charlie voltou a olhar-me de alto a baixo, lentamente.

— É claro que precisarias de um fato de banho.

*

Os treinos de natação eram muito mais divertidos do que os de corrida. Também eram mais duros do que eu pensara. O Sam ia buscar-me à cabana todas as manhãs, depois da sua corrida, e caminhávamos juntos até casa dele, para ele trocar de roupa. Tínhamos uma rotina de aquecimento, que envolvia alongamentos na doca e piscinas entre a doca e a jangada. Às vezes, o Sam nadava ao meu lado, dando palpites sobre a minha técnica, mas normalmente ficava a boiar agarrado a um tubo de espuma de piscina.

O Charlie tinha razão em relação ao fato de banho. Durante o meu primeiro aquecimento, passei o tempo todo a arranjar a parte de cima para não me sair nada do sítio. Nessa tarde, o Sam levou-nos no seu barco mais pequeno até à doca da vila e depois fomos a pé até aos armazéns Stedmans. Era uma mistura entre um centro comercial e uma loja dos 300 e tinha um pouco de tudo, mas nunca sabíamos se teria aquilo que procurávamos.

Por sorte, havia um expositor de fatos de banho femininos logo à entrada. Alguns tinham aquelas sainhas de folhos à antiga, mas também tinham uma série deles lisos, num tom vermelho-cereja. Práticos, baratos e minimamente giros: típicos dos armazéns Stedmans. Na secção de desporto, o Sam encontrou uns óculos de natação, e eu paguei ambas as peças com uma nota de 50 dada pelo meu pai. Gastámos o troco na gelataria — Moose Tracks para o Sam e algodão-doce para mim —, regressámos à doca e sentámo-nos num banco à beira da água a terminar os gelados. Estávamos a olhar para o lago em silêncio quando o Sam se inclinou e passou a língua em volta do meu cone, onde o gelado começava a derreter e a escorrer em riscos azuis e cor-de-rosa.

— Não percebo porque é que gostas tanto disto, sabe só a açúcar — disse o Sam, antes de reparar na minha cara chocada.

— Que foi isso? — perguntei. A voz saiu-me uma oitava acima do habitual.

— Provei o teu gelado — respondeu ele. O que, claro, era óbvio, mas pela forma como um frémito me percorreu a pele, bem podia ter sido ele a lamber-me a orelha.

*

Conforme a minha distância percorrida ia aumentando, o Sam remava o barco pequeno ao meu lado, para o caso de eu precisar de ajuda ou de proteção em relação a outros barcos. Quando lhe sugeri que ligasse o motor para não se cansar tanto, ele enxotou-me, dizendo que eu não precisava do cheiro a gasolina nos pulmões enquanto nadava. Eu treinava todos os dias, estava determinada a conseguir nadar até ao outro lado do lago até ao fim de agosto.

Na semana antes da minha grande travessia, estava na cozinha dos Floreks à espera de que o Sam mudasse de roupa, enquanto ajudava a Sue a tirar a louça da máquina.

— Ele contou-te que, todas as manhãs, antes de ir correr, ainda levanta os velhos pesos do pai? — perguntou-me a Sue, enquanto eu arrumava os copos no armário. Abanei a cabeça.

— Ele está mesmo entusiasmado com esta coisa de estar em forma, não está?

Ela entoou um som de concordância.

— Acho que ele quer ter a certeza de que consegue resgatar-te, caso precises — respondeu ela, apertando-me o ombro.

Na manhã em que ia tentar fazer a travessia, desci até junto da água, com os meus pais atrás de mim, de canecas de café na mão e uma velha máquina fotográfica. Quando o Sam chegou à doca, dirigi-me a ele, descalça, com a toalha e os óculos nas mãos.

— É hoje o grande dia. Como te sentes? — perguntou ele do barco à medida que eu me aproximava.

— Muito bem. Vou conseguir — gritei-lhe, enquanto lhe atirava com a toalha.

— Boa, boa — murmurou, procurando alguma coisa no barco. Parecia… nervoso.

— E tu, como te sentes? — perguntei. Ele levantou a cabeça na minha direção e esfregou o nariz.

— Sei que vais ser ótima, mas devo admitir que estou um pouco preocupado que alguma coisa corra mal. — Nunca tinha ouvido o Sam em pânico. Mas, naquele dia, era assim que ele estava. Entrei no barco.

— A água está calma, tu sabes fazer suporte básico de vida, tens um colete salva-vidas extra e também uma boia de salvação, temos um apito no barco para chamar ajuda, se for preciso, não que vá ser necessário, porque até temos público. — Apontei para a doca, onde os meus pais se tinham juntado à Sue e ao Charlie, e acenei-lhes.

— Estamos a torcer por ti, Percy! — gritou a Sue.

— Além disso — continuei —, sou uma excelente nadadora. Não tens razões para te preocupares. — O Sam inspirou profundamente. Estava um pouco pálido. Introduzi o dedo em volta da pulseira dele. — Juro, está bem?

— Tens razão. — Soltou um suspiro. — Só não te esqueças de descansares, se precisares. Podes sempre boiar durante um bocado.

Dei-lhe uma palmadinha no ombro.

— E então, vamos a isto?

— Vamos — respondeu ele. — Podia desejar-te boa sorte, mas não precisas.

Depois de estar na água, pus os óculos, mostrei o polegar ao Sam e voltei a minha atenção para a outra ponta do lago — o meu objetivo era chegar a uma praia pequena e rochosa. Respirei fundo três vezes, dei balanço com os pés contra o fundo do lago e avancei num crawl firme, com os braços e as pernas sincronizados. Não me apressei e depressa o ritmo se tornou automático, com a voz do corpo a sobrepor-se à da mente. Conseguia ver parte do barco quando virava a cabeça para respirar, mas não lhe prestava muita atenção. Estava a fazê-lo! Estava a atravessar o lago. O meu lago. Com o Sam ao meu lado. Um sentimento de orgulho encheu-me, dando-me força e distraindo-me do ardor nas pernas e da dor no peito. Continuei a avançar, abrandando quando precisava de recuperar o fôlego.

Mudei para bruços durante uns minutos para aliviar a tensão nos ombros, depois, voltei ao estilo inicial. Às vezes, conseguia ouvir o Sam a animar-me, mas não percebia nada do que ele dizia. De vez em quando, conseguia mostrar-lhe um polegar para cima, para ele saber que eu estava bem.

Quanto mais perto estava, mais hirtos sentia os membros. A dor no pescoço e nos ombros crescia exponencialmente e eu lutava para me manter concentrada na respiração. Cerrei os maxilares contra a dor, mas não parei. Sabia que não o faria. Ia conseguir chegar lá. E quando cheguei, puxei o corpo para a areia da praia, tirei os óculos e fiquei deitada, com a cabeça entre as mãos, as pernas ainda dentro de água, a respirar fogo pelos pulmões. Nem ouvi o Sam a puxar o barco para a praia — não reparei nele até ele estar agachado ao meu lado, com uma mão nas minhas costas.

— Percy, estás bem? — Abanou-me suavemente, mas não me mexi. Era como se o meu corpo estivesse tapado com aquele cobertor de chumbo que nos põem quando fazemos um raio-X. A voz do Sam soou-me subitamente junto ao ouvido. — Percy, Percy, diz-me que estás bem.

Virei a cabeça para ele e abri um olho. Estava a poucos centímetros, com uma expressão muito preocupada.

— A-hã — respondi. — Preciso de estar deitada.

O Sam soltou um suspiro enorme e a sua expressão alterou-se para júbilo.

— Percy, conseguiste! Conseguiste mesmo! Foste incrível!

As palavras jorravam-lhe da boca, mas eu tinha de fazer um esforço para as compreender. Sentia-me a delirar.

— Nem acredito que nadaste tudo de seguida, sem fazer pausas. Parecias uma máquina!

Ele tinha o maior sorriso do mundo. O Sam parecia ficar cada vez mais giro e, quando sorria assim, tornava-se completamente irresistível. Ele é lindo. Dei por mim a sorrir perante aquela constatação.

— Acabaste de dizer que eu sou lindo? — Ele riu-se.

Credo, devo ter dito aquilo um bocado alto.

— Deves estar mesmo exausta — disse, tirando a t-shirt e deitando-se ao meu lado, com as pernas também dentro de água e o braço por cima das minhas costas. Cheirava a sol e a suor. Fechei os olhos e inspirei profundamente.

— E também gosto do teu cheiro — murmurei, mas, dessa vez, ele não respondeu.

Passados cinco minutos ou cinco horas, o Sam disse que devíamos regressar, para que ninguém ficasse preocupado. Pus-me lentamente de gatas e, com a ajuda do Sam, entrei no barco com as pernas bambas, como se fossem feitas de gelatina.

— Bebe isto — ordenou, passando-me uma lata de Gatorade azul e embrulhando-me numa toalha. Depois de eu dar uns goles, surgiu-lhe de novo um sorriso na cara.

— Estou tão orgulhoso de ti — afirmou.

— Bem te disse que ela era uma nadadora — disse o Charlie ao Sam, enquanto ele me ajudava a sair do barco, e apertou-me o ombro.

— É mesmo — respondeu o Sam. O sorriso parecia colado ao seu rosto, muito maior e mais aberto do que aquele meio sorriso que costumava ter.

Quando saí do barco, havia uma fila para me abraçar. Primeiro, a minha mãe («Estiveste incrível no lago, querida.»), depois, o meu pai («Não sabia do que és capaz, miúda.») e, por fim, a Sue, que me apertou mais do que qualquer outro. Naquela altura, eu já era uns centímetros mais alta do que ela, e ela pareceu-me suave e pequena. Ficou de mão dada comigo quando nos afastámos.

— És uma miúda fantástica, sabes? — declarou, ficando com pequenas rugas no canto dos olhos. — Vamos lá encher-te de comida. Sou eu que faço o pequeno-almoço.

Até ao dia de hoje, não me lembro de alguma vez ter voltado a comer tanto bacon como naquela manhã. Os meus pais tinham voltado para a cabana, mas a Sue fez comida que dava para dez pessoas. Cozinhou bacon normal e bacon à canadiana, e os dois rapazes ficaram a observar-me, fascinados, a devorar pedaço atrás de pedaço, juntamente com ovos mexidos, torradas e tomate assado.

No fim da refeição, a Sue olhou-nos a cada um nos olhos e disse:

— Estou muito impressionada convosco este verão. Estão mesmo a crescer. Charlie, tens sido uma ajuda preciosa na cozinha e, Sam, estou muito agradecida por também já estares a trabalhar comigo. Não sei o que faria sem os meus rapazinhos.

Disse-o com total convicção e com a voz firme, apesar da emoção.

— Provavelmente, ias acorrentar algum pobre adolescente ao lava-louça do restaurante — comentou o Charlie.

A Sue riu-se.

— Sem dúvida. O trabalho duro faz bem à alma. Percy — continuou. — É preciso muita dedicação para fazer o que fizeste hoje, já para não falar daquele concurso de escrita que ganhaste. Estou tão orgulhosa como se fosses minha filha.

Deu-me uma palmadinha na mão e retomou o seu pequeno-almoço, como se não tivesse acabado de me fazer o maior elogio que eu alguma vez recebera de um adulto. Quando olhei para o Sam, ele estava a lacrimejar.

Era o fim perfeito para aquele verão.

*

Olá, Percy.

Eu sei que o Dia de Ação de Graças foi no fim de semana passado (já agora, ainda estou enjoado pela forma como a Delilah se babou para cima do Charlie), mas adivinha! A minha mãe vai dar-me folga na noite da passagem de ano, por isso, vamos poder passá-la juntos.

Sam

*

Sam,

A Delilah acha que o Charlie é giro, mas não te preocupes, ela tem um fraquinho pelo melhor amigo do primo. Até quer obrigar-me a ir a um encontro a quatro com eles, portanto, é provável que esqueça o Charlie rapidamente. Ciumento?

A minha mãe comprou um velho conjunto de fondue numa venda de garagem e vai fazer o jantar de passagem de ano ao estilo dos anos 70. Espero que gostes de queijo derretido.

Percy

*

Percy,

Só uma pessoa horrível podia não gostar de queijo derretido.

Não gosto da Delilah dessa maneira, se era que isso que querias dizer. Conheces o primo dela?

Sam

*

Sam,

Ainda não conheci o primo dela. Está no 12.º ano, como o Charlie, mas está noutra escola. Chama-se Buckley!!! Mas toda a gente lhe chama Mason, porque é o seu apelido, e parece-me que ele não deve gostar muito de Buckley. Quem gostaria?

Contagem decrescente para a passagem de ano!

Percy

*

Como tinha prometido, a minha mãe esmerou-se na sua noite de passagem de ano inspirada nos anos 70. Fez fondue e salada César, e sentámo-nos os quatro no chão, junto à lareira, a mergulhar pedaços de pão torrado no saboroso líquido amarelo, enquanto ouvíamos álbuns da Joni Mitchell e dos Fleetwood Mac no velho gira-discos do meu pai, que a minha mãe tinha mandado arranjar como prenda de Natal para ele.

— Isto, na verdade, é um bocado nojento, estarmos todos a pôr os nossos garfos dentro do mesmo queijo — disse eu, e a minha mãe lançou-me um olhar.

— Mas é tão delicioso — disse o Sam, agitando um pedaço de pão a pingar queijo perto da minha cara.

— Não podia concordar mais contigo, Sam — respondeu o meu pai, tirando o pedaço de pão ao Sam e metendo-o na boca.

Para a sobremesa, a minha mãe tinha feito bolo de cenoura. Depois, jogamos póquer com fósforos até o Sam nos deixar a todos na falência.

— Não sei se hei de ficar perturbado ou impressionado com o facto de alguém com 15 anos conseguir manter uma cara tão impenetrável — comentou o meu pai, ao entregar os seus últimos fósforos ao Sam.

À meia-noite, a minha mãe deixou-nos beber uma taça de champanhe cada um, e as bolhas deixaram-me as mãos e a cara quentes. Pouco depois, os meus pais prepararam o sofá onde o Sam ia dormir com lençóis presos nas almofadas, deitaram o resto do champanhe nos nossos copos e foram deitar-se.

Eu e o Sam sentámo-nos nas pontas do sofá, virados um para o outro, com a manta estendida sobre as nossas pernas. Eu estava triste por ter de voltar para a cidade dali a dois dias e queria passar a noite toda acordada a conversar. Ele tocou-me na perna com o pé, por baixo da manta.

— Vais contar-me como correu o teu encontro com o Buckley?

Não tínhamos falado sobre o primo da Delilah desde que eu o tinha mencionado uma vez num e-mail, esperando que isso levasse o Sam a confessar o seu amor por mim. Não tinha funcionado como planeado, e eu pensara que o Sam o tinha esquecido completamente.

A verdade é que eu e a Delilah tínhamos saído várias vezes com o Mason e o seu amigo Patel. Usar os apelidos como nome próprio parecia ser algo comum no grupo deles — ambos andavam numa escola privada só para rapazes, perto de onde eu vivia, e jogavam na mesma equipa de hóquei.

Fiquei surpreendida por a Delilah sair com alguém que era tão sossegado e de poucas palavras como o Patel, mas ele tinha uns olhos castanhos enormes e um sorriso ainda maior.

«Dá para perceber que ele é profundo», explicara-me ela, quando a questionei. «Os guarda-redes são sexy, e aposto que é ótimo a beijar.»

O Mason era obcecado por hóquei, por ganhar músculos para o hóquei e por deixar crescer o seu cabelo escuro para que este aparecesse encaracolado por baixo do capacete de hóquei. Tinha olhos azuis, como a Delilah, e também era lindo como ela, e penso que provavelmente tinha consciência disso, como ela tinha, mas, na verdade, era um tipo bastante simpático. Só que eu não pensava constantemente nele como pensava no Sam.

— O nome dele é Mason — corrigi-o. — E não há muito a contar.

— Podemos começar pelo básico. Gostas do Mason? — perguntou, com um meio sorriso.

Dei-lhe um pontapé. Depois, encolhi os ombros.

— É fixe.

— Só fixe? Hum, o caso é sério. — E, depois de um momento, continuou: — Não achas que é um pouco velho para ti?

— Ele vai fazer 18 anos daqui a umas semanas, e eu faço 16 em fevereiro. Além disso, só fomos a dois encontros.

— Não me tinhas falado do segundo.

Será que devia falar-lhe de outros rapazes? Ele não me contava nada sobre outras raparigas.

— Não me pareceu que te importasses, e também não é como se ele fosse meu namorado — defendi-me.

— Mas quer ser.

Não era uma pergunta.

— Não sei. Acho que os rapazes não pensam em mim dessa maneira.

— De que maneira, Percy?

Estaria a gozar comigo? Ou não percebia o que eu queria dizer? Eu tinha a cabeça tonta da confusão e do champanhe.

— Não têm interesse em beijar-me — respondi, baixando os olhos para as nossas pernas.

Ele tocou-me com o pé outra vez.

— Isso não é verdade. E, para que saibas, eu importo-me.

*

O Sam tinha razão. O Mason estava interessado. Em janeiro, eu e a Delilah fomos a dois dos jogos de hóquei dele e do Patel. Sentámo-nos nas bancadas, com copos de mau chocolate quente entre as mãos para as aquecer naquele recinto gelado. Em cada jogo, o Mason fez questão de me acenar do rinque de gelo antes de se posicionar no seu lugar de asa direita para o lançamento.

Consegui perceber por que razão ele gostava do hóquei: era o melhor jogador da equipa, de longe. De cada vez que marcava, olhava para mim, nas bancadas, com um sorriso enorme. No fim do segundo jogo, eu e a Delilah esperámos por eles à porta dos balneários, para depois irmos comer pizzas. O Mason saiu, de cabelo molhado e a cheirar a champô, com um saco de desporto enorme pendurado ao ombro. Vestia calças de ganga e uma camisola de gola alta justa, agarrada ao tronco e aos braços. Era ainda mais musculado do que o Charlie, e, tinha de admitir, era mesmo atraente. Enquanto a Delilah e o Patel caminhavam à nossa frente, o Mason puxou-me para a ombreira de uma porta, disse-me que eu era bonita e deu-me um beijo leve nos lábios. Eu agradeci e sorri-lhe, um pouco atordoada, sem saber bem o que vinha a seguir ou o que ele esperaria de mim.

— Gosto que sejas tão atrevida — disse ele, a rir-se.

Eu e a Delilah fomos convidadas para a festa de aniversário dos 18 anos do Mason, que se realizou num hotel um pouco pretensioso, em Yorkville, no fim do mês, que tinha um DJ, uma banca de sushi e uma lista de 120 convidados. A Delilah tinha garantido que todas as nossas colegas de turma sabiam daquilo, e tínhamos recebido a devida admiração respeitosa.

Na noite da festa, eu e a Delilah arranjámo-nos em casa dela — fizemos caracóis com ferros quentes e maquilhámo-nos com rímel e lip gloss —, mas, quando vesti o vestido vermelho, justo e comprido que a Delilah dissera que exibia o meu «corpo lindo de morrer», ela gritou:

— Nem pensar! Não podes usar isso!

— De que é que estás a falar? — perguntei, baralhada, olhando para as minhas sabrinas douradas.

— Essas cuecas de avozinha! Não aprendeste nada comigo? Não tens uma tanga?

Olhei para ela, incrédula.

— Aqui, não!

— Não tens emenda. — Ela suspirou e atirou-me a tanga vermelha mais minúscula que eu alguma vez vira.

— Acho que a minha mãe não ia gostar nada disto — afirmei, pegando nela.

— Também não ia gostar de ver a marca das cuecas nesse vestido, acredita — respondeu.

Tirei o que tinha vestido e enfiei a tanga.

— Muito melhor! — disse a Delilah, e deu-me um beliscão no traseiro. — O Mason não vai conseguir tirar as mãos daqui.

Aquela ideia arrepiou-me.

Os pais da Delilah levaram-nos de carro até ao hotel, deram uma nota de 50 à Delilah para apanharmos um táxi para casa e deixaram-nos no bengaleiro, para irmos entrando.

— Não pensei que houvesse tantos adultos aqui — murmurei à Delilah, ao olhar em volta do salão. Mais de metade dos convidados eram de meia-idade ou mais velhos.

— O meu tio é uma pessoa importante em Bay Street. Tem qualquer coisa que ver com a bolsa — sussurrou ela de volta.

Dançámos com algumas miúdas mais velhas enquanto os rapazes olhavam para nós, sentados em cadeiras forradas. Às oito da noite, o pai do Mason, um homem alto, com cabelo grisalho e um ar simpático, de quem a Delilah disse que «está quase a despachar a segunda mulher», fez um brinde ao filho e, depois, acompanhado por exclamações dos convidados, atirou-lhe um porta-chaves. Corremos todos para a rua, enfrentando o frio, para ver o novo Audi do Mason estacionado à entrada.

— Esta noite, vou eu levá-lo para casa por ti — disse-lhe o pai, piscando-lhe o olho e passando-lhe um cantil. Em menos de 20 minutos, todos os adultos que restavam tinham desaparecido.

Quando, no sistema de som, se começou a ouvir a encantatória flauta de pan de uma balada da Céline Dion, o Mason apontou para mim e para si próprio com um sorriso. Caminhei até ele, e ele pôs-me as mãos na cintura, enquanto eu punha as minhas sobre os ombros do seu fato escuro. Girámos para a frente e para trás, movimentando-nos em círculo, e o Mason inclinou-se e juntou os lábios ao meu ouvido.

— Estás linda hoje, Percy. — Fixei os olhos nos dele, que eram azuis, mas de um azul mais escuro e espesso do que os do Sam, e ele puxou-me com força contra o seu corpo, fazendo com que a minha cara ficasse encostada ao seu peito. — Não consigo parar de pensar em ti — murmurou.

Quando a canção acabou, ele levou-me para o átrio, onde a Delilah, o Patel, três outros rapazes e outra rapariga se juntaram a nós. De repente, um dos rapazes, que se apresentou como Daniels, mostrou-nos uma garrafa que tirou de dentro do casaco, dizendo que era vodca.

— Mudamos o local da celebração? — perguntou, mexendo as sobrancelhas e abraçando a outra miúda, que se chamava Ashleigh.

Todos os rapazes tinham quartos nos andares de cima, e juntámo-nos na sala da suite do Mason e do Patel. O Daniels sentou-se num cadeirão com a Ashleigh ao colo, a Delilah e o Patel ficaram com o sofá e os outros dois rapazes sentaram-se no chão, deixando uma cadeira para mim e para o Mason. Ajeitei-me um bocadinho de lado, mas ele puxou-me para o seu colo e o seu braço rodeou a minha anca. O Daniels passou a cada um de nós um copo com vodca e gelo. Cheirava a acetona e queimou-me os lábios, mesmo antes de eu beber um gole minúsculo.

— Não bebas se não gostares — segredou-me o Mason ao ouvido, para ninguém ouvir. Eu sorri-lhe, agradecida, e deitei o conteúdo do meu copo no dele.

— Prefiro assim — respondi. Ele sorriu. Os seus polegares moviam-se para cima e para baixo na minha anca enquanto o grupo falava sobre o seu novo carro e sobre a época de hóquei. Era tudo muito desinteressante, tendo em conta que éramos um grupo de adolescentes sem vigilância e com uma garrafa de álcool. Reparei que ninguém, além do Daniels, que apalpava o rabo da Ashleigh como se fosse massa crua de pizza, tinha enchido o copo uma segunda vez. Pelas onze horas, os outros foram para os seus quartos, e eu e a Delilah levantámo-nos para irmos buscar os casacos.

— Percy, antes de ires embora, quero mostrar-te uma coisa — disse o Mason, passando a mão pelo cabelo e parecendo um pouco nervoso.

— Sim, aposto que queres — murmurou o Patel, e a Delilah deu-lhe uma cotovelada.

O Mason conduziu-me a um pequeno átrio que dava para um quarto elegante, todo em tons cinzentos e castanhos, com uma cama de casal enorme e uma cabeceira de camurça. Fechou a porta atrás de nós, abriu a porta do roupeiro, ajoelhou-se e marcou um código num pequeno cofre. Quando se levantou, trazia na mão uma pequena caixa de cor turquesa.

— Que é isto? — perguntei. — Não é o meu aniversário.

— Eu sei — respondeu ele, aproximando-se mais. — Ia guardá-la para os teus 16 anos, mas não consigo esperar. Abre-a.

Os olhos dele analisavam o meu rosto, com expetativa. Abri a tampa e encontrei uma bolsinha também turquesa. Lá dentro, estava uma pulseira de prata com um fecho moderno e vistoso.

— Pensei que talvez quisesses ser minha namorada — disse e sorriu. — E que talvez precisasses de algo mais especial do que isto. — E levantou-me o braço, onde eu tinha a minha pulseira da amizade. Eu não tinha antecipado nada daquilo.

— É linda… hum… uau! Nem sei o que dizer! — gaguejei. O Mason pôs-me a pulseira e apertou-a.

— Podes pensar, mas quero que saibas que gosto mesmo de ti.

Pôs as mãos nas minhas ancas, puxou-me para ele e baixou a cabeça para juntar os lábios aos meus. Eram macios e moveram-se suavemente. Depois, afastou-se apenas o suficiente para me olhar nos olhos e declarou:

— És inteligente e divertida, és tão bonita, e nem sequer te apercebes disso.

Beijou-me de novo, com mais intensidade, e, dessa vez, fechei os olhos. Imagens do Sam passaram a alta velocidade pela minha cabeça, e quando o Mason passou a língua pelo contorno dos meus lábios, pareceu-me que os meus joelhos iam ceder e agarrei-me aos seus braços. Ele deu-me uma série de pequenos beijos junto ao canto da boca, depois no nariz, de novo na boca e, no fim, passou-me a língua outra vez pelos lábios. Dessa feita, abri-os e imaginei que era a língua do Sam que se enrolava com a minha. O Mason gemeu e moveu as mãos para as minhas costas, encostando-se mais ao meu tronco. Afastei-me.

— Tenho de ir, senão vamos chegar muito atrasadas a casa da Delilah.

Ele não se queixou, passou só as mãos pelas minhas costas acima, deu-me mais um beijo rápido e depois pegou-me na mão.

Ao lado da minha pulseira de tecido, a de prata brilhava, pelo que a tirei logo, antes que a minha mãe a visse na manhã seguinte e me fizesse perguntas.

A Delilah ficou surpreendida com o presente, a que chamou «excessivo», mas não lhe pareceu que o Mason, com aquilo, quisesse tornar as coisas mais oficiais.

— Claro que ele gosta de ti, Percy. És uma brasa. E as tuas mamas cresceram mesmo este ano — sussurrou ela, num tom teatral. — É melhor levares as coisas com calma com o Mason. Percebo que não gostas dele como gostas da tua Paixão de Verão, mas podes pensar nele apenas como uma boa prática para o caso de as coisas virem a acontecer com o Sam.

Assim que cheguei a casa, enviei um e-mail ao Sam.

Olá, Sam.

Tenho andado a pensar mais na minha nova história. O que achas de um lago que é assombrado por uma menina que caiu através do gelo no inverno, deixando a irmã gémea para trás? Quando a irmã já é adolescente, regressa ao lago para acampar e vê uma figura estranha no bosque, que, mais tarde, se descobre que é a gémea que morreu e que quer matá-la para não continuar a sentir-se sozinha. Pode ser assustador, mas também triste. O que achas?

Outra coisa: eu e a Delilah fomos à festa de aniversário do Mason ontem à noite e ele pediu-me em namoro. Já sei que não vais ficar surpreendido, visto que o adivinhaste no Ano Novo, mas eu fiquei. O que achas que devo fazer?

Percy

*

Percy,

Continuo a achar que um lago cheio de peixes mortos-vivos é a melhor escolha. Estou a brincar. Uma menina morta arrepiante continua a ser a melhor das ideias. Vais batizar as gémeas com aqueles nomes pavorosos, como Lilah e Layla ou Jessica e Bessica?

Já te fiz esta pergunta, mas acho que está na altura de a fazer de novo: gostas do Buckley?

Sam

*

Sam,

Porque é que não pensei em Jessica e Bessica mais cedo? Genial!!! O Mason até é um tipo fixe, mas eu gosto mais de outra pessoa.

Percy

*

Percy,

Acho que tens aí a tua resposta. Sam